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Nunca saímos de um encontro do mesmo modo que chegamos; somos sempre alterados nesse percurso. Percebemos as coisas de forma diferente na ida e na vinda, porque cada situação é única.

O diálogo é a essência da perspectiva da Análise Dialógica do Discurso. O texto, na perspectiva bakhtiniana, fundadora dessa vertente da AD, só tem sentido quando em contato com outros textos. Esse contato não deve ser apenas no plano da oposição, mas é como pensar em um encontro de palavras.

Assim como nos encontros fortuitos da vida cotidiana, os encontros de palavras nos alteram. Nesse sentido, o trabalho de análise de um gênero como um texto que relata situações vivenciadas em outros momentos nos coloca em contato com outros textos, outras experiências. Essa experiência outra pode ser também algo comparado ao que já vivemos ou temos como necessidade e, assim, entramos em contato já com um outro tempo, outros espaços, com as nossas próprias experiências.

Saber como alguém lidou com alguma situação de um modo diverso nos projeta para um outro tempo, com um novo olhar. Assim, já não somos mais os mesmos. Fomos alterados pela experiência do outro.

Na análise linguística, tudo isso ocorre de forma semelhante. Os nossos olhares e pontos de vista, construídos com nossas experiências de vida são penetrados pela palavra outra que encontramos na teoria. A nossa palavra, o objeto de estudo e a teoria se tocam e se alteram.

Neste trabalho, observamos como o publicitário procura trabalhar com a linguagem de modo que a sua palavra toque a palavra de seu auditório, a fim de que seu autor- contemplador, continue o diálogo respondendo ativamente ao que lhe foi posto aderindo ou não à palavra outra. Até mesmo a não-empatia aos argumentos verbo- visuais, à escolha do depoente-herói ou aos outros recursos discursivos usados para

que o autor tentasse atender aos anseios do receptor, já é por si só uma resposta. Todos esses pontos se tocam; são encontros.

A escolha do discurso indireto livre como recurso estilístico associado ao conteúdo temático e à demanda do auditório, que ora requer um texto mais formal ora menos formal é também diálogo. As vozes da demanda social, do publicitário, da instituição nesse estilo de escrita ecoam, mesmo que de forma velada em cada testemunhal publicitário. Bakhtin (2003) diz que se essas vozes que compõem os diálogos forem totalmente apagadas (o que é possível fazer estilisticamente) o sentido profundo desaparecerá.

O testemunhal publicitário recorre ao discurso de outrem como estratégia discursiva e faz emergir muitas vozes. As possibilidades de construções argumentativas nesse gênero midiático não se esgotam nessa estratégia, mas, ainda, é possível lidar com a emoção, também construída argumentativamente, uma vez que é um trabalho com a memória sociodiscursiva, já que as emoções são, também, sociais. Essa tarefa de trabalhar com a publicidade testemunhal é uma tarefa extremamente complexa ao publicitário e rica aos analistas do discurso.

Como dissemos no início deste trabalho, não pretendemos encerrar aqui a discussão e nem mesmo definir padrões de análise, pois nem mesmo Bakhtin e seu círculo o fizeram, mas tão somente abrir o diálogo nesta arena sobre o discurso midiático e o uso do testemunhal publicitário.

Ao escutar tantos “outros”, fomos alterados ao longo deste processo e esperamos, de algum modo, que na escuta ativa deste texto, nosso interlocutor também possa ter sido alterado e que essas questões apontadas possam, futuramente, ser retomadas em outros estudos.

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APÊNDICE A - Gravação das publicidades em disco de vídeo digital