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Consequência da política criminal brasileira: hiperencarceramento

PARTE II – Panorama do sistema prisional brasileiro

Capítulo 2: O sistema penitenciário atual: encarceramento em massa

2.2. Consequência da política criminal brasileira: hiperencarceramento

Paulatinamente, foi sendo inserida no Brasil a adoção de algumas premissas dessa nova política criminal iniciada nos Estados Unidos, que culminou na evolução da taxa de encarceramento brasileira. Sendo essa a principal consequência da adoção dessa política criminal mais rígida, centrada no aprisionamento dos indivíduos como forma de resolver o problema da insegurança pública. Assim, essa política se baseia na crença de que ao encarcerar mais indivíduos, e, consequentemente, retirá-los das ruas, haveria uma diminuição das taxas de crimes, o que aumentaria a segurança. O Ministério da Justiça divulgou, em 2014, dados mais recentes82 sobre a realidade carcerária brasileira, constatando esse grande aumento no número de presos, como podemos observar no gráfico abaixo, retirado do sítio eletrônico da organização Conectas Direitos Humanos83:

Gráfico 1- Evolução da população carcerária brasileira84

81 Ibidem, p. 39.

82Esses dados estão presentes no Mapa das Prisões, divulgado em 2014, mas que contém dados de 2013. 83A Conectas é uma organização não governamental internacional, sem fins lucrativos, fundada em

setembro de 2001 em São Paulo. Tem a missão de promover a efetivação dos direitos humanos e do Estado Democrático de Direito, no Sul global – África, América Latina e Ásia. Desde janeiro de 2006, possui status consultivo junto à Organização das Nações Unidas (ONU) e desde maio de 2009, dispõe de status de observador na Comissão Africana de Direitos Humanos e dos Povos. Essa organização publica regularmente, em seu sítio eletrônico, os dados públicos sobre a situação dos presídios brasileiros, tendo como objetivo desenhar um cenário cada vez mais complexo e atualizado da situação, pautando com dados o debate sobre segurança pública e contribuindo com a formulação de soluções mais adequadas para os problemas do sistema. Para saber mais ver: www.conectas.org.

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Fonte: Ministério da Justiça. Jun. 2013, extraído do site: http://www.conectas.org/pt/noticia/25378- mapa-das-prisoes. Acesso em 02 jun. 2015.

É possível observar, portanto, uma crescente evolução do número de encarcerados que, tendo iniciado em fins dos anos 1990, foi se aprofundando nos anos 2000 e continua em ascensão. De acordo com uma pesquisa feita pelo Centro Internacional de Estudos Prisionais da Inglaterra (King‟s College de Londres), em 2014, o Brasil passou a ter a terceira maior população carcerária do mundo, ficando atrás apenas dos Estados Unidos e da China, conforme a tabela abaixo85:

Tabela 1- Ranking dos países com as maiores populações carcerárias86

Estados Unidos 2.228.424 China 1.701.344 Brasil 711.463 Rússia 676.400 Índia 385.135 Tailândia 296.577 México 249.912 Irã 217.000 África do Sul 157.394 Indonésia 154.00

Com relação à crescente evolução no número de encarcerados no Brasil, importante mencionar também uma pesquisa realizada pelo Instituto de Pesquisa e Cultura Luís Flávio Gomes (IPC – LFG)87. Essa pesquisa levou em consideração o período de 20 anos, entre os anos 1990 e 2010 e constatou que o Brasil é o país que mais apresentou crescimento da população carcerária do mundo, tendo apresentado um aumento de 450%. Essa pesquisa indica ainda que, no mesmo período, os Estados

85Os dados da tabela levam em consideração também as prisões domiciliares. O número de pessoas

efetivamente presas no sistema penitenciário brasileiro, de acordo com essa pesquisa, é de 563.526. Assim, se desconsiderarmos a quantidade de prisões domiciliares, o Brasil ocupa a quarta posição na tabela, ficando atrás da Rússia.

86Tabela confeccionada pela autora com dados do King‟s College de Londres, extraídos do site:

http://www.kcl.ac.uk/depsta/law/research/icps/worldbrief/wpb_stats.php?area=all&category=wb_poptotal

87O instituto mudou de nome e atualmente se chama Instituto Avante Brasil – IAB (Instituto da Prevenção

do Crime e da Violência). É uma entidade sem fins lucrativos e que tem por escopo facilitar o acesso às informações e pesquisas sobre os mais diversos temas acadêmicos e científicos. Realiza pesquisas, cria fontes de dados, acompanha e avalia as diversas políticas adotadas e implementadas pelas autoridades e, sobretudo, contribui para a elaboração de políticas públicas nas suas áreas de atuação. Para saber mais ver: http://www.institutoavantebrasil.com.br.

Unidos apresentaram crescimento de 77%, a China de 31% e a Rússia de 17%88. Observa-se, portanto, que a população carcerária vem crescendo num ritmo bastante acelerado, enquanto que nos outros países esse crescimento se dá de maneira mais lenta, inclusive com períodos de decréscimo, conforme podemos observar no gráfico abaixo:

Gráfico 2- Evolução das populações carcerárias por país89

Essa pesquisa fez ainda uma projeção carcerária, utilizando como dados a movimentação carcerária do Brasil no período de 2005 a 2010 e a dos Estados Unidos no período de 2007 a 2009. Detectou, então, que, se as taxas de encarceramento brasileiras continuarem a subir nesse ritmo, em 2034, o Brasil terá a maior taxa de aprisionados do mundo, superando a população carcerária estadunidense. O estudo fez esses cálculos tendo como base a taxa média de crescimento da população carcerária brasileira no período pesquisado, o que corresponde a 6,80% ao ano. Com relação aos Estados Unidos, o cálculo baseou-se na taxa de redução da população carcerária no período estudado, correspondente a -0,03% por biênio e aproximadamente -0,0139% por ano. Assim, calcularam que, em 2034, os Estados Unidos terão 2.289.401 reclusos, já o Brasil passaria a ter 2.415.905.

Essa grande evolução do número de presos explica-se pelo recrudescimento da punição, que em parte, pode ser justificado por um forte clamor midiático e social favorável a punições cada vez mais duras e severas, o que termina por estimular mudanças nas legislações com essa finalidade. Sobre esse endurecimento das punições,

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Dados extraídos do site: http://www.ipcluizflaviogomes.com.br.

a Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH)90 se posicionou, num documento oficial91, atestando que vinha observando, nas Américas, uma tendência generalizada de maior uso do encarceramento e que havia uma extrema necessidade de rever algumas políticas criminais implementadas.