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Podem-se compreender condições de trabalho como o conjunto de circunstâncias em que o trabalho desenvolve-se e que incide tanto no conhecimento laboral do trabalhador quanto nas relações de trabalho (BLANCH, 2003). Sendo assim as condições de trabalho relacionam-se com a cultura organizacional na medida em que o contexto que o trabalhador insere-se e desenvolve suas atividades em uma organização é cultural.

Ramos, Peiró e Ripoll (2002) incluíram no construto todos os elementos situados em torno do trabalho e o trabalho em si mesmo, estabelecendo um enfoque político. Para esses autores existe uma relação dialética entre o trabalhador e seu meio social, sendo assim, as mudanças nas condições de trabalho refletem em outros campos da vida do trabalhador, bem como o que ocorre fora do trabalho, pode conferir novos significados ao experimento laboral. Blanch (2003) conceituou condições de trabalho como um conjunto de situações em que se desenvolvem as atividades laborais, incidindo expressivamente tanto na experiência do trabalho como na dinâmica das relações no contexto em que o trabalhador opera. O autor sugeriu um inventário para avaliar as condições de trabalho num aspecto multi e interdisciplinar, ressaltando as dimensões e divisões sociais do trabalho e a inclusão dos aspectos simbólicos.

Garrido (2005) recomendou uma classificação para condições de trabalho abordando aspectos objetivos (condições objetivas do trabalho) e subjetivos (formas de valoração das condições de trabalho pelos trabalhadores), comprovando que a percepção e valoração das condições de trabalho têm analogia tanto com características do indivíduo quanto com o modo pela qual o trabalho é realizado, resultando na satisfação do trabalhador. Por sua vez, a satisfação afeta o resultado no trabalho. Borges et al. (2015) desenvolveram um estudo, no qual a contribuição está no desenvolvimento de uma Taxonomia das Condições de Trabalho que considera quatro grandes grupos:

I. condições contratuais e jurídicas, que se refere aos vínculos do trabalhador com seu trabalho, abordando aspectos do contrato (se empregado), estabilidade, modalidades de contrato, sistema de incentivo e tempo dedicado ao trabalho; II. condições físicas e materiais incluindo o entorno do trabalho, como suas

condições físicas, instalações, espaço arquitetônico, segurança física e/ou material, formas de lidar com o impacto do espaço geográfico e condições climáticas;

III. processos e características da atividade que se relacionam com o conteúdo das atividades laborais, organização e divisão do trabalho, demandas do cargo ou posto de trabalho, modos de execução das atividades laborais e desempenho do trabalhador;

IV. condições do ambiente sociogerencial, no que diz respeito a aspectos das relações verticais e horizontais de trabalho, gerência ou gestão em seus aspectos sociais, e outras práticas intercedidas pelas relações, resultantes da inserção no mercado de trabalho.

Essas condições do ambiente sociogerencial estão descritas na Tabela 1 que apresenta a variância encontrada no estudo de validação do Questionário de Condições de Trabalho (BORGES et al., 2013). Neste estudo as categorias e subcategorias das condições de trabalho serão utilizadas para formulação das dimensões qualitativas de análises das condições de trabalho.

Em pesquisas anteriores realizada em HUs por Costa (2012) e Costa, Borges e Barros (2015) usando a taxonomia a seguir descrita sobre as condições de trabalho o aspecto de maior comprometimento foi o ambiente sociogerencial. Como o trabalho é um fenômeno sócio histórico, acredita-se que mudanças no contexto de trabalho, incluindo-se aí as mudanças culturais, estão dialeticamente relacionadas com a mudança nas condições de trabalho, de modo que a cultura organizacional e as condições de trabalho estão diretamente relacionadas, com o ambiente sociogerencial (COSTA; PESSOA, 2017).

Tabela 1: Categorias e subcategorias de avaliação das condições de trabalho Condições Físicas e materiais Subcategorias Aspectos Psicobiológicos

Perceber-se exposto a: riscos do ambiente físico e material que podem ter impacto na saúde (corporal e psíquica).

Espaço de Trabalho

Perceber-se exposto a: realizar as atividades dentro de instalações específicas da organização e/ou quanto é necessário ser realizado no campo e no espaço virtual.

Aspectos Fisicoquímicos

Perceber-se exposto a aspectos do ambiente físico e material do trabalho, como: a presença de vapores, fumaça e poeira; temperatura e iluminação.

Exigências de Esforço Físico

Percebe-se exposto a: atividades de trabalho que exigem uma execução mecânica e movimentos repetitivos, com uso de máquinas e equipamentos.

Riscos de Acidentes

Percebe-se exposto a: diferentes riscos de acidentes de pequeno porte, incapacitantes e fatais. Processos e

características da atividade

Espaço de Autonomia

Contar na organização do trabalho com a possibilidade de decidir autonomamente pelos métodos, planejamento e ritmo do que se realiza. Espaço de ação.

Complexidade, Responsabilidade e Rapidez

Quanto se exige do trabalhador execução de tarefas complexas, rapidez, responsabilidade por danos e iniciativa diante do imprevisto.

Organização do Tempo

Quanto de autonomia se dispõe para organizar o próprio trabalho no tempo, planejar intervalos, folgas e férias.

Estímulo à colaboração

Quanto é possível contar com a colaboração dos pares e colaborar com eles na realização do trabalho.

Fonte: Adaptado de Borges et al. (2013). Condições do

ambiente sociogerencial

Organização das atividades

Diz respeito à natureza e distribuição das atividades no ambiente de trabalho. Revela aspecto da percepção do participante sobre o exercício da função gerencial organizativa, o que justifica a denominação.

Infraestrutura e Pressão

Refere-se a pressões diretas e indiretas (por meio da fragilidade infraestrutural): exposição a situações de falta de equipamentos e material de trabalho; percepção de exigências

desproporcionais às condições de infraestrutura.

Oferta de Informação de Saúde

Diz respeito à percepção dos participantes sobre ações gerenciais de prevenção a acidentes de trabalho e a problemas de saúde ocupacional, informando o trabalhador sobre os riscos existentes.

Discriminação

Refere-se à sujeição dos participantes a situações de discriminação baseadas em traços pessoais (por exemplo: idade, altura, cegueira, sexo). Fazendo parte da dimensão sobre o ambiente sociogerencial alude, portanto, a percepção do participante quanto ao gerenciamento na organização que minimize ações discriminatórias.

Participação

Itens referentes à percepção dos participantes sobre as práticas interativas de consulta sobre mudanças na organização do trabalho e de abertura ao diálogo em torno do desempenho no trabalho.

Violência

Itens que aludem a ameaças de violência físicas, agressões verbais, intimidações, perseguições e discriminação sexual. Refere-se, portanto, à amistosidade das relações interpessoais.

Ambiente Conflitivo

Os itens descrevem a percepção do participante no que se refere às possibilidades de ser envolvido em conflitos interpessoais e em situações que divergem de seus valores e princípios.

Percebe-se também que a mudança cultural não é concretizada de forma rápida e simples. No contexto das empresas públicas, espera-se que a mudança cultural sempre se dê de maneira complexa e dificultosa, sobretudo, por estas organizações ainda apresentarem características burocráticas muito fortes e um quadro de funcionários com pouco poder de ação e resolução de problemas diante das limitações legais a que estão impostas.

Marx (1987), em seu livro Teorias da Mais Valia, faz uma crítica pertinente ao modo de produção capitalista ao afirmar que:

A produtividade do capital, antes de mais nada consiste, mesmo considerando apenas a subsunção formal do trabalho ao capital, na coerção para se obter trabalho excedente, trabalho acima da necessidade imediata, coerção que o modo capitalista de produção partilha com modos de produção anteriores, mas que exerce e efetiva de maneira mais favorável à produção (MARX, 1987, p.384).

Ao fazer essa crítica Marx não tinha intenção de discutir condições de trabalho, mas quando cita que no modo de produção capitalista as condições objetivas de trabalho não são subordinadas ao trabalhador e sim o trabalhador é quem é subordinado ao trabalho, acaba por fazê-lo. Já se percebe em Marx uma abordagem das relações de trabalho. Seguindo a mesma linha de pensamento de Marx, Engels (1986) foi um dos primeiros teóricos a discutir efetivamente condições de trabalho ao abordar a vida de operários ingleses (COSTA, 2012).

Adam Smith (1983 apud ARRIGHI, 2008) tem uma visão oposta a de Marx e Engels, enquanto para Marx a evolução é resultado da luta de classes, Smith acredita que é o resultado da natureza humana, pois considera que o ser humano é naturalmente direcionado ao desejo de progresso e busca de melhoramentos. A evolução é resultado da busca de meios mais eficazes de realizar um trabalho, entre eles a divisão do mesmo. Para Smith a divisão do trabalho era uma condição natural (ARRIGHI, 2008).

Já para Taylor (1980, apud COSTA 2012) os trabalhadores produziam mais se visualizassem um ganho salarial maior em consequência disto. Supunha a harmonia de interesses entre capital e trabalho, cooperação dos empregados, busca do rendimento máximo e desenvolvimento do empregado para obter maior produtividade.

No que se refere às condições de trabalho é importante destacar que Taylor e seus seguidores acreditavam que o aumento da produção era resultado do bem-estar do trabalhador e da diminuição da fadiga física. Sendo assim, preocuparam-se com a adequação de instrumentos e métodos de trabalho, com a organização do ambiente de trabalho, com a melhoria das condições do ambiente de trabalho e com a criação de instrumentos específicos para determinadas funções (COSTA, 2012).

Enquanto Taylor estudou o modo de execução da tarefa e o perfil do trabalhador, Mayo realizou, entre 1924 e 1932, estudos sobre os efeitos da iluminação no ambiente de trabalho e o rendimento dos trabalhadores e evidenciou o papel e a importância das relações interpessoais e sociais no trabalho e seus efeitos na produtividade, concluindo que os trabalhadores reagem melhor aos estímulos do grupo que aos incentivos salariais (COSTA, 2012).

Para Tiffin e McCormick (1959, apud COSTA 2012) o trabalho humano depende de várias circunstâncias como atitudes e interesses, personalidade, instrução e os estímulos decorrentes da situação laboral. Estes autores adotam um enfoque individual das condições de trabalho propondo que estas fossem estudadas a partir das condições ambientais, que incluíam as condições atmosféricas, iluminação e ruído, e do tempo, que incluía horas de trabalho e descanso.

Segundo Costa (2012) a temática “condições de trabalho” passou a despertar o interesse dos setores organizados da sociedade em virtude do desmoronamento da sociedade de bem-estar nos países capitalistas. O envelhecimento das populações e a automação industrial fez com que a economia capitalista não conseguisse manter o padrão de empregos, de crescimento econômico e de manutenção dos salários reais, afetando a qualidade de vida destas populações e se refletiu nas suas condições de trabalho e vice-versa.

No Brasil há uma concentração de estudos de condições de trabalho utilizando variáveis relativas ao meio físico de trabalho, riscos à saúde do trabalhador e processo produtivo, relacionadas ou não com trabalho/emprego (COSTA, 2012).

Segundo Baumol, Blinder e Wolff (2003 apud FERREIRA et al., 2010):

As privatizações conduzem as organizações a mudanças que se iniciam antes mesmo do processo de desestatização se concretizar. Tais mudanças abrangem, em geral, três ações principais, descritas a seguir:

i. Estratégia de redução da força de trabalho - o objetivo é diminuir custos por meio de aposentadorias, transferências e demissões, incentivadas ou não;

ii. Redesenho organizacional - o objetivo é cortar trabalho, em vez de funcionários, eliminando funções, níveis hierárquicos, divisões e produtos; e

iii. Estratégia sistêmica - costuma ser observada nos períodos pós-privatização, já que tem característica de longo prazo e visa mudar a organização. Representa um esforço para transformar tanto os valores quanto a cultura da organização (BAUMOL; BLINDER; WOLFF, 2003 apud FERREIRA et al., 2010, p.472).

Embora a contratualização não seja uma privatização, observou-se que nos hospitais contratualizados com a EBSERH o modelo da mudança referida pelos autores supramencionados foi seguido. A força de trabalho vem sendo substituída paulatinamente por trabalhadores celetistas; o redesenho organizacional está retratado nas modificações do

organograma e processos organizacionais como vistos no PDE HUOL-EBSERH (SOUZA et al., 2014) e aspectos da mudança cultural se refletem nos processos, na logomarca e no site dos hospitais. Hipotetiza-se que estas modificações culturais impactem nas condições de trabalho dos profissionais.

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