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Reconhecer os desafios e problemática da Comunicação é atentar para o fato de que a multiplicidade dos fenômenos comunicativos converge reflexivamente, para Sodré (2007), para uma identificação teórica da comunicação como vínculo intersubjetivo, seja no nível das operações discursivas para produção de sentido, seja para no nível das formações sociais de controle e gestão do vínculo pelo discurso, como as desenvolvidas no âmbito da midiatização (SODRÉ, 2007, p.20).

Com base em Sodré (2007, 2010), em tempos de virtualização, a questão é entender a vontade do poder como força que possibilita a expansão da vida pelo bios midiático. Essa configuração que observa o nível relacional e vinculativo imbricados em um terceiro nível em que se desdobra a comunicação como objeto conceitual, o crítico-cognitivo em meio à virtualização em que a consciência é tecnológica com ação concreta dos sujeitos descoladas do contexto e da tradição cultural. Ou seja, uma outra ordem de relações.

A produção da existência nesse último nível tem na comunicação um processo menos informacional e instrumental e mais constitutivo capaz de produzir sentidos e discursos,

pensados na semiose social sugerida por Verón (1980), mas um social tratado como um novo tempo. Segundo Sodré (2007), uma temporalidade condensada no presente, de fluidez informativa no espaço ilimitado das redes em que a consciência não consegue representar os fenômenos dentro de um tempo. É um futuro que recai tecnologicamente sobre o presente, que por sua vez, é tratado digitalmente por imagens, equivalendo-se ao passado (SODRÉ, 2007, p.19)

Pensar uma semiose social em tempos de midiatização é reconsiderar o escopo da comunicação como fenômeno com inteligibilidade própria, como uma hermenêutica da existência seguindo recomendação de Sodré (2007) e, portanto, com papel importante na compreensão das relações societárias criadas no âmbito desse bios midiático que acabam por espraiar-se de modo complexo pelo conjunto do tecido social.

Essa compreensão não só obriga a lidar com a necessidade de pensar do ponto de vista epistemológico a comunicação tendo identificar a compreensão informacional que colonizou o sentido constitutivo do processo comunicacional, restringindo e dimensionando seu escopo a nível relacional e vinculativo para pensar a sociabilidade e a produção de sentido.

Em linhas gerais, o processo comunicativo – colocar em comum as diferenças por meio do discurso com ou sem auxílio da retórica – e até mesmo o processo comunicacional – fenômeno constituído pela ampliação tecnológica da retórica pela mídia – acabaram apropriados pelo campo econômico no processo histórico descrito em Mattelart (2006) por meio de uma infopolítica marcadamente estratégica que restringe a comunicação a uma vertente difusionista (a transmissão) para mediação utilitária e regulada identificadas nos discursos da comunicação como meio para a gestão da informação e do conhecimento que estão nos discursos institucionais demandados pela ambiência da configurada Sociedade da Informação.

Assim, com a midiatização – pensada como processo que supera a ideia da mediação e considera a comunicação como um fenômeno de inteligibilidade suficiente para institucionalizar, na perspectiva das mídias como meio para compreensão, novos jeitos de ser e estar no mundo tecnológico – acaba disputada no contexto da Sociedade da Informação.

A questão que se destaca como fundamental, portanto, é referenciar na perspectiva da comunicação os conflitos contemporâneos.

Na sociedade da informação, o discurso informacional regula o fenômeno comunicacional, instrumentalizando os níveis desse fenômeno (relacional, vinculativo e

crítico-cognitivo), sobretudo a vertente relacional de caráter propriamente informacional. Essa instrumentalidade acaba por instituir, sob a lógica das forças econômicas, práticas políticas e culturais responsáveis pela manutenção do jogo de forças que coloca as tecnologias, a informação e a comunicação no centro de um reordenamento de forças determinadas pela mudança societária do capitalismo.

Nessa perspectiva, a midiatização se torna simbolicamente um terreno em disputa para um permanente conflito pela expansão da vida como força que representa a vontade de poder que, como vimos, está no cerne da Sociedade da Informação na leitura crítica dos mecanismos e estratégias identificadas por Lopes (2008) a partir do desenho das mudanças descritas em Lastres e Ferraz (1999) e Castells (1999, 2009, 2010) com as devidas observações críticas da natureza e significado dessas alterações para uma sociedade nada nova apesar das terminologias.

É evidente que a leitura da disputa na Sociedade Midiatizada pela expansão da vida é permeada por um jogo de forças entre a regulação e emancipação em toda a trama da vida social (VIZER, 2006) na permanente produção discursiva de sentido que tem as tecnologias da informação e da comunicação nas duas dimensões de Herscovici (2002), operando como produtivas, mas também na conformação de mecanismos de regulação no campo do simbólico.

Essa dimensão conflitiva envolvendo a comunicação como objeto conceitual com suas respectivas dimensões e níveis identificados por Sodré (2006, 2007, 2010) referencia de modo mais explícito a relação entre comunicação e incomunicação escondida pela exacerbação da dimensão funcional em detrimento de sua função normativa (WOLTON, 2006, 2010), nas tensões envolvendo mutações tecnológicas, explosões e implosões das identidades e as reconfigurações políticas das heterogeneidades (MARTÍN-BARBERO, 2006) e da configuração e disputa no espaço de fluxos sociedade em rede (CASTELLS, 1999, 2010) e na constituição de lugares com suas respectivas temporalidades desenhadas pelas técnicas (SANTOS, 1997), que identificamos como questões centrais para pensar a sociedade contemporânea sob o rótulo da Sociedade da Informação.

Essa abordagem da comunicação, considerando a midiatização como essa forma de inteligibilidade, nos permite apontar as indicações críticas que devem nortear a leitura sobre a Comunicação Pública, em uma leitura crítica da comunicação no contexto das organizações.

A relação de funcionalidade atrelada às práticas de gestão da comunicação em meio a estratégias de organização sistemática dos dados, da informação e do conhecimento tem de lidar com uma questão do fenômeno da comunicação em tempos de midiatização.

Para Fausto Neto (2008), há um paradoxo desconsiderado por analistas, estrategistas e pesquisadores, o de que quanto mais são organizadas (sob o ideário da transparência) redes voltadas para encadeamentos e circulação de fluxos, no âmbito do ambiente da crescente midiatização, mais ocorrem descompassos entre suas lógicas e aquelas que emanam dos processos de apropriação pelos públicos. Há o que o autor chama de pontos de fuga que tomam o lugar de processos e de mecanismos de regulações buscadas por políticas e estratégias informacionais, indicações que aportam o debate para o próximo capítulo na reflexão sobre a Comunicação Pública no contexto da democracia deliberativa para pensarmos a participação social nas decisões sobre políticas públicas.