• Nenhum resultado encontrado

Entendimentos jurisprudenciais do Tribunal de Justiça de São Paulo e dos

4 A FISSURA LABIOPALATINA E A SUA CARACTERIZAÇÃO COMO

4.3 ENTENDIMENTOS JURISPRUDENCIAIS E PROJETOS DE LEI RELEVANTES

4.3.1 Entendimentos jurisprudenciais do Tribunal de Justiça de São Paulo e dos

Diante da utilização do modelo social de deficiência, o Tribunal de Justiça de São Paulo e os Tribunais Regionais Federais da 4º e 5º região, proferiram decisões favoráveis aos fissurados, reforçando a tese de que a fissura labiopalatina pode ser reconhecida como deficiência perante o ordenamento jurídico brasileiro, apesar de que ainda há uma escassez de jurisprudências nesse sentido.

O Tribunal Regional Federal da 4º região, em 2017, proferiu decisão favorável na Apelação Cível nº 0015388-08.2016.4.04.9999, deferindo a concessão do benefício assistencial LOAS, pleiteado contra o Instituto Nacional do Seguro Social – INSS, a uma criança com fissura labiopalatina. Importante destacar que no voto da decisão, houve a consideração do modelo social para fins de reconhecer o benefício concedido.

BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. CONCESSÃO. PORTADOR DE DEFICIÊNCIA.

MENOR. CONDIÇÃO SOCIOECONÔMICA. MISERABILIDADE.

PREENCHIMENTO DE REQUISITOS. CONSECTÁRIOS LEGAIS. IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO. 1. O direito ao benefício assistencial, previsto no art. 203, V, da Constituição Federal, e nos arts. 20 e 21 da Lei 8.742/93 (LOAS) pressupõe o preenchimento de dois requisitos: a) condição de pessoa com deficiência ou idosa e b) situação de risco social, ou seja, de miserabilidade ou de desamparo. 2. Reconhecida a inconstitucionalidade do critério econômico objetivo em regime de repercussão geral, bem como a possibilidade de admissão de outros meios de prova para verificação da hipossuficiência familiar, cabe ao julgador, na análise do caso concreto, aferir o estado de miserabilidade da parte autora e de sua família. 3. A situação retratada nos autos, onde criança com doença congênita se encontra em situação de vulnerabilidade social comprovada, compromete suas chances de efetiva participação social em pé de igualdade na vida social, dadas as barreiras presentes na vida comunitária, ensejando a proteção jurídica prevista no benefício de prestação continuada. Ademais, a proteção jurídica à criança com deficiência vai além da constatação da vulnerabilidade contemporânea, ao atentar para os prejuízos ao desenvolvimento de futuras e potenciais capacidades e chances de inclusão e de exercício de direitos. 4. Preenchidos os requisitos no caso em apreço, é de ser

concedido o benefício assistencial pleiteado. 5. A definição dos índices de correção monetária e juros de mora deve ser diferida para a fase de cumprimento do julgado. 6. O cumprimento imediato da tutela específica independe de requerimento expresso do segurado ou beneficiário, e o seu deferimento sustenta-se na eficácia mandamental dos provimentos fundados no art. 461 do CPC/1973, bem como nos artigos 497, 536 e parágrafos e 537 do CPC/2015. 7. A determinação de implantação imediata do benefício, com fundamento nos artigos supracitados, não configura violação dos artigos 128 e 475-O, I, do CPC e 37 da Constituição Federal.

[...]

Nesse quadro, não há conceituação juridicamente correta de incapacidade e de deficiência senão mediante a consideração conjunta da dimensão biomédica (aqui abrangendo também as avaliações psicológicas) e da dimensão social, uma vez que a falta de uma dessas dimensões inviabiliza no mundo concreto e na história onde tomam sentido e existência os conceitos e as realidades da saúde, da doença e da capacidade para o trabalho ou atividade habitual.

(BRASIL, 2017, grifo nosso)

Já o Tribunal de Justiça de São Paulo, ao julgar a apelação nº 0014113- 91.2010.8.26.0071, proveu o recurso reconhecendo que a candidata com fissura labiopalatina deveria tomar posse no concurso em que havia sido aprovada na condição de portadora de necessidades especiais, fazendo jus à nomeação nas vagas reservadas:

RECURSO DE APELAÇÃO - DIREITO ADMINISTRATIVO AÇÃO DE RITO ORDINÁRIO - CONCURSO PÚBLICO CANDIDATA PORTADORA DE NECESSIDADES ESPECIAIS - PERÍCIA MÉDICA ATESTANDO CONDIÇÃO DIVERSA DESCLASSIFICAÇÃO - IMPOSSIBILIDADE. 1. Candidato inscrito para o certame como portador de necessidades especiais, apresentado a respectiva prova documental. 2. Perícia médica posterior que negou a condição. 3. Edição de Portaria invalidando a anterior, de nomeação da candidata aprovada no certame. Impossibilidade. 4. Fissura Labiopalatina que caracteriza anomalia congênita, descrita na própria legislação como condição especial. 5. Existência de prova documental e pericial atestando a condição da autora. 6. Recondução determinada por meio de posse, ao cargo para o qual foi nomeada. 7. Invalidação da Portaria que tornou sem efeito o ato de nomeação. 8. Retroação de pagamento dos vencimentos desde quando publicada, no Diário Oficial, a decisão de sua nomeação, posteriormente invalidada. 9. Ação julgada improcedente em primeiro grau. 10. Sentença reformada para julgar procedente a ação. 11. Recurso de apelação provido para tal fim.

(SÃO PAULO, 2013)

Corroborando, o Tribunal Regional Federal da 5º Região, em julho de 2019, no julgamento da apelação nº 0807487-84.2018.4.05.8308, decidiu que a Apelada que possuí sequelas da fissura labiopalatina tem direito ao ingresso em faculdade ensino superior utilizando-se de vagas destinadas aos deficientes:

ADMINISTRATIVO. ENSINO SUPERIOR. RESERVA DE VAGAS. DEFICIENTE. MATRÍCULA. - Cuida-se de apelação de sentença que julgou procedente o pedido para declarar a nulidade do Ato Administrativo nº 084/2018/SRCA de 16/05/2018, ato que tornou sem efeito a matrícula da autora e, por conseguinte, para determinar que a ré promova todos os atos necessários ao ingresso da autora no curso de graduação em Engenharia Agronômica, concedendo-lhe vaga reservada a candidatos portadores de deficiência, no prazo de 48 horas, sob pena de

multa diária no valor de R$ 200,00 (duzentos reais) limitada a R$ 5.000,00 (cinco mil reais). Por consequência lógica, a ré deve oportunizar à autora, o exercício de todos os direitos e deveres inerentes aos estudantes do curso de Engenharia Agrônoma, inclusive o direito ao acesso a materiais de estudo e de prestar avaliações já realizadas, concedendo-lhe prazo razoável, para tanto. - Inconformada, apela a UNIVASF, alegando que a autora não comprovou deficiência capaz de comprovar o amparo no art. 4º, incisos I a V, do Decreto 3.298, de 20/12/1999, art. 41 da Lei 8.666/93 (vinculação ao Edital), artigos 3º, I, e 53 da Lei 9.394/1996 e artigos 2º, 5º caput, 37 caput, 206 I e 207 da Constituição Federal. Impossibilidade de condenação em honorários em favor da DPU. - A Lei nº 13.146/15 assegura a toda pessoa com deficiência o direito à igualdade de oportunidades com as demais pessoas e que não sofrerá nenhuma espécie de discriminação. - No caso dos autos, a autora foi aprovada para o curso de graduação em Engenharia Agrônoma (Id : 4058308 5595594). 16 Boletim de Jurisprudência - Outubro/2019 (1ª Quinzena) - Analisando os laudos constantes nos autos (Id. 4058308.5595576 /4058308.5595573), verifica-se que a autora apresenta sequelas de Fissura Labiopalatal, apresentando alterações na emissão de fonemas, dificultando a comunicação oral, com grande hipernasalidade. - Conforme bem esclarecido na sentença “ o Laudo Médico Pericial concluiu que a autora é “Portadora de fissura labial, corrigida cirurgicamente na infância” e de “Fenda Palatina, parcialmente corrigida, provocando dificuldade na fala” e que “Considerando que a pericianda apresenta alteração anatômica e alteração funcional da voz, o que dificulta moderadamente sua comunicação, é considerada deficiência da fala”. Em resposta ao quesito 5, a perita afirma que “a deficiência da pericianda não é estética, produz dificuldade para falar”. - Desse modo, conclui-se que a lesão que a autora apresenta não tem caráter estético, como definiu a administração, mas trata-se sim de deficiência. - Em relação aos honorários advocatícios, o Plenário do STF, ao julgar, em 30/06/2017, o AgReg na AR 1.937, Rel. Min. Gilmar Mendes decidiu que “após as Emendas Constitucionais 45/2004, 74/2013 e 80/2014, houve mudança da legislação correlata à Defensoria Pública da União, permitindo a condenação da União em honorários advocatícios em demandas patrocinadas por aquela instituição de âmbito federal, diante de sua autonomia funcional, administrativa e orçamentária”, ficando afastada a aplicação da Súmula nº 421/STJ. - Fixados os honorários recursais, majorando em 2% os anteriormente arbitrados, nos termos do artigo 85, § 11, do CPC. - Apelação improvida. (BRASIL, 2019, grifo nosso)

Portanto, com a pesquisa de jurisprudências que tratem do modelo social de caracterização da pessoa com deficiência e do fissurado na condição de pessoa com deficiência, apesar da escassez de decisões nesse sentido, encontram-se os entendimentos jurisprudenciais do Tribunal de Justiça de São Paulo e dos Tribunais Regionais Federais da 4ª e 5ª região reconhecendo a possibilidade do acesso das pessoas com fissuras aos benefícios destinados aos deficientes, bem como acesso ao mercado de trabalho e à educação, respectivamente.