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5 LICENCIATURA EM EDUCAÇÃO DO CAMPO: UM CAMINHO EM

5.7 CONTRA-HEGEMONIA

A construção de uma contra-hegemonia passa pelo acesso da classe trabalhadora ao conhecimento. Para isso, a escola se apresenta como um local no qual isso é possível. Não estamos defendendo-a como local único de construção do saber, apenas apresentando-a como uma ferramenta que possibilita que a classe trabalhadora gere seus intelectuais orgânicos, ou seja, possa formar seus sujeitos imersos nos seus contextos, imbuídos de competências teóricas e práticas para fazer a transformação e a libertação da estrutura hegemônica. Portanto, a escola pode ser um elemento de concretização de uma vontade coletiva.

A educação dos trabalhadores deve assumir ao menos dois significados: primeiro, ao assumir a perspectiva do interesse do conjunto das classes subalternas no processo de negação da subalternidade, ou seja, no processo de emancipação da exploração e da opressão, implicará em um programa, um projeto, um momento de construção; segundo, deverá se dotar de uma perspectiva cultural e teórica adequada, que, metodologicamente, parta do princípio que “economia” e “política”, sociedade civil e Estado são uma mesma e única realidade, que pode ser abordada por diferentes pontos de aproximação. Essa perspectiva da totalidade não poderia ser outra que a oferecida pela filosofia da práxis.

A escola voltada para os interesses dos excluídos deve se organizar internamente para que as possibilidades contra-hegemônicas possam ser criadas pelas pessoas que a frequentam. Em relação ao trabalho pedagógico da LEdoC acerca das ações contra-hegemônicas, Margarida (2012) e Rosa (2012) as descrevem como uma construção que está expressa na prática do coletivo dos educandos e dos educadores e acrescentam que:

[...] ela questiona o modelo de universidade, então quando você entra, por exemplo, no nosso caso que 60% dos alunos das turmas, da turma 4 e turma 5 são calungas. Então, ela é uma ação contra hegemônica porque é o curso mais negro da Universidade. Em torno de 65% são alunos de origem quilombola, ou de comunidades do interior, enfim, que acabam criando

dentro da Universidade uma simbologia. Porque eles chegam do campo com suas demandas, com sua especificidade, então questiona tanto o modelo, a estrutura e eles são muito ativos, então eles participam das atividades dentro da Universidade realizando palestras, seminários, articulações com outros cursos, uma certa presença no Campus Darcy Ribeiro em atividades e isso acaba questionando o ponto de vista da imagem lá dentro do campus (ROSA, 2012).

[...] o próprio curso ele questiona a Universidade porque ele é o único em alternância da Universidade, é o único curso direcionado aos sujeitos do campo, então nos Órgãos colegiados sempre há um questionamento, às vezes um constrangimento ou discordâncias. Então o curso provoca discussões dentro dos conselhos, dentro dos colegiados na estrutura universitária [...] a garra que os alunos têm e os professores é de não perder determinadas características que o curso tem como a alternância, os tempos educativos, a convivência, a organicidade que é um curso gestado também pelos estudantes, então manter essas características e os princípios básicos que estão no PPP da LEdoC vai fazer com que ele se estabeleça e consiga se estruturar, dentro da Universidade sem perder os seus princípios. (ROSA, 2012).

[...]

Certamente a LEdoC vivencia cotidianamente a luta pelo direito à educação; a busca de oferecer aos estudantes o acesso aos conhecimentos negados historicamente; a luta pelo do reconhecimento do curso na universidade, legalmente e como um curso de qualidade. A construção do pensamento crítico através das inserções na escola e na comunidade, a formação para a coletividade. Enfim, muitas ações conjuntas que resultarão em uma formação diferenciada e um ser transformado. Todas essas ações são contra-hegemônicas (MARGARIDA, 2012).

A licenciatura trabalha na intenção de que os educandos possam estabelecer ações contra-hegemônicas na escola e na comunidade do meio rural. Para isso, é necessário que eles aprendam a valorizar seus saberes, a ter confiança em suas relações, em seus espaços, em sua cultura e em sua vontade coletiva. Gramsci (1964 apud DEL ROIO, 2007, p. 70) chama atenção quanto à necessidade de descobrirmos como se unificam as classes subalternas, “[...] como a cultura das classes subalternas se rompe e se transforma em cultura e vontade coletiva antagônica à das classes dominantes, rompendo-se assim a subalternidade”.

Em relação às ações contra-hegemônicas presentes no processo de formação da LEdoC, Lírio e Violeta (2012) destacaram que o trabalho pedagógico tem contribuído para o estabelecimento de formas contra-hegemônicas:

Eu acho que está possibilitando várias quebras da hegemonia, no caso a licenciatura e a Educação do Campo, está levando discussões muito importantes pra dentro da escola, onde a agente tem os alunos inseridos. Os estudantes estão inseridos e trazendo pra dentro da Universidade. Eu percebo isso. Eu percebo que os estudantes estão engajados, estão desencadeando discussões nos outros cursos dentro da FUP [...] dentro da FUP os estudantes já estão conseguindo e também os professores. O trabalho que está sendo feito pela LEdoC está trazendo pra dentro da FUP

essa discussão. [...] perceber um grupo tão heterogêneo de estudantes da LEdoC, também dentro da Universidade é muito diferente. Já é diferente, então eu percebo que isso está acontecendo sim (LÍRIO, 2012).

[...]

Sim! Ela possibilita muitas. Principalmente a própria forma de muitos colegas, muitos professores pensarem, a forma de aprender, de ensinar. [...] Ela já tem uma postura contra hegemônica. O nosso curso, ele já é contra hegemônico porque ele vai contra muitos princípios da Universidade, muitas coisas, muitas normas e até a forma de se trabalhar também, tentando fazer a interdisciplinaridade, ser um curso que não forme só um professor, mas o gestor. Tem uma coisa muito interessante que é trabalhar com as áreas, a formação de áreas, Áreas de Linguagem, Áreas de Ciência faz com que a gente esteja sempre em constante interdisciplinaridade mesmo que ela não aconteça na postura dos outros docentes, mas ela aconteça pelos alunos, então a forma de ver a educação, por nós professores e pelos alunos também. Tem muitos aspectos que são contra-hegemônicos. Acho que pra começar pelo próprio curso, pelo próprio PPP do curso é contra- hegemônico, você não vai encontrar muita coisa parecida com ele ali dentro (VIOLETA, 2012).

O processo de conhecer e transformar na LEdoC são aspectos e momentos da filosofia da práxis, da ciência, da cultura, da história, da política etc. Por isso, Gramsci (1964 apud DEL ROIO, 2007, p.72) afirma que “[...] na teoria e na ação política, ‘a luta pode e deve ser conduzida desenvolvendo o conceito de hegemonia [...]’, condição para que a classe operária possa se emancipar da situação de subalternidade”.