O
homem se agita, se afana e se sacrifica para que, em último caso, todos os seus interesses não se transformem em meras conquistas superficiais e sejam consistentes na aquisição de comodidades ba- nais e conveniências, embora sem significação trans- cendente. Isto ocorre porque considera a vida como uma experiência na qual é preciso sofrer, embora o mínimo possível. Daí as misérias, os erros e a tre- menda desorientação em que vivem os seres huma- nos como vítimas de sua própria e ingente ignorância. Seus sistemas de filosofia e suas religiões, grandes ou pequenas, tiveram grande importância no curso da história, porém conseguiram muito pouco no sentido de dominar as paixões humanas, extirpar suas falhas e deficiências ou transformar sua natureza humana em espiritual.Por outra parte as doutrinas éticas, por mais aceitáveis que pareçam, não atacam na própria raiz os males que afligem a humanidade e, assim, não se consegue delas o benefício que era de se esperar. Os ensaios reformistas de todas as épocas, certamente magníficos no melhor de suas intenções, não conseguiram ir ao fundo dos problemas humanos.
É por isso que hoje impera o caos em toda a ordem de coisas nos relacionamentos humanos.
Vejamos agora quais são as normas necessárias ante semelhante realidade e como poderemos conse-
guir uma genuína superação e um verdadeiro engran- decimento do ser humano que, na verdade, é o cum- primento do objetivo da própria existência humana. É claro que nada há de ser conseguido, neste sentido, enquanto não se atinja a completa realização do ver- dadeiro “objetivo da vida” e até que não consigamos realmente conhecer os verdadeiros fundamentos da existência, ou melhor, como o indivíduo se desenvolve e no que consiste seu melhor comportamento. Isto implica num certo plano, ou seja, “um esboço de su- peração vital” ainda para ser descoberto para a imen- sa maioria dos seres humanos.
Primeiramente vamos deixar claro que não pre- tendemos expor, aqui, nenhum vade-mécum extraor- dinário, pois o que vamos dizer nada tem de novo. Referimo-nos ao Caminho da Retidão, cujos objetivos consistem em facilitar a liberação do indivíduo das suas múltiplas “bengalas” e todos os encadeamentos a que está sujeito e lhe produzem a ignorância e seus costumeiros sequazes: a vaidade, as ilusões e a falsidade.
Muitos sistemas se caracterizam pelos seus “ismos” e inúmeros, com princípios sagrados e belos ideais de superação, suas mefistofélicas mesquinhezes. Hoje subsistem um número imenso de organizações graças ao fato de proclamarem bombasticamente sua adesão a estas normas libertadoras, mas cujos procedimentos não se ajustam às correspondentes necessidades, sendo seus propósitos, portanto, de justificação duvidosa e claramente inconfessáveis.
O “Caminho de Ouro ou da Retidão” é constituído das seguintes condições:
Compreensão Correta Controle Mental Genuína Sabedoria
Atitude Mental Correta Discipulado (Chela)
Palavra Correta Atitude e Ação Corretas
Viver Correto Concentração Moralidade
Esforço Correto Anagaryka1
Atenção Correta Meditação Meditação
Pensamento Correto Contemplação
1 O “iluminado”, um “sem-teto”. Pessoa que deu a maior parte ou todas as suas posses e
responsabilidades mundanas comprometendo-se em tempo integral para a prática budista. É um estado a meio caminho entre monge e leigo, onde um assume os Oito Preceitos para todo o período de Anagarika, que poderia ser para a vida inteira.
A expressão “correta” que usamos aqui é sinônimo de devida, precisa e conveniente. As alusões que seguem na coluna do meio se referem às três condições fundamentais para se conseguir a Verdadeira Iluminação ou Liberação Espiritual. Quanto às palavras, “Discipulado” e “Anagaryka”, marcam os campos de desenvolvimento consciente e suas respectivas correspondências, de acordo com a Reta Norma. As demais expressões na última coluna da direita, estão implícitas em si mesmas. Demarcam as condições para a qual tendem as disciplinas superiores, ou seja, “controle da mente”, “concentração”, “meditação” e “contemplação”.
Torna-se imprescindível expor aqui, com dados precisos, os valores e complicações de cada uma destas fases do desenvolvimento mental, que se traduzem depois em “Vivências” da Consciência. Porém, antes, faremos a advertência de que se fala muito sobre esses assuntos transcendentes, com o único objetivo
de exploração, por charlatães e ilusionistas e por organizações, cuja única finalidade são os resultados mercantis e propósitos sectários. Por isso, os estudantes
sinceros e amantes da verdade devem resguardar- se das pessoas e das sociedades que baseiam suas atividades em sectarismos ou das “escolas ocultas” que recorrem a paramentos e cerimoniais complexos a fim de seduzir melhor suas vítimas. Todo sistema
baseado em promessas fantásticas é falso e espúrio e só atende ao lado sensorial do ser humano. Seus únicos
resultados positivos, portanto, fora de enriquecer seus expositores, são criar maior confusão em seus filiados, os quais experimentam maior desespero e constantes infortúnios.
O Caminho da Retidão se baseia nas condições
indispensáveis para a conquista dos objetivos da
verdadeira superação humana. Para isto, como é fácil compreender, não é mister nenhuma classe de mistagogia2 nem mistificação tão comuns entre os
sistemas de “filosofia mística” e escolas de suposta “esotericidade”. Os verdadeiros centros de estudos esotéricos são de expressão simples e clara e sem nenhuma sistematização possível. NÃO HÁ NADA O QUE OCULTAR NO VERDADEIRAMENTE ESPIRITUAL. O que se oculta é o indigno, o inseguro, o irresoluto, o fantástico, que têm necessidade da confabulação das trevas para melhor operar.
A Ciência Sagrada ou Secreta, isto é, a genuína realização transcendente da filosofia fundamental ou
2 Mistagogia é o ato de iniciar e instruir (alguém) nas coisas misteriosas
esotérica é ensinada publicamente, na certeza de que ninguém entenderá nada dela sem estar em devidas condições para “compreender”. Talvez isto explique a necessidade das condições prévias que denominamos o Caminho da Retidão, indispensáveis para a liberação.
Nenhuma realização verdadeiramente transcen- dental é possível sem que se haja conseguido, previa- mente, o domínio de ditas condições, que por sua vez exigem e implicam:
1. Critério preciso e ausência de superstição. 2. Toda resolução deve ser tomada com a melhor compreensão e elevada intenção.
3. Palavra correta, como expressão do pensamento correto.
4. Comportamento modesto, edificante e sereno. 5. Existência enobrecedora e com propósitos cada vez mais bondosos.
6. Esforços dignificantes, dedicação superadora de qualquer dificuldade e total controle pessoal.
7. Elevação de metas, nobreza de ideais e atitude mental compassiva, doce e amorosa.
8. Elevação mental para as causas e motivos superiores da Consciência, a fim de descobrir cada vez mais a significação transcendente da existência e de seus objetivos ulteriores.
Temos de insistir no fato de que ninguém deve dedicar-se às experiências místicas ou espirituais sem uma clara e resoluta atitude que permita um seguro desenvolvimento. A espiritualidade e o misticismo
verdadeiros não se conquistam senão ao preço de sérias disciplinas e rigorosas experiências íntimas, e não mediante doutrinas cosmológicas e fantasias dogmáticas, nem, muito menos, com cerimoniais que só fazem excitar a emocionalidade de seus participantes.