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E (supervisora) Dirijo-me a sala da direção para tratarmos assuntos do meu trabalho: a supervisão da

escola. Pontuamos necessidades mais prementes quanto o andamento geral da escola. Vamos até a sala de artes localizada ao fundo da escola que necessita de reparos emergenciais e verifico ao passar pelo pátio que há uma

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classe realizando atividades na aula de educação física. Alguns alunos estão sentados apenas assistindo. Compartilho com a direção meu questionamento sobre o motivo de não participarem.

Leitura de diário oficial, acompanhamento dos e-mails, atualização de listagens e cadastros, elaboração de bilhetes/comunicados e prestação de contas de ordem financeira se complementam com ações de ordem estrutural, ligadas a manutenção predial e ao funcionamento da unidade escolar como: consertos diversificados (de ordem elétrica e hidráulica), limpeza da escola, supervisão do funcionamento escolar, controle de materiais recebidos como Kit de uniformes, controle de recebimento de hortifruti para a merenda escolar, entre imprevistos como falta de fraldas na mochila das crianças pequenininhas e crianças com alergias alimentares são contextos típicos que constroem o cenário de trabalho dentro das unidades escolares e configuram o trabalho em seu interior.

A forma como esses contextos são geridos varia de acordo com a história de constituição de cada escola, considerando como se constituí sua equipe de trabalho e a formação desses profissionais, além de como a comunidade se insere em seu interior, enfim como são os contextos de participação e a proposta de gestão formulada pela instituição (AGUILAR, 2005).

Os fragmentos aqui destacados evidenciam a burocratização presente no trabalho do gestor, desde a Educação Infantil, posicionando essa dimensão como sua principal atribuição, entendendo o gestor como responsável pelo controle administrativo através da operacionalização de tarefas que promovem as condições financeiras e materiais para o funcionamento da instituição.

Pelos relatos apresentados vemos uma concepção de gestão educacional pautada no cumprimento de tarefas, no cumprimento de prazos e na administração do cotidiano sem que haja uma reflexão sobre esse fazer, repercutindo numa prática alienada, sem envolvimento do coletivo, sem diálogo, sem possibilidade de participação da equipe escolar e da comunidade, como prevê a prática da gestão democrática.

Como estamos tratando de percepções/representações de gestores da Educação Infantil da região metropolitana de Campinas, resgatamos aqui uma pesquisa realizada numa escola do município de Campinas onde Ganzeli e Baldan (2010) puderam constatar que a organização do trabalho escolar é marcada pela separação entre as atividades burocráticas e

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as pedagógicas, sendo esta separação legitimada pela legislação que regula os cargos dos funcionários ligados à Educação, conferindo um estilo tradicional a organização do trabalho.

Um exemplo marcante desse modelo tradicional era a separação, prevista na legislação, entre o “administrativo” e o “pedagógico” relacionadas às atribuições dos especialistas. As atividades do Supervisor Educacional referiam-se predominantemente aos aspectos normativos, sendo responsável pelo assessoramento do Diretor Escolar e do Vice-Diretor, enquanto o Coordenador Pedagógico trabalhava com a dimensão pedagógica, responsabilizando-se pelo acompanhamento das atividades

realizadas pelo Orientador Pedagógico (Lei Municipal Nº 12.985/ 200749).

As reuniões entre esses dois grupos de funcionários eram realizadas separadamente, com práticas distintas e, não raramente, contraditórias (GANZELI; BALDAN, 2010, p. 09).

A separação entre o burocrático e o pedagógico como uma forma de organizar o trabalho escolar se legitima ancorada em legislações locais, dado que os municípios devem elaborar os Planos de Carreira, Cargo e Remuneração para os Profissionais do Magistério Municipal, conforme determina a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – Lei nº 9394/96 e possuindo autonomia nessa ação.

Contudo, a ênfase dada ora ao burocrático ora ao pedagógico, conforme a posição ocupada pelos gestores deve fazer parte de uma reflexão coletiva do grupo de trabalho que constitui as unidades de Educação Infantil, de forma a romper com as contradições presentes nessa forma de conceber e promover a organização da unidade escolar, entendendo o trabalho realizado em seu interior de forma integrada, como um processo indissociável assim como o educar e o cuidar são compreendidos na Educação Infantil (CERISARA, 1999; FARIA, 2000; OLIVEIRA, 2002).

Retomando Candido,

A estrutura organizacional da escola não está sustentada apenas por um plano racional determinado pela burocracia. A escola é uma totalidade mais ampla, compreendendo não apenas as relações ordenadas conscientemente, mas, ainda, todas as que derivam de sua existência enquanto grupo social (CANDIDO, 1971, p. 107).

Nos fragmentos aqui apresentados vemos o peso atribuído para as questões de ordem administrativa e financeira, compreendidas como de ordem burocrática, no entanto, o desafio está em tratarmos com o mesmo peso e de forma integrada as questões de ordem

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humana e pedagógica que permeiam todos os contextos educacionais como parte do processo educativo.

4.1.2- Olhando para o pedagógico

[...] a proposta pedagógica da escola não se separa do projeto político-pedagógico. Ela nasce no processo da construção daquele e nos ajuda a concretizar os objetivos gerais, específicos e as metas presentes no projeto.

Paulo Roberto Padilha

O trabalho do gestor é composto pela dimensão técnico-administrativa, a qual é encarada como a dimensão burocrática deste labor, mas é também composto pela dimensão pedagógica onde os processos educativos e a constituição dos sujeitos refletem a intencionalidade político-pedagógica que fundamenta as ações daqueles que participam da gestão escolar.

Segundo Oliveira (2010)

[...] a organização do trabalho escolar refere-se à forma como as atividades estão discriminadas, como os tempos estão divididos, os ritmos determinados, a distribuição das tarefas e competências, as relações de hierarquia que refletem relações de poder, entre outras características inerentes à forma como o trabalho é organizado.

Quando pensamos a organização do trabalho na escola em sua dimensão pedagógica logo vem em mente a relação direta estabelecida entre professores e alunos, no entanto essa dimensão é muito mais ampla e envolve a todos os atores que permeiam o cenário educacional, portanto, envolve também a ação de seus gestores e comunidade.

Neste sentido, quando pensamos as Instituições de Educação Infantil e falamos em pedagógico falamos nas intencionalidades que são também políticas e que envolvem concepções de Educação, de Sociedade e de Infância, nos remetendo a pensar no tipo de educação que temos ofertado visando a qual proposta de sociedade.

Refletir sobre a educação das crianças pequenas em contextos institucionais como os expressos pelas escolas de Educação Infantil envolve retomarmos a especificidade do trabalho desenvolvido nesses espaços.

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Dentro desta perspectiva, Rocha (2000) diferencia as escolas de Educação Infantil das escolas de Ensino Fundamental pontuando suas funções:

[...] enquanto a escola se coloca como o espaço privilegiado para o domínio dos conhecimentos básicos, as instituições de educação infantil se põem sobretudo com fins de complementaridade à educação da família. Portanto, enquanto a escola tem como sujeito o aluno, e como o objeto fundamental o ensino nas diferentes áreas, através da aula; a creche e a pré-escola têm como objeto as relações educativas travadas num espaço de convívio coletivo que tem como sujeito a criança [...]. A partir desta consideração, conseguimos criar um marco diferenciador destas instituições educativas: escola, creche e pré-escola, a partir da função social que lhes é atribuída no contexto social, sem estabelecer necessariamente com isto uma diferenciação hierárquica ou qualitativa (ROCHA, 2000, p.68-69).

Observando os relatos dos gestores da Educação Infantil, vemos diferentes contextos onde o pedagógico se revela, indicando suas percepções sobre essa dimensão do trabalho.

Ao focar o trabalho pedagógico que emerge nas instituições de Educação Infantil é possível perceber na fala desses gestores a relação direta entre professor-criança evidenciadas, apontando para um distanciamento do gestor, no sentido de não se reconhecer como sujeito direto dessa ação, remetendo-se ao trabalho “do outro”, quando o assunto é a dimensão pedagógica do fazer educacional.

Podemos observar nos fragmentos dos Relatos 01 A, 07 A e 11 A (a seguir) que o cerne da narrativa envolve o pedagógico, contudo, tratado na ação direta dos professores com as crianças e ou suas famílias.

Relato 01 A (diretora educacional) - Percebi um certo