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Capítulo 3 – O complexo sucroalcooleiro

4.3. O complexo sucroalcooleiro do Triângulo Mineiro à luz do modelo proposto

4.3.2. Meso-análise aspectos econômicos, ambientais e sociais em âmbito regional e

4.3.2.2. Ganhos ambientais

Qualquer atividade antrópica necessariamente gera impactos sobre a base de recursos naturais do espaço onde se realiza. O discurso da sustentabilidade deve balizar-se, contudo, pela busca do objetivo de mitigar os efeitos adversos sobre a capacidade de suporte do meio- ambiente natural. Dessa maneira, é imprescindível que o complexo sucroalcooleiro minimize os impactos de suas atividades sobre a base de recursos naturais do TM. Já foi observado que o complexo, no TM, vem ocupando áreas anteriormente ocupadas (e já degradadas66)pela pecuária e outras culturas agrícolas. Isso quer dizer que, no que tange à degradação ambiental do TM, o complexo ocupa áreas que já sofreram o impacto em outro período do tempo, não sendo, portanto, o causador primeiro de degradação. O que vem ocorrendo, por outro lado, conforme ressalta Michelotto (2008), é que o complexo vem recuperando áreas de preservação permanente em reposta à pressões legais.

Dizer isso, contudo, não é afirmar que as atividades do complexo estão livres de causarem impactos potenciais importantes. Com a ajuda de alguns autores, foi possível resumir alguns dos impactos causados pelo complexo, bem como algumas das formas com as quais o mesmo lida com as questões. O Quadro 19 abaixo contempla essa análise.

66 Michelotto (2008) e Teixeira; Nascimento (2012) também mostram que a expansão do cultivo da cana-de-

açúcar no Triângulo Mineiro se dá majoritariamente sobre áreas já degradadas pelas atividades previamente estabelecidas na região.

123 Quadro 19 - Impactos ambientais potenciais e ações do complexo sucroalcooleiro rumo à sua mitigação.

Impacto ambiental potencial Como o complexo lida com a questão

Perda de biodiversidade por desmatamento

Complexo utiliza áreas já degradadas pela pecuária, por exemplo, não ampliando o desmatamento. Ademais, em resposta à legislação, vem atuando para a recuperação de

áreas de preservação. Uso intensivo do solo e

consequentes processos erosivos e assoreamentos

Controle dos processos erosivos para viabilizar mecanização. Além disso, na entressafra o solo é coberto por outras culturas, o que garante o processo de nitrificação, ajuda a conter

a erosão e consequentemente reduzir os assoreamentos. Aumento de escoamento

superficial, infiltração e processos erosivos

O uso de cobertura do solo com outras culturas também colabora para diminuir o escoamento, transporte de materiais e infiltrações

Desequilíbrios no ciclo hidrológico em razão da utilização intensiva da

água

O complexo tem atuado rumo ao fechamento do ciclo na utilização de água, reutilizando grande parte da água que entra no sistema. ANA ET AL. (2009) aponta que o complexo

reutiliza, em média, 95% da água que entra no processo.

Alteração na regularidade dos canais fluviais

O uso intensivo de recursos hídricos pode afetar a vazão dos cursos fluviais, mas a progressiva redução no uso da água também pode reduzir a pressão do complexo sobre os

rios

Aumento do risco de baixa na geração de energia elétrica nas

épocas de seca

A cogeração ocorre com mais frequência nos meses de safra, que coincide, em parte com a época de seca, onde a capacidade de geração por parte das hidrelétricas no centro-sul é reduzida; logo, diante dos incentivos adequados, o complexo pode complementar a matriz

hidrelétrica com o excedente da cogeração

Aumento no consumo de água

As ações de fechamento de ciclo em termos de reutilização e reaproveitamento de água tem mudado esse quadro. Contudo, há de se avaliar o uso da água para irrigação, que, ao

contrário, pode tornar o complexo ainda mais intensivo no uso de água.

Risco de contaminações pelo uso indiscriminado de agrotóxicos

A cana-de-açúcar possui baixo grau de utilização de agrotóxicos (fertilizantes, pesticidas e herbicidas); o reuso de sub-produtos como a vinhaça tratada, e a utilização de controle

biológico de pragas reduzem ainda mais a necessidade de fertilizantes e agrotóxicos. Ademais, conforme demonstra BNDES E CGEE (2008) o recurso ao melhoramento genético

permite a seleção de variedades mais resistentes de cana-de-açúcar o que também contribui para a redução de uso destes insumos.

Repetição do uso do solo pode acarretar sua compactação e perda

de fertilidade

A cana-de-açúcar é uma cultura semi-perene e, segundo, Neves;Conejero (2010), é muito menos danosa aos solo que culturas como a da soja. Ademais, novas técnicas agronômicas como a rotação de culturas (com sorgo, por exemplo) vêm sendo aplicada em terras onde a

cana-de-açúcar é plantada, o que reduziria o impacto sobre a perda de fertilidade do solo.

Poluição atmosférica decorrente das queimadas

Em resposta à legislação ambiental, o recurso às queimadas tem sido reduzido em todo o país, dando lugar à colheita mecanizada. Em Minas Gerais, foi assinado entre o governo do Estado, associações de produtores e entidades da sociedade civil, um protocolo (Protocolo

de Intenções de Eliminação da Queima da Cana no Setor Sucroalcooleiro) que prevê a redução gradativa do uso da queimada até 2014.

Risco de contaminação pela vinhaça

A vinhaça é, atualmente, tratada e reutilizada dentro do complexo, voltando para as lavouras como fertilizante para o solo; se utilizada de forma adequada, os impactos sobre

os recursos hídricos superficiais é mínimo. Contudo, em razão de especificidades geomorfológicas da região (alta permeabilidade dos arenitos), os lençóis freáticos podem

ser contaminados, comprometendo a qualidade da água que volta à superfície e dos reservatórios do Aquífero Guarani. Neves;Conejero (2010) apontam que, se utilizada em uma proporção de até 300m³/ha, mesmo os danos aos reservatórios subterrâneos seriam

evitados.

124 (...continuação)

Impacto ambiental potencial Como o complexo lida com a questão

Uso intensivo de combustíveis fósseis na logística dos produtos finais; emissões de gases do efeito

estufa

Tomando como base uma unidade de energia fóssil, o complexo sucroalcooleiro produz, com o etanol, 8 unidades de energia renovável, conforme mostra Neves; Conejero (2010). Isso demonstra que o complexo mais que compensa a energia fóssil utilizada no processo produtivo como um todo. Contudo, fica o desafio para que essa proporção aumente, como

por exemplo, a adoção de frotas movidas a etanol/ biodiesel nas fases de distribuição dos produtos finais e transporte de insumos.

Fonte: Elaboração própria a partir de Michelotto (2008), Neves; Conejero (2010), ANA et al. (2009), Sawyer (2008) e BNDES; CGEE (2008).

Os ganhos ambientais promovidos pelo complexo advêm de pressões distintas tanto em termos de adequação à legislação ambiental dos mais variados agentes (municipais, estaduais e federais), quanto de estímulos mercadológicos (pressão por parte da demanda ou competidores que passam a valorizar os atributos ambientalmente responsáveis)67.Vale ressaltar que o complexo recorre a inovações em termos de práticas agronômicas, reutilização de sub-produtos, racionalização no uso de perdas, adoção de melhoramento genético, controle biológico de pragas, modernização de máquinas e equipamentos, entre outras práticas correntes. Todo esse “pacote técnico-científico” colabora de maneira importante para a redução da pressão causada pelas atividades do complexo sobre o meio ambiente.

Em Mateus (2010) há uma avaliação qualitativa do desempenho ambiental das usinas do estado de Minas Gerais. Esse mesmo trabalho aponta que, de todas as unidades pesquisadas, 100% apresentam licença ambiental, 88% possuem outorga para uso de águas públicas e 95% fizeram o Estudo de Análise de Risco de suas atividades. Além disso, 91% contam com sistemas de controle de emissões de gases de efeito estufa. Com relação ao tratamento de resíduos sólidos, 70% apresentam Inventários de Resíduos Sólidos Industriais, enquanto 30% possuem projetos de disposição de resíduos sólidos em solo agrícola. Do ponto de vista dos efluentes líquidos, 44% das usinas possuem sistemas de impermeabilização de reservatórios de tais efluentes.

Suas conclusões, contudo,

67 Essa constatação é muito afeita às considerações advindas dos autores que estudam a Responsabilidade Social

Corporativa, que demonstram que a firma é uma unidade aberta aos estímulos externos e ao “mindset” do momento histórico em que se insere, assim como a sociedade é afetada pelas ações da organização, numa relação dialética. A respeito disso, vale recorrer a estudos como o de Elkington (1994), Hoff (2008), Hoffman (2001) e Steurer et al. (2005).

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(...) demonstram a conveniência dos empreendimentos atenderem inicialmente os parâmetros vinculados às exigências de mercado ou aqueles que, notadamente, a população do entorno percebe, tal como a obtenção da licença ambiental ou a adoção de sistemas de controle das emissões atmosféricas, parâmetros que atingiram os maiores percentuais, assim como o percentual de empreendimentos com outorga de uso de águas púbicas, principal insumo dessa atividade industrial. Em relação aos demais parâmetros, principalmente, aqueles que se referem ao efetivo controle e ao monitoramento dos impactos inerentes a suas atividades, constatou-se um baixo percentual de atendimento à sua realização, exigindo, portanto, maior controle do setor sucroalcooleiro pelo órgão ambiental (MATEUS, 2010, p.130).

Diante desse quadro, quando questionadas sobre o impacto que o complexo sucroalcooleiro causa sobre os biomas do TM, 50% das usinas afirmaram que o complexo causa pouco impacto, ao passo que 30% admitiram que as atividades sucroalcooleiras causam impactos relativamente altos (questão 5). Das respondentes, 80%, contudo, acreditam que as práticas de preservação e recuperação realizadas nos últimos 5 anos tem resultado em melhorias consideráveis e 22,2% não souberam opinar (questão 6).

Das práticas de redução de impactos ambientais listadas no questionário (manejo de resíduos, redução de queimadas, proteção e recuperação de matas nativas, proteção e recuperação de nascentes e rios, e busca de alternativas para sub-produtos indesejados), as usinas deram grande grau de importância a todas elas – destaca-se, contudo, os itens Manejo

de Resíduos, Redução de Queimadas (com 90% das usinas imputando nota máxima no grau

de importância a ambos os itens) e Proteção de nascentes e rios (100% das usinas deram importância máxima a este item) (cf. pergunta 7).

Em suma, ao que diz respeito aos ganhos ambientais promovidos pelo complexo, é possível afirmar que ocorre um duplo esforço: i) recuperar áreas previamente degradadas; e ii) ao mesmo tempo reduzir o impacto das atividades do complexo sobre o meio ambiente.