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As reacções ao stress podem desembocar num determinado número de consequências. Isto verifica-se quer ao nível individual como ao nível colectivo e, tanto para o empregador como para o trabalhador.

Actualmente é incontestável o facto de que o stress prolongado tem repercussões para a saúde dos indivíduos.

2.7.1 - As consequências do stress sobre o sistema imunitário

O stress é capaz de tornar o organismo humano mais vulnerável aos agentes infecciosos e constituir, por esse motivo um factor de risco. Tal facto acontece porque as reacções biológicas e hormonais que o stress desencadeia permitem a fragilização do sistema imunitário e a diminuição das defesas biológicas do ser humano.

De acordo com Adler e Hillhouse (1996), o sistema imunitário desempenha uma função de vigilância, identificando e defendendo o organismo dos agentes patogénicos, isto é, contra bactérias, vírus, parasitas e fungos que podem provocar doenças. Mas, também nos protege das células anormais que se constituem no próprio organismo, alteradas por uma afecção maligna ou pela invasão de um vírus. O sistema imunitário ajuda o ser humano na medida em que dispõe de mecanismos que permitem reconhecer e neutralizar os corpos estranhos que surgem no organismo - designados em linguagem médica como antigénio - e memorizar determinado antigénio específico para referência futura. Esta capacidade em particular é extremamente importante para a sobrevivência da espécie, uma vez que permitiu o desenvolvimento do processo de vacinação e a erradicação de várias doenças.

As situações indutoras de stress podem debilitar o sistema imunitário, tanto ao nível das defesas como ao nível da imunocompetência. Lovallo (1997) refere que o aumento dos níveis de Cortisol e da actividade do sistema nervoso, que se verificam durante o stress, podem suprimir a acção do sistema imunitário que normalmente se observa após as vacinações. Por sua vez, Glaser, Kiecolt-Glaser, Bonneau, Malarkey & Hughes (1992 in Lovallo, 1997), comprovaram que os estudantes de medicina que revelaram a produção de um maior número de anticorpos, após a vacinação contra a

Hepatite B, forain aqueles que mencionaram ter um maior apoio social e um nível menor de stress global. Lovallo (1997) refere ainda vários trabalhos que demonstram existir uma supressão da função imunitária devido ao stress, quando há reactivação de vírus latentes. Há alguns vírus que podem existir no organismo humano em estado de "adormecimento". Sob uma situação de stress acompanhada por emoções desagradáveis, esse vírus pode ser reactivado (Jemmott & Locke, 1984; Jenkins & Baum, 1995; Glaser, Kiecolt-Glaser, Speicher & Holliday, 1985, in Lovallo, 1997).

2.7.2 - Situações stressantes e doença física

As investigações que se têm vindo a realizar, sobretudo a partir da década de 60, revelaram a possibilidade de o stress estar associado ao aparecimento de determinadas doenças físicas.

Serra (1999) refere a existência de três mecanismos através dos quais o stress pode conduzir a situações de doença física:

1. a activação dos eixos simpático-medular e hipotálamo- hipófiso-suprarrenal, com o consequente aumento da secreção de adrenalina e de Cortisol que, em conjunto, têm repercussões a nível cardiovascular e do aparelho digestivo;

2. a alteração dos hábitos e do comportamento observável induzidos pelo stress que podem prejudicar a saúde dos indivíduos;

3. a atribuição que o indivíduo faz aos sintomas e o modo como lida com a própria doença.

As modificações que se podem observar no aparelho cardiovascular em situações de stress correspondem a um aumento da frequência e da força de contracção cardíaca e a uma subida considerável da tensão arterial. As

exigências em oxigénio e o aumento da pressão repercutem-se no coração podendo provocar doenças cardiovasculares.

Karasek, Baker, Marxer, Ahlbom e Theorell (1981) estudaram a associação existente entre determinadas características do trabalho e a presença de doença cardíaca coronária e doença cardiovascular, concluindo que os trabalhos psicologicamente exigentes aumentam o risco de desenvolver doença cardíaca coronária e o risco de ocorrer morte prematura devida a acidente vascular cerebral. Estes autores avaliaram o nível de controlo potencial que o trabalhador tem sobre a tomada de decisões respeitantes ao seu trabalho, expresso através do grau de autonomia relativo aos processos de trabalho e do grau de liberdade respeitante ao tempo de trabalho, verificando que os trabalhos onde o nível de controlo é baixo estão associados a u m aumento do risco de desenvolver doença cardiovascular.

As situações agudas de stress costumam estar associadas ao aparecimento de lesões gástricas e a úlceras. De acordo com Velucci (1997 in Serra, 1999), a libertação de CRF provoca alterações fisiológicas menos rápidas do que a adrenalina, mas a sua acção tem uma duração mais longa, pelo que é responsável pelas respostas gastrointestinais ao stress, nomeadamente pelo aparecimento de gastrites e de úlceras.

A alteração dos hábitos e do comportamento observável induzidos pelo stress, nomeadamente fumar, tomar café, consumir bebidas alcoólicas, comer em excesso ou usar drogas, são vias que os indivíduos utilizam para

esbater as emoções desagradáveis que surgem associadas ao stress mas que, simultaneamente, podem prejudicar a saúde dos indivíduos. Considerando que a saúde de um indivíduo sujeito a uma situação de stress pode já estar debilitada devido às consequências produzidas pelas reacções fisiológicas anteriormente mencionadas, os efeitos de tais comportamentos irão

prejudicar ainda mais o indivíduo. Mas, também a nível colectivo eles se repercutem. Tomemos o exemplo do alcoolismo, assunto tabu e bastantes vezes negado mas, infelizmente, um problema bem real no mundo do trabalho e cujas consequências têm custos muito elevados. Um trabalhador alcoólico custa em termos de redução da sua performance, em perdas no tempo de trabalho e em gastos médico-sociais. Além disto, pode dar origem à existência de más relações interpessoais, ambientes de trabalho desagradáveis, aumentar o risco de cometer erros, sem esquecer o perigo que isso implica no caso de desempenhar funções com elevado grau de responsabilidade, nomeadamente se essa responsabilidade envolver o bem- estar de terceiros.

As perturbações cognitivas induzidas pelo stress, diminuição da capacidade de concentração e de tomada de decisão ou a baixa auto-estima podem aumentar os riscos de acidente de trabalho e afectar o nível de execução das tarefas. As situações stressantes podem, ainda, conduzir a estados depressivos, de apatia, a sentimentos de incapacidade e frustração que, actuando em conjunto, podem ter incidência nas taxas de acidentes de trabalho.

2.7.3 - Consequências do stress no trabalho

Como vimos atrás, o stress associado ao trabalho pode resultar de uma acumulação de situações de trabalho consideradas como ameaçadoras pela maioria dos indivíduos, por uma sobrecarga qualitativa e/ou quantitativa, por conflitos e ambiguidade de papéis, por relações interpessoais conflituosas, por condições físicas de trabalho deficitárias, ou ainda por falta de consonância entre o indivíduo e o papel que desempenha no seio da organização em que trabalha.

A exposição a agentes stressores pode conduzir a perturbações do equilíbrio fisiológico e psicológico e, consequentemente provocar mal-estar, desconforto e doença, o que na esfera do trabalho poderá resultar em baixas performances, absentismo e relações interpessoais deficitárias. De acordo com a OIT (Hansez & De Keyser, 1999) o stress e o burnout serão responsáveis por um crescimento do absentismo. O Journal of Occupational and Environmental Medicine (NIOSH, 1999) informa que as despesas de saúde com trabalhadores sujeitos a altos níveis de stress são quase 50% superiores às despesas com trabalhadores não sujeitos a condições de trabalho stressantes. Nos estudos sobre as condições de trabalho realizados pela Fundação Europeia para a melhoria das Condições de Vida e de Trabalho de Dublin em 1996 e em 2000, 28% dos trabalhadores inquiridos referiram problemas relacionados com o stress. Aliás, o stress e as perturbações músculo-esqueléticas são identificados como os maiores riscos para a saúde no trabalho e estudos realizados na União Europeia revelam que 50% a 60% dos dias de trabalho perdidos se devem a problemas ligados ao stress (Cox & Rial-González, 2000).

As repercussões fisiológicas e psicológicas da exposição a situações de trabalho stressantes podem conduzir a uma diminuição da performance dos trabalhadores e da qualidade dos serviços prestados, a um aumento do absentismo e do turnover, a um aumento do número de acidentes de trabalho, a reforma ou abandono precoce da actividade profissional, a problemas de relacionamento profissional, social e familiar e a um sentimento generalizado de insatisfação pessoal e familiar, pelo que, o nível e a qualidade de vida dos trabalhadores se deterioram (Serra, 1999).

De tudo o que ficou dito, podemos concluir que para se entender melhor o stress, este deve ser considerado como uma parte de um complexo e dinâmico sistema interactivo entre o indivíduo e o ambiente, no qual são

introduzidas as necessidades e as capacidades de cada um e as exigências do seu meio. Na maior parte das vezes, o indivíduo tenta orientar os seus pensamentos, as suas emoções e as suas relações com o mundo num estado de equilíbrio, em que se sinta confortável. Quando, por qualquer motivo, um factor rompe esse equilíbrio, o indivíduo actua de forma a sentir-se o mais confortável possível, adaptando o seu comportamento, ou através de estratégias de coping.

A maneira como o indivíduo lida com o stress é, nesta abordagem, um factor importante no tipo de resposta que empreende para lhe fazer face.

Uma vez que as situações stressantes têm características que são possíveis de identificar e consequências na saúde dos indivíduos, torna-se pertinente actuar ao nível da identificação de que características do ambiente de trabalho desencadeiam situações de stress no local de trabalho, de modo a desenvolver mecanismos e metodologias que permitam diminuir o risco do trabalhador ser sujeito a tais situações no seu trabalho.

Uma forma de o fazer passa pelo desenvolvimento de instrumentos metodológicos que permitam a identificação das situações ou características, de determinado local de trabalho, susceptíveis de desencadear stress. Assim, será possível agir sobre os contextos de trabalho eliminando os stressores desnecessários e tornando o ambiente de trabalho menos deletério para a saúde e o bem-estar dos seus trabalhadores.

Capítulo 3

Contextualização do trabalho de investigação