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Capítulo 2 – Convergência do referencial teórico-conceitual rumo à construção de um

2.1. Convergência do Referencial

A análise global realizada no Capítulo 1 permite elencar elementos convergentes entre os enfoques abordados ao longo desta exposição, ao mesmo tempo justificando a utilização dos mesmos para a construção do modelo de análise que se propõe com a dissertação. O Quadro 12 ilustra o esforço de frisar os elementos convergentes entre o Enfoque Territorial, o Paradigma Centrado na Sustentabilidade, a Ecologia Industrial e o Ecossistema Industrial.

Quadro 12 - Enfoque Territorial, Paradigma Centrado na Sustentabilidade, Ecologia Industrial e Ecossistemas Industriais: elementos convergentes.

Características Enfoque Territorial Paradigma Centrado Na Sustentabilidade Ecossistemas Industriais Ecologia Industrial/ Abordagem Geral Multidimensional/Sistêmica/Holística Multidimensional/Sistêmica Multidimensional/Sistêmica

Objetivo Geral Desenvolvimento amplo

Crescimento Econômico, Equidade Social, Sustentabilidade Ambiental/ Integração Crescimento integrado/ redução de impactos ambientais

Visão dos problemas

e soluções Multidisciplinar Multidisciplinar Sistêmica/Multidisciplinar

Visão temporal Longo Prazo Longo Prazo/Gradualismo Longo Prazo/Gradualismo

Elemento de

coesão/identidade Território (construção natural, social e cultural)

Meio ambiente natural/ necessidade de redução de impactos ambientais Arranjo industrial/ necessidade de redução de impactos ambientais Escala de

Planejamento Local/Regional/Territorial Local/ Regional/ Global Local/Regional

Estratégia de Planejamento

Top-down e bottom-

up/descentralizada/concertad

a Top-down e bottom-up

Top Down e bottom-up/ Múltiplosatores Busca explorar Vantagens comparativas e competitivas/Sinergias/Com plementaridades/ especificidades territoriais Desenvolvimento sustentável Vantagens comparativas e competitivas/ Complementaridades inter e intra firmas (Continua...)

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(...continuação) Características Enfoque Territorial Paradigma Centrado Na Sustentabilidade Ecossistemas Industriais Ecologia Industrial/

Princípio econômico Progresso Economia Verde Economia Verde/Crescimento

Princípio de eficiência Competitividade/ Diversidade / Cooperação/ Participação/ Integração Cooperação/ Integração/ Redução de impactos ambientais Competitividade/ Diversidade/ Cooperação/ Integração / Redução de impactos ambientais Natureza de agentes

e processos Heterogênea Heterogênea Heterogênea

Papel de atores

locais Ativo / Catalisador de mudanças Ativo / Catalisador de Mudanças Ativo

Capital natural Intrínseco ao território/ conservar/ manter Conservar/ manter Conservar/ manter

Relação natureza- sociedade-economia Interdependência/Elemento norteador de estratégias/Exploração Sustentável Interdependência/Elemen to norteador de estratégias/Exploração Sustentável Interdependência/Elemento norteador de estratégias/Exploração Sustentável

Fonte: Elaboração própria.

O que o Quadro 12 busca salientar é que tais abordagens são complementares na medida em que aspectos chaves se assemelham. A abordagem geral, os princípios, os objetivos e estratégias, bem como a visão de mundo de cada um dos enfoques trabalhados convergem rumo a um paradigma holístico que busca explorar as sinergias, a cooperação e a integração entre agentes rumo a um padrão de desenvolvimento que gere impactos cada vez menores sobre o meio ambiente natural. Destaca-se que todas as abordagens inserem-se uma proposta de desenvolvimento que faz contraponto aos enfoques tradicionais.

Primeiramente, há de destacar as novas abordagens de desenvolvimento baseadas em conceitos como sustentabilidade, complexidade e transdisciplinaridade. Allenby (1992) destaca que o conceito de desenvolvimento sustentável conforme adotado no Relatório Brundtland é bastante impreciso27 e explicita a necessidade de se definir um “estado final”. Contudo, em sistemas complexos e dinâmicos – tal como a economia global – dificilmente se alcança um estado final equilibrado e estático. A partir dessa considerações, propõe que o desenvolvimento sustentável deva ser encarado como verbo e não como substantivo; é preciso encarar o desenvolvimento sustentável como processo dinâmico e contínuo.

Iyer-Raniga e Treloar (2000) destacam que as abordagens de desenvolvimento tradicionais se embasam a partir de interpretações mecanicistas da realidade – o que seria

27 Embora Sawyer (2011, p. 37) destaque que o conceito adotado no Relatório tenha tido algum sucesso ao ser

consagrado pelos representantes globais e que “qualquer linguagem diplomática consensual, ainda mais quando acordada globalmente, é necessariamente vaga”.

52 totalmente adequado para problemas simples e lineares, mas não para os complexos. As relações são, em sua maioria, não-lineares e o ambiente é dinâmico e variável. Por isso se fazem necessárias abordagens de desenvolvimento que considerem a evolução e a co- evolução dos componentes do sistema, uma vez que estes interagem entre si e com o sistema de maneira não-linear. O desenvolvimento deve, portanto, contemplar os aspectos evolutivos e a complexidade dos elementos sociais e ecológicos. O conflito e a incerteza se fazem presentes e, a partir disso, o processo de aprendizado ganha relevância, estando na base de qualquer processo evolutivo. Logo, indivíduos e sociedade devem se inserir em um contínuo processo de aprendizado para a atingir a evolução e, portanto, a sustentabilidade.

Em segundo lugar, há de levar em consideração o papel da localidade e da participação dentro das novas propostas de desenvolvimento. Andrews (1999) ajuda na aproximação conceitual entre as abordagens – ainda que não o faça objetivamente, nem trabalhe com o ET – ao afirmar que o fluxo de matéria e energia da comunidade industrial como um todo é algo que interessa aos tomadores de decisão locais uma vez que é localmente que são sentidos os efeitos em termos de saúde e segurança públicas, qualidade ambiental, utilização de recursos, tratamento de resíduos, etc. Se o processo de tomada de decisão é realizado localmente, um ESI colabora com o aspecto bottom-up, através de decisões descentralizadas e interdependentes, relacionando os variados atores locais.

Ainda sobre a importância do local, Leff (2004) destaca com precisão:

É em nível local que se definem as racionalidades ambientais de uma nova racionalidade produtiva que orienta a co-evolução ecológico-cultural através de estratégias de manejo sustentável dos recursos naturais. (...) Cada cultura deverá delimitar e dar sentido ao sistema de recursos naturais e tecnológicos que constituem suas formas de apropriação e transformação da natureza. A construção de uma racionalidade ambiental apresenta, assim, a articulação das economias regionais e locais à ordem global. (LEFF, 2004, p. 264).

O papel da participação e a importância de processos descentralizadores e promotores de empoderamento também são frisados em Iyer-Raniga e Treloar (2000) – o debate aberto e coordenado entre governos locais e população é fundamental uma vez que há troca de saberes e compartilhamento de responsabilidades. A co-evolução entre social e natural passa por processos de envolvimento da população local nos processos de tomada de decisão, segundo os autores – o que explicita a limitação das estratégias estritamente top-down.

Também sustentando que a EI pode ser encarada como um enfoque de desenvolvimento local, Côté e Cohen-Rosenthal (1998) discutem sobre o papel de um ESI em uma comunidade local. Segundo os autores, tais arranjos podem ser encarados como uma estratégia desejável

53 para restaurar as condições econômicas e sociais de determinada região bem como adicionar valor em termos de qualidade de vida, empregos de qualidade, incentivos à educação e ao engajamento comunitário. Visão que se aproxima com a de Saquet (2011, p.75) quando este afirma que “com suas redes, as empresas podem mudar um território, [e] provocar mudanças significativas no arranjo socioespacial”.

Leff (2004) salienta que as discussões propostas pela economia política deslocam-se para algo que chama de ecologia política, na qual “os antagonismos das lutas sociais se definem em termos de identidade, territorialidade e sustentabilidade” (LEFF, 2004, p. 149). Em outros termos, o autor afirma que aqueles elementos inseridos dentro do ET ganham importância na medida em que, a um só tempo, se convertem em conceitos políticos e questionam as formas de apropriação econômica da natureza. O território, segundo o autor é o locus da reconstrução e da valorização das identidades e dos recursos naturais, bem como das novas estratégias de reapropriação da natureza; os conceitos de “território-região funcionam como lugares-suporte para a reconstrução de identidades enraizadas em práticas culturais e racionalidades produtivas sustentáveis” (LEFF, 2004, p. 318). Mais ainda,

A sustentabilidade está enraizada em bases ecológicas, identidades culturais e em territórios de vida; desdobra-se no espaço social, onde os atores sociais exercem seu poder de controle da degradação ambiental e mobilizam potenciais ambientais em projetos auto-gerenciados para satisfazer as necessidades e aspirações que a globalização econômica não pode cumprir (LEFF, 2004, p. 157).

Contudo, ainda que haja uma série de elementos convergentes entre os enfoque, chama- se a atenção para a existência de outros que não necessariamente se assemelham. Exemplo disso é a escala de planejamento entre as abordagens. O Paradigma Centrado na Sustentabilidade busca modos de planejamento e ação em escalas múltiplas que variam do local ao global, dado que externalidades ambientais têm a capacidade de afetar comunidades em escalas variáveis. Por outro lado, o Enfoque Territorial e a Ecologia Industrial/Ecossistema Industrial, apesar de também serem multiescalares, têm o foco de ação voltado essencialmente ao local/regional. Ademais, se analisadas as estratégias de planejamento, percebe-se que a concertação, elemento central para o Enfoque Territorial, não necessariamente é utilizado nas outras abordagens.

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