As escolas protestantes desde, pelo menos, o ano de 1908 patenteavam já a sua estabilização. Em 1909 havia 31 escolas patrocinadas pelas diferentes denominações protestantes, das quais 9 eram da responsabilidade de ILCAE. Cerca de 10 anos antes o seu número rondava as 25 para Portugal Continental e Ilhas; dessas 25, 5 eram da ILCAE. No cômputo geral as escolas da ILCAE representavam cerca de ¼ da oferta escolar protestante (20% em 1900; 29% em 1909), Relativamente só às escolas de ILCAE, constata-se que entre 1879 e 1923 mobilizaram uma população escolar de 17.642. Estas 9 escolas constituíam a rede escolar da ILCAE, situando-se em Lisboa, Porto, Vila Nova Gaia, Sintra e Setúbal. Algumas destas escolas não tiveram uma vida longa. As escolas protestantes nascem no período da Monarquia Constitucional, sendo este tempo também o da sua afirmação; provavelmente com maior significado de vinculação ao espaço de onde emergem, do que aquele que porventura podem ter tido no período republicano. No geral, as escolas protestantes pautaram-se sempre pela neutralidade, não pretendendo, na dimensão dos saberes transmitidos, afrontar os normativos dos Governos e, em certa medida, abdicando do seu carácter confessional, propondo um ensino que incluísse a modernidade e as suas inovações pedagógicas em detrimento da dimensão prosélita ou catequética. Neste aspeto sempre foram escolas pautadas por um espirito secular, tendendo, com alguma frequência para posições laicas.
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As razões que levaram os protestantes a assumirem esta neutralidade relacionam- se sobretudo com a prudência necessária para se poderem afirmar num país católico com uma escola confessional, pelo menos nos três primeiros anos do ensino elementar, onde o ensino da religião é obrigatório. A grande parte das escolas protestantes nascera num período onde havia a necessidade de lidar com muita sensibilidade, no que concerne à estruturação da oferta educativa. Neste sentido, pode ser lícito concluir que as Escolas souberam na perfeição captar públicos populares sem abdicarem da qualidade pedagógica (apesar que esta foi uma paulatina conquista dos próprios promotores) como deixam antever as posições dos alunos das Escolas protestantes nos Exames Públicos.
Como minoria religiosa salvaguardaram-se, num contexto onde a hegemonia sociológica do catolicismo era aparentemente uma realidade, optando por constituir uma oferta plausível, evitando confrontos religiosos, inserindo-se na sociedade, jogando, portanto, no terreno legislativo. Tal, contudo, não os inibiu de formularem críticas ao ensino confessional e partilharem com outros grupos, sectores e movimentos sociais um reportório argumentativo anticlerical e anticongreganista com base na premissa de que a educação é uma formação secularizada para uma vivência mais plena da cidadania, ancorada nas instituições liberais. No período republicano, e já como religião minoritária, pautaram a sua conduta pela adaptação das escolas à legislação –“ensino neutro em matéria religiosa” –, o que não evitou equívocos em algumas situações devido à interpretação restritiva do Artigo 10º. da Lei da Separação, que considerava o ensino religioso como igual a culto público, logo “carecendo de autorização prévia”, o que se traduziu em excessos por parte das autoridades republicanas.
Mas, associada a esta questão levantava-se um debate que os protestantes acaloravam: a escola neutra não quer significar a inexistência de escolas de raiz religiosa – logo, estava implícita a liberdade de ensino como corolário lógico da liberdade religiosa –, o que não queria significar que o ensino religioso fosse ministrado nas escolas, porque para este, os lugares próprios para ser transmitido eram a família e a igreja. O período republicano foi experienciado já com religião minoritária, onde a luta pela liberdade de ensino foi a tónica, apesar de no essencial as escolas terem “alterado os seus procedimentos desconformes com a lei” - como se pode ler no parecer de Alberto Xavier, administrador do 4º bairro de Lisboa, a propósito de uma vistoria ao Colégio Evangélico Lusitano - nunca abandonaram as posições que, desde a Monarquia Constitucional, vinham defendendo com veemência.
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