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Os homens se educam mediatizados pelo mundo.

Paulo Freire

Por meio de nossas análises foi possível compreender que se o tema escolhido pelos estudantes para seus seminários for próximo de questões do contexto universitário e possuir relação com seu curso, a atividade de apresentação se aproxima mais dos padrões esperados e construídos pela comunidade discursiva acadêmica para o gênero discursivo seminário. Nesse caso, fica mais nítido o processo de apropriação do gênero em questão, pois é possível verificar construções linguístico-discursivas e também gestuais/corporais indicando que os expositores estão construindo modos de apresentar seminário de acordo com a forma esperada no contexto universitário.

Todavia, quando o tema é um pouco distante do contexto acadêmico, o que se nota é justamente uma hibridização de gêneros. Isso ocorre porque os universitários reconhecem um padrão próprio do contexto em que se encontram, o qual deve ser construído e seguido em suas apresentações. Contudo, surge com isso uma força tensiva, pois, em nosso entender, o tema orienta também toda a configuração do gênero discursivo. A saída encontrada pelos estudantes é justamente hibridizar os gêneros para que a comunidade discursiva valide sua apresentação como sendo um seminário. Nesse sentido, essa tentativa de se adequar aos padrões construídos pela comunidade de que participam indicia que os estudantes estão em um processo de apropriação do gênero oral seminário, pois, embora não realizem efetivamente o modelo prototípico, considerando a noção de conjuntos de gêneros (BAZERMAN, 2005), eles estão em um gênero próximo a este, o que permite considerar que eles estão desenvolvendo competências discursivas e genéricas (MAINGUENEAU, 2005) próprias de um sistema de gêneros (BAZERMAN, 2005), ou seja, eles estão transitando entre gêneros próximos, o que nos permite conjeturar que esta seja uma forma de apropriação, dentro de um gradiente tensivo.

Os estilos dos estudantes também ficam bastante evidentes nas apresentações dos seminários. Isso sugere, mais uma vez, que os estudantes estão se apropriando do gênero em questão, pois não seria possível que eles conseguissem

desenvolver seus estilos dentro do gênero em questão e que esses fossem adequados à atividade linguística, caso não estivessem compreendendo o funcionamento da mesma.

No que tange à questão da construção do coenunciador coletivo, os estudantes o elaboram por meio de conhecimentos prévios de fala pública, isto é, situações de apresentação à frente de um grupo. Considerando seus coenunciadores diretos eles prevêem quais comportamentos linguísticos e discursivos serão mais adequados, de forma a garantir a continuidade da interação pretendida na atividade de apresentação de seminário. Nesse caso, eles se pautam em relacionamentos que possivelmente são oriundos da relação professor-aluno(s) e aluno(s)-aluno(s) em seus respectivos cursos e do contexto universitário, de forma que a elaboração de enunciados, com vistas a envolver o coenunciador, traz resquícios de maneiras de interagir, por um lado, do professor em aula e, por outro, entre os próprios estudantes.

O supradestinatário, nos casos dos seminários analisados, adequou-se aos propósitos esperados pelos estudantes com a realização da atividade discursiva de exposição oral e foi, em alguns casos, reformulado durante a própria situação de interação. Os estudantes expositores ainda demonstram domínio do gênero, pois para adequar suas falas a seus coenunciadores recorrem a estratégias linguístico-discursivas que seguiram padrões enunciativos adequados à atividade em questão. Além disso, seus discursos se construíram com orientação a seu coenunciador coletivo e também com os discursos circulantes na esfera universitária, evidenciando que os estudantes possuem competência discursiva no letramento acadêmico, o que lhes ajuda na realização dos seminários.

No caso do estudante indígena, avalia-se que embora ele revele algumas inadequações quando ao domínio da variante culta da língua portuguesa, essas não influenciam significativamente em sua realização da atividade de exposição. Ele demostrou domínio do gênero discursivo seminário ao assumir sua condição de expositor, que está ao mesmo tempo sendo avaliado por um docente, e, assim, agiu discursivamente dentro das fronteiras que delineiam tal gênero. Ele também percebeu o jogo tensivo de poderes, mas não se inibiu, buscando meios para conseguir aliar o que se espera de uma exposição oral na esfera acadêmica a seus propósitos pessoais com a realização de seu seminário.

As professoras demonstraram que, embora empreguem o seminário como atividade avaliativa, compreendem-no e ponderam questões diferentes, cada uma

elencando o que lhe servirá como critério mensurável e também qual a funcionalidade de tal atividade linguística em sua disciplina.

Com relação às orientações para a realização do seminário, visto que essa seja uma atividade de atribuição de conceitos, todas as docentes consideram que seus estudantes já dominam tal gênero discursivo e que saibam como realizá-lo, por isso não realizam orientações detalhadas ou minuciosas sobre tal gênero, mas as fazem de forma pontual ou rápida. Embora não percebam, as orientações dos professores são maneiras de conduzir o estudante à apropriação do gênero seminário. Entretanto, como essas orientações não satisfazem plenamente a condução à apropriação, o(s) estudante(s) precisa(m) procurar outras formas de garantir que esteja se adequando aos moldes dessa atividade, por isso eles se baseiam em conhecimentos prévios acerca do que seja apresentar seminário, seguindo padrões de apresentações realizadas anteriormente e mediante conhecimentos adquiridos em outras atividades presentes na esfera acadêmica, que contemplem concomitantemente, por um lado, questões da realização da atividade verbal e, por outro, questões avaliativas.

De maneira geral, o que se percebe é a construção de uma noção do gênero seminário com variações para cada professora, mas com base em uma prototipicidade (cf. SWALES, 1990). O(s) estudante(s), por sua vez, na interação com essas variações constrói(em) sua maneira de agir dentro de tal gênero, isto é, ele(s) desenvolve(s) seu(s) estilo(s) de acordo com padrões possibilitados por essa atividade linguístico-discursiva. Nesse sentido, a interação entre professor-aluno, aluno-aluno, e aluno-mundo orientará não só o estudante a apropriar-se do seminário, mas também os professores a refletirem o que consideram ser esse gênero, a cada vez que o empregam como forma de avaliação.

Dessa forma, é possível observar nas apresentações analisadas que os estudantes, a sua maneira, estão se apropriando do gênero discursivo seminário. Alguns alunos estão mais próximos dos padrões esperados pela comunidade acadêmica, levando-se em consideração, ainda, as diferenças de expectativa existentes em cada área de estudo dentro da universidade; outros ainda estão um pouco afastados, mas todos estão em processo de apropriação, pois todos estão, por serem recém-ingressos na universidade, desenvolvendo seu letramento acadêmico nos diferentes gêneros do discurso que aí são praticados.