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AS COSMOVISÕES AFRICANAS E O PARADIGMA CIENTÍFICO MODERNO: DA SUBESTIMAÇÃO À RUPTURA EPISTÊMICA

Nelsio Gomes

RESUMO: Este estudo trata-se das cosmovisões africanas face ao paradigma científico

moderno e da invisibilização das epistemologias africanas durante a invasão colonial em África. No decorrer deste debate teórico em diálogo com os pensadores/intelectuais africanos e não apenas, a nossa discussão fundamenta-se sobretudo acerca dos efeitos do colonialismo em África. Assim sendo, constata-se que a ocupação colonial no continente africano, por conseguinte, influenciou a prática da repressão, subjugação e a exploração excessiva dos recursos naturais dos povos de distintos países africanos e ainda, desagregou a forma de organização socioeconômica, política e cultural que existia na época pré-colonial. Para realização desta pesquisa, baseamos numa metodologia qualitativa por meio da revisão bibliográfica como uma das técnicas de recolha de dados produzidos por outros pesquisadores como: livros, artigos científicos, monografias e entre outros trabalhos de autores que possuem debates referentes acerca do nosso tema. Á visto disso, pretende- se neste trabalho realçar que a dominação europeia em África, deixou inúmeros vestígios históricos que até hoje estão causando cisão interafricanos, conflitos armados, rivalidades étnicas, disputas territoriais, religiosas etc. Portanto, os resultados obtidos, apresentam que o processo da ocupação colonial em África, além de fragmentar as nações africanas e os seus povos, deixou as cicatrizes profundas que seguem gerando as instabilidades políticas, a perda das identidades culturais e dos conhecimentos endógenos.

PALAVRAS-CHAVES: África; Invasão colonial; Epistemologias.

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INTRODUÇÃO

No presente artigo, objetiva-se debater sobre as implicações da divisão territorial dos países africanos no decorrer do domínio colonial em África que oportunizou a exploração dos recursos naturais, a depreciação dos conhecimentos africanos, além disso, considerando- os como exóticos, incluindo a inferiorização do mesmo povo o que posteriormente influenciou o comércio transatlântico onde os povos africanos foram arrancados nas suas terras, isto é, da África e levados para a Europa e América para serem escravizados nos países que compõem estes continentes.

Sendo assim, Wolfgang Döpcke (1999, p. 77) afirma arbitrariedade “pela qual as fronteiras foram impostas às sociedades africanas pelos colonizadores europeus, ignorando as realidades étnicas, geográficas, ecológicas e políticas existentes”.

Essa incursão europeia, acarretou ampla desintegração das comunidades africanas e ainda invisibilizou os saberes intrínsecos e aniquilou as identidades culturais existentes para promover a assimilação das culturas, hábitos e dos conhecimentos eurocêntricos. Nela, a exploração passou a ser pautada pelos interesses ligados aos recursos naturais, tais como ouro, cobre, tecidos, diamantes e entre outros, nos polos geográficos estratégicos situados perto ao Mar Mediterrâneo, tendo em vista suas vantagens para o comércio marítimo, o que possibilita a transportação das riquezas dos países africanos para abastecer os mercados da Europa, América, Índia. Esse cenário, contribuiu para o enfraquecimento das indústrias e da economia africana.

Diante disso, Ahmed Idha Salim ressalta que:

Neste sistema capitalista mercantilista, a exploração dos recursos humanos e materiais das sociedades do Leste africano revestiu‑se na forma de uma troca desigual que se estabeleceu duravelmente entre, por um lado, os mercadores estrangeiros parasitas estabelecidos em Zanzibar e, por outro lado, os povos do litoral e do interior. Os lucros substanciais assim obtidos eram transferidos para a Europa, América e Índia e não eram praticamente investidos no desenvolvimento material ou técnico da África Oriental. Os artigos importados, os quais eram trocados pelos produtos do Leste africano, tais como o marfim, eram artigos de consumo de baixo custo que não serviriam para a formação de capital. A importação de alguns destes artigos prejudicava as indústrias locais: a indústria têxtil de Lamu e dos portos do Benadir foi duramente atingida pela importação de tecidos de algodão asiáticos, a princípio, e, em seguida, americanos (SALIM, 2010, p. 273).

Sendo assim, para realização desta pesquisa, foi utilizado o procedimento metodológico qualitativo de abordagem bibliográfica, na qual a coleta de informações foi fundamentada através da análise das ideias dos autores, como Adesina (2012); Hountondji (2008), Lauer e Anyidoho (2016); Salim (2010); Serrano e Munanga (1995) e incluindo as contribuições significativas dos outros autores acerca da temática debatida. Perante isso, os resultados alcançados revelam que a ocupação colonial em África, desagregou as fronteiras africanas de forma arbitrária sem respeitar as autoridades locais existentes nessa época e esses cenários são origem histórica de conflitos presentes na África.

Na conjuntura que as sociedades africanas se encontram na atualidade, entende-se que a modernidade imposta pelo colonialismo, pode ser compreendida como uma visão de mundo a partir da interrupção com a tradição herdada pelos povos não europeus, implementando, assim, a cultura e os modos de vida oriundos da Europa, justificando que o atraso dos povos africanos é o resultado do seguimento das tradições dos seus antepassados (LAUER e ANYIDOHO, 2016).

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Nesse contexto, compreende-se que, para os europeus, os africanos deveriam seguir o modelo eurocêntrico para se desenvolver. Sem isso, não haverá outra forma. Porém, os africanos não precisam seguir o padrão eurocêntrico para o desenvolvimento da África, uma vez que, esse não é um único modelo ideal para a prosperidade de todos os países, dado que as realidades sociais são distintas. O que os países africanos necessitam em princípio é a união que minimizará os conflitos sociais que podem permitir a existência da paz duradoura. Além disso, cada povo africano deve pensar num desenvolvimento assentado nas relações históricas, econômicas, socioculturais e políticas do seu país.

No entanto, a descolonização dos países da África, América Latina e da Ásia vem para deslegitimar o discurso utilizado no período colonial, nos quais os colonialistas europeus se consideram superiores e dotado de capacidades, aptidões e de inteligência devido a sua forma de raciocinar. Esse processo de emancipação desses territórios, possibilitou as proclamações das independências de diferentes países pertencentes a estes continentes, que anteriormente, sofreram a ocupação colonial e os seus respectivos países eram administrados por colonizadores europeus (SERRANO e MUNANGA, 1995).

Assim, durante o século XIX, a questão da mestiçagem por exemplo, inspirada por teorias raciais que emergiram na Europa, foi categorizada as pessoas nessa condição mediante as suas cores de pele, confirmadas pelos sensos. Nessa época, observa-se que a humanidade foi fracionada em raças. E, perante um pressuposto cientificismo perpetrava- se a ideologia colonial da “raça pura” (PRADO, 2009). Porém, as raças biologicamente e cientificamente não existem quando se coloca nos seres humanos, mas sim, este conceito foi primeiramente utilizado para classificar as espécies de plantas e animais em suas distintas formas. Foi a mesma ideologia que os europeus utilizaram para inferiorizar os africanos que consideravam desde a invasão colonial em África de incapazes e indolentes (MUNANGA, 2004).

E, relativamente à epistemologia “é um ramo da filosofia cujo foco principal é analisar e avaliar as alegações acerca do conhecimento. E pela extensão de que todos os humanos têm a capacidade de conhecer, a epistemologia é universal e independente de cultura, tribo ou raça” (KAPHAGAWANI e MALHERBE, 2002, p. 2).

Nesse sentido, apesar de que a epistemologia como estudo do conhecimento ora multifuncional, nota-se que, existe as pluriversalidades de conhecimentos em que as demandas do pensamento são desenvolvidas e associadas. Não obstante, as formas que os indivíduos fazem para obtenção de saberes mudam conforme as situações socioculturais, históricas, políticas etc. E ainda, este conhecimento pode ser transmitido mediante as gerações e do mesmo modo, pode ocorrer através de processos de socialização e de convívio social entre sujeitos.

De outro modo, a cultura simbolizava para as mulheres africanas como uma arma de resistência em oposição ao regime colonial, com intuito de libertar os povos africanos da subjugação e da escravidão embasada na legitimação da supremacia branca, uma vez que, é uma ideologia política que reproduz e mantém a dominação social, política, histórica, ou seja, industrial por pessoas brancas, como é presente nas estruturas sociopolíticas históricas, culturais e contemporâneas. Tudo isso era uma construção eurocêntrica para validar a sua dominação sobre os outros povos não europeus com saberes e padrões distintos dos povos ocidentais (DOVE, 1998).

Perante o exposto, Hountondji (2008) sublinha que a unidade dos africanos e das disciplinas vinculadas às instituições que estudam os saberes endógenos, sobretudo os Estudos

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Africanos, deveriam unir-se para se fortalecer ainda mais, levando em consideração a luta e a resistência dos povos africanos durante séculos como forma de emancipar-se de qualquer tipo de dominação e preservar os conhecimentos repassados de geração em geração pelos seus antepassados, bem como expulsar o colonialismo distante do continente africano e alforriar os povos africanos da subordinação e escravidão.