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PROFESSORES (CCAP) 239 6.2 A POLÍTICA DE AVALIAÇÃO DE DESEMPENHO

1.4 CONSIDERAÇÕES TEÓRICO-METODOLÓGICAS

Estudamos documentos dos governos brasileiro – Ministério da Educação e do Congresso Nacional -, paulista e português para conhecer as políticas de AD propostas e implantadas e documentos de OM que influenciaram sua formulação, especialmente da OCDE, BM e PREAL. Analisamos jornais e notícias publicados na internet pela FENPROF – sobretudo o Jornal da FENPROF - e pelo Sindicato dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo (APEOESP) visando a identificar os posicionamentos e reações dessas organizações diante das políticas de avaliação e bonificação docente, bem como as repercussões da luta sindical sobre estas políticas.

Desenvolvemos pesquisa de campo em Portugal, onde, além de coletar documentos na sede das organizações sindicais docentes, entrevistamos, a partir de uma entrevista semi- estruturada (Apêndice B), cinco dirigentes sindicais:

- dois do Sindicato dos Professores do Norte (SPN) (DIRIGENTE 1 e DIRIGENTE 2);

- um do Sindicato dos Professores da Região Centro (SPRC), também Coordenador Geral da FENPROF (DIRIGENTE 3) e

- dois do Sindicato dos Professores da Grande Lisboa (SPGL) (DIRIGENTE 4 e DIRIGENTE 5).

Por meio da coleta de documentos e das entrevistas realizadas em Portugal procuramos identificar: a) os posicionamentos e as reações das organizações sindicais à implementação da ADD do ME; b) as repercussões da luta sindical sobre esta política e c) as estratégias do governo português para implantar a referida política. Também analisamos o aparato legal que sustenta a política de ADD implementada em

Portugal em 2008 e os elementos políticos e teóricos que a consubstanciaram, como o Programa do XVII Governo Constitucional (PORTUGAL, 2005a) e o Estudo sobre a revisão da carreira docente, de João Freire (FREIRE, 2005). Enfocamos a análise no DL n. 15/2007, de 19 de janeiro de 2007 (PORTUGAL, 2007a), que estabelece a revisão do Estatuto da Carreira Docente (ECD) e cria o “novo” e amplamente contestado modelo de ADD.

Utilizou-se a pesquisa documental para investigar as políticas de bonificação implementadas no Estado de SP e aquelas propostas pelo governo brasileiro. As reações e posicionamentos da APEOESP, bem como as repercussões de sua luta sobre as políticas de bonificação foram analisadas a partir dos materiais publicados por esta organização em seu site – www.apeoesp.org.br.

Tanto em Portugal, quanto em SP, privilegiamos para análise as reações e posicionamentos das principais organizações sindicais docentes, quais sejam: a FENPROF, que tem 60% do total de professores sindicalizados em Portugal, de acordo com o dirigente da FENPROF, e a APEOESP, que conta com 180 mil sócios (APEOESP, 2014). Não se trata de um estudo comparativo entre as organizações sindicais, nem entre as políticas de AD analisadas. Procuramos identificar em Portugal - onde a avaliação docente foi implantada como política pública desde o início dos anos 1990 - os enfrentamentos realizados pelas organizações sindicais docentes, especialmente a FENPROF, em torno da formulação e implementação da política de ADD de 2008, e as repercussões desses embates sobre a própria política. O conhecimento deste processo de luta entre o governo português e as organizações sindicais docentes é importante para perspectivar a organização e a mobilização que os sindicatos de professores brasileiros poderão ter que empreender para se oporem às políticas de AD já instituídas e as que poderão vir a ser adotadas no Brasil. A orientação neoliberal das políticas de AD implementadas nos países periféricos a partir dos anos 2000 têm apresentado crescentemente uma perspectiva individualista, meritocrática, competitiva, excludente e discriminatória que, desse modo, desafia as organizações sindicais docentes, por natureza, representativas dos interesses coletivos dos trabalhadores.

Por fim, considerando a produção deste estudo no âmbito da Linha de Pesquisa Trabalho e Educação, procuramos realizar uma análise da documentação atentando para as inter-relações entre o mundo do trabalho e a educação. A forma como estas relações aparecem na documentação indica que a educação tem, para seus formuladores - intelectuais orgânicos do capital - um caráter pragmático, funcionalista, utilitário, instrumental e conformador em relação ao mundo do trabalho. Portanto, nessa documentação, as recomendações de AD, justificadas pelo discurso da melhoria da qualidade do professor, de seu desempenho e da educação, assumem o mesmo sentido, que é problematizado pela correlação de forças entre docentes e organizações sindicais, por um lado, e governo, por outro, na formulação e implementação da política educacional.

Para alcançar os objetivos propostos neste estudo e desenvolver as problematizações nele levantadas, fundamentamo-nos nas contribuições do materialismo histórico. Buscamos neste referencial um suporte teórico e metodológico para compreender as políticas de AD propostas por OM e adotadas por governos como singularidades que expressam e condicionam a universalidade, ou seja, a sociedade capitalista compreendida como totalidade histórico-social.

As políticas de AD inserem-se num quadro mais amplo de políticas e reformas educacionais que carregam as marcas da luta de classes em torno do sentido da educação básica pública. Esta e, mais especificamente, as políticas de AD, processam-se articuladamente à totalidade histórico-social (CURY, 1987). Por isso, elas possuem, na sociedade capitalista, “uma especificidade que só é inteligível no contexto das relações resultantes dos conflitos das duas classes fundamentais” (CURY, 1987, p. 13). Compreender as políticas de AD, portanto, pressupõe analisá-las à luz das relações e interesses de classe que atravessam sua produção e implementação, bem como analisar o seu sentido no conjunto das políticas públicas e da totalidade histórico-social.

A educação básica pública é uma prática social permeada pelos conflitos e interesses de classes. Ela exerce uma função social importante na produção e difusão das concepções de mundo de capital e trabalho, ou seja, do consenso necessário à reprodução ou transformação das relações de produção capitalistas. Para o capital, disputar políticas e reformas educacionais, bem como as finalidades da educação básica

pública, é crucial para tentar garantir a reprodução da sua concepção de mundo e, nesse sentido, mascarar as contradições inerentes ao modo de produção capitalista. A direção das organizações sindicais docentes e os posicionamentos e ações destas são disputados por diferentes lideranças, que representam distintos projetos de classe e frações de classe, os quais, por sua vez, se opõem ou aderem às políticas de AD propostas por intelectuais burgueses e adotadas por governos.

Discutir os limites e as possibilidades da luta sindical no Estado capitalista demanda refletir sobre os fundamentos desse Estado, pois a educação, objeto de trabalho dos docentes, é um direito constitucional a ser assegurado, em seu nível básico, majoritariamente pelo Estado, nos casos de Brasil e Portugal. Além disso, os docentes da educação básica, em sua maioria, são trabalhadores vinculados ao Estado, constituindo-se, no Brasil, na maior categoria de trabalhadores do setor público, com dois milhões de membros. Por último, é no âmbito do Estado que se elaboram e avaliam políticas como as de AD, que têm mobilizado a resistência de docentes e sindicatos em função de inúmeras implicações.