• Nenhum resultado encontrado

5 LICENCIATURA EM EDUCAÇÃO DO CAMPO: UM CAMINHO EM

5.5 INTERDISCIPLINARIDADE E OS NOVOS CAMINHOS

Segundo Freitas (1995, p. 109), “[...] a interdisciplinaridade não é mais do que a intenção de pesquisar a realidade, em todas as suas relações e interconexões, por meio de um método integral de investigação [...] na base do qual encontra-se o materialismo dialético [...]”.

Portanto, com base nas reflexões de Freitas, podemos dizer que fragmentar a informação seria negar que o conhecimento é produzido no interior das relações sociais e afirmar que a lógica dominante cujo princípio é dividir em pequenas partes para impedir a compreensão da totalidade, pois é nela que podemos perceber as contradições.

O modelo de organização curricular do paradigma dominante é impregnado pelo modo de produção capitalista. Nessa lógica, o conhecimento é divido em partes, uma vez que prima pelo isolamento. Caldart (2011, p. 109) destaca que “[...] em determinado estágio, esse isolamento é questionado pela realidade [...] cujos problemas, cada vez mais complexos, exigem a desfragmentação”. Tal fato implica em pensar formas diferenciadas de conceber o conhecimento na perspectiva da “[...] reintegração por meio de esforços interdisciplinares e transdisciplinares”.

A interdisciplinaridade surge no momento em que se faz necessário repensar os campos epistemológicos como uma crítica à compartimentação do conhecimento. Organizar o currículo de forma interdisciplinar não significa eliminar disciplinas ou fazer a fusão de duas ou mais, significa estabelecer relações entre os campos teóricos.

Caldart (2011, p. 110) alerta que hoje o capital está exigindo a desfragmentação do conhecimento de maneira a satisfazer algumas de suas necessidades. Contudo, nesse sistema, a superação da fragmentação não é dada na perspectiva da totalidade, pois, se acontecer de forma radicalizada, ela se voltará contra as estruturas capitalistas. Fora da categoria totalidade, ela não tem força política porque acontece de forma superficial e ideológica.

No que se refere à interdisciplinaridade na organização do trabalho pedagógico na LEdoC, Violeta (2012) afirma que:

[...] é algo assim intrínseco mesmo, algo que é da natureza do curso e ela vai se dando, de alguma forma, mesmo que em alguns momentos ou em muitos momentos não se busca isso, de alguma forma, na forma de agir de alguns docentes, mas é algo que vai se dando, mesmo, vai transpassando o curso por meio dos alunos porque eles vão caminhando [...]. Nós temos tudo isso lá. Isso é bom. [...].

Uma observação importante é a ideia de movimento e totalidade presente na interdisciplinaridade. Quando uma disciplina se modifica, ou ressignifica a partir da outra, estão presentes as categorias citadas. Elas dinamizam o trabalho da equipe, conforme cita Margarida, “[...] todas as ações da LEdoC envolvem interdisciplinaridade. Existe uma intensa articulação entre o núcleo básico e os temas articuladores. Através do seminário de TC, todos tocam os professores [...]. Estamos buscando esta articulação” (MARGARIDA, 2012).

A interdisciplinaridade é uma continuidade que requer um acentuado trabalho da equipe, conforme destaca Rosa (2012):

Ela é uma metodologia específica e ela exige um tempo maior de preparação, de inter-relação, de reuniões, de discussões entre os professores pra poder acontecer e nós perdemos esses tempo, ou seja, nós somos engolidos, digamos, pela estrutura da Universidade, o nosso tempo pra aprofundar a interdisciplinaridade diminuiu [...] então nós temos um grupo pequeno pra fazer tudo o que é necessário para um curso como esse.

A interdisciplinaridade e a formação por área do conhecimento são permeadas pelo debate de concepção de escola e de formação que, segundo Caldart (2011, p. 111), apresenta três visões sobre os caminhos de transformação da escola: a) que a área seja ancorada em uma visão neoliberal de escola; b) que a base seja uma visão histórico-crítica desvinculada da transformação da escola, mas de transformação da sala de aula (revisão de conteúdos e métodos); e c) uma visão

que compreenda a necessidade de uma transformação radical da escola atrelada a um projeto de sociedade da classe trabalhadora. Esta última é indicada pela autora, como aquela que deve ser assumida pelas licenciaturas em Educação do Campo. Isso implica repensar as relações sociais que estão presentes no interior da escola do campo, que perpassam o currículo, os conteúdos, enfim, todo trabalho pedagógico.

Ao falarmos de interdisciplinaridade, somos compelidos a tratar da organização do currículo por áreas, das quais decorrem a constituição dos núcleos, bem como os complexos de aprendizagem. Sobre os núcleos, ou a formação por área do conhecimento, falamos em capítulos anteriores. Portanto, dedicaremos uma reflexão maior a respeito dos complexos de estudos que, segundo Freitas (2010, p. 9 apud BARBOSA, 2012, p. 227):

[...] é uma tentativa de superar o conteúdo verbalista da escola clássica, a partir do olhar do materialismo histórico-dialético, rompendo com a visão dicotômica entre teoria e prática (o que se obtém a partir da centralidade do trabalho socialmente útil no complexo). Ele não é um método de ensino, em si, embora demande, em associação a ele, o ensino a partir do trabalho: o método geral do ensino pelo trabalho.

Para entender os complexos, é necessário compreender a concretude dos fenômenos tomados da realidade e unificados ao redor de um determinado tema ou ideia central. Dessa compreensão, decorre a inclusão do trabalho como princípio educativo e articulador da vida. “[...] O trabalho é a base da vida para as pessoas. Disso segue-se que a atividade de trabalho das pessoas está no centro do estudo” (NARKOMPROS, 1992, p. 6 apud FREITAS, 2009, p. 36).

O eixo transversal que perpassará o complexo é o trabalho, portanto é objeto de estudo. Por ele, o educando poderá compreender e praticar a autogestão, bem como o trabalho como um “elemento socialmente útil”. Por essa razão, não pode ser eliminado do interior da escola. Pelo trabalho, a escola se torna uma continuidade da vida, um lugar no qual se organiza a “tarefa de conhecer este meio”, suas tramas, relações, contradições, lutas e seus desafios. Dessa compreensão, entendemos que os complexos implicam na elaboração das categorias: atualidade, auto-organização e autogestão.

Freitas destaca que a ideia central de um complexo apresenta ao menos três dimensões nas quais está presente a ideia da totalidade da realidade vivida:

natureza, trabalho e sociedade. O estudo da natureza e sua conexão com o trabalho e a sociedade implicam em analisar a complexidade da realidade. “[...] a essência dos complexos, enquanto unidade curricular, está na sua capacidade de articular as bases da ciência, vale dizer, os conceitos das disciplinas, de forma dialética, através do trabalho, promovendo o seu diálogo com a prática social mais ampla [...]” (FREITAS, 2009, p. 72).

Em relação a essa compreensão dentro da LEdoC, Rosa destaca que existe esse entendimento, porém ele é um processo complexo. “[...] essa relação nós procuramos fazê-la tanto no planejamento das etapas, quanto no seu encerramento. Ao fazer o planejamento de cada etapa, de cada turma, nós vamos no PPP,35 vemos as disciplinas, fazemos as reuniões, então ocorre muitas reuniões [...]” (ROSA, 2012).