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Condições de produção: comunidades virtuais e blogs

No documento 2011MarioRafaelYudiFukue (páginas 171-178)

QS 21: Família parafrástica dos saberes hiperdiscursivos sobre TAB

3 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS E ANÁLISES

3.5 BLOCO III: A FD da bipolaridade e o hiperdiscurso sobre TAB

3.5.1 Condições de produção: comunidades virtuais e blogs

Para constituição do corpus que compõe este bloco, lemos a totalidade de textos60 e comentários contidos em espaços não institucionais, como o blog Bipolarbrasil e as comunidades virtuais Eu tenho transtorno Bipolar!, Bipolaridade e Bipolar. Após a leitura, classificamos cento e vinte e dois recortes discursivos, dos quais, selecionamos 31 SDs representativas das regularidades que ocorrem no discurso analisado. Em vista da natureza do

corpus deste bloco, é fundamental estudarmos a constituição de blogs e comunidades virtuais.

No universal intotalizável da cibercultura, a interconexão constitui a humanidade num contínuo sem fronteiras, mergulha as pessoas no mesmo banho de comunicação interativa. A interação tece um “universal por contato” (LÉVY, 1999, p. 127). Essa interação se revela pelo desenvolvimento de comunidades virtuais, construídas por afinidades de interesses e conhecimento, num processo de cooperação ou de troca, tudo isso sem depender da



60 Isso significa que lemos todos os posts e comentários possíveis de serem acessados até o dia 1º de novembro

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proximidade geográfica e das filiações institucionais. Não é objetivo das comunidades virtuais substituir os encontros físicos, mas servir de complemento a elas. Na verdade, as chamadas “comunidades virtuais” realizam de fato uma verdadeira atualização (no sentido de criação de um contato efetivo) de grupos humanos que eram apenas potenciais antes do surgimento do ciberespaço. Para Lévy, a “expressão ‘comunidade atual’ seria, no fundo, muito mais adequada para descrever os fenômenos de comunicação coletiva no ciberespaço do que ‘comunidade virtual’” (p. 130).

O blog, por seu turno, são uma espécie de diário público virtual, onde o sujeito escreve sobre tudo o que deseja. Conforme Grigoletto, o blog representa “a escrita de si na internet e constitui-se num espaço que é de todos e de ninguém ao mesmo tempo, onde predomina o anonimato, a memória é fugaz e a escrita é fluida” (2007, p. 73).

Por exemplo, o blog “bipolarbrasil” (bipolarbrasil.blogspot.com) reúne posts, textos de pequena extensão, do dono e moderador da site, cujo nome/apelido é “Will”. Todos os posts reúnem assuntos que tratam do TAB ou outros relacionados ao transtorno; para cada post há um link que possibilita a qualquer internauta postar comentários, dos quais, quase todos são atenciosamente respondidos por Will, mesmo que isso demore alguns dias.

Conforme o próprio Will, o blog surgiu despretensiosamente:

SD 65: Quando eu pensei em um blog sobre bipolaridade, eu pensei em um lugar para servir de

backup de minhas pesquisas sobre a doença. Pensei em um lugar que somente eu iria acessar... Seria um lugar para eu desabafar e servir de uma espécie de diário para eu entender a evolução do transtorno bipolar do humor.

Mas para minha surpresa logo após uma semana que o blog estava no ar, ele começou a ser acessado por diversas pessoas. E esse número foi crescendo ao ponto de um dia eu pensar em organizar as informações, adicionar vídeos, link para notícias no twitter, espaço para envio de relatos, pesquisa de estado de humor etc. E deu certo!

[...] Eu fico muito feliz que os textos que são postados têm sido importante para os bipolares e àqueles que convivem com o paciente. Este é um caminho para dizer às pessoas que elas não estão sozinhas. Mostrar que a doença é "real", mas que há tratamento para isso.

(fonte: http://bipolarbrasil.blogspot.com/2009_12_01_archive.html - Acesso: 22/09/2010)

A princípio, o blog surgiu como um diário e local de armazenagem de pesquisas sobre TAB para Will. Contudo, atraiu a atenção de muitas pessoas interessadas no assunto. Foi pela demanda crescente, registrada pelo número de acessos, que Will começou a estruturar o site e organizar o conteúdo, adicionar vídeos, postar links, enviar relatos e reproduzir pesquisas sobre o transtorno. Para Will, o blog é um meio para “dizer às pessoas que elas não estão sozinhas”, mostrar que “a doença é ‘real’, mas que há tratamento para isso”. Dessa forma, percebe-se que o blog pode se constituir como espaço da escrita de si e como meio de

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construção de relações de identificação entre os usuários e o autor do blog. Escrevem Grigoletto e Jobim: “A escrita de si torna-se, então, pública e passa a ser determinada não só pelo social, mas também pelo olhar do leitor do blog, que pode ser desconhecido, mas que produz relações de identificação com o autor” (2007, p. 75). Por meio dessas relações de identificação é que se constrói a busca por uma identidade que condiz com os saberes psiquiátricos ou religiosos sobre o bipolar.

Seguem diagramas com o design/arquitetura do blog e legenda:

Diagrama 6 – Página de entrada do blog bipolarbrasil

Fonte: http://bipolarbrasil.blogspot.com

1 – Barra de Ferramentas de Acesso Rápido: Home, Sobre o site, Link para vídeos, Fórum e Licença 2 – Data do post.

3 – Corpo do post . Ao acessar o blog, o internauta é direcionado para o post mais recente. O

internauta consegue acessar posts mais antigos do mesmo mês utilizando a barra de rolagem.

4 – Ferramentas laterais: há a listagem de seguidores do blog (que são informados de todas as

novidades e publicação de novos posts), ferramenta de pesquisa, vídeos, marcadores que trazem os termos mais pesquisados no blog, o arquivo com links para todos os posts do blog, links para sites relacionados e uma lista com os assuntos do blog.

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Diagrama 7 – Página de comentários de um post do blog bipolarbrasil

Fonte: http://bipolarbrasil.blogspot.com/2010/11/espectro-bipolar.html#comments

1 – Forma-avatar (anônimo ou nickname) do comentarista: O internauta que posta um comentário

pode fornecer seu nome ou apelido. Há a possibilidade de postar como “anônimo(a)”.

2 – Corpo do comentário: o internauta pode publicar seu comentário, que pode ou não passar pelo

crivo de um moderador, geralmente o dono/editor do blog. Existe a possibilidade de postar um comentário sobre o próprio comentário.

3 – Data e hora da postagem do comentário.

Atualmente, o blog reúne posts dos mais variados assuntos relacionados à TAB. Tomemos os posts do mês de agosto de 2009 como amostra: Encontro bipolar no Rio de Janeiro; Dentro da Chuva Amarela - dica livro bipolar; Links para enriquecer o tema Bipolar; Vídeos sobre transtorno bipolar – UOL; Vídeos com vários bipolares; Perda de memória e bipolaridade; Distimia, ciclotimia e borderline; Bipolar e vicio em sexo; Números do transtorno bipolar do humor; Dicas para bipolares; Ciclotimia x bipolaridade por Max Gehringer; Rotina de sono bipolar; Mitos e fatos transtorno bipolar; Medicamento é importante para o bipolar; Sou bipolar: Contar ou não contar?; Terapia para Transtorno Bipolar do Humor; Gráfico do Humor bipolar; Solidão bipolar; Omega 3 para transtorno bipolar; Fracasso bipolar; Tratamento bipolar gratuito em São Paulo; Teste Bipolar.

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Essa amostra revela a diversidade de assuntos tratados no blog. Há nove posts sobre tratamento do TAB e a importância do medicamento e terapia; nove posts com dicas de livros, vídeos, testes e curiosidades sobre o transtorno; um post sobre encontros de bipolares; um

post que trata da relação entre TAB e sexualidade e três posts de cunho pessoal que tratam da

solidão que acometem o bipolar e do dilema entre revelar ou não que sofre da doença.

Essa diversidade de assuntos, mesmo relacionados a um único tema, revela a dinamicidade da cibercultura da inteligência coletiva. Um grupo humano qualquer só se interessa em se constituir como comunidade virtual para se aproximar do ideal do coletivo inteligente. Para Lévy (1999, p. 130), “o ciberespaço talvez não seja mais do que o indispensável desvio técnico para atingir a inteligência coletiva”. A inteligência coletiva é a produção de conhecimento como resultado da sinergia de internautas interconectados pelo ciberespaço em comunidades virtuais de interesse comum. A inteligência coletiva só seria possível em razão da disponibilidade de novas ferramentas de comunicação e de coordenação, que tornam possíveis novos modos de organização dos grupos humanos, sem modelos na história. Entretanto, Lévy reconhece que há muito mais dúvidas do que certezas no campo da inteligência coletiva. A inteligência coletiva pressupõe a formação do ciberespaço como um megacérebro planetário ou uma associação de cérebros autônomos nômades que se associam para produzir e compartilhar sentido? Não se sabe. A inteligência coletiva é ainda um conceito indefinido e aberto. Há apenas uma certeza: o ciberespaço faz surgir uma nova forma de inteligência, resultado da interconexão de internautas.

Dessa forma, o ciberespaço surge como a ferramenta de organização de comunidades em coletivos inteligentes, mas também como o instrumento que permite aos coletivos inteligentes articularem-se entre si. Conforme Lévy (1999, p. 133), “interconexão geral, comunidades virtuais e inteligência coletiva são aspectos de um universal por contato, um universal que cresce como uma população”, mas que não será totalizável. As fontes serão sempre mais heterogêneas e as linhas de fuga continuarão a se multiplicar. Em suma, a cibercultura revela o universal intotalizável.

De certa forma, estudar a cibercultura é conhecer as condições de produção das sequências discursivas que compõem o corpus deste trabalho. São discursos produzidos e mergulhados na cibercultura, neste universal sem totalização.

Vimos, anteriormente, os diagramas com a arquitetura do blog bipolarbrasil. Julgamos importante, para o estudo das condições de produção do corpus deste trabalho, trazer diagramas com a arquitetura de uma comunidade virtual que funciona como fóruns abertos sobre TAB, como seguem a seguir.

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 Diagrama 8 – Comunidade virtual Eu tenho Transtorno Bipolar do site de relacionamentos Orkut

Fonte: http://www.orkut.com.br/Main#Community?cmm=718619

1 – Nome da comunidade e faixa de links: os links permitem ingressar na comunidade, promovê-la

entre outros usuários do site Orkut e reportar abusos, como comentários racistas ou pedofilia. Há a possibilidade também de acessar o fórum, participar de pesquisas, inteirar-se de eventos e contatar membros da comunidade.

2 – Descrição da comunidade: geralmente, há uma breve saudação, seguida dos objetivos da

comunidade e de orientações para participação nas discussões do fórum. Esta seção traz também o nome ou apelido do dono da comunidade e uma lista com os moderadores, que possuem o poder de vetar comentários que julgarem fora de padrão (anúncios comerciais, por exemplo) ou comentários ofensivos. Donos de comunidades do Orkut podem optar por ter ou não moderadores. No caso da comunidade “Eu tenho bipolaridade”, existe moderação.

3 – Listagem com fotos e nomes (ou apelidos) dos últimos internautas a acessarem a comunidade.

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Diagrama 9 – Fórum da comunidade virtual Eu tenho Transtorno Bipolar do site de relacionamentos Orkut

Fonte: http://www.orkut.com.br/Main#CommTopics?cmm=718619

1 – Listagem com os tópicos em discussão na comunidade. Geralmente são vetados pelos

moderadores tópicos que não tratam do TAB. A listagem traz o número de comentários do tópico e a data da última publicação.

Diagrama 10 – Tópico em discussão da comunidade virtual “Eu tenho Transtorno Bipolar”

Fonte: http://www.orkut.com.br/Main#CommMsgs?cmm=718619&tid=5540602498693047587 1- Tópico em destaque

2- Listagem com os comentários do fórum. Todo membro da comunidade pode postar comentários

em qualquer tópico, desde que siga as regras da comunidade. Comentários ofensivos ou racistas e palavrões são censurados. No caso desta comunidade, não existe a possibilidade de postar comentário como “anônimo”.

O estudo da cibercultura e do ciberespaço feito no segundo capítulo e a descrição da arquitetura de blogs e comunidades virtuais pavimentaram o caminho para iniciarmos as análises do bloco 3. No entanto, antes de prosseguirmos, precisamos considerar a questão: Podemos falar em Hiperdiscurso?

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No documento 2011MarioRafaelYudiFukue (páginas 171-178)