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Apesar dos recursos disponíveis para prevenção de desastres e do conhecimento técnico sobre suscetibilidade e ações estruturais mitigadoras do risco associado a deslizamentos, na prática a organização entre os moradores e instituições a fim de reduzir os problemas tem se mostrado, até o momento, insuficiente. Observa-se o descaso frente a esse problema, dada a luta constante pelo acesso ao direito à moradia e a quantidade exorbitante de pessoas morando em áreas impróprias à ocupação em todo Brasil.

Nesse contexto, as pesquisas, atividades de extensão e discussões sobre redução de risco de desastres, passíveis de interpretações diversas entre as diferentes vertentes, devem se tornar mais expressivas dentro das universidades em diversas áreas do conhecimento, posto que o tema é interdisciplinar. Falta diálogo entre as pessoas dessas áreas, entre esses e os órgãos públicos gerenciadores de desastres e, principalmente, com a comunidade.

Ações bem planejadas para redução do risco associado a deslizamentos envolvendo intervenções estruturais e não estruturais devem contar com o prévio conhecimento dos moradores sobre a percepção de risco, que foi o objetivo deste trabalho, focando em três comunidades de Angra dos Reis.

A seguir são apresentadas as principais conclusões desse levantamento de percepção de risco que podem contribuir para tornar mais eficientes as ações para a redução dos riscos nas referidas comunidades.

Observa-se que os moradores fazem uma hierarquização e relativização dos incômodos e seus respectivos riscos. A importância dada aos deslizamentos divide-se com a dada à outros incômodos presentes na localidade. 26,5% dos moradores consideram a violência e as drogas como o problema mais importante do bairro, mas os deslizamentos também possuem uma importância relativa significativa de 23,5%.

165 Em relação aos problemas pessoais da vida do morador e de sua família, a relativização do problema acontece, principalmente, em áreas de alto e muito alto risco.

As percepções de risco dos moradores se distanciam das percepções de risco dos técnicos, sendo essa distância tão maior quanto maior for o grau de risco em que se encontra o morador. Os moradores apresentam familiaridade com o tema dos deslizamentos, segundo as seguintes constatações: 97,1% dos moradores dizem que sabem o que é uma área de risco; 91, 2% dos moradores já foram afetados ou conhecem alguém que foi afetado por algum desastre, sendo que esse percentual cresce com o aumento do grau de risco; 79,4% dos moradores admitem existir risco de deslizamentos na comunidade, no entanto, de uma forma geral, eles não consideram que moram em área de risco; 61,8% dos moradores dizem que o deslizamento de terra ameaça a sua vida ou qualidade de vida de alguma maneira, sendo esse percentual menor nas áreas de risco alto e muito alto (50%), percentual não esperado, mas justificado pela influência do comportamento dos moradores do Morro da Carioca em áreas de risco alto e muito alto. 75,0% dos moradores dessas áreas dizem que os deslizamentos não ameaçam o seu bem estar e 100% não consideram os deslizamentos como um incômodo no bairro.

De uma forma geral, os moradores declaram que os deslizamentos podem causar problemas sérios, trazendo risco a vida, tanto pela morte de pessoas como pela degradação da qualidade de vida de quem consegue sobreviver ao desastre. A comunidade está propensa a discutir o problema, mostrando com suas falas que não negligenciam a suscetibilidade a deslizamentos da área em que vivem. Mesmo com essa consciência e a vontade de que os problemas ocasionados pelos desastres se resolvam, os moradores tentam esquecer que estão sujeitos ao problema ou atribuem o problema não a eles próprios, mas ao vizinho ou ao governo, uma vez que eles não se sentem capazes de resolvê-lo. Alegam que enfrentariam inúmeras dificuldades para

166 garantir uma vida digna se saíssem de suas moradias, já que o governo não fornece assistência compatível com as perdas ocasionadas após o desastre.

A impotência sentida pelos moradores, ao se verem diante da ausência de alternativas para se proteger, impede o engajamento em atividades de redução dos riscos. 76,5% dos moradores não se acham capazes de fazer algo que contribua para evitar os deslizamentos, sendo que o percentual desses aumenta com o grau de risco do local onde moram.

A desarticulação entre os moradores e os agentes públicos locais favorece essa impotência. Os órgãos públicos ainda possuem muitas dificuldades para organizar atividades de prevenção que envolvam a comunidade, por isso os moradores não têm noções suficientes sobre a gravidade das ações antrópicas instabilizadoras das encostas (52% dos moradores tem dificuldades em identificar essas ações), não sabem como contribuir na sua vida diária para reduzir a susceptibilidade aos deslizamentos, fazendo com que, quando o perigo dos deslizamentos existe, não estejam preparados para enfrentá-lo. É importante instruí-los sobre a adoção de ações simples para a redução do risco, como saber fazer um sistema de drenagem local, garantir a limpeza dos canais de drenagem, não retirar coberturas vegetais do solo e realizar o reflorestamento em encostas etc.

Outro fator que contribui para os moradores não se sentirem capazes de transformar positivamente o meio em que vivem é que a maioria dos moradores (67,6%) considera que somente as obras de engenharia resolveriam o problema dos desastres, também em função de não possuírem conhecimento adequado sobre ações para a redução desse problema.

Os moradores atribuem ao governo toda responsabilidade sobre as consequências dos desastres porque se sentem abandonados pelos governos, afastados da Defesa Civil e, principalmente, porque para eles as ações para a redução de risco se limitam a obras de engenharia cuja execução só seria viável com o financiamento do governo.

167 Quanto ao sistema de alarme, quase a totalidade dos moradores (82,4%) não confiam e têm pouca compreensão sobre o funcionamento do mesmo e uma grande parcela diz que não sairiam de suas casas se o sistema fosse acionado (26,5%) ou não sabe se sairiam (20,6%).

Além da dificuldade de comunicação com a Defesa Civil, a ligação afetiva e social entre os moradores e o seu local de moradia e as oportunidades oferecidas pelo mesmo, principalmente para os moradores das áreas de risco médio, alto e muito alto, podem contribuir para esta postura quanto ao sistema de alerta.

Evidencia-se que um trabalho educacional que mostre aos moradores como eles podem contribuir significativamente para a redução dos riscos, minimizando e/ou revertendo as ações antrópicas nocivas a estabilidade das encostas e participando efetivamente na gestão dos riscos, incentivaria o seu engajamento em atividades de prevenção. Para tal, as ações educativas devem, portanto, ter como foco a promoção do empoderamento da população, a formação de um canal de comunicação entre os órgãos governamentais e a população e a integração desta nas suas ações de redução dos desastres.

Adverte- se que essa análise deve ser encarada de forma provisória e aproximativa, uma vez que em pesquisa científica as afirmações podem superar conclusões prévias a elas e podem ser superadas por outras afirmações futuras (Minayo, 1992 apud Minayo et al., 2012).

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