• Nenhum resultado encontrado

2 CONHECIMENTOS ELEMENTARES E GRAUS DE INSTRUÇÃO

No documento A educação republicana em Condorcet (páginas 89-96)

Condorcet (2001) propõe um programa específico de instrução comum, propugnando prolongá-lo para depois da escolaridade obrigatória. A instrução comum abrangeria conhecimentos políticos, a moral, a economia doméstica e rural, as partes das ciências e das artes de utilidade comum, bem como a educação física e moral. A narratividade é considerada

66 Fragmento das “Cinco memórias”: “[...] q’entre les vérités reconnues et celles qui ont échappé à nos

um dos métodos mais eficazes para a instrução comum. Coutel (2004) comenta que uma narração oferece um rosto às palavras e uma existência sensível a princípios e valores morais. A imaginação narrativa antecipa uma implicação do cidadão com a continuidade e o aperfeiçoamento da república e de suas instituições.

A instrução comum prepara os homens para revisar regularmente as leis e a Constituição, em função dos progressos das luzes, de erros e de preconceitos a questionar. Ela orienta a respeitar os direitos do homem, a exercer o poder constituinte do povo e a aprimorar o sufrágio, cuja organização poderia falsear a expressão majoritária. As narrações apresentam ações, personagens e episódios que suscitam tomadas de posição e de consciência, sem correr o risco de ofender aos jovens leitores ou espectadores. O narrador - analisa Coutel (2004) - escapa a todo dogmatismo, contudo propõe certa exemplificação ética e cívica.

Coutel (2004) alude que a instrução comum advogada por Condorcet implica uma mediação entre república e instrução republicana, entre teoria e prática da cidadania. A instrução comum não decorre de um entusiasmo, mas tampouco se trata de uma simples série de conhecimentos positivos. Ela corresponde a uma prática teórica dos direitos políticos. Para ensinar aquilo que é também uma prática, isto é, a virtude política dos cidadãos, são necessários conhecimentos precisos e uma coerência ética do mestre, que segue seus próprios preceitos. A tomada de consciência, nesse espaço educacional, é suscitada e não ditada.

Condorcet considera que a efetividade dos princípios das luzes pressupõe uma instrução pública que ofereça aos cidadãos conhecimentos e as mais variadas oportunidades. A esse respeito, o autor do “Relatório” escreve:

Facultar a todos os indivíduos da espécie humana os meios de proverem as suas necessidades, de conseguirem o seu bem-estar; assegurar a cada um este bem-estar, torná-lo cônscio defensor dos seus direitos e esclarecido cumpridor dos seus deveres; garantir-lhe a facilidade de aperfeiçoar sua indústria, de se habilitar para o desempenho de funções sociais a que tem o direito de ser chamado, de desenvolver completamente os talentos que recebeu da natureza; estabelecer entre os cidadãos uma igualdade de fato e realizar a igualdade política reconhecida pela lei - tal deve ser o primeiro objetivo de uma instrução nacional e, sob este aspecto, ela é para os poderes políticos um dever de justiça67.

67 Fragmento original do “Relatório”: “Offrir à tous les individus de l’espèce humaine les moyens de pourvoir à

leurs besoins, d’assurer leur bien-être, de connaître et d’exercer leurs droits, d’entendre et de remplir leurs devoirs; assegurer à chacun la facilite de perfectionner son industrie, de se rendre capable des fonctions sociales auxquelles il a droit d’être appelé, de développer toute l’étendue des talents qu’il a reçus de la nature; et par là établir entre les citoyens une égalité de fait, et rendre réelle l’égalité politique reconnue par la loi”.

Condorcet estabelece cinco graus para a instrução republicana: escolas primárias, secundárias, institutos, liceus e Sociedade Nacional das Ciências e das Artes. A escola primária veicula conhecimentos gerais para que o indivíduo possa dirigir, ele mesmo, suas atividades e opiniões: “O primeiro grau de instrução comum tem a finalidade de colocar todos os habitantes de um país em condições de conhecer seus direitos e seus deveres, a fim de poder exercer uns e cumprir os outros, sem serem obrigados a recorrer a uma razão alheia68” (2008, p. 71).

Cabe à instrução, num primeiro grau, ensinar a leitura, a escrita e operações básicas de matemática, bem como elementos de economia doméstica,

[...] para a administração de seus negócios, para o livre desenvolvimento de sua indústria e de suas faculdades; para conhecer seus direitos e exercê-los [a cidadania]; para ser instruído sobre seus deveres, para poder cumpri-los bem; para julgar suas ações e aquelas dos outros segundo suas próprias luzes [...] para não ser mais vítima desses erros populares que atormentam a vida com temores supersticiosos e esperanças quiméricas69 (2013, p. 198).

O primeiro grau de instrução narra histórias morais curtas aptas a fixar a atenção das crianças acerca dos primeiros sentimentos que devem experimentar, e para dispô-las a refletir sobre esses sentimentos, preparando-as para as ideias morais que devem florescer um dia dessas reflexões. A instrução inicial, para o autor, deve proporcionar, ainda, uma descrição sumária dos produtos do país e explicitar as leis nacionais, de tal modo que cada criança seja preparada para a vida em sociedade, sobretudo no que diz respeito a deveres e direitos que dispomos uns para com os outros:

Ao unir, como se propôs, a leitura à escrita, ao apresentar as primeiras ideias morais em histórias que despertem o interesse, misturando o estudo da geometria à diversão de ora fazer figuras, ora operações em terrenos, só falando, nos elementos da história natural, de objetos que podem observar e cujo exame é prazeroso, tornaremos a instrução fácil. Ela perderá o que poderia ter de desagradável, e a curiosidade natural da infância será um aguilhão suficiente para provocar a determinação pelo estudo70 (2008, p. 96).

68 Original das “Cinco memórias”: “Le premier degré d’instruction commune a pour objet de mettre la généralité

des habitants d’un pays en état de connaître leurs droits e leurs devoirs, afin de pouvoir exercer les uns et remplir les autres, sans être obligés de recourir à une raison étrangère” (1994, p. 109).

69 Trecho original do “Esboço”: “[...] pour l’administration de ses affaires, pour le libre développement de son

industrie et de ses facultés, pour connaître ses droits, les défendre et les exercer , por être instruit de ses devoirs; pour pouvoir les bien remplir; pour juger ses actions et celles des autres avec sa propre conscience [...] pour n’être plus la dupe de ces erreurs populaires qui tourmentent la vie de craintes superstitieuses et d’espérances chimériques” (2004, p. 439).

70

Trecho das “Cinco memórias”: “En unissant, comme on l’a propose, la lecture à l’écriture, en présentant les premières idées morales dans des histories qui peuvent n’être pas sans intérêt [...] en mêlant à l’étude de la géométrie l’amusement de faire tantôt des figures, tantôt des opérations sur le terrain, en ne parlent, dans les

A instrução secundária proposta por Condorcet (2001) oferece um curso elementar de matemáticas, de história e de física. O segundo grau de instrução se estende ao ensino de princípios das ciências políticas e da Constituição, de noções fundamentais de gramática e da metafísica, de princípios da lógica e da arte de expressar ideias, assim como de elementos de geografia. Além disso, para o autor, nesse estágio o aluno deve ser preparado para acompanhar o desenvolvimento das manufaturas e para lidar criativamente com as novas exigências de conhecimento postas pelas transformações nas tecnologias de produção de riquezas.

O terceiro grau de instrução, por sua parte, é oferecido pelos Institutos, nos quais o conhecimento erudito é desenvolvido capacitando-se o aluno para o desempenho de funções públicas que exijam mais conhecimentos. São oferecidos cursos de ciências matemáticas e físicas, de ciências morais e políticas, de aplicação das ciências e das artes, e de literatura e belas artes. Para Condorcet (1990), as matérias de estudo ministradas nesse grau devem conferir a imprescindível abertura intelectual para um estudo aprofundado. Nos Institutos se ensinará:

[...] não somente o que é útil saber como homem e como cidadão, quaisquer que sejam as profissões a que se dediquem, senão tudo o que pode ser necessário para cada grande setor profissional como a agricultura, as artes mecânicas, a arte militar e inclusive os conhecimentos médicos que necessitam simples praticantes, as parteiras e os artesãos veterinários71.

O quarto grau de instrução é oferecido nos Liceus, nos quais as ciências devem ser ensinadas em seu pleno desenvolvimento, ou seja, no estado em que se encontram desenvolvidos os conhecimentos. O ensino nos Liceus revela, conforme Condorcet, pela própria composição de seu corpo de professores e estudantes, uma progressiva diminuição da desigualdade de fortunas, unindo sujeitos provenientes das variadas camadas sociais. Ali são formados:

éléments d’histoire naturelle, que d’objets qu’on peut observer, et dont l’examen est uns plaisir, on rendra l’instrucion facile; elle perdra ce qu’elle peut avoir de rebutant, et la curiosité naturelle à l’enfance sera um aiguillon suffisant pour déterminer à l’étude” (1994, p. 131).

71 Originalmente, no “Relatório”: “[...] non seulement ce qu’il est utile de savoir comme homme, comme

citoyen, à quelque profession qu’on se destine; mais aussi tout ce qui peut l’être pour chaque grande division de ces professions, comme l’agriculture, les arts mécaniques, l’art militaire; et même on y a joint les connaissances médicales nécessaires aux simples praticiens, aux sages-femmes, aux artistes vétérinaires”.

[...] os sábios, os que fazem da cultura de seus espíritos, do aperfeiçoamento de suas próprias faculdades, uma das ocupações de sua vida; os que se dedicam a profissões nas quais êxitos só se conseguem com estudo aprofundado de uma ou de várias ciências. Neles se formam os professores. Por meio desses estabelecimentos cada geração poderá transmitir à geração seguinte o que recebeu da que lhe precedeu e o que ela pôde agregar72.

Condorcet (2010b) assinala que cabe à matemática desenvolver o hábito de cultivar ideias abstratas. Com relação às ciências naturais, o ensino deve ser limitado a algumas experiências e análises. O essencial seria ensinar menos coisas e formar mais o espírito. Quanto ao ensino da história, dever-se-ia tomar cuidado para não ensinar o que apenas confundisse as crianças. Elas ainda não estariam preparadas para compreender a dinâmica dos fatos políticos que constituem a história dos povos. Quando se pensar em ensinar história para destacar figuras exemplares de virtude, o importante é distinguir os traços característicos dos eventos e os significados morais que possam, de fato, ser compreendidos pelas crianças, tais como a ideia de humanidade, a piedade filial, a amizade, a coragem e a simplicidade. Não se trata de apresentar os fatos como verdades, antes mesmo de as crianças poderem compreender as regras da crítica da história, o que as levaria a desenvolver o hábito de acreditar ingenuamente em relatos. Quanto ao ensino de línguas, o autor recomenda que a gramática só seja apresentada quando a criança já dominar a leitura e tiver desenvolvido gosto por ela.

Condorcet (1990) advoga a gratuidade nos primeiros quatro níveis de instrução, a fim de que seja assegurado aos alunos das classes sociais menos favorecidas o gozo da possibilidade de desenvolver suas capacidades:

[...] importa à prosperidade pública dar às crianças das classes pobres, que são as mais numerosas, a possibilidade de desenvolver as suas faculdades; é um meio, não só de assegurar à pátria mais cidadãos em estado de servi-la e, à ciência, mais homens capazes de contribuir para o seu progresso, mas também de diminuir essa desigualdade que nasce da diferença das fortunas e fundir entre si as classes que esta diferença tende a separar. A ordem da natureza não estabelece na sociedade outra desigualdade que a da instrução e a da riqueza e, alargando a instrução, atenuaremos ao mesmo tempo os efeitos destas duas causas de distinção. As vantagens da instrução, menos exclusivamente unidas às da opulência, serão cada vez menos sensíveis e não chegarão a ser perigosas; nascer rico estará equilibrado pela igualdade,

72

Fragmento original do “Relatório e projeto”: “[...] les savants, ceux qui font de la culture de leurs esprit, du perfectionnement de leurs propres facultes, une des occupations de leur vie, ceux qui se destinent a des professions ou l’on ne peut obtenir des grands succès que par une étude approfondie d’une ou plusieurs sciences. C’est là aussi que doivent se former les professeurs. C’est au moyen de ces établissements que chaque générations peut transmettre à la génération suivante ce qu’elle a raçu de celle qui l’a précédée, et ce qu’elle a pu y ajouter”.

pela superioridade da ilustração que devem obter, naturalmente, aqueles que têm mais motivos para adquiri-la73.

A Sociedade Nacional das Ciências e das Artes, o último grau de instrução, dirige e vigia a instrução republicana. A entidade deve exercer a supervisão dos demais níveis de ensino, gozando para tanto de autonomia perante o poder público. Cabe à Sociedade proteger e acelerar os progressos das ciências e das artes, resistindo, se for o caso, contra os possíveis inimigos das luzes, e eventualmente protegendo a instrução do próprio arbítrio do Estado. Para Condorcet (1990), os trabalhos e funções da Sociedade visam a:

Primeiro: vigiar e dirigir a instrução geral; segundo: contribuir ao aperfeiçoamento e à simplificação do ensino; terceiro: ampliar os limites das ciências e das artes por meio de descobrimentos; quarto: corresponder com as sociedades científicas estrangeiras para enriquecer a França com descobrimentos de outras nações. Estará encarregada, segundo as circunstâncias, pelo corpo legislativo, dos diferentes trabalhos científicos e literários que tenham por objeto a utilidade pública e a glória da pátria74.

Não há desenvolvimento moral sem formação intelectual. Condorcet (1990) admite duas instâncias reguladoras da instrução: a Assembleia Nacional, reconhecida como a expressão legítima da razão comum; e a Academia Nacional das Ciências (Sociedade Nacional das Ciências e das Artes). A primeira exerce o controle jurídico e a segunda o epistemológico. Trata-se, de acordo com Silva (2004), de uma sociedade que se organizaria democraticamente ao mesmo tempo em que se guiaria pelos princípios da razão e da ciência. Sem a arte de se instruir por si mesmo, os cidadãos, numa sociedade de incertezas, não poderiam construir uma democracia duradoura.

Ainda para Silva (2004), o conhecimento elementar, a ser difundido e discutido na instrução pública, deveria possibilitar uma certa independência e um domínio mínimo de conhecimentos frente às exigências sociais cotidianas, como, por exemplo, saber a respeito de

73

Original do “Relatório e projeto”: “[...] il importe à la prospérité publique de donner aux enfants des classes pauvres, qui sont les plus nombreuses, la possibilite de dévolopper leurs talents; c’est un moyen, non seulement d’assurer à la patrie plus de citoyens en état de la servir, aux sciences plus d’hommes capables de contribuer à leurs progrès, mais encore de diminuer cette inégalité qui naît de la différence des fortunes, de mêter entre elles les classes que cette différence tend à séparer. L’ordre de la nature n’établit dans la societé d’autre inégalité que celle de l’instruction et de la richesse; et, em étendant l’instrucion, vous affaiblirez à la fois les effets de ces deux causes de distinction. L’avantage de l’instruction, moins exclusivement reuni à celui de l’opulence, deviendra moins sensible, et ne pourra plus être dangereux; celui de naître riche sera balance par l’égalité, par la supériorité même des lumières que doivent naturellement obtenir ceux qui ont un motif de plus d’en acquérir”.

74 Idem: “Premier: de surveiller et diriger l’instruction générale; second: de constribuer au perfectionnement et à

la simplifications de l’enseignement; troisième: de reculer, par des découvertes, les limites des sciences et des arts; quatrième: de correspondre avec les sociétés savants étrangères, pour enrichir la France des découvertes des autres nations. Elle sera, suivant les circonstances, chargée par le Corps législatif de différens travaux scientifiques et littéraires, qui auront pour objet l’utilité publique et la gloire de la patrie”.

seus direitos e deveres, contar, ler e escrever. A escolha dos conteúdos deveria dar-se conforme a idade dos alunos a quem eles se destinam, possibilitando o florescimento natural de capacidades intelectuais. Os conteúdos deveriam ser definidos de acordo com o conceito de conhecimento elementar. A definição de tal saber será sempre problemática e sujeita a revisão. O que está em jogo é a correta proporção entre o que realmente é necessário e pode ser ensinado pela instrução e a extensão de conhecimentos acumulados pelo patrimônio coletivo, conforme os progressos do espírito em uma determinada época. O conhecimento elementar estabeleceria uma dupla continuidade entre razão individual e razão comum, de uma parte, e entre sábios e cidadãos, de outra.

Condorcet (1994) vislumbra na instrução pública uma oportunidade de combater a estupidez produzida pela divisão social do trabalho. O autor recorda Smith, para quem quanto mais as profissões mecânicas se dividiam, mais o povo tornava-se exposto a contrair essa estupidez natural própria de homens limitados a um pequeno número de uma mesma espécie de ideias. Cabe à instrução, desse modo, ampliar o repertório de conhecimentos ao mesmo tempo em que desenvolve o raciocínio e a independência intelectual, o que a distingue seguramente de um mero ensino técnico ou profissional. Disso resulta que o conhecimento elementar não corresponde a uma mera informação. Ou seja, não se trata, simplesmente, de uma transmissão de conteúdos e habilidades práticas.

A instrução básica e elementar não deve ser uniformizadora - reivindica Condorcet (2010b). Já nos seus primeiros escritos sobre a educação, o autor destaca que os homens são naturalmente desiguais no que respeita ao espírito, ou seja, que eles desenvolvem capacidades de aprender e talentos diferentes. Ainda que se possa organizar um curso geral destinado a todas as crianças, indistintamente, não se trata de ensiná-lo a todos, nem em sua totalidade, nem da mesma maneira. O ensino, pensado dessa maneira, deve respeitar as diferenças nas capacidades de aprendizagem. Essas diferenças, contudo, não devem definir hierarquias escolares discriminadoras. Para aqueles que apresentam maior dificuldade de aprendizagem, o ensino deve, nos termos de Condorcet, limitar-se a conhecimentos gerais, apenas o mínimo indispensável para que os indivíduos não sejam reduzidos ao estado de imbecis ou idiotas na sociedade. Em outras palavras:

[...] é difícil não crer na desigualdade natural dos intelectos [...] grande parte das causas da desigualdade acidental não depende da vontade dos professores; somos forçados, na prática, a encarar a educação como agindo sobre intelectos naturalmente desiguais [...] Quanto aos estudos necessários para o desenvolvimento de suas aptidões, será preciso limitar o que tem de aprender apenas àquilo que esteja mais conforme a eles, que seja mais adequado à natureza e à força de seus intelectos. Pode-se, por conseguinte,

propor um curso geral de educação que possa servir a todas as crianças, mas ele não deve ser ensinado a todas, nem integralmente, nem da mesma maneira (2010b, p. 64).

Trata-se de uma redução da extensão do que deve ser ensinado. No entanto, esse método exige um aprofundamento maior no ensino daquilo que é mais útil ou para o qual a criança demonstrar maior gosto e talento. O útil, para Condorcet, não se confunde com as vantagens de uma aplicação imediata do conhecimento. Os que demonstrarem talento para o estudo devem receber, advoga o autor, incentivos públicos e recursos econômicos quando não puderem arcar com as despesas escolares. Isso deve ser feito em proveito dos menos favorecidos para continuar seus estudos. Busca-se, de um lado, tornar o ensino igual e universal, e, de outro, o mais completo possível conforme as circunstâncias o permitirem:

[...] deve-se observar o interesse e a capacidade de uma criança quando se quer levá-la a cumprir um plano de estudos previamente traçado. Como nem tudo nesse plano é de igual utilidade para o futuro, dado que uma parte para os primeiros estudos tem por objetivo, sobretudo, o desenvolvimento das faculdades da criança, o estabelecimento do hábito de estudo, e o gosto e a facilidade da ocupação, o professor deve ter bastante flexibilidade para conciliar o plano de estudos que ele formulou com os dotes particulares de cada criança. Nem devemos preocupar-nos muito se, por alguma razão particular, a criança não aprende certos conhecimentos verdadeiramente úteis. Nos últimos anos de estudo, a razão está já bem formada e se pode, então, fazê-la compreender a necessidade de adquirir tais conhecimentos (2010b, p. 67-68).

Supõe-se que todos se beneficiem com o investimento público na formação dos indivíduos talentosos. Os conteúdos ou as informações não seriam em si o objetivo da

No documento A educação republicana em Condorcet (páginas 89-96)