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A globalização e o crescente fluxo de pessoas pelo globo, assim como a facilidade trazida pelo advento das tecnologias de mobilidade e de informação, têm feito com que produtos, bens simbólicos e culturais circulem com maior velocidade e facilidade, havendo a naturalização de uma sociedade da superdiversidade, multicultural, estando a língua no centro dessas transformações e sendo a chave para o alcance de muitas delas. As empresas de alta tecnologia são as primeiras a perceber a necessidade de abrir-se para uma realidade multilíngue. Como demonstra Oliveira (2013):

É o que fazem as empresas de tecnologia de ponta, como o Google, ou entidades como a Wikipédia: funcionam em muitas línguas, e o lucro advém da soma de todos esses mercados linguísticos28. Para poderem alcançar mercados, precisam preparar instrumentos multicanal, para que todas as línguas possam funcionar ao

28 Calvet interpreta que o mercado linguístico é a expressão de relações de forças econômicas e políticas, é o espaço em que se dão as lutas de poder entre comunidades linguísticas, e é o espaço em que é praticada a gestão das línguas pelos polos de poder de plantão numa determinada ordem (OLIVEIRA, 2013, p.65).

mesmo tempo, o que indica prioridade do multilinguismo no mundo digital. (OLIVEIRA, 2013, p. 63)

Os efeitos da globalização e a necessidade de inserir-se também são sentidos no mundo acadêmico, por meio das políticas de internacionalização das universidades brasileiras, que em conformidade com Amorim e Finardi (2017),

A globalização, definida como o fluxo de tecnologia, economia, conhecimento, pessoas, valores e ideias entre fronteiras (KNIGHT; de WIT, 1997) afeta e é afetada pela internacionalização da educação superior, definida como o processo de integração de uma dimensão internacional, intercultural e global na missão ou função da educação superior (KNIGHT, 2003, p.2, nossa tradução).

Luce, Fagundes e González Mediel

(2016) entendem que como a

internacionalização do ensino superior impulsiona os sistemas e instituições de educação superior a responder às necessidades educativas do mundo globalizado, para os países em desenvolvimento, como o Brasil, investir na internacionalização da educação superior é incontestavelmente uma necessidade para a inserção no mundo globalizado (AMORIM; FINARDI, 2017, p.615).

Os esforços de integração nesse processo internacional, intercultural e global esbarraram prontamente na falta de políticas linguísticas de incentivo ao ensino-aprendizagem de idiomas no Brasil, uma vez que as línguas são a ponte de conexão dessas necessidades, obstáculos esses fortalecidos pelo mito do monolinguismo brasileiro (fortemente presente, inclusive dentro das universidades, por vezes nos próprios cursos de Letras), corroborando com o passado e apagando a possibilidade de assumirmo-nos como um país plurilíngue e ganharmos

positivamente com essa condição em diversos âmbitos, inclusive na inserção das universidades brasileiras, nesse novo cenário globalizado, segundo Oliveira (2000),

Para a linguística brasileira, da forma como ela está estruturada nas nossas universidades hoje, o estudo da diversidade linguística, isto é, do plurilinguismo, tem um lugar apenas modesto nos esforços de pesquisa. Quando se fala em diversidade linguística muitas vezes se pensa na diversidade interna à própria língua portuguesa, o que decorre, entre outras razões, do predomínio, no país, de uma sociolinguística de cunho laboviano que poderíamos chamar de sociolinguística do monolinguismo. Menor ainda é a preocupação de contribuir para garantir, às populações que não falam português, seus direitos linguísticos, através, por exemplo, de intervenções políticas nos órgãos responsáveis ou na mídia (OLIVEIRA, 2000, p.132).

O programa “Ciências sem Fronteiras”, do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI) e do Ministério da Educação (MEC), no Brasil, colocou em evidência internacional a falta de delineamento de políticas linguísticas de ensino- aprendizagem de idiomas. De acordo com o depoimento do professor Almeida Filho, pesquisador do Departamento de Línguas Estrangeiras da Universidade de Brasília (UnB), em entrevista para Angela Chagas:

O Ciências sem Fronteiras – lançado em dezembro de 2011 com o objetivo de oferecer mais de 100 mil bolsas de estudo em quatro anos – expõe o "lado feio" da educação no Brasil. "Essa ida para o exterior é muito saudável, mas mostrou o lado feio, as pessoas não estavam percebendo o quanto é fraco o ensino de

idiomas nas escolas do Brasil". Segundo ele, falta uma política de longo prazo para garantir o aprendizado, principalmente de inglês e espanhol. Investimento na formação de professores, aumento da carga horária de aulas e diversificação do material didático são alguns pontos apontados pelo pesquisador. (ALMEIDA FILHO, 2013 apud CHAGAS, 2013). A partir de então, de alguns esforços, estabeleceram-se políticas linguísticas na área da educação para o ensino de línguas, que deram origem a Programas como o “Idioma sem Fronteira” (IsF), promovido pelo MEC e a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), que se destina à comunidade acadêmica, professores de língua estrangeira da rede pública de educação básica, licenciandos e licenciados em Letras vinculados aos cursos de alemão, espanhol, francês, inglês, italiano e japonês, mas somente para universidades credenciadas no programa e que propõe como objetivo:

promover ações em prol de uma política linguística para a internacionalização do Ensino Superior Brasileiro, valorizando a formação especializada para professores de línguas estrangeiras (IsF, 2017). Ainda que de todo, programas como o IsF, são extremamente positivos principalmente com a democratização do acesso ao aprendizado do idioma através de aulas remotas, a nosso ver, após análise e reflexão sobre as ofertas dos programas IsF, observarmos que os editais de 2016 e 201729, funcionaram de forma híbridas: presenciais e à distância, porém, em geral, privilegiando as línguas europeias por meio das quais se estabeleceram parcerias principalmente com instituições eurocêntricas, como Serviço Alemão de Intercâmbio Acadêmico (DAAD); Agencie Universitarie de la Francophonie (UAF), não considerando as parcerias com outras universidades latinas, por

29 Vide Idiomas Sem Fronteiras (IsF). Disponível em: http://isf.mec.gov.br. Acesso em: 05 de fevereiro de 2018.

exemplo, ou desfrutando de possibilidades de acordos estabelecidos como o Mercado Comum do Sul (Mercosul) (que tem em dos seus objetivos o fortalecimento dos idiomas português-espanhol), desconsiderando possíveis cooperações entre universidades e pesquisadores altamente especializados que possuímos ao nosso cerco. Se nos detivermos rapidamente a observar no mundo onde estão localizados os Institutos de Estudos Avançados, perceberemos que há um desequilíbrio, como mostra o mapa:

Figura 01 – Mapa dos Institutos de Estudos Avançados no Mundo

Fonte: MIAS (2017)

Parece-nos que programas como o Ciência sem Fronteiras e o IsF, podem ser ótimas portas de entrada para a busca da internacionalização das universidades, gerando uma aproximação entre o equilíbrio dessas políticas de internacionalização e por consequência de línguas e proliferando os Institutos de Estudos Avançados pelo mundo, principalmente na América Latina.

Ações explícitas de políticas linguísticas, como o desenvolvimento do IsF, estão diretamente ligadas a ações de políticas públicas e, como muitas das ações de políticas públicas no Brasil, mostram sua descontinuidade e esforços que não se comunicam, uma vez que, como Medida Provisória (MP) nº 746/2016 , que torna obrigatório o ensino de inglês nas escolas do ensino fundamental ao médio, em detrimento de outros idiomas, a

MP nº 746/2016 caminha na contra mão da proposta do IsF, que tenta apaziguar justamente o problema detectado da falta de domínio de idiomas de nossos alunos quando chegam à graduação, pós-graduação, inclusive do inglês, problema este que se inicia no ensino fundamental. Deixamos com isto, em evidência, a necessidade de se pensar gestões de ensino de línguas, planejamentos de ações de políticas linguísticas que começam antes mesmo da graduação, pós-graduação (e, não somente a população escolar, mas a população como um todo) e proporcionem uma democratização da(s) língua(s), dando espaço a outras línguas, acabando com o pré-conceito do monolinguismo, valorizando o plurilinguismo e as línguas aqui estabelecidas, inclusive.

2.1. FATOR MIGRATÓRIO, POLÍTICAS DE MIGRAÇÃO E