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3 FISSURA LABIOPALATINA

3.3 CONSEQUÊNCIAS DA FISSURA LABIOPALATINA

3.3.3 Consequências psíquicas

A fenda labiopalatina, além das consequências estéticas e funcionais, compromete o indivíduo fissurado no seu desenvolvimento social, visto que, diante dos padrões de beleza e normalidades impostos pela sociedade, há uma dificuldade dos fissurados manterem o seu convívio social, sendo excluídos da sociedade, gerando, portanto, possíveis problemas psíquicos. (FERRAZ, 2013, p. 29-31)

Por muitas das vezes, com o objetivo de trazerem proteção aos seus filhos, os próprios pais de crianças fissuradas acabam isolando os seus filhos da sociedade, na tentativa de coibir que esses venham a sofrer preconceitos pelas questões funcionais ou retaliações pelas suas aparências físicas. Nesse sentido, Miguel, Locks e Prado (2009, p. 159) discorrem sobre a proteção familiar:

Os relatos demonstraram que até o momento do início escolar a criança é cercada de proteções no ambiente familiar. [...] A mãe muitas vezes está ao lado do filho procurando socorrê-lo e explicando suas deficiências a outras crianças com quem ele procura interagir. Ela se torna a porta-voz dele, traduzindo a sua linguagem, alterada pela deficiência anatômica provocada pela fissura labiopalatal.

Com isso, para diversos indivíduos com fissuras, o primeiro convívio social se dá efetivamente na escola. Entretanto, infelizmente, pela falta de conscientização da fissura labiopalatina aos demais alunos e, em algumas vezes, ao próprio docente, muitas crianças acabam sofrendo preconceitos, por meio de comentários, chacotas e brincadeiras de natureza discriminatória, no qual inferiorizam a sua aparência ou o seu modo de falar. (MIGUEL, LOCKS, PRADO, 2009, p. 158-160)

Além disso, há na escola atividades que exigem uma fala bem articulada de seus participantes, ocasionando um sentimento de limitação nos fissurados, conforme dispõe Bastos, Gardenal e Bogo (2008, p. 284):

Antes que a criança ingresse na escola não há muita dificuldade de adaptação quanto às suas dificuldades decorrentes da fissura por que ela esteve mais presente ao ambiente familiar. E se houve aceitação da família, não se constituíram problemas psicológicos até esse momento. Já na escola, a criança se sente excluída das atividades que exigem uma fala bem articulada e, não podendo corresponder a esses anseios sociais, sente-se limitada, inferior e excluída dessas atividades, podendo inclusive abandonar a escola.

Portanto, é necessário que ocorra adaptações no ambiente escolar para resguardar a integridade mental do fissurado, pois, em caso contrário, ao invés de auxiliar no aprendizado daquele indivíduo, a instituição de ensino acabará o ocasionando possíveis problemas psíquicos, surgindo o sentimento de inferioridade e timidez, resultando em um isolamento social e uma baixa comunicação do fissurado com os demais colegas. (BASTOS; GARDENAL; BOGO, 2008, p. 283-285)

Ainda, além da dificuldade no ambiente escolar, há, na fase da adolescência, o despertamento do desejo de relacionamento nos seres humanos, no qual, através de diversos fatores, elegem uma pessoa para conhecer e flertar. Dentre esses fatores, um de alta relevância

seria o fator da beleza, já que a estética, além de outros fatores essenciais como honestidade e caráter, é predominante para o início de um interesse em um determinado indivíduo. (BRASIL

et al., 2007, p. 376-377)

Sobre os fatores relevantes na hora da procura por um par romântico, Brasil et al. (2007, p. 377) ensinam:

A beleza é um fator relevante na hora da paquera ou do flerte (Maner, 2003). O corpo é abordado em termos estéticos, é objeto de desejo e fonte de prazer (Chaves, 2001). A fase do flerte é muito importante para a formação do par romântico, pois leva as pessoas a se aproximarem e a se conhecerem. Nesta fase os parceiros sentem-se empolgados, alertas, vivos e atraentes (Davis, 1979). Silva (2001) refere que as pessoas apresentam sinais de que desejam a privacidade, impedindo a aproximação de terceiros. Para que haja flerte, primeiro a pessoa precisa eleger um parceiro. Em correlação, os pré-adolescentes e adolescentes que possuem algum tipo de fissura, mostram preocupação e insatisfação com sua estética facial, conforme estudos apresentados por Bastos, Gardenal e Bogo (2008, p. 282):

Foi possível observar que o tipo e a severidade da malformação influenciaram no julgamento da atratividade da face, pois crianças com anormalidade craniofacial associada à outra malformação receberam contagens significativamente mais baixas para a atratividade e contagens mais altas para a avaliação de prejuízo do que as crianças com uma malformação craniofacial sem malformação associada. Este estudo mostra ainda que a deformação evoca respostas tanto positivas quanto negativas: negativa porque a malformação craniofacial conduz à rejeição e positiva porque as pessoas aprendem a mostrar maior condolência por indivíduos com diferenças visíveis. Outros trabalhos sobre autopercepção da face e ajuste psicossocial, em pré- adolescentes e adolescentes com anomalias craniofaciais, mostraram correlação positiva entre estas anomalias e a insatisfação com o aspecto da face e, também, que essa autopercepção difere da percepção dos pais e familiares.

Logo, o indivíduo com fissura tende a ter dificuldades no relacionamento com outras pessoas, visto que a fissura labiopalatina ocasiona um defeito anatômico no lábio que, em sua grande maioria, atinge o assoalho nasal do indivíduo, ocasionando uma assimetria visível em sua face. Diante disso, o fissurado sente-se diferentes do demais adolescentes, não se inserindo no meio social, surgindo problemas psicológicos, conforme ensinamentos de Ferraz (2013, p. 32-33):

[...] o impacto social e emocional das anomalias craniofaciais na vida destas pessoas e de seus familiares, apontou que os prejuízos estéticos e funcionais, mesmo reparados, podem incidir por toda a vida, já que estes indivíduos apresentaram níveis desfavoráveis de ansiedade, depressão, fobia social, autoestima e qualidade de vida comparados aos indivíduos normais.

Com os problemas escolares e de relacionamento pessoal entre os indivíduos fissurados e as demais pessoas pertencentes a uma determinada sociedade, pode ocorrer problemas de escolarização, além de uma baixa autoestima, ocasionando um possível abandono escolar e isolamento daquele indivíduo. Por consequência, o abandono escolar traz um grau de baixa escolaridade ao indivíduo fissurado, dificultando o seu ingresso no mercado de trabalho, prejudicando a sua relação profissional com a sociedade. (TREZZA et al., 2016, p. 270)

Além das consequências decorrentes do abandono escolar e da autoestima em si, há também a questão da exclusão pelas disfunções ocasionadas pela fissura, visto que os indivíduos com fissuras, principalmente a fissura transforame completa, podem ficar com sequelas estéticas e funcionais mesmo após a finalização do seu tratamento. Dentre as sequelas mais graves que prejudicam a sua inserção no mercado de trabalho, estão a de fala, audição e a estética em si. (TREZZA et al., 2016, p. 270)

Corroborando, Trezza et al. (2016, p. 270) explica a dificuldade na inserção do indivíduo fissurado, com sequelas funcionais de fala, no mercado de trabalho:

O indivíduo fissurado que apresenta fala nasalizada e de difícil compreensão é alguém que pode ser julgado erroneamente como menos capaz e poderá ter menores chances de ser admitido em um emprego. Isto porque estas alterações de fala despertam no ouvinte a sensação de que o falante não tem inteligência normal.

Desse modo, a exclusão dos fissurados do mercado de trabalho, devido às consequências decorrentes da fissura, ocasiona dificuldades na obtenção do seu sucesso profissional, podendo resultar em uma baixa autoestima nesses indivíduos, visto que já possuem complexos quanto suas estéticas e problemas funcionais, principalmente de fala, meio de comunicação exigido pela maioria dos empregadores. (GLAESER; COSTA; COLLARES, 2018, p. 194)