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4. A AGENDA CLIMÁTICA E A AGENDA URBANA: Município de São Paulo e Região

4.3 Considerações finais do capítulo quatro

A agenda de enfrentamento às mudanças climáticas esteve inserida no governo municipal desde 2005, tendo sido capitaneada pelo secretário do verde e meio ambiente entre 2005 e 2012. Este gozava de influência na estrutura governamental à época, e assim realizou o esforço de tradução e orientação de políticas setoriais com os propósitos de enfrentamento às mudanças climáticas, particularmente de mitigação, inspirando-se na abordagem de redes transnacionais e outros governos locais.

A lei de mudanças climáticas do município de São Paulo, promulgada em 2009, estabeleceu diretrizes, objetivos e metas amplos direcionados às políticas setoriais nas áreas de transportes, energia, construções, saúde, gerenciamento de resíduos e uso dos solos, visando principalmente aos propósitos de mitigação de emissões de GEE, sem definir os meios e recursos para a sua efetiva realização.

Questões como o fornecimento de habitação de interesse social, contenção de áreas de risco, urbanização de favelas, desenvolvimento social, que dizem respeito à ampliação da capacidade adaptativa dos grupos sociais mais vulneráveis não entraram, nesse sentido, para o portfólio da lei do clima.

Nesse sentido, questões como o fornecimento de habitação de interesse social, contenção de áreas de risco, urbanização de favelas, desenvolvimento social, que dizem respeito à ampliação da capacidade adaptativa dos grupos sociais mais vulneráveis, não entraram para o portfólio da lei do clima.

168 A política de mudanças climáticas paulistana teve dificuldades de cumprir seus objetivos e metas ainda no período em que este tema fazia parte da agenda governamental, sendo conduzida pelo secretário do meio ambiente. Citamos particularmente o não cumprimento das ambiciosas metas de redução de emissões de GEE em 30% até 2012 com base nas emissões de 2003, tendo em vista que as reduções de emissões que se esperavam dos aterros sanitários Bandeirantes e São João não foram contabilizadas para a cidade, por terem sido negociadas por meio de créditos de carbono em leilão internacional.

As principais políticas associadas discursivamente aos objetivos da lei do clima durante o período 2005-2012 foram abandonadas durante a gestão Haddad, particularmente o Programa de Inspeção Veicular Ambiental e o Programa Ecofrota. Contudo, nesse período observaram-se significativos avanços em políticas urbanas convergentes com os propósitos da lei do clima, mas que não foram articulados discursivamente nesse sentido.

A implementação de políticas públicas requer constante comprometimento e decisão por parte das lideranças políticas e administrativa situadas na estrutura governamental. No entanto, apesar do relevante momento internacional para questões climáticas (COP21 Acordo de Paris), a gestão Haddad não tratou o tema com a mesma importância atribuída pela gestão Kassab. A presidência do Comitê de Mudanças Climáticas, que era realizada pela Secretaria de Desenvolvimento Urbano, passou em 2013 para a Secretaria do Verde e Meio Ambiente. Esta, por sua vez, perdeu poder, recursos e influência estratégica nesse período. Nesse sentido, observou-se a perda de orientação estratégica baseada numa liderança capaz de renovar a agenda do clima durante essa gestão.

Os principais avanços da política urbana nesse período foram consolidados no Plano Diretor Estratégico, promulgado em 2014, estabelecendo as diretrizes para guiar os investimentos públicos e privados para o desenvolvimento da cidade nos próximos 16 anos. Por tratar de preocupações centrais à cidade, a elaboração e discussão em torno dos objetivos, metas e instrumentos do plano diretor mobilizam diferentes segmentos de movimentos sociais nos processos participativos. Diferentemente da política de mudanças climáticas que necessita de tradução e interpretação para associá-la a demandas preexistentes na sociedade.

O Plano Diretor aborda de maneira sistêmica e articulada desafios urbanos nas áreas de habitação social, transportes, desenvolvimento econômico e preservação ambiental, tendo como objetivos a contenção do espraiamento urbano e a redução dos fluxos pendulares na cidade. Na política habitacional foram criados instrumentos autoaplicáveis que permitem

169 fonte de financiamento regular que promove aumento na arrecadação e vinculação de parte dos recursos para a construção e requalificação de habitações de interesse social. Afinal, construções acima do coeficiente básico de potencial construtivo um, pagam outorga onerosa do direito de construir. Nesse sentido, promove-se ampliação da base de arrecadação do fundo de desenvolvimento urbano, o qual deve destinar 30% para habitações de interesse social.

Somam-se a esses instrumentos urbanísticos o Parcelamento, Edificação e Utilização Compulsórios (PEUC) e o IPTU progressivo cujo objetivo é assegurar a função social da propriedade e combater a ociosidade construtiva em áreas onde há infraestrutura básica, garantindo assim que a taxa mínima de ocupação seja cumprida. Além disso, o PDE ampliou a reserva de terras para a produção de habitação de interesse social, privilegiando as faixas de renda mais baixas (de 1 a 3 salários mínimos). E criou mecanismos inovadores como a quota de solidariedade e a cota-parte máxima da terra, ambos com o propósito de estimular ocupações urbanas que atendam diferentes faixas de renda em áreas dotadas de infraestrutura urbana consolidada.

A política habitacional se vincula a política de mobilidade urbana, tendo em vista que o PDE previu instrumentos urbanísticos que orientam o adensamento construtivo e populacional nos eixos de transportes de média e alta capacidade. Nos chamados eixos de estruturação da transformação urbana, além dos instrumentos que orientam o adensamento construtivo e populacional, são previstos instrumentos de qualificação urbana dos imóveis e prioridade aos transportes públicos e incentivos aos usos mistos habitação, trabalho e lazer.

Ainda nos referidos eixos de estruturação da transformação urbana, o PDE prevê incentivos a instalação de empresas, ligada aos eixos de transportes, em regiões de periferia onde há baixa oferta de empregos e alta densidade populacional. Assim, criou polos estratégicos de desenvolvimento econômico, na macroárea de estruturação metropolitana, a fim de diminuir a intensidade dos movimentos pendulares internos à cidade e proveniente dos municípios metropolitanos.

Nesse sentido, esses instrumentos voltados às áreas de habitação, transportes e desenvolvimento econômico trabalham conjuntamente para os objetivos de redução das mobilidades pendulares por automóveis particulares, principal fonte de emissões de GEE na cidade de São Paulo e Região Metropolitana; além disso, o incentivo ao crescimento da cidade onde há infraestrutura consolidada visa promover a contenção do espraiamento urbano

170 excludente, que está intimamente relacionado à ocupação de áreas suscetíveis gerando áreas de risco de desastres, particularmente aos efeitos climáticos extremos.

Além disso, a gestão das áreas verdes e preservação ambiental no município ganha um novo status com o Plano Diretor, atuando de forma mais articulada na gestão da cidade. Nesse sentido, o PDE reservou áreas públicas e privadas para a construção de parques públicos considerando-os como Zonas Especiais de Proteção Ambiental, impedindo o parcelamento urbano dessas áreas. Criou também incentivos à produção orgânica e ao turismo nas zonas rurais do município a fim de preservar a identidade e vocação do território, buscando-se evitar assim o avanço urbano nessas áreas que cumprem relevantes serviços ambientais para toda a região metropolitana. Ainda nessa lógica, outro instrumento que merece destaque é o pagamento por serviços ambientais aos proprietários ou possuidores de áreas com ecossistemas provedores de serviços ambientais.

Apesar das convergências dos instrumentos do PDE e da política urbana com os propósitos de redução de emissões de GEE e redução de vulnerabilidades aos eventos climáticos extremos no território do município, a gestão 2013-2016 não articulou tais avanços discursivamente à agenda climática, tendo em vista a falta de percepção estratégica desta agenda por esse governo.

Por outro lado, as diretrizes e objetivos previstos pelo Plano Diretor, operacionalizados por instrumentos autoaplicáveis com fonte de recursos regulares, devem guiar o desenvolvimento da cidade no médio e no longo prazos, proporcionando maior estabilidade ao desenvolvimento das políticas públicas, particularmente as de transporte e habitação. Assim, trata-se de um instrumento relevante para dar respostas às causas e efeitos das mudanças climáticas no nível local.

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