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3. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

3.2. Construção do instrumento de coleta de dados

Um dos objetivos da presente pesquisa foi a construção de um instrumento para a identificação das representações das crianças sobre o ambiente da instituição de educação infantil. Como exposto nos procedimentos metodológicos, o método utilizado neste estudo foi o clínico, que tem como uma de suas especificidades a ausência de procedimentos gerais de coleta e análise dos dados, o que exige do pesquisador a elaboração de um instrumento que atenda aos objetivos da pesquisa dentro da temática a ser estudada.

Por isso a proposta de construir um instrumento que nos possibilitasse apreender as representações das crianças sobre o conceito de escola, visando adequá-lo à temática do estudo e à idade das crianças, sujeitos desta pesquisa.

O processo de construção do instrumento iniciou-se durante a disciplina sobre o método clínico, no curso do Mestrado em Economia Doméstica. No final da disciplina foi elaborado um esboço de possíveis perguntas relacionadas à temática.

Após a leitura de pesquisas em que crianças foram entrevistadas sobre o ambien- te escolar, principalmente do trabalho de Saravali (2010), as perguntas foram reelabora- das, acrescentando-se às perguntas básicas perguntas complementares. Ressalta-se que, embora o método clínico seja um procedimento de entrevista aberta, é necessário dispor de um núcleo básico de perguntas referentes aos aspectos fundamentais da pesquisa e que devem ser feitas a todos os sujeitos da pesquisa, para possibilitar a comparação das respostas. Ou seja, cada entrevista será diferente pelo fato de a entrevista clínica ser aberta e seguir o curso do pensamento do sujeito, porém deve conter uma parte básica que seja comum a todas as entrevistas. As perguntas complementares, diferentemente das básicas, não necessariamente são feitas a todos os sujeitos, pois variam de acordo com a resposta dada por eles, o que apontará se serão necessárias outras perguntas para melhor esclarecimento do sentido do que foi dito pelo entrevistado (DELVAL, 2002).

Para melhor organização interna do trabalho, as perguntas foram ordenadas dentro dos seguintes itens propostos por Delval (2002): Descrição inicial: parte introdu- tória da temática; Autocaracterização: item que tem por objetivo possibilitar conhecer como as crianças falam de assuntos referentes a elas diretamente; Aspectos: item em que aprofundamos a temática com as crianças; Extensão: item que tem como objetivo expandir a temática com situações amplas que abrangem aspectos para além das vivências das crianças entrevistadas; Mudança: item com o objetivo de conhecer as

explicações das crianças sobre fenômenos que envolvem mudanças; Justificativas: item que tem por objetivo conhecer as explicações das crianças sobre a causa de fenômenos; e Soluções: item que tem por objetivo conhecer as soluções propostas pelas crianças a problemas apresentados a elas.

Posteriormente, definiu-se a categoria Escola para nortear as perguntas dentro de cada item organizador da entrevista. A categoria Escola foi criada para verificar as representações das crianças sobre o conceito de escola; sobre o que um lugar precisa para ser uma escola; o que é uma escola boa e uma escola ruim; as preferências das crianças em relação ao ambiente escolar, bem como conhecer as soluções propostas pelas crianças diante de situações-problemas referentes à escola apresentadas a elas.

Após as modificações no roteiro de entrevista, inicialmente foram realizadas duas entrevistas com crianças dentro da faixa etária dos sujeitos da pesquisa, sendo uma de escola construtivista (criança 1) e outra de uma escola tradicional (criança 2), como estudo-piloto. Como ressalta Delval (2002), o estudo-piloto é de extrema importância, pois permite testar nosso procedimento de pesquisa antes de empreender o trabalho definido. Seu objetivo é pôr à prova o procedimento em todos os aspectos, até que ele se adapte da melhor maneira possível aos objetivos da pesquisa.

Portanto, realizou-se, individualmente, uma entrevista clínica com cada uma das crianças, para apreender suas representações sobre a escola. Os dados obtidos dessas duas entrevistas do estudo-piloto evidenciaram a capacidade das crianças de falar sobre suas vivências na escola e a representação que constroem desse ambiente. Portanto, a realização do piloto mostrou que é possível entrevistar crianças na idade de 5 a 6 anos e que o método clínico é um procedimento que possibilita apreender as representações infantis. Representações estas que necessitam ser conhecidas e estudadas como forma de contribuir para futuras reflexões, principalmente com relação aos temas relacionados às crianças e à sua vida em sociedade. Esses aspectos podem ser visualizados nos extratos do estudo-piloto:

Eu acho que a gente poderia mudar a escola. Poderia mudar... Tirar o quadro das escolas que tem quadro e mudar pela área externa.

(Criança 1, 5 anos, escola construtivista)

Precisa tê cadeira, precisa tê sala, precisa tê parede, precisa tê telhado, precisa tê figura, precisa tê colagem. (Criança 1, 5 anos,

Hum... Um lugar pra mim... Que eu gosto de ir e brincar às vezes... E também, quer dizer, e também... é... é... estudar. (Criança 2, 6; 4 anos,

escola tradicional)

Além de reafirmar a eficácia do método clínico na apreensão das representações infantis, o estudo-piloto com essas duas crianças apontou mudanças necessárias a serem feitas nas entrevistas. Percebemos que a entrevista estava muito extensa para as crianças, com duração média de 49min6s, portanto foram feitas modificações para diminuir a quantidade de perguntas. Delval (2002) aconselha não tentar abarcar um campo de problemas vasto demais; se a intenção é estudar um problema amplo, é melhor dividi-lo em partes e escolher uma delas, deixando as outras para outra ocasião. Segundo o autor, uma entrevista muito longa é cansativa para os sujeitos e para o pesquisador é difícil de analisar.

Em seguida, realizou-se mais uma entrevista, a partir da qual sentimos neces- sidade de uma situação-problema que introduzisse o tema para a criança, auxiliando-a no pensamento e na reflexão para responder as perguntas da entrevista.

A partir da leitura de uma história utilizada com as crianças na publicação intitulada Consulta sobre a Qualidade na Educação Infantil, realizada com crianças entre 5 e 6 anos de instituições de educação infantil de quatro Estados brasileiros (Minas Gerais, Rio Grande do Sul, Ceará e Pernambuco), surgiu a ideia de elaborar uma história para introduzir nossa entrevista e que fosse referência de algumas perguntas. Essa história foi uma adaptação da história utilizada na Consulta sobre a Qualidade na Educação Infantil:

Era uma vez uma cidade muito legal, que tinha quase tudo que as pessoas precisam: tinha padaria, supermercado, loja, farmácia, igreja e outras coisas. Mas não tinha escola para crianças pequenas, só tinha escolas para crianças grandes. Então as pessoas que moravam nessa cidade acharam que precisava ter uma escola para crianças pequenas como você. Mas essas pessoas não sabiam como essa escola tinha que ser. Elas queriam uma escola que fosse boa, mas não sabiam do que as crianças gostavam, o que elas queriam que tivesse lá. Então, se você morasse nessa cidade, você poderia ajudar a construir a escola. (Fonte: adaptado de Campos e Cruz, 2006)

Após a introdução da história na entrevista foram realizadas mais duas entre- vistas com crianças na faixa de 5 anos de idade, para testar novamente o instrumento. Com base na história, foi confeccionado um desenho para auxiliar as crianças visualizarem a situação narrada pela história, como apoio ao seu pensamento. Esse

desenho foi confeccionado em uma folha de papel-cartão, feito a lápis e posteriormente colorido, como pode ser visualizado no Apêndice D.

Por fim, foi realizada a sexta e última entrevista-piloto, que nos oportunizou fazer as adequações finais para irmos a campo. O protocolo de entrevista e a figura utilizada como material de apoio para a criança visualizar a situação proposta na história encontram-se nos Apêndices C e D.