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4. A Distribuição Social do Produto dos Dízimos

4.2. Clero e instituições religiosas

4.2.3. Conventos e Mosteiros

O estudo da importância dos dízimos no cômputo geral dos rendimentos do clero regular em Portugal não tem muitos anos, nem tem tido muitos adeptos. Iniciado nos anos 70 por Aurélio de Oliveira, com o seu trabalho sobre o mosteiro de Tibães, pontualmente o mesmo autor tem apresentando ou orientado outros, de diverso fôlego, mas todos úteis para o conhecimento da presença e influência da ordem de S. Bento no

189 Veja-se, a título de exemplo, alguns contratos de subarrendamento das rendas da Mitra em diversas

igrejas, realizados em 1826 e com duração de dois anos. Cf. Arquivo Distrital de Braga, Notários-Braga, José Bento Ferreira Couto, Lv 177, fl 37-38, 39v-40, 52v-54, 61-62 e 67-68.

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noroeste português190. Apesar disso, todos eles terminam, invariavelmente, no triénio liberal ou mesmo antes. Para o lapso temporal posterior e até à extinção dos dízimos, em 1832, apenas temos conhecimento de um estudo sobre o clero regular, na perspectiva que enunciámos. O autor apresenta uma visão geral das congregações, a nível nacional, apresentando comparações entre as mesmas que também nos podem ser úteis191.

Nas comarcas eclesiásticas de Braga e Valença encontrámos a receber dízimos 30 casas regulares, 21 masculinas e apenas 9 femininas.

49 - Conventos e mosteiros – rendimentos (mil réis) e n.º de casas por Ordem Ordem Nº %Nº Rendimentos Encargos Rend líquido %RL Beneditinos 12 40,00 11660,615 1506,197 10154,418 34,89 Cónegos Regrantes de S Agostinho 2 6,67 9025,978 687,306 8338,672 28,65 Congregação de S Jerónimo 1 3,33 3091,092 49,884 3041,208 10,45 Franciscanos 8 26,67 3214,310 557,911 2656,399 9,13

Bernardos 3 10,00 2519,254 20,000 2499,254 8,59

Eremitas de S Agostinho 1 3,33 1764,873 195,274 1569,599 5,39

Dominicanos 1 3,33 724,898 25,756 699,142 2,40

Cónegos Seculares de S João Evangelista 2 6,67 234,079 85,347 148,732 0,51

TOTAL 30 100,00 32235,099 3127,675 29107,424 100,00

Levando em linha de conta as congregações, vemos que, sem sombra de dúvida, a que ocupa uma posição de destaque é a Ordem de S. Bento, não só pelo número de casas, mas também por estas deterem mais de 1/3 do total de rendimento líquido do conjunto do clero regular (quadro 49). Tendo entrado no território português nos finais do século XI, rapidamente esta ordem desenvolveu a sua influência, fixando-se a maior parte das suas futuras casas no noroeste de Portugal192. Entre elas sabemos que eram muito importantes os mosteiros de Tibães (casa mãe da congregação em Portugal), de

190 Cf. Aurélio de Oliveira, A Abadia de Tibães.... Veja-se ainda o trabalho do mesmo autor

“Contabilidade Monástica...”, pp. 131 a 179. Como vimos, mais recentes são outros três trabalhos sobre mosteiros: Fernanda Paula Sousa Maia, O Mosteiro de Bustelo...; Maria Cecília Encabo y Valenciano, O Mosteiro de Rendufe...; Célia Maria Taborda da Silva, O Mosteiro de Ganfei.

191 Cf. Fernando de Sousa, “O rendimento das Ordens Religiosas nos finais do Antigo Regime”, in

Revista de História Económica e Social, Lisboa, Sá da Costa, n.º 7, 1981.

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Rendufe, de Ganfei e de S. Tirso de Riba de Ave, todos institutos muito ricos e com uma forte presença no Minho193.

Porém, as casas da ordem de São Bento em termos individuais não seriam das mais privilegiadas com esta prestação eclesiástica na região. Basta para tal recordarmos o quadro 35, dos maiores recebedores de dízimos, onde o mosteiro de S. Maria de Refóios do Lima e o de S. Vicente de Fora, pertencentes aos Cónegos Regrantes de S. Agostinho, e o mosteiro de S. Marinha da Costa, da Congregação de S. Jerónimo, ocupam respectivamente a 7ª, 9ª e 11ª posições. São institutos especialmente privilegiados, todos eles masculinos, que no fundo se apresentam num lugar diferente do ocupado, por exemplo, pelos franciscanos que se encontram numa posição modesta no seio dos restantes institutos masculinos (quadro 50).

50 - Casas masculinas – rendimentos (mil réis)

Denominação Rendimentos Encargos Rend líquido %RL Mosteiro de S Maria de Refóios de Limac 4574,617 0 4574,617 19,76 Mosteiro de S Vicente de Forac 4451,361 687,306 3764,055 16,26 Mosteiro de Santa Marinha da Costae 3091,092 49,884 3041,208 13,14 Mosteiro de S Martinho de Tibãesa 3284,506 587,863 2696,643 11,65 Mosteiro de S Maria de Bourob 2055,084 0 2055,084 8,88 Convento de Nossa Senhora do Pópulog 1764,873 195,274 1569,599 6,78 Mosteiro de S André de Rendufea 1226,393 55,712 1170,681 5,06 Mosteiro de S Maria de Mirandaa 742,802 0 742,802 3,21 Convento de S Domingos de Vianaf 724,898 25,756 699,142 3,02 Mosteiro de S Maria de Carvoeiroa 715,206 33,250 681,956 2,95 Mosteiro de S Romão de Neivaa 680,780 43,749 637,031 2,75 Mosteiro de S Tirso de Riba de Avea 597,028 39,388 557,640 2,41 Mosteiro de S Salvador de Ganfeia 335,428 0,370 335,058 1,45 Mosteiro de S Maria de Pombeiroa 226,919 13,551 213,368 0,92 Mosteiro de S Salvador de Palmea 229,180 23,000 206,180 0,89 Mosteiro de S Maria de Fiãesb 155,300 0 155,300 0,67 Convento de S Elói do Portod 154,987 40,347 114,640 0,50 Casa de Salvador de Vilar de Fradesd 79,092 45,000 34,092 0,15 Convento de S António de Caminhah 12,000 0 12,000 0,05

Convento de Mosteiróh 1,200 0 1,200 0,01

Colégio de S Bento de Coimbraa 231,891 341,347 -109,456 -0,47

TOTAL 25334,637 2181,797 23152,840 100,00

MÉDIA POR CASA 1206,411 103,895 1102,516

Notas: a – Beneditinos; b – Bernardos; c – Cónegos de S. Agostinho; d – Cónegos de S. João Evangelista; e – Congregação de S. Jerónimo; f – Dominicanos; g – Eremitas de S. Agostinho; h – Franciscanos

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Das casas masculinas, a maioria é constituída por mosteiros de S. Bento, sendo todos eles proprietários de dizimarias. Os conventos de religiosos, em conjunto, absorviam cerca de 80% do total de dízimos do clero regular, representando o seu rendimento médio quase o dobro do que pode ser encontrado para os institutos femininos (quadro 51).

51 - Casas femininas – rendimentos (mil réis)

Denominação Rendimentos Encargos Rend líquido %RL Convento de S Ana de Vianaa 3084,842 331,967 2752,875 46,23 Convento da Senhora dos Remédiosh 1707,111 256,578 1450,533 24,36 Convento de S Francisco de Vale de Pereirash 640,706 239,039 401,667 6,75 Convento da Senhora da Conceição de Bragah 327,588 0 327,588 5,50 Convento de S Maria de Aroucab 308,870 20,000 288,870 4,85 Convento de S Clara de Guimarãesh 297,355 21,927 275,428 4,63 Convento do Salvador de Bragaa 305,640 36,000 269,640 4,53 Convento de Chagas de Vila Viçosah 150,000 0 150,000 2,52 Convento de S Clara de Vila do Condeh 78,350 40,367 37,983 0,64

TOTAL 6900,462 945,878 5954,584 100,00

MÉDIA POR CASA 766,718 105,098 661,620

Notas: a – Beneditinos; b – Bernardos; c – Cónegos de S. Agostinho; d – Cónegos de S. João Evangelista; e – Congregação de S. Jerónimo; f – Dominicanos; g – Eremitas de S. Agostinho; h – Franciscanos

No conjunto das casas femininas, mais uma vez se destaca um convento beneditino, o das religiosas de S. Ana de Viana. Porém, na região, a principal presença é das franciscanas com 6 casas em 9 (quadro 51). Todos estes conventos eram proprietários de dízimos, com a excepção do das Chagas de Vila Viçosa que recebia uma pensão anual de 50$000 réis em dinheiro, nas dizimarias de Tabaçô, concelho de Arcos de Valdevez, Vilela, em Póvoa de Lanhoso, e Soajo.

Esta é uma verdadeira excepção, em conjunto com os dois conventos de franciscanos de S. António de Caminha e de Mosteiró, pois, na esmagadora maioria dos casos, as casas regulares tinham dizimarias anexas, o que lhes proporcionava rendimentos relativamente elevados.

Podemos verificar que, no conjunto dos interessados, o clero regular ocupava a terceira posição, pelo que é muito natural que os dízimos representassem uma parcela significativa dos seus rendimentos chegando por vezes a valores que rondavam a casa

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dos 40%194. Assim, não podemos deixar de reparar no cuidado posto, por exemplo, pelos religiosos de Tibães em tudo o que dizia respeito a esta prestação, em especial no que tocava aos arrendamentos, forma mais usual de recolher os dízimos a que tinham direito e que na região estudada, entre 1827 e 1831, era a única a que recorriam195. Na maior parte dos casos, com contratos trienais, este mosteiro – no que era seguido por outros da Ordem de S. Bento, como o mosteiro de Ganfei, localizado em Valença ou o de Bustelo – deixava o encargo da recolha dos dízimos nas freguesias que tinha anexas a rendeiros196. Estes, suportando um clausulado por vezes excessivo, tinham de cumprir os contratos, pagando as quantias estipuladas ao mosteiro sendo, por vezes, obrigados a garantir alguns dos encargos que eram impostos às dizimarias197.

Estes últimos prendiam-se, essencialmente, como não podia deixar de ser, com as côngruas do clero paroquial, mas também com as fábricas das respectivas igrejas e com pequenas pensões ao seminário diocesano, no caso das casas beneditinas, e aos cabidos. Pontualmente, viam os seus rendimentos serem transferidos para outras entidades, como o celeiro do Micho198, os membros dos cabidos e a Mitra Primaz.

Verificámos que a presença da ordem de S. Bento é verdadeiramente significativa, sendo de destacar a posição do mosteiro de Tibães fruto da sua categoria privilegiada dentro da ordem.

Não podemos deixar de referir também a presença dominante de casas masculinas em detrimento das femininas, bem como das casas sediadas na região do arcebispado,

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Cf. Fernando de Sousa, “O rendimento das Ordens Religiosas...”, pág. 14.

195 Cf. Aurélio de Oliveira, A Abadia de Tibães..., pp. 430 a 448 e ANTT, AHMF, Tesouro Público, caixa

4308.

196 Cf. Fernanda Paula de Sousa Maia, O Mosteiro de Bustelo..., pp. 187 e 188 e Célia Maria Taborda da

Silva, O Mosteiro de Ganfei, pág. 152.

197 Cf. Aurélio de Oliveira, A Abadia de Tibães..., pp. 439 a 441.

198 Este encargo com o “selleiro do Mycho do paço de Braga”, em alguns contratos, era imposto aos

rendeiros, tendo estes de aí depositar certas quantidades de géneros, vulgarmente cereais. Cf. Aurélio de Oliveira, A Abadia de Tibães..., pág. 448.

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em relação às que lhe são estranhas. Neste caso eram apenas quatro: o convento de S. Elói do Porto, o colégio de S. Bento de Coimbra (curiosamente com um saldo negativo), o convento das Chagas de Vila Viçosa e o mosteiro de S. Vicente de Fora de Lisboa.

Em termos individuais pensamos que esta última, porém, era a casa mais beneficiada do conjunto se atendermos ao facto de ser um interessado ausente e distante em relação às suas dizimarias. Efectivamente, para esse facto aponta também o trabalho de Fernando de Sousa sobre os rendimentos das ordens religiosas, onde é referido que esse instituto recolhia, só em dízimos, por ano, a nível nacional, mais de 20 contos de réis!199