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Com base em tudo o anteriormente exposto, este tópico da dissertação deve responder às perguntas elaboradas no início da pesquisa:

a) É possível afirmar que a dignidade humana é fundamento da eficácia horizontal dos direitos humanos fundamentais entre particulares? b) Pode-se afirmar que a eficácia dos direitos fundamentais, além de

ser vertical (entre cidadão e Estado), é também aplicável às relações entre corporações e indivíduos ou entre indivíduos e outros cidadãos?

c) De que modo deve se operar a efetividade horizontal do direito fundamental social ao trabalho digno?

Como resposta à primeira pergunta, sobre a possibilidade da afirmação da dignidade da pessoa humana como fundamento da eficácia horizontal dos direitos humanos fundamentais entre particulares, tem-se que a conclusão é positiva.

A dignidade da pessoa humana foi analisada sob as suas dimensões básica e cultural, entendida a primeira como sendo o núcleo essencial deste princípio que deve ser respeitado e protegido em qualquer contexto e cultura. A dimensão básica é o limite que impede que o homem seja tratado como meio e utilizado, como se mero objeto fosse, para a satisfação dos interesses de outrem. Esta dimensão básica é o que previne a coisificação do ser humano.

Já a dimensão cultural é o componente contextualizado da dignidade e que permite o exercício da dimensão básica sob a ótica axiológica e ética de uma determinada cultura e lugar. Essa dimensão cultural possibilita que o indivíduo tenha protegida a dimensão básica de sua dignidade, o núcleo essencial dos seus direitos, e que esta mesma seja exercida através das lentes culturais de um determinado lugar e época da história, resguardando, assim, sua identidade cultural.

A dignidade foi ainda analisada sob a ótica da impossibilidade de sua atribuição ou retirada mediante qualquer atividade humana. Cuidou-se de analisar este princípio como característica inerente à própria existência do ser

humano. Foi possível perceber que, na evolução histórica do conceito de dignidade da pessoa humana, outros dois princípios estiveram intimamente ligados a ela, a liberdade e a igualdade, e, juntos, estes três princípios fundamentam a eficácia dos direitos fundamentais.

A dignidade, então, pode perfeitamente ser entendida como o fundamento da eficácia dos direitos fundamentais em relação às arbitrariedades eventualmente comentidas pelo Estado. A garantia da proteção da dignidade é o que faz com que o Estado reste impedido de intervir, de maneira irrestrita, na esfera da vida privada do indivíduo. A dignidade posa como limite à intervenção estatal, sendo verdadeiro fundamento da eficácia dos direitos humanos fundamentais.

No tocante à segunda indagação, que é atinente à possibilidade de oposição dos direitos fundamentais aos casos de colisão de interesses nas relações intersubjetivas privadas, quando os envolvidos são pessoas ou corporações, também a resposta deve ser positiva.

Na análise dos fundamentos da eficácia dos direitos fundamentais, foi encontrada na dignidade a principal justificativa para tal eficácia. Da mesma forma deve ser encarada a eficácia entre particulares.

Dentre os vários argumentos apresentados para a aceitação da aplicação dos direitos fundamentais às relações particulares, a irradiação dos valores e princípios constitucionais mereceu destaque. O fenômeno chamado de constitucionalização do direito privado foi vislumbrado como a verdadeira razão para a impregnação do direito privado pelos valores e princípios constitucionais, dentre eles, a dignidade da pessoa humana.

As três principais teorias de aplicabilidade dos direitos fundamentais às relações privadas, aplicação imediata, aplicação mediata e não aplicação, foram analisadas e foi possível perceber que, na doutrina nacional, a mais aceita é a da aplicação imediata e direta das normas de direitos fundamentais às relações, a qual postula a desnecessidade da criação de leis infraconstitucionais para regular o exercício de tais direitos.

Se a eficácia das normas de direitos fundamentais deve ser aplicada de maneira direta e imediata às relações intersubjetivas privadas, isso é

igualmente verdade às relações trabalhistas. Essa investigação é o principal objetivo da presente dissertação.

Assim, pode ser respondida positivamente a terceira indagação proposta sobre a possibilidade e a medida da eficácia horizontal dos direitos fundamentais nas relações de trabalho.

Na perseguição da solução à questão proposta, foram analisadas as peculiaridades das relações trabalhistas, em especial a desigualdade jurídico-econômica existente entre as partes. O empregador detém os meios e o capital, e o contrato de trabalho coloca o empregado em condição de subordinação econômica e jurídica ao empregador. Esta subordinação é o principal ponto de fragilidade dos direitos do trabalhador e a grande parte das violações e ameaças ao patrimônio jurídico do operário acontecem tendo como base esta subordinação.

Também a globalização foi apontada como terreno fértil para violações de direitos dos trabalhadores. As grandes mudanças no processo de controle e prestação de serviços, decorrentes dos avanços tecnológicos e do infindável fluxo de informações da chamada aldeia global foram indicadas como pontes de entrada dos abusos de direitos dos empregadores.

Nesta seara foi analisada a distinção entre os direitos laborais específicos e atinentes à prestação de serviços e os direitos laborais inespecíficos. Estes são entendidos como os direitos da personalidade do trabalhador que devem ser respeitados a despeito da vigência do contrato de trabalho. Isso porque o trabalhador não pode deixar de ser entendido como pessoa humana e merece ter seus direitos personalíssimos respeitados sob qualquer hipótese.

Aqui, mais uma vez, se percebeu o papel da dignidade da pessoa humana na fundamentação da eficácia horizontal dos direitos fundamentais. Se o trabalhador é pessoa, e não pode deixar de ser visto assim, apesar da existência de um limitador dos seus direitos, o contrato de trabalho, a sua dignidade deve ser preservada e garantida em qualquer circunstância.

Por fim, na discussão da metodologia da aplicação das normas de direitos fundamentais às relações privadas, chegou-se à conclusão de que é aplicável às relações intersubjetivas a eficácia direta e imediata dos direitos fundamentais, especialmente quando a violação for a um direito de proteção.

Quando o trabalhador tiver violado um de seus direitos da personalidade, neste trabalho também referidos como direitos laborais inespecíficos, caberá ao judiciário reparar a situação aplicando diretamente a eficácia dos direitos fundamentais.

Foi possível ainda perceber que o Supremo Tribunal Federal e o Superior Tribunal de Justiça aplicam, ao caso concreto, a eficácia direta dos direitos fundamentais, tanto em matéria de direito do trabalho, como em outras esferas do direito, sob o fundamento da dignidade da pessoa humana.

Ainda fundamentada na dignidade da pessoa humana é a decisão do Tribunal Regional do Trabalho de Santa Catarina, ao sumular a impossibilidade de impor e cobrar metas abusivas, sob pena de incorrer na obrigação de indenizar, como claro exemplo da aplicação direta e imediata dos direitos fundamentais às relações de trabalho.

Por fim, afirmou-se que a utilização da ponderação de direitos colidentes oferece resposta adequada ao problema do conflito entre direitos fundamentais dos particulares envolvidos em relações de trabalho. O princípio da proporcionalidade, observado em suas características de adequação, necessidade e proporcionalidade em sentido estrito, serve com elevada utilidade, ao propósito de reparar o direito violado e à medida que também preserva o direito limitado na solução dos conflitos de direitos.

A utilização da proporcionalidade, em caso de colisão de direitos fundamentais, mostrou ser uma metodologia capaz de impor limitações aos direitos fundamentais dos empregadores, sem que isso implique em esvaziamento de seu conteúdo, ao mesmo tempo em que promove a proteção e garantia dos direitos dos empregados porventura violados.

Por tudo o acima exposto, pode-se afirmar que a dignidade da pessoa humana é, de fato, o maior fundamento da eficácia horizontal dos direitos fundamentais nas relações intersubjetivas privadas, destacadamente, nas relações laborais quando ocorre a desigualdade econômica entre as partes e a subordinação jurídica do empregado ao empregador. Também a dignidade mostrou ser o principal fundamento da preservação dos direitos da personalidade do empregado na hipótese de abusos cometidos pelo empregador. Por fim, na hipótese de colisão entre direitos fundamentais dos

particulares envolvidos em relação laboral, deve ser utilizado o princípio da proporcionalidade como medida de solução do conflito e preservação dos direitos colidentes.

No documento UNIVERSIDADE DO OESTE DE SANTA CATARINA (páginas 114-119)