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CAPÍTULO II – ELEMENTOS DE DIREITO URBANÍSTICO

3.5. Conteúdo

Como regra geral, o EIV deverá conter elementos suficientes para demonstrar, de

forma clara e precisa, todos os prováveis efeitos que a execução do

empreendimento causará à população que habita ou circula no seu entorno, bem

como antever os reflexos que serão gerados na infra-estrutura urbana.

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São diversos aspectos a serem sopesados na confecção do EIV, sob ponto de

vista do potencial impacto funcional, estético, paisagístico e de infra-estrutura

urbana gerado pelo novo projeto. O conteúdo mínimo previsto no artigo 37 do

Estatuto da Cidade engloba questões de adensamento populacional,

equipamentos urbanos e comunitários, uso e ocupação do solo, valorização

imobiliária, geração de tráfego e demanda por transporte público, ventilação e

iluminação, paisagem urbana e ao patrimônio natural e cultural.

Cumprirá, contudo, ao Município complementar este rol, tecendo novas exigências

ou detalhando os aspectos a serem abordados pelo EIV. Destacamos que esta

delegação de função legislativa ao Município não ocorre ao acaso, uma vez que

deve prevalecer o interesse local na fixação dos requisitos do EIV. Por mais que o

Estatuto da Cidade tenha determinado o conteúdo mínimo do Estudo, outras

particularidades regionais ditadas pelos usos e costumes de determinadas cidades

poderão ser agregadas como itens obrigatórios no conteúdo do EIV.

A título de exemplo, não se supõe que as exigências de conteúdo para o EIV

sejam exatamente iguais para uma grande metrópole e para uma cidade histórica,

diante das características substancialmente diferentes desses agrupamentos

urbanos. Da mesma forma, municípios com vocação turística, como cidades

litorâneas e estâncias hidrominerais, devem conter em sua legislação relativa ao

EIV as especificidades próprias, não deixando se restringir ao conteúdo mínimo do

Estatuto da Cidade, que cuida apenas dos principais elementos de infra-estrutura

que usualmente são afetados por empreendimentos de grande porte.

Neste sentido, supomos que o EIV deverá ao menos: (i) descrever

detalhadamente as características do empreendimento; (ii) examinar a área de

influência em que o empreendimento será implantado; (iii) indentificar os possíveis

impactos que ele poderá causar, e; (iv) indicar as medidas de prevenção,

atenuação, potencialização ou compensação desses impactos ou ainda de

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gerenciamento de riscos urbanos potenciais ou pré-existentes. Além disto,

consideramos que os impactos analisados pelo EIV não devem se restringir

apenas a aspectos puramente urbanísticos, pois os reflexos sociais e econômicos

também devem ser contemplados.

Por outro lado, em razão da complexidade das questões urbanísticas a serem

enfrentadas nas metrópoles, entendemos que o conteúdo do EIV haveria de ser

mais abrangente e completo nessas cidades. Relacionamos abaixo alguns itens

que, sob nossa ótica, haveriam de ser considerados na regulamentação do EIV.

No quesito da adequação urbanística, a infra-estrutura urbana básica nos parece

ser o primeiro elemento a ser investigado. Questões como acessibilidade,

circulação e transporte são elementos fundamentais no Estudo, incluindo

transporte coletivo (mapeamento de linhas de ônibus disponíveis, informações

sobre a distância à estação ferroviária mais próxima, de trem ou de metrô, com

estudo da capacidade de absorção de novos passageiros, informações sobre

projetos de expansão das linhas de ônibus e de trens); estudo do sistema viário,

com levantamento do fluxo de veículos presente e futuro; indicação de rotas

alternativas para diferentes regiões da cidade, incluindo rotas de fuga em caso de

catástrofes como enchentes, incêndios ou explosões; indicação de capacidade

das vias de tráfego na região; informações sobre a demanda de vagas de

estacionamento em razão da dimensão do projeto e possibilidade de futuro

incremento na disponibilidade de vagas.

Na esfera do abastecimento e saneamento básico, a legislação haveria de

considerar os sistemas existentes e/ou planejados de abastecimento de água,

energia elétrica e gás, de saneamento básico, coleta e tratamento de esgotos;

afora sistemas de escoamento de águas pluviais e prevenção às enchentes, e de

coleta e destinação de lixo, resíduos sólidos e líquidos.

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A iluminação e segurança pública também são itens que merecem atenção do

legislador, pois novos empreendimentos são potenciais causadores de impacto

nos equipamentos urbanos e comunitários. Por outro lado, podem contribuir,

dentro de um planejamento ordenado, para a recuperação de regiões degradadas

e redução de índices de criminalidade no seu entorno.

Por outro lado, empreendimentos realizados em áreas já desenvolvidas podem

demandar melhorias na infra-estrutura urbana avançada, como cabeamento de

fibra-ótica, melhoria nas condições de conectividade com banda larga de Internet

e instalações de TV a cabo.

No campo sócio-econômico, consideramos que o EIV deve adentrar em aspectos

de análise de mercado, antevendo os resultados da concentração de atividades e

reflexos urbanísticos dessa concentração sobre a economia local, especificação

do raio de abrangência e interferência nas demais atividades já existentes na

região.

Relativamente aos aspectos ambientais, o EIV deve apontar todos os impactos

causados tanto pela execução da obra (movimento de terra e destinação do

entulho; limpeza dos pneus dos caminhões antes de saírem para a via pública;

interferência da obra com sistema de drenagem - capacidade de bueiros;

perturbações sonoras resultantes dos ruídos da obra; interferência do trânsito de

máquinas e caminhões no tráfego local e poluição do ar em razão de suspensão

de partículas), como aqueles causados pelo funcionamento do empreendimento

ou atividade (adensamento populacional e criação de ilhas de calor,

impermeabilização do solo, poluição do ar, perturbações sonoras, produção de

resíduos e sua destinação final, impactos em espaços públicos ou institucionais do

entorno, como parques, praças, impacto no patrimônio histórico e na paisagem

urbana).

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Consideramos que o EIV poderá ainda determinar situações em que o

empreendimento deva obter certificação relativa à sustentabilidade ambiental, com

a adequada destinação e reciclagem de resíduos na fase de obra e redução de

consumo de energia na fase de operação. Vale notar que essa certificação já

ocorre para os chamados “green buildings” ou “edifícios verdes”, que são

edificações providas de medidas construtivas e procedimentais que buscam o

aumento de sua eficiência no uso de recursos, com foco na redução dos impactos

sócios-ambientais, realizado por meio de processo que abrange o ciclo de vida

completo das edificações.

Por fim, acreditamos que o EIV deve abordar os impactos especificamente

considerados sempre que no entorno do empreendimento pretendido houver

hospitais, escolas, universidades, igrejas ou atividades que recomendem o silêncio

ou produção de baixo nível de ruído. Pela mesma razão, novos empreendimentos

próximos a estádios de futebol, ginásios, clubes, casa de shows, casas noturnas,

templos, terminais de ônibus, ou outros pólos de aglomeração humana também

são causadores de impactos específicos sobre esses estabelecimentos e

atividades e, portanto, devem ser objeto de uma análise própria e pormenorizada

de seus efeitos.

Ressalvamos que a análise de todos estes itens justifica-se para os grandes

centros ou regiões metropolitanas, podendo a lista se tornar tanto menos extensa

quanto menor o porte da cidade, respeitando-se, porém, o conteúdo mínimo

previsto no artigo 37 do Estatuto da Cidade.

Embora se trate de um documento técnico em sua essência, consideramos que o

EIV deverá primar pela linguagem acessível a todos os munícipes, a fim de

permitir a plena compreensão dos dados levantados e possibilitar a participação e

a gestão democrática, tema que exploraremos no Capítulo IV. Em outros termos,

quanto menos o conteúdo do EIV precisar ser interpretado, tanto melhor para os

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moradores, associações de classe e população, em geral, que poderão conferir os

documentos e informações e, a partir disto, extrair as próprias conclusões.