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4   REVISÃO DA LITERATURA

4.7   COP-21 e mudanças climáticas

Já as causas antropológicas, segundo as autoras, estão associadas às atividades humanas no aumento da poluição por queima de combustíveis fósseis, queimadas, desmatamento, formação de ilhas de calor etc. A questão não é se a Terra está esquentando ou não, pois isso é um processo natural; o problema é a ação do homem no meio ambiente levar a um aumento da temperatura global além do que seria em um processo natural, como indicam os últimos relatórios do IPCC.

As MCs são, muitas vezes, interpretadas como sinônimo de pautas ambientais a serem cobertas pela mídia, sendo que em determinados momentos ganham mais visibilidade e importância do que o próprio meio ambiente nas notícias. Isso é mais perceptível quando temos grandes acordos, estudos e dados emitidos por organismos internacionais sobre o quadro atual do clima global.

As conferências das partes (COPs) pela ONU surgem, junto com os estudos sobre MCs publicados pela mídia, como uma das frequentes ocasiões em que a imprensa brasileira veicula matérias sobre meio ambiente, identificadas pela Revista Imprensa em 2001.

Mudanças no clima envolvem riscos que afetam a todos nós, independentemente do nível de impacto.

Sobre as MCs, Barros e Sousa (2008) afirmam que somente após o quarto relatório do IPCC, em 2007, o tema ganhou visibilidade nos jornais, por conta de sua grande repercussão com as projeções pessimistas quanto a responsabilidade humana no aquecimento global. Até então, os relatórios e estudos climáticos não tinham o apelo necessário para que a sociedade se engajasse no debate e que os jornais abrissem espaço para tal diálogo. 

A Conferência das Partes (COP) é o órgão supremo da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (UNFCCC). Estabelecida no artigo 7º da Convenção, a COP é um encontro dos países signatários onde a implementação da Convenção e de todos os mecanismos que venham a ser adotados devem ser permanentemente avaliados e revisados.

As COPs vêm acontecendo anualmente desde 1995, ano em que se realizou a primeira Conferência das Partes, na Alemanha.

O acordo fechado no dia 12 de dezembro, em Paris, último dia da Conferência, é um acontecimento histórico e ambicioso. Pela primeira vez, quase todos os países do mundo concordaram em agir contra as MCs, buscando minimizar o impacto que o homem vem causando ao processo do aquecimento global. O objetivo do acordo é limitar, até o ano de

2050, o aumento máximo de 2ºC na temperatura da Terra em relação ao início da Revolução Industrial29.

Esse desafio será mediante corte nas emissões de gases de efeito estufa; assim, os países signatários do acordo ficam responsáveis por implementar políticas públicas que incentivem matrizes energéticas menos poluentes e mais sustentáveis. A base do acordo foi a crescente preocupação dos dados publicados pelo IPCC.

O IPCC, em seu último relatório publicado em 2014, concluiu que a probabilidade de atividades humanas, como a queima de combustíveis fósseis, ser responsável pelo aquecimento global desde 1950 é de mais de 95%. Há risco de impactos "severos, penetrantes e irreversíveis", diz o documento30. Isso posto, demonstra a importância de tal convenção, buscando atingir o patamar de 1,5ºC de aumento na temperatura, tendo como 2ºC o limite acordado entre os países participantes.

Sobre o aumento da temperatura, o quinto relatório do IPCC mostra que, se nada for feito, a temperatura global se elevará entre 3,7 e 4,8ºC em relação a 1850-1900. De 1988 a 2007 foram publicados outros quatro relatórios, sendo o último destes, em 2007, o de maior repercussão, devido às conclusões pessimistas que acentuaram a responsabilidade humana no aquecimento global, na redução de neve no mundo, o derretimento dos glaciares e a provável inundação de cidades litorâneas em todo o mundo.

Para o IPCC31, é possível frear o aquecimento e evitar um futuro indesejável, mas isso requer um consenso mundial e acordos imediatos para reduzir a emissão de gases de efeito estufa. Esse acordo saiu da COP-21, onde se planejou um acordo mundial para minimizar as emissões de gases poluentes, e, assim, garantir um futuro para as novas gerações.

Sobre os impactos do aquecimento global, Paulo Artaxo (2008 apud RUTKOWSKI;

TASSARA, 2008: 13) explica as consequências de um aumento da temperatura global nos moldes projetados pelo quarto relatório do IPCC, publicado em 2007, caso nada seja feito:

Essa elevação de temperatura também vai trazer efeitos muito grandes sobre a saúde humana, e vai alterar o ciclo hidrológico – onde chove, quanto chove       

29 Nota à Imprensa: Acordo de Paris, do Observatório do Clima, disponível em:

http://www.observatoriodoclima.eco.br/nota-a-imprensa-acordo-de-paris/. Acesso em: 05 maio 2016.

30 Quinto Relatório do IPCC. Disponível em: http://www.ipcc.ch/pdf/assessment-report/ar5/syr/SYR_AR5_FINAL_full_wcover.pdf. Acesso em: mar. 2016. 

31 Quinto Relatório do IPCC. Disponível em: http://www.ipcc.ch/pdf/assessment-report/ar5/syr/SYR_AR5_FINAL_full_wcover.pdf. Acesso em: mar. 2016.

 

e quando chove -, afetando a agricultura. Ou seja, o impacto sobre a estrutura da sociedade será forte ao longo deste século, do ponto de vista social e econômico. Os outros efeitos são o aumento do nível do mar, previsto para subir 40 centímetros ao longo deste século, o que pode trazer problemas graves em muitas áreas costeiras. Haverá também a destruição de alguns ecossistemas, principalmente o Ártico – a previsão é que, em 2050, não haverá mais gelo no Ártico durante o período do verão – e o ecossistema amazônico, que é extremamente sensível às alterações climáticas. Parte da Amazônia pode se tornar uma vegetação do tipo Cerrado, característica do Brasil Central.

Diante de tal cenário, é crucial entendermos quais os impactos do aquecimento global nas atividades humanas e nos ecossistemas, para que seja estabelecido maior nível de atenção para a mitigação das consequências. Passar esse cenário de forma didática, séria e contextualizada é uma tarefa que os comunicadores devem ter para garantir o espaço de debate democrático sobre as mudanças climáticas na mídia.

Veiga (2010: 71 apud CAMPOS, 2011: 10) explica que há uma espécie de ‘santíssima trindade’ da cruzada contra o aquecimento global, termo aceito quase de forma unanime, que incorpora: “a) precificar o carbono, mediante taxação, comércio e regulação; b) adotar programas que acelerem o surgimento de tecnologias capazes de descarbonizar as matrizes energéticas; informar, c) educar e persuadir os cidadãos sobre as alterações que se impõe”.

Destacamos o item c), em que o autor coloca a comunicação como um dos pilares para a luta contra o aquecimento global.

De acordo com Campos (2011), nenhum empreendimento pode prosperar sem levar em conta que o aquecimento global é a maior ameaça do momento, ainda maior que o terrorismo e instabilidade política no Oriente Médio. Essa sentença demonstra a amplitude de temas que as mudanças climáticas envolvem. Suas consequências permeiam todas as editorias dos jornais e englobam muitas pautas jornalísticas. As agências de comunicação também lidam diariamente com o aquecimento global inserido direta ou indiretamente em suas áreas de atuação.

Embora o tema venha ganhando cada vez mais destaque nos últimos anos, após 21 COPs realizadas pela ONU e depois de incessantes inserções na mídia de desastres ambientais relacionados com o aquecimento global, é necessário contextualizar o início da cobertura das MCs pelos jornalistas. 

Para Loose (2015), as pautas sobre MCs nunca ocorreram de uma forma sistêmica, mas inseridas paralelamente a uma das síndromes do jornalismo ambiental identificadas por Bueno (2007), a síndrome do zoom. A diferença dessa síndrome para o que é proposto por Loose é que as notícias sobre MCs acabam envolvendo aspectos tão amplos e dados globais que terminam descontextualizando o leitor da problemática e deixando-o de lado das políticas de sustentabilidade a serem discutidas sobre o aquecimento global. Além de descontextualizar o leitor, esse tipo de notícia tira das pessoas um pouco da cidadania, pois impede a participação ativa de atores que enfrentarão diretamente os riscos ambientais: as comunidades mais pobres e marginalizadas.  

Sobre o enquadramento dado na cobertura das MCs, Loose (2015) diz que os riscos se apresentam tanto em notícias locais como em notícias globais, entretanto, são essas últimas que possuem maior número. O problema do risco se apresentar mais frequentemente em notícias de enfoque global é que "não relaciona os hábitos e posturas da população em relação ao problema" (LOOSE, 2015: 56). Embora essa relação do risco com o noticiário global busque criar o alarde positivo para que a população tome maior consciência sobre a gravidade das MCs, isso acaba distanciando o ator social de seu meio, dificultando, assim, criar uma relação de causa e efeito no lugar onde mora.

A proximidade com o leitor é um dos valores-notícia mais importantes; entretanto, buscar a legitimação de uma matéria pelo contexto global não é o melhor caminho para construção de uma consciência coletiva socioambiental, por mais que queira gerar impacto pelo denuncismo que envolve as MCs. Prova disso é que, para Loose (2015: 57),  

[...] várias pesquisas mostram que as pessoas demonstram dúvidas sobre as MCs, seus riscos e formas de combatê-lo porque as informações recebem ênfases inadequadas. A contextualização – ou exposição sobre as circunstâncias e o lugar de discussão do fato – auxilia na compreensão correta e evita, por exemplo, que negacionistas recebam o mesmo espaço que a parcela majoritária dos cientistas que estudam o clima. 

 

O que a autora defende é que uma busca pelo vínculo entre o local e o global, na disseminação do risco nas notícias sobre MCs, consegue uma aproximação maior com o cidadão e possibilita levar mais e melhores informações sobre o que acontece com o ambiente em que vive. A legitimação pode estar nas fontes da notícia que, além de abrirem o foco da problemática envolvida, também escuta o que os cidadãos têm a dizer sobre o assunto e busca relacionar fatos a acontecimentos do dia a dia de pessoas comuns.

O que demonstra esse enquadramento distanciado que Loose defende é a pesquisa contida no Manual de Como falar sobre o Clima32, do Observatório do Clima, que mostra, entre outras coisas, conceitos mal compreendidos pelo público e que possuem um significado bem diferente para os especialistas. A título de exemplo, podemos citar as causas das mudanças climáticas, que para população brasileira, a poluição é a principal culpada, enquanto na opinião de especialistas, o verdadeiro problema está na queima de combustíveis fósseis. Outro ponto importante no Manual é que, para o brasileiro, o desmatamento é o principal responsável pelas mudanças climáticas, sendo que ele é importante, mas não é a principal causa. Esses exemplos demonstram como é importante educar e alfabetizar ambientalmente a população brasileira por meio da mídia. 

Durante a Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e o Desenvolvimento (Rio-92), foram 104 reis, rainhas e chefes de estado, acompanhados de 10 mil delegados de 180 países para compor uma cúpula sem precedentes na história. Para tal evento, nove mil jornalistas foram credenciados para cobrir os acontecimentos.  

Na COP-21, entretanto, foram deslocados três mil jornalistas para cobrir o evento, um número bem inferior ao Rio-92. As delegações, por sua vez, representaram uma enorme quantidade de pessoas na Conferência. Já com relação aos chefes de estado, a COP-21 bate mais um recorde com 150 reis, príncipes, chefes de estado e chefes de governo presentes em Paris33.O importante é observar se durante a Conferência, essa explosão de pautas ocorreu de forma semelhante, sincronizada, levando à exaustão o que antes do evento era visto sem prioridade de pauta. Durante o evento, 195 países marcaram presença no que é considerado o maior acordo firmado no mundo, enquanto 175 desses já assinaram o acordo internacional34, superando os 119 países que ratificaram o acordo para o Direito do Mar35. 

Trigueiro (2005) destaca que as editorias de meio ambiente foram criadas nos principais veículos de comunicação para suprir a imensa demanda de notícias sobre a Rio-92,       

32 Como falar sobre o Clima Observatório do Clima, disponível em:

http://arapyau.org.br/comofalarsobreclima/. Acesso em: abr. 2016.

33Representantes de 195 países se reúnem em Paris para a COP-21. Disponível em: http://g1.globo.com/jornal-nacional/noticia/2015/11/representantes-de-195-paises-se-reunem-em-paris-para-cop-21.html. Acesso em: abr.

2016.

34Acordo do clima é assinado por 175 países, recorde da ONU. Disponível em:

http://g1.globo.com/natureza/noticia/2016/04/acordo-do-clima-e-assinado-por-175-paises-recorde-da-onu.html.

Acesso em: abr. 2016.

35Mais de 130 países assinarão Acordo de Paris no dia 22, na sede da ONU. Disponível em:

http://www.observatoriodoclima.eco.br/mais-de-130-paises-devem-assinar-acordo-de-paris/. Acesso em: abr.

2016.

mas posteriormente elas vieram a se desintegrar, tanto pelo fim do evento quanto pelo impeachment do então presidente Fernando Collor. Tempos depois, essas editorias voltaram aos jornais e até então são encaradas de forma cada vez menos preconceituosas. Se não fosse pela estrutura criada durante a Rio-92, os jornais certamente não teriam dado esse arranjo estrutural para o meio ambiente nas suas redações. Para Trigueiro (2005: 81),

Nunca, em nenhum outro período da história, se falou tanto em meio ambiente. Uma verdadeira operação de guerra mudou a rotina das redações, onde uma montanha de pautas até então solenemente desprezadas, mais por ignorância do que por má-fé, justificaram coberturas espetaculares.

É importante lembrar que, durante o período em que as editorias de meio ambiente foram suprimidas, elas eram cobertas dentro da editoria de ciências, certamente provando seu vínculo com o jornalismo científico.

Complementando Trigueiro sobre a cobertura das mudanças climáticas, Loose (2015:

46) diz: 

As alterações do clima se tornam pauta nos veículos de comunicação durante a divulgação de pesquisas e relatórios científicos, desastres climáticos e a realização de eventos políticos que concentram chefes de estado, ou seja, de forma esporádica. 

Campos (2010) lembra que o direito de participação em decisões de caráter ambiental está prescrito em diversas recomendações da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), em diversas diretivas da Comunidade Econômica Europeia (CEE), na Carta Mundial da Natureza e na Convenção sobre a Conservação da Natureza e dos Recursos Naturais. Também sobre a participação popular nessas decisões, Campos (2010: 21) diz que

[...] a comissão Brundtland também considerou o reconhecimento do direito de os indivíduos conhecerem e terem acesso às informações correntes sobre o estado do meio ambiente e dos recursos naturais, o direito de serem consultados e de participarem do processo decisório relativo a atividades que possam ter um efeito significativo sobre o meio ambiente.

É esse direito de participação que a mídia tem que garantir, deixando um ambiente democrático para que se possa desenvolver as políticas públicas voltadas para a sustentabilidade e a mitigação do aquecimento global. Por fim, o autor diz que é dever dos

comunicadores informar adequadamente sobre questões relacionadas ao meio ambiente, porque os receptores da mídia têm direito à informação correta e bem apurada.