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Capítulo 1 – O referencial teórico: paradigma centrado na sustentabilidade, ecologia

1.2. Ecologia Industrial (EI) e Ecossistemas Industriais (ESI)

1.2.1. O Fechamento do ciclo de matéria e energia

É importante ter em perspectiva que a ecologia industrial busca o que se entende por

fechamento do ciclo. O ciclo de matéria e energia “pode ser visualizado em termos de um

sistema de compartimentos contendo estoques de um ou mais nutrientes, ligados por certos

fluxos” (AYRES, 1994, p. 25, traduzido, grifos presentes no original). Um sistema pode ser

considerado totalmente fechado se não há fontes externas de recursos ou resíduos, ou seja, se os estoques em cada compartimento são constantes. Tal característica implica que os inputs de cada compartimento devem ser balanceados pelos outputs. Se essa condição não for respeitada para dado compartimento, logo, o estoque de alguns compartimentos aumenta, enquanto o de outros diminui13.

13É importante inserir aqui algumas breves reflexões sobre a possibilidade física de um sistema fechado. Para

isso, é interessante conferir as obras Cechin e Veiga (2009) e Mueller (1999) para considerações das leis físicas da termodinâmica e suas relações com o processo econômico - tal discussão é inspirada, sobretudo, a partir da obra de Georgescu-Roegen (1971). A partir disso, considerar um sistema perfeitamente fechado é uma impossibilidade física em razão das Leis da Termodinâmica. Em qualquer processo de transformação físico- energético, a energia de baixa entropia que entra no sistema é transformada e, em parte, dissipada, fazendo com que aumente a entropia – e, portanto, diminuindo a disponibilidade de energia potencial. Dizer isso é afirmar que um sistema que aproveite a totalidade da energia que entra no sistema é fisicamente impossível em razão de um processo entrópico – de depreciação energética do sistema. Para que o sistema continue a funcionar, faz-se necessário, portanto, sempre uma fonte de energia primária que, ao ser processada dentro do mesmo, necessariamente dissipará alguma energia. Agradecimentos ao Prof. Dr. Daniel Andrade Caixeta (IE-UFU), por essas observações. Paradigma Centrado na Sustentabilidade Ecologia Industrial Nível da Firma • Design "verde" • Prevenção • Eco-eficiência • Contabilidade "Verde" Nível Interfirma • Simbiose Industrial - ecossistemas industriais • Ciclos de vida do Produto • Iniciativas do setor industrial

Nível Regional/Global • Ciclos e Orçamentos • Estudos dos fluxos de

materiais e energia • Desmaterialização e

17 Lançando mão das análises apresentadas em Allenby (1992) e Jelinskiet al. (1992), a Figura 2 demonstra esquematicamente, a partir de uma analogia com um sistema biológico, como se comportaria um modelo industrial tradicional vigente desde a Revolução Industrial e que se estabeleceu mundialmente, especialmente ao longo do século XX, como panaceia ao desenvolvimento – o modelo linear de utilização de energia e recursos ou a ecologia tipo I. O modelo linear é utilizado como ilustração de formas ineficientes de metabolismo, a exemplo das formas mais primitivas de vida e demonstra que não há ligação entre os fluxos de matéria e energia entre uma fase e outra do processo. Krones (2007) sublinha que não há preocupação quanto à escassez de recursos ou destino final dos sub-produtos do processo; os recursos são considerado ilimitados e as consequências do despejo de resíduos são desconsideradas.

Figura 2 - O fluxo linear de matéria e energia (ecologia tipo I).

Fonte: Elaboração própria a partir de Allenby (1992) e Jelinski et al. (1992).

Alternativamente, há o que propõe a ecologia tipo II com o modelo quasi-cíclico do fluxo de energia e matéria. Conforme se vê na Figura 3, os recursos são considerados limitados e há alguma preocupação com a disposição dos resíduos. Graedel (1994) afirma que, em um ambiente de restrições – com base de recursos limitada -, o sistema evolui para um modelo mais complexo e menos dissipativo. Percebe-se maior interação entre os entes do sistema, uma vez que recursos são limitados e os agentes se veem na necessidade de realizarem trocas. Conforme ressaltam Jelinski et al. (1992), tal sistema é muito mais eficiente que o do tipo I e o esquema pode ser observado, pelo menos em parte, em alguns setores industriais. Os autores sublinham, ainda, que há um movimento visível de convergência rumo a um padrão industrial mais semelhante ao tipo II, fugindo dos modos de operação lineares. Contudo, assim como em Graedel (1994), em Jelinski et al.(1992) há o sentimento de que o esquema tipo II não é totalmente sustentável.

Recursos

Ilimitados

Ecossistema

Resíduos

Ilimitados

18

O sistema tipo II é muito mais eficiente que o anterior, mas fica claro que não é muito sustentável no longo prazo em razão de os fluxos estarem sendo todos em uma única direção, ou seja, o sistema está “decaindo” [running down, no original]. Para serem realmente sustentáveis, ecossistemas biológicos evoluíram para algo completamente cíclico na natureza, com “recursos” e “resíduos” sendo indefinidos, uma vez que os resíduos de um componente do sistema representa os recursos de outro (JELINSKI et al., 1992, p. 793, traduzido).

Figura 3 - O fluxo quasi-cíclico de matéria e energia (ecologia tipo II).

Fonte: Elaboração própria a partir de Allenby (1992) e Jelinskietal. (1992).

O que Jelinski et al. (1992) discutem nas últimas linhas do parágrafo acima é o fluxo

cíclico de matéria e energia – conforme sistematizado na Figura 4. Ali, o caráter cíclico foi

atingido através de uma complexa teia de interações entre agentes e ecossistemas distintos, que por sua vez, aproveitam apenas um input de energia – radiação solar. Krones (2007) relaciona tal modelo a um complexo esforço de reciclagem que estaria em consonância com as máximas da termodinâmica14, sendo necessários poucos recursos e energia solar elementos exógenos - para manter o sistema em funcionamento.15 Complementa com pertinência ao afirmar que “a transição rumo a uma estrutura industrial [relativamente mais fechada] é um problema tanto socioeconômico quanto tecnológico” (KRONES, 2007, p. 20, traduzido).

14 Se considerados os aspectos relacionados às Leis da Termodinâmica, o único sistema possível de ser

alcançado é o quasi-cíclico. Autores que estudam concordam que tal como todos os outros sistemas inseridos no universo onde se aplicam as leis da termodinâmica, o sistema econômico é entrópico. Mais que isso, o padrão de crescimento e desenvolvimento econômico mais afeito ao modelo linear de exploração dos recursos (tipo I) aumenta e acelera a entropia do sistema. O que importa, de qualquer maneira, é a proposta da ecologia industrial em aproveitar com maior eficiência a disposição de recursos, reduzindo a depleção e permitindo com que o sistema se torne mais fechado e menos entrópico em termos relativos.

15 É importante ter em perspectiva a complexidade da análise em um sistema como os do tipo II e III. Graedel (1994) atenta para o fato de que, os ciclos menores e as interações que ocorrem entre os distintos ecossistemas dentro do macro-sistema (visualizado como o círculo pontilhado na Figura 4) funcionam em escalas espaciais e temporais diferentes, o que torna a análise e o entendimento dos fenômenos ainda mais complexos. Igualmente, análises envolvendo complexas redes industriais devem levar em conta tais aspectos.

Energia e

Recursos

Limitados

Ecossistema

Ecossistema

Resíduos

Limitados

19 Figura 4 - O fluxo cíclico de matéria e energia (ecologia tipo III).

Fonte: Elaboração própria a partir de Allenby (1992) e Jelinskietal. (1992).

Cabe aqui outra observação pertinente:

(...) sistemas industriais (e outros sistemas antropogênicos) estão evoluindo sob uma crescente pressão seletiva de forma que se movem do modelo de operação linear (tipo I) ao semicíclico (tipo II) ou cíclico (tipo III). (...) A ecologia industrial busca facilitar a evolução da indústria do tipo I rumo ao tipo II ou tipo III através da explicação da interação de fluxos e processos e da otimização de aspectos envolvidos. Um objetivo central da ecologia industrial, combinada a atividades apropriadas em outros setores, é alcançar o desenvolvimento sustentável(GRAEDEL, 1994, p. 26, traduzido).

O Quadro 2 abaixo resume as características dos tipos de fluxos de matéria e energia abordados previamente.

Ecossistema

Ecossistema

Ecossistema

ENERGIA

20 Quadro 2 - Modelos de Fluxo de Matéria e Energia: principais características.

Fonte: Elaboração própria a partir de Allenby (1992), Jelinski et al. (1992), Krones (2007).

Ainda com o suporte de Jelinski et al. (1992), é possível ilustrar um esquema inspirado pela ecologia industrial conforme o que se vê na Figura 5: trata-se de um ecossistema

industrial. Verificam-se quatro elementos fundamentais – ou nós – que permitem ao sistema características de um padrão cíclico, quais sejam, i) o extrator ou produtor primário; ii) o manufaturador ou processador de materiais; iii) o consumidor; e iv) o processador de resíduos. Tal como num ecossistema natural, no ecossistema industrial (o círculo pontilhado na Figura 5) cada um desses nós possui papel complementar aos dos outros, permitindo a sustentabilidade do sistema. Observa-se que cada um dos nós, além de trocar fluxos de matéria entre si, metabolizam tais fluxos dentro de suas bordas, tornando o sistema mais racional quanto à utilização do recurso limitado que dá origem ao fluxo primário de matéria ou energia.

Na medida em que [tais nós] realizam operações dentro de suas bordas de maneira cíclica ou se organizam para encorajar fluxos cíclicos de materiais dentro do ecossistema industrial, eles evoluem para modos de operação que são mais eficientes, com menores impactos negativos nos sistemas de suporte externos e são mais semelhantes ao comportamento ecológico do tipo III (JELINSKI et al., 1992, p. 794, traduzido).

Tipo I - Linear

• Proto-sistema quase linear;

• Fluxos de matéria e energia advindos da fonte primária até a formação de resíduos são independentes;

• Recursos são ilimitados; por essa razão, não há necessidade de se criarem mecanismos de reciclagem/reuso de inputs/outputs;

• Resíduos são ilimitados. Tipo II - Quasi-cíclico

• Surge a partir de restrições na base de recursos - aumento da escala de biomassa ao ponto de afetar a capacidade de suporte do sistema;

• Os fluxos podem ser grandes dentro do sistema, mas fora (entrada e saída) são limitados;

• Os organismos passam a se relacionar com mais intensidade; não é apenas um grupo de sistemas lineares desconexos;

• Não é sustentável em termos absolutos por ainda despejar resíduos de volta ao sistema. Tipo III - Cíclico

• Com o crescimento da diversidade de biomassa e a restrição na base de recursos, desenvolve-se um fluxo cíclico de matéria e energia;

• É caracterizado pela reciclagem/reuso de toda a matéria e energia pelos entes que compõem o sistema, necessitando apenas de um fluxo de entrada (radiação solar).

21 Figura 5 - Esquema idealizado de um Ecossistema Industrial.

Fonte: Elaboração própria a partir de Jelinski et al. (1992, p. 794).