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2. MARCO TEÓRICO

2.2 Atributos essenciais das redes interorganizacionais

2.2.5 Configuração

Outro fator relevante para as redes interorganizacionais é o tipo do relacionamento entre as organizações parceiras que conformam uma estrutura organizacional em rede e que podem ocorrer em diversos níveis, características e aspectos. Nesta subseção, apresentam-se, especialmente, algumas das principais tipologias de redes encontradas na literatura, a fim de aumentar a compreensão sobre as configurações de rede.

As organizações que estão agrupadas em uma estrutura que opera em rede possuem relacionamentos interorganizacionais que, segundo Hakansson e Snehota (1995), sustentam-se em termos de três ligações: (i) de atividades – consideram as atividades técnicas, administrativas, comerciais e outras atividades de uma organização que podem ser ligadas de diferentes maneiras às de outra, conforme o relacionamento que se desenvolve; (ii) de recursos – referem-se à conexão de vários elementos de recursos (tangíveis e intangíveis) da rede, sendo que as ligações de recursos resultam de como o relacionamento se desenvolveu e representou, em si mesmo, um

recurso para organização; e (iii) de atores – referem-se à conexão de atores que influencia o modo como eles percebem e formam as suas identidades em relação uns com os outros.

É importante descatar que essas ligações, que incluem os recursos como parte integrante da relação interorganizacional, acontecem de forma constante e simultânea entre as organizações que conformam a rede. Então, estabelecido o contexto dessas características, que dão sustento a uma estrutura organizacional, apresentam-se algumas propostas que permitirão conhecer e identificar algumas configurações de arranjos interorganizacionais e suas características presentes.

De acordo com a RedeSist (2003), é possível estabelecer uma diferenciação entre três configurações interorganizacionais, isto é, tipos de rede: de empresas, de indústrias e de firmas. A primeira, empresa em rede, refere-se a mudanças na organização interna da firma, decorrentes da evolução da firma estruturada em múltiplas divisões independentes entre si (multi-divisional), para um novo padrão de articulação entre as distintas alçadas produtivas e organizacionais, possibilitado pelo desenvolvimento das tecnologias de informação e de telecomunicação.5

A segunda configuração, de indústria (ou setor industrial) em rede, faz referência, de modo comum, a setores de infraestrutura (telecomunicações, energia, saneamento etc.), baseando-se no estabelecimento de um padrão de interconexão e compatibilidade entre tecnologias e características técnicas de processos produtivos realizados nas diferentes unidades produtoras daquela atividade.

A terceira configuração de rede refere-se a arranjos interorganizacionais baseados em vínculos sistemáticos entre firmas formalmente independentes, originando um padrão particular de governança que é capaz de promover uma coordenação mais eficaz de atividades complementares realizadas por essas diversas empresas. Tais redes podem, ainda, estar vinculadas tanto a diferentes elos de uma determinada cadeia produtiva (conformando redes de fornecedor-produtor-usuário) como a diferentes dimensões espaciais (a partir das quais se conformam redes locais, regionais, nacionais ou supranacionais).

Além das concepções desenvolvidas, em 2003, no âmbito da RedeSist, duas classificações seminais sobre redes são as de Miles e Snow (1992) e Grandori e Soda (1995). Esses primeiros autores (1992) identificaram três tipos básicos de rede: estável, interna e dinâmica.

i. A rede estável é constituída de organizações independentes de diferentes donos, cuja relação interorganizacional ocorre com o desenvolvimento de atividades em integração vertical;

ii. A rede interna é constituída por relações de organizações que estabelecem um mercado interno que compõe uma organização central, isto é, dentro de uma organização, várias outras podem ser vistas comprando e vendendo entre si e também podem negociar com organizações externas;

iii. A rede dinâmica delineia-se por organizações parceiras que podem ser agregadas ou removidas, cuja combinação da avaliação central com a autonomia operacional local é refletida onde empresas independentes estão ligadas entre si por um curto tempo ou por um tempo de produção particular de bens ou serviços, com operações ao longo de toda a cadeia de valor.

A diferenciação de tipologias de redes interorganizacionais proposta por Grandori e Soda (1995) também separa as redes em três tipos:

i. As redes proprietárias, que se caracterizam pela formalização de acordos relativos ao direito de propriedade entre os acionistas de empresas;

ii. As redes burocráticas, as quais são caracterizadas pela existência de um contrato formal que se destina a regular não só as especificidades de fornecimento de bem/serviços, mas também a própria organização da rede e as condições de relacionamento entre seus membros;

iii. As redes sociais, em oposição às redes burocráticas, que têm por característica fundamental a informalidade nas relações interempresariais, ou seja, prescindem de qualquer tipo de acordo ou contrato formal, tornando-se direcionadas para o intercâmbio da chamada mercadoria social – prestígio, status, mobilidade profissional e outros.

Para Casarotto Filho e Pires (2001), as redes podem ser definidas como rede top down (de cima para baixo) – na qual a pequena empresa pode-se tornar fornecedora de uma empresa-mãe ou, principalmente, subfornecedora – e como rede flexível – que ocorre quando as empresas unem-se por um consórcio com objetivos amplos ou mais restritos, simulando a administração de uma grande organização, mas com maior flexibilidade.

Hoffmann, Molina-Morales e Martínez-Fernández (2007) apontam para a existência de uma tipologia de redes que sintetiza muitos estudos anteriores – conforme representada no

Quadro 2.3. Os autores (2007) mostram que os tipos de rede são muito diversificados, tanto se aproveitando da convivência social, no caso das redes aglomeradas territorialmente e que incorporam relacionamentos para além do comercial, como das relações puramente comerciais, como no caso das redes dispersas geograficamente.

Quadro 2.3 – Resumo da tipologia de redes.

Indicadores Tipologia

a) Direcionalidade Vertical Horizontal b) Localização Dispersa

Aglomerada

c) Formalização Base contratual formal Base não contratual

d) Poder Orbital

Não Orbital

Fonte: HOFFMANN; MOLINA-MORALES; MARTÍNEZ-FERNÁNDEZ, 2007, p. 110.

Para a ilustração da aplicação dessa tipologia foram consideradas três redes dentro da indústria de cerâmica de revestimento, duas no Brasil e uma na Espanha. Os quatro indicadores (direcionalidade, localização, formalização e poder) podem ser entendidos, conforme literatura e estudos de casos analisados por Hoffmann, Molina-Morales e Martínez-Fernández (2007), da seguinte forma: (i) a direcionalidade descreve a direção das relações entre as partes e enfatiza dois tipos predominantes, as redes horizontais (estabelecidas entre empresas que competem em termos de produtos e/ou mercados) e as redes verticais (aquelas em que cada processo é realizado por empresas especializadas, e não concorrentes, e que não atuam no mesmo mercado); (ii) a localização refere-se ao fato de que as redes podem ser aglomeradas (concentradas territorialmente, isto é, em uma determinada localidade geográfica) ou dispersas; (iii) a formalização aborda que as redes podem ser estruturas formalizadas, de base contratual, ou informais, de base não contratual; e (iv) o poder é a capacidade de decisão em relação aos rumos que a rede vai tomar.

Lazzarini (2008) destaca outros tipos de rede, a saber: horizontais (empresa do mesmo setor ou setores adjacentes); verticais (rede de laços sequencialmente encadeados como, por exemplo, a cadeia de suprimentos); netchains (rede que apresenta conjuntamente laços horizontais e verticais); constelações (empresas autônomas que cooperam entre si, mas que competem com outros grupos do mesmo setor ou similares) e conselhos entrelaçados (redes interorganizacionais formada por meio de laços interpessoais, como, por exemplo, os conselhos de administração).

Todeva (2006) e Jones e Lichtenstein (2008) destacam outro tipo de rede, a qual os autores, respectivamente, denominam “redes de projetos” e “projetos interorganizacionais”. Para aquela primeira autora (2006), redes de projetos são planejadas com antecedência e construídas com base em objetivos claros, metas pré-estabelecidas, mas muitas vezes com resultados desconhecidos ou incertos. Os participantes de redes do projeto são pré-selecionados e inscritos como contribuintes com papéis designados, a fim de produzir resultados planejados. Para Jones e Lichtenstein (2008), os denominados projetos interorganizacionais envolvem dois ou mais atores de organizações distintas que trabalham em conjunto para criar um produto/serviço tangível em um período limitado de tempo.

Logo, a principal distinção entre projetos interorganizacionais e outros formas de coordenação interorganizacional comumente estudadas é que projetos, por definição, são temporários. Dessa maneira, as redes interorganizacionais contidas em projetos existem por um período de tempo limitado, designado por um propósito final pré-estabelecido, com o intuito de realizar os objetivos determinados a priori. Quando esses objetivos forem concluídos, a organização do projeto literalmente se dissolve (JONES; LICHTENSTEIN, 2008).

Nesse sentido, o estudo de Barbosa e Medeiros (2005a) investigou a configuração de arranjos interorganizacionais na implementação de um programa público, no qual o desafio está em estabelecer um formato que seja capaz de induzir a ação para o alcance dos resultados planejados. Observou-se que o arranjo adquiriu uma configuração hierárquica, bastante verticalizada, centralizada e pouco interativa, tendo como principal consequência a inadequação do formato do arranjo para o objetivo proposto. O trabalho é concluído tecendo recomendações para a construção de redes interorganizacionais adequadas aos objetivos das ações propostas.

Em outro trabalho, Barbosa e Medeiros (2005b) analisaram a rede montada para a execução de um programa governamental e apontaram como ela assumiu a configuração de constelação, caracterizada por relações formais em pares, as quais estiveram baseadas na transação de recursos e serviços técnicos, entre a agência central e os demais implementadores. A configuração do arranjo interorganizacional seguiu um padrão altamente formalizado, sujeito a fortes restrições contingenciais de escassez de tempo e recursos, não refletindo uma constituição resultante de um planejamento consolidado.

Diante do exposto a respeito da configuração das redes, origina-se a sexta proposição deste trabalho:

Proposição 6 (P6): A configuração influencia a complementaridade de recursos no âmbito da rede.

Essa proposição evidencia várias configurações de arranjos interorganizacionais, contudo, não se teve a intenção de exaurir toda a tipologia existente na literatura, mas, sim, alcançar um melhor entendimento sobre o relacionamento entre as organizações que conformam uma estrutura organizacional em rede. Para tanto, sabendo que o objeto de estudo (unidade de análise) deste trabalho refere-se a redes interorganizacionais contidas em diversos projetos, isto é, temporárias e dinâmicas, buscar-se-á ampliar esse entendimento por meio da utilização dos indicadores da tipologia proposta por Hoffmann, Molina-Morales e Martínez-Fernández (2007), pois esses indicadores foram aplicados com base na análise comparativa de empresas dos países que serão estudados nesta pesquisa. Desse modo, será possível investigar se há uma configuração que seja capaz de promover maior influência na complementaridade dos recursos para o funcionamento da rede.

Assim, a revisão da literatura, levada a cabo em toda seção 2.2, permite identificar cinco variáveis (razões determinantes, mecanismos de coordenação, tamanho, densidade e configuração) que estão relacionadas com o funcionamento das redes interorganizacionais. Acredita-se, a partir dos aspectos teóricos da revisão de literatura, que o resultado da complementaridade de recursos no âmbito da rede poderá ter impacto sobre o desempenho da inovação das empresas, pois, conforme a VBR, o desempenho de uma organização pode ser explicado pela forma como são geridos e utilizados os seus recursos. Na seção que se segue, abordar-se-á melhor esse tema.