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2 ACERCA DAS BARRAGENS: BREVES REGISTROS

3 CONTEXTO PARTICULAR DA POPULAÇÃO ATINGIDA PELA CONSTRUÇÃO DA BARRAGEM DE ACAUÃ

3.2 CONDIÇÕES DE REALOCAÇÃO DA POPULAÇÃO ATINGIDA

É importante ponderar se a construção de uma barragem justifica-se do ponto de vista da população local e, sobretudo, avaliar quais os impactos sofridos. Andrade (2002) lembra, oportunamente, que a satisfação da comunidade local está aquém das expectativas geradas com a construção de uma barragem e ocorre que os interesses externos (governamentais e/ou de empresas privadas) sobressaem-se em relação aos interesses da população diretamente envolvida.

A autora referenciada afirma que, mesmo antes da construção da barragem, entre os atingidos, sobressai o medo de perder elementos paisagísticos e culturais relacionados com o modo e a experiência de vida, apesar desse sentimento coexistir com uma expectativa

relacionada à melhoria econômica que a obra venha a proporcionar (ANDRADE, 2002). Mesmo quando as indenizações são justas e pagas, as perdas culturais e afetivas não são compensadas, produzindo um estado de insatisfação nas pessoas cujas vidas foram afetadas com a construção de reservatórios.

A Barragem de Acauã, o terceiro maior reservatório de acumulação de água do Estado da Paraíba, foi projetada para beneficiar uma população de aproximadamente 621.974 pessoas, objetivando o abastecimento humano de cidades localizadas na bacia do Médio Paraíba, além de abrigar projetos de irrigação e de piscicultura no Vale do Baixo Paraíba e, também, para conter enchentes que assolam os municípios localizados a jusante da barragem (GOVERNO DO ESTADO DA PARAÍBA, 2004). Entretanto esta visão oficial contrasta com os marcantes impactos ambientais, sociais, econômicos e culturais sofridos, respectivamente, pelo ecossistema e pela população direta e indiretamente atingida pela construção de Acauã, especialmente os deslocados dos seus locais tradicionais de vida, alvo da presente investigação.

Acauã alterou, significativamente, a estrutura demográfica e produtiva de uma extensa faixa territorial dos municípios de Aroeiras, Itatuba e Natuba, inundando a área habitada por uma população que foi deslocada e obrigada a alterar seu sistema de vida. Em termos numéricos, Acauã deslocou aproximadamente 4.500 pessoas, entre crianças, adultos e idosos, que viviam às margens do Rio Paraíba, em sua maioria pequenos proprietários e trabalhadores rurais, antigos moradores dos povoados de Melancia, Cajá, Ilha Grande, Junco, Pedro Velho e Cafundó, que foram submergidos pelo reservatório de Acauã (CONSELHO DE DEFESA DOS DIREITOS DA PESSOA HUMANA, 2007).

Além da retirada dos habitantes e da indenização por suas terras e residências afetadas, as providências incluíram o reassentamento dos atingidos em várias comunidades. Somam seis as comunidades que foram constituídas, a saber: Cajá, Melancia, Costa, Pedro Velho, Água Paba e Riachão. As famílias foram transferidas, compulsoriamente, para essas comunidades, configuradas em conjuntos habitacionais rurais isolados, situados em áreas do semiárido, com fortes sinais de desertificação, notadamente desprovidas de condições elementares de vida, com escassez de serviços públicos e, o que é mais grave, sem meios para os moradores retomarem suas atividades produtivas.

Para caracterizar as condições de realocação dessa população, o tópico seguinte sistematiza informações acerca das comunidades em referência.

3.2.1 Conhecendo as novas comunidades

Tomando como referência a caracterização do espaço geográfico e a situação socioeconômica da população dos municípios paraibanos onde Acauã foi construída, o presente tópico se propõe a caracterizar as comunidades das agrovilas assentadas pelo Governo do Estado da Paraíba, originadas da desocupação das áreas de inundação do lago formado pela Barragem de Acauã. É importante frisar que tais comunidades são remanescentes da atividade agrícola das margens do Rio Paraíba.

Para uma sucinta caracterização das comunidades assentadas, segue-se uma descrição baseada tanto em visitas fruto da pesquisa de campo, em informações verbais de Silva O. (2007, 2008), corroboradas por vários interlocutores entrevistados, como em documentos oficiais, precisamente o Relatório de Viagem do Ministério da Integração Nacional/ Secretaria de Infraestrutura Hídrica (BRASIL, 2004) e o relatório das atividades de visita às referidas comunidades, elaborado pela Comissão Especial do Conselho de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana (COMISSÃO DO CONSELHO DE DEFESA DOS DIREITOS DA PESSOA HUMANA, 2007) 37.

A Comunidade do Cajá está localizada no município de Itatuba, Paraíba, e é formada por um conjunto de 97 casas populares pré-moldadas, construídas em pequenas ruas sem pavimentação, abrigando 170 famílias. A população conta com energia elétrica e um telefone público. A via de acesso ao local é bastante precária e não há sistema de transporte regular que possibilite o deslocamento das pessoas até a sede do município ou para outras localidades. Não há terras agricultáveis, nem arborização e tampouco hortas comunitárias. Não existem postos de saúde e nem outros serviços de infraestrutura e lazer para a coletividade. Uma escola e um posto médico funcionam, de maneira improvisada, em duas casas premoldadas. Quanto à escola, foi verificado o funcionamento de uma sala de aula, com uma turma multiseriada (anos iniciais do ensino fundamental). Além disso, foi verificada a falta de merenda escolar. Quanto ao posto médico, não apresenta estrutura, com carência de médicos e de equipamentos. A assistência à saúde é feita através do Programa de Saúde da Família (PSF), todavia os moradores reclamaram da irregularidade do atendimento, pois os

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A Comissão Especial, criada pela resolução n. 26/2006 do Conselho de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana (CDDPH), foi constituída com duas finalidades: 1) acompanhar denúncias de ocorrências de violações de diretos humanos decorrentes da implementação de barragens no país, realizando um levantamento empírico dos casos; e 2) apresentar sugestões e propostas acerca da prevenção, avaliação e mitigação dos impactos sociais e ambientais da implementação dessas barragens e a preservação e reparação dos direitos das populações atingidas (COMISSÃO ESPECIAL DO CONSELHO DE DEFESA DOS DIREITOS DA PESSOA HUMANA, 2007).

profissionais da área passam até mais de 30 dias sem comparecer na localidade. Apesar de estar há cerca de um quilômetro de distância da Barragem de Acauã, o abastecimento de água para essa comunidade é realizado através de carros-pipa. Existe uma caixa de água coletiva. Somente algumas poucas residências dispõem de cisterna privada, construídas no âmbito de um projeto do Governo Federal. Outro sério problema identificado é o sistema de saneamento coletivo, denominado fossão. Trata-se de uma estrutura precária e deteriorada, com transbordamento e exposição pública dos dejetos que ali se acumulam.

A comunidade de Melancia também está localizada no município de Itatuba, PB, onde foram construídas 70 casas premoldadas, abrigando122 famílias e dispondo de energia elétrica e de apenas um telefone público. O acesso a esta comunidade é ruim, todavia, é a comunidade melhor localizada, em comparação com os demais assentamentos, porque está próxima à represa e foi construída em um terreno plano, com terras em volta mais propícias para o cultivo agrícola irrigado. Essa comunidade enfrenta, praticamente, os mesmos problemas da anterior. A escola destinada aos anos iniciais do ensino fundamental está precariamente instalada em uma casa residencial emprestada, faltando, inclusive, merenda escolar. Não existe posto de saúde ou outros serviços, como também não se vislumbrou qualquer estrutura para o lazer da comunidade. Não há terras disponíveis para atividades agrícolas e de pecuária. Há, no entanto, um programa de desenvolvimento da piscicultura, cujo andamento pode ser prejudicado pelo forte mau cheiro que emana das águas da represa. Ademais, o esgotamento sanitário apresenta problema com transbordamento direcionado para um pequeno açude próximo da comunidade.

A comunidade do Costa está localizada no município de Natuba, PB, a quatro quilômetros de distância da represa, formada por 121 casas, abrigando 122 famílias. Não possui energia elétrica e nem telefone público. É a mais isolada das agrovilas que abrigam os desalojados pela Barragem de Acauã. É considerado o caso mais grave, por conta do isolamento, pela maior distância até a barragem e pelo acesso mais precário. O assentamento se assemelha a um acampamento provisório, com total exclusão das condições de uma vida digna para os assentados. Além desses problemas, apresenta as mesmas dificuldades das comunidades anteriores como: escola precária em casa residencial e sem merenda escolar; posto de saúde e assistência médica precários; sistema de abastecimento de água implantado, mas com funcionamento irregular; transbordamento da fossa de captação, com dejetos sendo conduzidos para o próprio reservatório de Acauã; falta de área para realização de atividades agrícolas.

A situação desta Vila é tão grave que chamou a atenção dos membros da Comissão Especial do CDDPH, que relataram:

Outrossim, das situações de carência dos assentamentos visitados, cabe um especial destaque para a comunidade denominada Costa. Da forma como foi estruturado e como funciona, o assentamento Costa recebeu de seus moradores o apelido de campo de exclusão, em pleno século XXI. As justificativas desse apelido partem do seu grande isolamento geográfico, longe de tudo e de todos, com um precaríssimo acesso viário que somente possibilita o tráfego de veículos de tração ou caminhões. O fato é que o local do assentamento não apresenta qualquer conveniência a não ser a do isolamento, prestando-se tão somente ao confinamento dessa comunidade assentada, pela distância e por estar desprovida dos mais elementares serviços públicos. Essa estruturação retira dos moradores da comunidade Costa, sobretudo dos jovens, qualquer perspectiva de desenvolvimento econômico e vida social, favorecendo a marginalidade e até mesmo a criminalidade. A situação é tão precária que ouvimos, estarrecidos, o seguinte comentário de um ancião da comunidade: o pessoal daqui só não pede esmola porque não tem a quem pedir (COMISSÃO ESPECIAL DO CONSELHO DE DEFESA DOS DIREITOS DA PESSOA HUMANA, 2007, p. 21, grifo do autor).

A comunidade de Vila Nova de Pedro Velho está localizada no município de Aroeiras, PB. É a maior agrovila do projeto, formada pelo conjunto de 365 casas, abrigando cerca de 470 famílias. A maioria das casas é do tipo premoldado. Possui energia elétrica e telefone público. Não há sistema de transporte regular e a estrada de acesso é muito precária. O assentamento apresenta problemas de infraestrutura e ausência de serviços sociais. O sistema de abastecimento de água foi implantado, mas, nos primeiro anos do assentamento, não funcionava e a população recorria a um barreiro de uma propriedade vizinha, cuja água apresentava sinais visíveis de contaminação por fezes e urina de animais, que também faziam uso da mesma água. O esgotamento sanitário é problemático, com o transbordamento constante das fossas de captação, cujos dejetos são conduzidos até a Barragem de Acauã. Outros problemas das comunidades anteriores são verificados, como: escola precária; falta de merenda escolar; assistência médica precária; falta de segurança pública; não disponibilização de área para o cultivo agrícola e para a pecuária.

A comunidade de Água Paba fica localizada no município de Natuba, PB, na extremidade final do reservatório de Acauã, formada por 61 famílias, a maioria instaladas em suas antigas casas, sendo que as famílias que perderam suas casas devido ao alagamento construíram, elas mesmas, suas casas de pau a pique. Esta comunidade não recebeu nenhuma assistência do Governo Estadual e não dispõe de terras ou de programas destinados a atividades agrícolas e/ou pecuárias.

O EIA não incluiu essa comunidade como atingida pela barragem e, então, ela ficou de fora de qualquer assistência. O estudo realizado pela FAC, também, não contemplou. As

famílias ainda moram nas casas originais, só que ficaram isoladas pela barragem. Perderam, inclusive, a via de acesso para João Pessoa e Umbuzeiro. O povoado de Água Paba tinha acesso às cacimbas do rio e, atualmente, continua sem água encanada. Depois da barragem, quando baixa o nível do reservatório, se verifica o efeito do assoreamento. A água vai se espalhando com o assoreamento e, a cada ano, vai sendo acumulado mais lama, lixo e areia. Sendo assim, a água vai invadindo as terras.

A Comunidade de Riachão está localizada no município de Aroeiras, PB, e não foi atingida diretamente pelas águas da barragem, mas teve sua dinâmica de vida afetada, pois a barragem interrompeu as vias de transporte e comunicação com outras localidades com as quais havia um intercâmbio comercial do excedente da agricultura familiar.

O levantamento feito em 2004 resultou em um quadro resumo das dificuldades das agrovilas da Barragem de Acauã (Quadro 1), para uma apreensão panorâmica das dificuldades enfrentadas pela população atingida.

O Quadro 1 proporciona uma visualização das consequências da falta de infraestrutura dos assentamentos, comprovando as precárias condições de vida das famílias, nas respectivas comunidades. Esse levantamento, realizado em 2004, é ratificado pela visita da Comissão Especial do Conselho de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana, em 2007, e pelas visitas e entrevistas que foram realizadas no âmbito da presente pesquisa, desde 2006 até 2010. Em síntese, os problemas se repetem nas diversas comunidades e não foram solucionados no decorrer do tempo.

ITENS OBSERVADOS COMUNIDADES CAJÁ (Itatuba/PB) Melancia (Itatuba/PB) Costa (Natuba/PB) Água Paba (Natuba/PB) Pedro Velho (Aroeiras/PB) Casas existentes (*) 97 70 121 61 365 Famílias residindo (*) 170 122 120 61 450 Déficit residencial (*) 73 52 0 (**) 85 Escola Funcionamento precário; necessita construir escola Funcionamento precário; necessita construir escola Funcionamento precário; necessita construir escola Funcionament o precário; necessita construir escola Existente e não funcionando; aloja desabrigados

Merenda escolar Atendimento precário Atendimento precário Atendimento precário Atendimento precário Atendimento precário Posto Médico Funcionamento

precário; necessita construção de prédio Funcionamento precário; necessita construção de prédio Funcionamento precário; necessita construção de prédio Funcionament o precário; necessita construção de prédio Inacabado e sem funcionamento; aloja desabrigados Assistência médica

Ruim Ruim Regular Ruim Satisfatória

Esgotamento sanitário Em precário funcionamento Em precário funcionamento Em precário funcionamento Inexistente Em precário funcionamento Abastecimento de água Existente, sem a captação de água e sem tratamento Existente sem o tratamento da água Existente, sem a captação de água e sem tratamento

Inexistente Existente e sem funcionamento;

bomba de captação quebrada Agricultura e

pecuária

Sem área para desenvolvimen

to

Sem área para desenvolviment

o

Sem área para desenvolviment

o

Existente em pequenas áreas

Sem área para desenvolvimento Vias de acesso Em péssimas

condições Em péssimas condições Em péssimas condições Em péssimas condições Além de precárias, necessita de duas passagens molhadas Transporte Precário; sem

atendimento regular Precário; sem atendimento regular Precário; sem atendimento regular Precário; sem atendimento regular Precário; sem atendimento regular Energia Possui rede de

energia

Possui rede de energia

Sem energia Possui rede de energia

Possui rede de energia Telefone Atendida Não atendida Não atendida Não atendida Atendida Segurança Inexistente Inexistente Inexistente Inexistente Inexistente Beneficiamento por programas sociais 50% das famílias excluídas de qualquer programa social 50% das famílias excluídas de qualquer programa social 50% das famílias excluídas de qualquer programa social 50% das famílias excluídas de qualquer programa social 50% das famílias excluídas de qualquer programa social

(*) Informações colhidas junto à população de cada comunidade.

(**) Praticamente metade das residências são construções de pau-a-pique.

Quadro 1: Resumo das dificuldades das agrovilas da Barragem de Acauã, Paraíba, 2004

3.2.2 Problemas impostos à população desalojada

Outorgando especial atenção às condições dos assentamentos, serão sintetizados, na sequência, vários problemas enfrentados pelos atingidos por Acauã, os quais, visivelmente, determinam uma situação de violação dos direitos humanos. São várias situações irregulares que influem na precariedade das condições de infraestrutura dos referidos assentamentos.

Processo indenizatório

Em relação às indenizações dos bens afetados, a definição de critérios foi unilateral, pois a população não participou do processo. Antes do início das obras de construção de Acauã, os moradores dos antigos povoados instalados nas proximidades ou nas margens do Paraíba, no trecho destinado às obras do reservatório, não receberam informação adequada acerca do que lhes iria acontecer. Segundo informações dos moradores, ratificadas no relatório da Comissão Especial do Conselho de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana (2007), eles foram abordados por representantes da empresa construtora somente quando os trabalhos de construção já haviam começado, ocasião em que foram feitas as propostas de indenização.

A forma mais comum de indenização foi a entrega de casas nos assentamentos rurais, denominados de agrovilas, situados a poucos quilômetros do reservatório. Na realidade, ditos assentamentos não possuem características de agrovilas, pois são formados por pequenas casas, edificadas em terrenos de pequenas proporções, que não dispõe de espaço sequer para o cultivo de uma horta caseira.

Lins recupera os critérios adotados pelos empreendedores para as indenizações:

Para aqueles que tinham terra, os valores das indenizações seriam pago a partir dos benefícios materiais existentes nas terras, tais como casas, árvores frutíferas, abstraindo a valoração do trabalho investido no trato com a terra. Para os que tinham casas, foi oferecido outra em troca, ou o pagamento em dinheiro de acordo com valores estabelecidos pelos empreendedores (LINS, 2006, p. 121).

A Comissão Especial do Conselho de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana (2007) informou que, mediante a falta de alternativa, a maioria aceitou a proposta do pagamento de indenizações em dinheiro e de recebimento de uma casa, prometida no local onde a família

escolhesse e equivalente a que possuía. Após tudo consumado, a população se viu surpreendia com o pequeno valor das indenizações e com as minúsculas casas premoldadas, construídas em ruas sem infraestrutura, que podem ser visualizadas na Figura 16. Segundo a referida Comissão, as indenizações por família circunscreveram, em média, a quantia de R$ 4.000,00 (quatro mil reais), por família e/ou uma casa em um dos assentamentos.

O processo de indenização provocou bastante indignação, como afirma a moradora entrevistada:

Não é assim tão fácil de arrumar as coisas que a gente perdeu e estamos nesse Movimento pra ver o que é que vai acontecer, se a gente recupera o que perdeu, mas não vai ser da noite para o dia que a gente vai arrumar. Para destruir foi muito fácil, mas para construir não é nada fácil. Hoje eu moro numa casinha de placa, mas não é minha porque o dinheiro que eles me deram foi pouco. Quando os empregados do Governo andavam por lá, a gente não sabia. Se fosse hoje, era diferente. Até meu próprio filho mesmo, que estudou, não sabia. Eles chegavam na casa da gente perguntando se você queria casa ou dinheiro, mas eles diziam que era uma casa! Aí quando eu vi aquelas casinhas, eu disse que não queria mais a casa. Então ele chegou pro meu filho e disse que não tem mais jeito não. Meu filho foi lá onde eles estavam trabalhando e foi quem ajeitou e eles deram esse dinheiro que não deu pra construir porque foi 3.000 reais. A minha casa lá, era uma casa boa e o dinheiro não dava pra construir outra casa. Eu moro numa casa daquelas, mas não me agrado. As casas de placa já estão todas acabadas (Informação verbal)38.

No âmbito da pesquisa de Lins (2006), nos dois povoados por ela pesquisados (Cajá e Melancia), os moradores, que foram indenizados com dinheiro, receberam cerca de R$ 5.281,00 (cinco mil, duzentos e oitenta e um reais), no povoado de Cajá, e cerca de R$ 8.373,00 (oito mil, trezentos e setenta e três reais), no povoado de Melancia. Segundo a autora, nos dois casos os moradores ficaram muito insatisfeitos.

Os bens, as terras, as casas dos moradores foram desvalorizadas a partir do próprio anúncio de que seriam inundadas, pois a iminência da inundação já representou um fator de prejuízo econômico (LINS, 2006). Além disso, muitas dessas propriedades haviam sido recebidas por herança e nem todas possuíam documentação regular, fato, também, constatado pela Comissão Especial do Conselho de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana (2007).

No geral, os valores das indenizações pagos aos atingidos de Acauã foram muito baixos e, independentemente do valor monetário pago, o dinheiro acabou rapidamente nas mãos de pessoas provavelmente inexperientes em lidar com finanças, deixando a maioria das famílias sem nada, poucos meses depois. Esta foi mais uma constatação de Lins (2006) em

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Informação fornecida por Silva, M. T., moradora de Vila Nova de Pedro Velho, Aroeiras, Paraíba, 61 anos, em entrevista concedida em Brasília, Distrito Federal, em outubro de 2007, durante o 2º Encontro de Educação do MAB.

sua investigação acerca dos impactos sociais sobre os atingidos de Cajá e Melancia, situação que certamente se aplica aos demais atingidos.

Figura 16: Unidades habitacionais de Vila Nova de Pedro Velho, Aroeiras, Paraíba, 2009 Fonte: Arquivos do MAB-Paraíba (2009)

Cedido pelo MAB-Paraíba.

É importante informar que algumas pessoas não tiveram suas casas inundadas pelo