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2 A CENTRALIDADE DO TERRITÓRIO NA POLÍTICA NACIONAL DE

2.1 O novo modelo de gestão da PNAS

2.1.4 Controle social: o desafio da inclusão dos usuários

A concepção de controle social expressa na PNAS encontra-se referenciada na Constituição Federal de 1988, sendo compreendido como instrumento privilegiado, porém não único, de participação popular no processo de elaboração, implementação e fiscalização da política pública, com vistas ao exercício ativo no processo de garantia dos direitos fundamentais. Por certo, a criação dos conselhos de políticas públicas e de direitos representa importante inovação na gestão pública direcionada à democratização das relações entre Estado e sociedade. Vale registrar que a referência à política pública remete à noção de “res publica, isto é coisa de todos”, pressupondo a simultaneidade do envolvimento do Estado e da sociedade. Nas palavras de Pereira (2007, p. 222), importa considerar que política pública significa

[...] ação pública, na qual, além do Estado, a sociedade se faz presente, ganhando representatividade, poder de decisão e condições de exercer o controle sobre a própria reprodução e sobre os atos e decisões do governo e do mercado. É o que preferimos chamar de controle democrático exercido pelo cidadão comum, porque é um controle coletivo, que emana da base da sociedade, em prol da ampliação da democracia e da cidadania.

Nesse enfoque, expõe-se que a política pública se constitui em ação coletiva voltada para a efetivação de direitos sociais requeridos pela sociedade, estando devidamente prevista e normatizada em legislação específica, contando com a participação e o controle social por parte da sociedade. A partir dessa abordagem decorre a importância de a Assistência Social ser reconhecida como política pública, sendo o Estado o responsável pela garantia desse direito social, a ser ofertado à sociedade com o correspondente controle social. Nessa direção, importa registrar a importância do fortalecimento, da ampliação e da diversificação dos instrumentos de participação e controle social na Política de Assistência Social, concebendo-a enquanto estratégia de ampliação de espaços públicos democráticos, devendo voltar-se prioritariamente à participação da população usuária dessa política. Desse modo, comungando com a avaliação de que

O grande desafio consiste, assim, em consolidar os conselhos não só como espaço político aberto, de comunicação mais direta com os grupos e entidades que já se encontram representados, mas como canais de ativação da presença daqueles em nome dos quais o discurso da assistência social busca seu reconhecimento (RAICHELIS, 2000, p. 285).

Observa-se, portanto, a necessidade urgente do adensamento da representação política popular dos principais sujeitos dessa política ― os usuários ―, de forma que se consiga transformar os espaços públicos dos conselhos em efetivos “espaço de resgate do protagonismo dos subalternizados” (YAZBEK, 1996, p. 54). Nessa mesma perspectiva de análise, incorpora-se a afirmativa de que “[...] os usuários só poderão ter participação efetivamente qualificada, interferindo nas políticas e transitando para o status de sujeitos de direitos, se tiverem os instrumentos de análise da realidade” (GOMES, 2000, p. 170). Em outros termos, significa que a participação ativa, crítica e propositiva dos usuários na totalidade do processo de elaboração, implementação e fiscalização da política pressupõe a agregação de outros componentes imprescindíveis, a começar pela efetivação da gestão pública democrática. Nesse sentido, estudo sobre a cultura política de gestores estaduais desenvolvido no Estado de Santa Catarina conclui que

As orientações dos gestores diante dessa política, cabe reiterar, revelam uma dicotomia entre a noção de Assistência Social como política pública e o caráter privado do atendimento às demandas sociais, o que confirma a presença de uma herança histórica favorecedora de práticas autoritárias, sejam elas tecnocráticas ou clientelistas (Oliveira, 2003, p. 205).

A rigor, a cultura pública democrática que se deseja imprimir na gestão da Política de Assistência Social será uma construção longa, coletiva e resultado da convergência de múltiplas dimensões de uma totalidade social a ser transformada. Assim, a mesma não pode “[...] ser explicada ou compreendida sob uma perspectiva exclusiva ou deslocada desse contexto no qual se insere e enraíza” (Oliveira, 2003, p. 203). Assim, num país com forte tradição escravocrata, patrimonialista e antidemocrática, a cultura política de participação popular ativa e crítica encontra-se “engatinhando”. Portanto, em concordância com Alves (2007), acredita-se que o adensamento da participação popular no processo de gestão e controle social das políticas públicas e em especial da Política de Assistência Social se encontra condicionado, em grande parte, ao compromisso ético-político por parte dos trabalhadores sociais, em estabelecer aliança estratégica com a população usuária, a fim de “[...] expandir nos espaços públicos o verdadeiro sentido político da participação popular” (ALVES, 2007, p. 226).

Equivale dizer que a ação afirmativa do fortalecimento do controle social, com o necessário alargamento do protagonismo popular dos usuários, caminha na contracorrente do autoritarismo social entranhado na cultura política da sociedade brasileira (RAICHELIS, 2000). Cumpre, ainda, registrar que, relativamente à efetivação do controle social, se encontra

prevista na PNAS a viabilização de um conjunto de ações, a exemplo da “[...] formação, capacitação, investimentos físicos, financeiros, operacionais e políticos, que envolva esses atores da política de assistência social” (BRASIL, 2005b, p. 52). O desafio que se coloca para o conjunto dos agentes públicos da Política de Assistência Social aponta a construção de novas estratégias capazes de contribuírem na ampliação e no fortalecimento dos espaços públicos de controle social, tendo na organização coletiva dos usuários dessa política seu principal referencial. Ademais, a participação da sociedade no controle social da política pública, especialmente da população usuária, deve superar a condição formal e protocolar ainda majoritária, passando a afirmar-se enquanto condição estratégica e qualificada do alargamento dos direitos sociais.

Diante dos aspectos destacados até aqui, observa-se como fundamental na análise sobre a implementação do novo conteúdo da PNAS, na perspectiva do SUAS, o conjunto de determinantes que atuam, diretamente ou indiretamente, sobre ele, tornando-se mais compreensível a identificação dos distintos “SUAS” que vem-se materializando a partir de diferentes direções políticas, ritmos, configurações e realidades socioterritoriais.