• Nenhum resultado encontrado

D (Coordenadora Pedagógica) Basicamente todos os dias a minha rotina de trabalho é de observação e

acompanhamento das atividades dos professores e orientação pedagógica.

O que é ser gerente de orientação escolar? Quais orientações revestem essa nomenclatura?

Percebemos no relato 17 C o olhar para a rede de escolas e a angustia de se perceber como um profissional sem experiência local. A afirmação quanto a experiência global para gerenciar o coletivo macro revela um sentimento de totalidade no fazer pedagógico que na realidade camufla uma necessidade de autoconfiança para manutenção do cargo, cujo acesso nem sempre se dá por concurso público, mas por seleção interna, substituição e indicação.

A forma de acesso a determinado cargo influencia diretamente na forma de conceber esse local gestor e as ações realizadas deste lugar, o que por sua vez influencia diretamente na manutenção ou não dessa posição profissional.

Vale resgatar que quanto às formas de acesso ao cargo o artigo n° 67 da Lei de Diretrizes e Bases da Educação (n° 9394/1996) expõe que:

Os sistemas de ensino promoverão a valorização dos profissionais da educação, assegurando-lhes, inclusive nos termos dos estatutos e dos planos de carreira do magistério público:

I- ingresso exclusivamente (grifo nosso) por concurso público de provas e títulos.

160

O ingresso no cargo é previsto via concurso público, entretanto dentro da carreira pública existe a possibilidade de trânsito de um cargo para outro dentro de uma área via designação de um superior através de função gratificada.

A gestora do relato 17 C é uma servidora pública municipal concursada que foi designada à função gratificada dentro do Departamento de Educação Básica, assumindo um cargo denominado de Gerente, no caso, gerente de orientação escolar.

Além dos dilemas presentes quanto a forma de acesso ao cargo, convém ressaltar que ser gestor da educação infantil é conviver com a história dessa etapa educacional, ou seja, conviver e lutar pela quebra de estereótipos que demarcaram por muito tempo o público a quem se destinava a creche e a pré-escola, revelando as marcas sociais que as originaram como instituições distintas.

Conforme Kuhlmann Júnior (1991) os jardins de infância inspirados nos Kindergarten de origem alemã voltavam-se à atender os filhos da burguesia, ou seja, da elite brasileira, enquanto as salas de asilo e as creches destinavam-se as crianças das camadas populares, especificamente aquelas crianças cujas mães estavam inseridas no mercado de trabalho extradomiciliar.

Tal passado ainda hoje se faz presente através de indícios impregnados de preconceitos que procuram demarcar o caráter dessas instituições. Pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional vigente (LDB n° 9394/1996) o que distingue as instituições de Educação Infantil – creche e pré-escola é a faixa etária a que cada equipamento abrange.

Quando colocamos como ponto de discussão e de reflexão a gestão das creches e pré-escolas, não podemos desvincular dessa pauta a questão da formação de seus gestores. Pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional - LDB n° 9394/1996, Título VI – Dos profissionais da educação, a formação dos gestores é apresentada pelo artigo 64° da seguinte forma:

A formação de profissionais de educação para administração, planejamento, inspeção, supervisão e orientação educacional para a educação básica, será feita em cursos de graduação em pedagogia ou em nível de pós-graduação, a critério da instituição de ensino, garantida, nesta formação, a base comum nacional (BRASIL, 1996).

161

Através dessa orientação legal vemos uma mudança na forma de conceber a formação do gestor. Não se busca formar um especialista, mas um profissional que seja capaz de conceber, diagnosticar, acompanhar, orientar, indagar, rever e promover contextos educativos olhando para o processo educacional como um todo tendo a formação superior inicial como matriz formativa.

Nesse sentido, Ferreira (2009) problematiza a situação do gestor educacional na atualidade colocando que,

Formar gestores em educação hoje, no Brasil, significa lidar com carreiras que vêm se tornando social e economicamente pouco atrativas; significa formar profissionais que sabem, a priori, que irão se defrontar com condições de trabalho desfavoráveis; significa conviver com adversidades, com salários que não são suficientes para o suprimento das necessidades básicas, muito menos para proporcionar a atualização e o aperfeiçoamento necessários (p.87).

Pensamos na formação do profissional de educação, focamos nosso olhar para os gestores educacionais e miramos a organização do trabalho realizado, as formas de acesso nos cargos de gestão, as especificidades e desafios que circundam o seu trabalho. Quanto ao gestor ligado as unidades de Educação Infantil, este assim como a própria Educação Infantil se constitui com especificidades que correspondem aos desafios e nuances de seu cotidiano de trabalho.

4.1.1- Entre as demandas do cargo: o burocrático

“... ocupações que me engolem...” (Relato 05 A) “Sensação de impotência.” (Relato 08 A) O sentimento de trabalho contínuo e de não concretização dos planos de trabalho pode ser percebido durante a leitura dos relatos analisados a seguir. Neste momento, nosso eixo de análise volta-se para o trabalho realizado nas escolas de Educação Infantil entendidos como parte do trabalho burocrático.

O uso preciso da palavra Burocracia foi utilizado pela primeira vez no século XVIII (termo em francês bureaucratie) a partir do neologismo recuperando a partícula bureau (escritório) acrescentando a partícula grega krátos (poder ou regra) para formar o novo termo significando o exercício do poder por funcionários de escritórios. Desde então, o

162

termo Burocracia é muito utilizado na sociologia das organizações para abordar estruturas de organização compostas por regras, procedimentos, divisão de responsabilidades, especialização do trabalho, hierarquia e relações impessoais (MATOS, 2013).

Destacamos que o termo Burocracia47 aqui utilizado está sendo compreendido como:

Burocracia como organização, porque está baseada em uma racionalidade formalizadora de natureza instrumental, estruturada na forma como o trabalho se organiza. A divisão técnica e social do trabalho estabelece a forma como as outras dimensões da vida influenciam o cotidiano dos indivíduos. A burocracia é organização porque está baseada em uma ordem específica que precisa ser compartilhada e reproduzida para garantir a existência da própria civilização. Assim, desde a organização estabelecida na forma como se estrutura a divisão técnica do trabalho para a subordinação da existência dos homens até a burocracia no interior do Estado, enquanto grande organização que assegura a continuidade do processo civilizatório na modernidade, a burocracia é vista não como produto, mas como processo de racionalização (FARIA; MENEGHETTI, 2011, p. 437).

Voltando nosso olhar para os gestores aqui em questão e pensando nos conhecimentos inerentes a seu cargo vemos o quanto suas atribuições se ampliam para além das responsabilidades pedagógicas. Dentre suas responsabilidades inserem-se demandas de ordem organizacional que fazem parte do papel burocrático que exercem, sendo-lhes atribuída a função de zelar pelo pedagógico, mas também pelo cumprimento das demandas legais presentes no sistema educacional, pelas questões administrativas que vão além do domínio dos procedimentos organizacionais e cadastrais de pessoal e crianças (educandos dentro do sistema), englobando a gestão patrimonial e a manutenção das instalações escolares.

Todas essas atribuições conferidas ao gestor escolar têm por objetivo garantir condições para que o trabalho pedagógico aconteça com êxito no interior das escolas, neste caso, nas creches e pré-escolas por nos referirmos aos gestores da Educação Infantil.

47Por definição, uma organização que é burocrática é guiada por princípios que conduzem o negócio com base no conhecimento empírico, atentando para o dever. Entretanto cada funcionário está inserido em uma posição da escala hierárquica que deve ser respeitada. Cabe ao funcionário, após ser nomeado para o cargo, apenas exercer a função delegada de acordo com suas qualidades técnicas. O que é recompensado por um salário regular dotado de um plano de carreira para toda a vida. O funcionário deve abrir mão de seu julgamento quando estiver cumprindo com seus deveres oficiais e determinações de autoridades da escala hierárquica.

Fontes: WEBER, Max. O Que é a Burocracia. Site visitado: <http://www.cfa.org.br/servicos/publicacoes/o- que-e-burocracia/livro_burocracia_diagramacao_final.pdf> Acesso em maio de 2013.

163

A dimensão pedagógica que compõe o trabalho dos gestores não é aqui destacada, pois será analisada adiante. Ao olharmos para os trechos dos relatos destacados a seguir é possível perceber o destaque dado para a dimensão organizacional que compõe a burocracia escolar focando principalmente questões relacionadas à manutenção predial, ao acompanhamento cadastral e das matrículas, ao acompanhamento dos recursos financeiros e prestação de contas e a gestão de pessoal.

Os gestores elencam as ações realizadas ao longo de um dia de trabalho demarcando essas ações como corriqueiras, rotineiras e pouco significativas, atribuindo um tom pejorativo a dinâmica de trabalho a que estão imersos e que são fundamentais para a constituição organizacional da unidade escolar.

Relato 01 A (diretora) – [...] realizei algumas tarefas