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Os textos que compõem o corpus encontram-se na íntegra, nos Anexos. Ainda que utilizemos nas análises apenas recortes de cada um deles, os colocamos integralmente à disposição do leitor, caso queira apreciar o texto por completo, de onde os recortes foram tirados.

3.1.1 Definição e procedência

O corpus de nossa pesquisa é formado pelo conjunto de textos escritos por professoras participantes do Projeto Formar - um projeto de formação docente desenvolvido no norte do Estado do Espírito Santo, entre 1997 e 2007, visando à formação de professores alfabetizadores para atuação na educação infantil e no ensino fundamental. Nos referidos textos, as professoras relatam as suas memórias sobre a sua história pessoal de alfabetização. Os textos foram produzidos em 2005, em cumprimento de uma das atividades escritas às quais os professores eram submetidos ao longo do projeto. A produção escrita das memórias foi uma oportunidade para que as professoras, já no início do projeto, expressassem suas experiências como alunas, na medida em que relatavam lembranças da “época de escola”. Os textos serão aqui transcritos na íntegra. Foram preservados alguns desvios à gramática normativa, como os ortográficos, os de concordância, os de regência e os de pontuação, pois a singularidade dos relatos também incide na forma como as professoras estruturam linguisticamente seus textos, além daquilo que procuram comunicar.

Mais informações sobre o projeto de onde os textos foram retirados: o Projeto Formar foi viabilizado por meio de uma parceria entre a Aracruz Celulose S.A. e a Rede Interdisciplinar de Educação (RIED) – Organização da Sociedade Civil de Interesse Público (OSCIP) que exercia a função de coordenação do projeto. O projeto Formar é um projeto de formação em rede, nos municípios de atuação da Aracruz Celulose, empresa que lhe ofereceu apoio e patrocínio desde 1997. Ao longo de seus dez anos de duração, o Formar foi desenvolvido em 18 municípios do Estado do Espírito Santo e em 2 municípios do estado de Minas Gerais: Aracruz, Colatina, Conceição da Barra, Fundão, Ibiraçu, Jaguaré, João Neiva, Linhares, Marechal Floriano, Mucurici, Montanha, Pedro Canário, Rio Bananal, Santa Leopoldina, Santa Teresa, São Mateus, Serra e Sooretama, no Espírito Santo, e Nanuque e Carlos Chagas, em Minas Gerais. Alcançou, portanto, um número significativo de professores do ensino público desse estado, uma média de 900 professores participantes por ano. Por meio de um convênio que incluía a Secretaria de Ensino Fundamental do Ministério da Educação (SEF/MEC), a partir de 2001, o Projeto Formar associou-se ao PROFA, um Programa de Formação de Professores Alfabetizadores implementado pela SEF/MEC em todo o país. Algumas características básicas do PROFA: abordava especificamente o ensino e a aprendizagem iniciais da leitura e da escrita; totalizou uma carga horária de 160 horas, distribuídas em três módulos; as atividades propostas giravam em torno do estudo em grupo e da produção individual e coletiva de textos, que eram socializados no grupo de estudos e/ou entregues a um coordenador, tendo em vista a avaliação. O Projeto Formar seguiu a mesma organização e metodologia de trabalho do PROFA. Deu-se, então, por meio do estudo aprofundado de três módulos que focalizaram a tematização da prática da alfabetização em processo, de acordo com os princípios da Psicogênese da Língua Escrita, de Emília Ferreiro34 e Ana Teberosky. O módulo I, de onde os textos de memórias foram tirados, aborda conteúdos de fundamentação, relacionados aos processos de aprendizagem da leitura e escrita e à didática da alfabetização.

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A doutora Emília Ferreiro foi orientanda de Jean Piaget. Juntamente com Ana Teberosky dedicou- se a investigar os processos cognitivos que levam a criança a construir os seus conhecimentos sobre a língua escrita. Por meio de suas pesquisas, pôde-se compreender o caráter construtivo dos processos de aquisição da leitura e da escrita pelas crianças.

3.1.2 Critérios de seleção

A opção pelos textos de memórias das professoras do Formar, dentre uma imensidão de outras produções delas que constam nos arquivos da Ried, se justifica, sobretudo, pela pessoalidade e informalidade que eles poderiam apresentar, uma vez que, ao relatarem sua história pessoal, se sobressairia nos textos um tom mais informal. A pessoalidade permite que venham à tona nos textos com maior facilidade experiências particulares, singulares, íntimas daqueles sujeitos. Diferente se optássemos por trabalhar com textos de ordem científico-pedagógica, como os artigos produzidos por elas ou os próprios relatórios dos estudos e atividades realizadas no projeto, por exemplo, que elas escreviam periodicamente. Textos como esses últimos, segundo entendemos, tornariam restrita uma análise mais subjetiva, uma vez que a organização dos discursos dessa natureza se dá justamente pela manutenção de certas regularidades que privilegiam a circulação e a materialização de enunciados do campo científico-pedagógico, em que o caráter subjetivo é atípico. Portanto, dar preferência a textos que trazem experiências pessoais das professoras, em que tange no caso à sua formação escolar, legitima análises que como a nossa, privilegiam os processos sócio-histórico-ideológicos articulados aos fenômenos lingüísticos.

Mais especificamente dentre os textos de memória, o critério de seleção, em termos mais restritos, se baseou, em primeiro lugar, na disponibilidade dos textos, pois nem todos os grupos de cada município enviaram à Ried seus textos de memória, por motivos diversos, devidamente justificados no contexto do projeto. Depois desse levantamento inicial de todos os textos enviados (que somam um total de 27 textos), se seguiu uma leitura de cada um deles e, enfim, selecionamos aqueles que traziam em sua materialidade enunciativa efeitos que atingem aqueles sujeitos no processo de construção de sua subjetividade. Como nos interessava observar certas regularidades enunciativas que se mantêm e que se re-atualizavam, nos restringimos àqueles textos que apresentavam, de alguma forma, enunciados que circulavam em torno do nosso foco de análise, sobre o qual trataremos a seguir. Nessa espécie de mapeamento enunciativo, restaram-nos efetivamente 21 textos das professoras do Formar.