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CAPÍTULO III – ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS DADOS

3.2 As crenças da professora

3.2.2 Crenças sobre aprendizagem de LE

3.2.2.2 Crenças sobre a aprendizagem de LI

Depois da apresentação das crenças de Belinha sobre a aprendizagem na EP, discuto as crenças especificamente relacionadas à aprendizagem de LI, organizadas no quadro 8, reveladas durante a observação das aulas e verbalizadas no decorrer da coleta de dados.

Quadro 8 – Crenças sobre a aprendizagem de LI

Durante o período de observação das aulas e coleta dos dados para a pesquisa, percebi a importância do vocabulário para a aprendizagem, nas falas e ações de Belinha. Pesquisas recentes evidenciam que o vocabulário é o aspecto considerado mais importante a ser estudado da língua, por alunos e professores (CONCEIÇÃO, 2004). Assimilar e reter uma quantidade de palavras considerada básica tornou-se um desafio para o ensino de LE, principalmente ao considerarmos o contexto da EP, onde grande parte dos alunos não conta com situações de uso da LI.

Uma das principais crenças evidenciadas na fala de Belinha é a de que qualquer habilidade (falar, escrever, ler, ouvir e compreender), não pode ser desenvolvida sem que antes, o aluno tenha uma grande quantidade de vocabulário memorizado. A crença parece reforçar sua desmotivação, visto que, em sua concepção, um depende do outro:

[62]

“como é que você vai ensinar uma outra língua sem vocabulário?”

(N). [63]

“[...] o aluno não estuda, e sem vocabulário não consegue fazer nada... sem saber o vocabulário, não é possível desenvolver as outras habilidades.” (EI-2).

[64]

“90% dos alunos, não interiorizam o vocabulário porque não estudam... “(N).

Belinha crê, ainda, que o vocabulário deve ser memorizado através de repetição (oral e escrita) e tradução, conforme demonstra os excertos a seguir:

“Sem vocabulário, o aluno não desenvolve outras habilidades.” “O aluno não aprende vocabulário porque não estuda.”

“Vocabulário só é aprendido memorizando.”

“A maior dificuldade do aluno é memorizar e interiorizar o vocabulário.” “O aluno gosta mais da gramática.”

[65]

“[...] o mais difícil de tudo é aprender o vocabulário, porque o aluno não estuda..., e pra mim o vocabulário só se aprende estudando e memorizando.” (EI-1).

[66]

“B_ Então, vamos relembrar as question words? [escreve no quadro:

Who] O que é WHO?

A1_ É onde? [dá uma risadinha].

B _ É quem... se eu faço a pergunta [escreve no quadro]: Who are you? O que significa? Who are you?

A2_ Quem é...hum...

B _Quem é... [pausa] Quem é... VOCÊ?E [escreve no quadro] WHERE? O que é Where?[realiza o mesmo procedimento com

WHERE e as outras question words WHAT, WHEN, HOW OLD]

(Aula 11 – 27/03/07).

No trecho da aula observada percebe-se que o objetivo de Belinha é com relação ao significado das palavras isoladamente. Ela repete diversas vezes as palavras, pois acredita que pronunciando e traduzindo-as os alunos as memorizam. A crença de que o vocabulário é o aspecto da língua mais difícil de aprender, provavelmente acompanha Belinha desde o início dos seus estudos da LI. É possível que ela não conheça estratégias usadas para a fixação do vocabulário, não sabendo também sugerir aos alunos que as utilize. Convém notar que outras investigações (GU & JOHNSON, 1996; MORI, 1999a) evidenciaram a influência das crenças na aprendizagem do vocabulário. Gu & Johnson (op. cit) observaram que os alunos usavam com mais freqüência estratégias baseadas em suas crenças. O estudo de Mori (op. cit.) revelou que a tradução era utilizada por alunos que acreditavam que a língua-alvo era difícil de aprender.

Outra crença revelada na fala de Belinha, tanto nas EI assim como na observação das aulas, é a de que o aluno não estuda e que por isso, não memoriza o vocabulário. E, de acordo com estudos recentes, esse aglomerado de crenças, que se interelacionam (SILVA, 2005), podem ter se originado nas experiências prévias da informante como aprendiz, em escolas públicas, particulares ou em cursos livres de idiomas. No caso de Belinha, que estudou a LI em um curso particular, que utiliza o método de gramática e tradução, com base na repetição de listas de palavras, a maneira que ela conhece para ‘aprender’ é memorizando o vocabulário através de repetição e tradução.

Vários estudos (CONCEIÇÃO, 2004; SOUSA, 2007; VECHETINI, 2005) têm mostrado a preocupação atual com estratégias que ajudem o aluno a assimilar o vocabulário. Porém, a memorização através de repetição, fruto da abordagem estruturalista, certamente não

é a solução ideal. A crença de que o vocabulário deve ser memorizado, apontada no QE, é reforçada nas EI e confirmada na observação das aulas. A mesma crença já foi levantada em outros estudos (GU & JOHNSON, 1996; MORI, 1999a) e confirmada por Conceição (op.

cit.).

Enfatizo que a crença de que o vocabulário deve ser memorizado, pode ser originada nas experiências anteriores de Belinha, nas quais listas de vocabulário são apresentadas para memorização, e que essa prática é usualmente realizada por Belinha, reforçada através da sua própria fala, como demonstra o excerto a seguir:

[67]

“... eu, por exemplo... tenho essa mania de querer aprender novas palavras... e eu... olha... preciso copiar várias vezes, para memorizar uma palavra nova...”. (EI-2).

No entanto, Belinha considera essa prática ineficaz, de acordo com a transcrição que segue:

[68]

“... às vezes até eu acho, NOSSA! QUE COISA RIDÍCULA! Colocar o aluno pra escrever a mesma palavra de 3 a 5 vezes cada palavra... eles escreviam, mas odeiam fazer isso, é muito cansativo... Então... eu ainda não consegui descobrir um método pra eles memorizarem e aprenderem o vocabulário.” (EI-2).

Ainda que considere ‘ridículo’ Belinha continua a utilizar a cópia das palavras descontextualizadas. Quando fala no ‘método’, que ela ainda não descobriu, refere-se às estratégias de retenção de vocabulário que, como mencionei, é possível que ela não conheça. Segundo o meu entendimento, ao usar o recurso da cópia de palavras, mesmo considerando-o ineficiente, Belinha é influenciada pela crença de que o vocabulário deve ser memorizado.

Ao ser questionada sobre o aspecto mais fácil para o aluno, e mais viável para o professor no ensino da LI na EP no QE, a crença de que o aluno prefere estudar a gramática, em detrimento de outros aspectos da LI, foi evidenciada na sua resposta. Posteriormente, durante a N, as EI, na observação das aulas e nas SV essa crença foi reforçada, conforme indicam os trechos que seguem:

[69]

“O aluno? Eu acho... eh... ele aprende mais a explicação da gramática, acho que eles gostam mais de fazer exercícios gramaticais...” (N).

[70]

“... eu acho que a gramática... quando você tá explicando, pode observar que pela repetição das regras [...] na hora da correção eu sempre repito as regras, e eles vão pra casa e não se esquecem .. fixa, eles entendem , porque?Aquilo lá (gramática) é compreensão...o vocabulário não...”(EI-2).

Belinha, mesmo ao refletir sobre o baixo índice de aprendizagem de LI na EP, continua se indagando a respeito das causas desse ‘não-aprender’:

[71]

“ (...) a falta de estudo do aluno, leva ele até o ensino médio...e lá o problema do vocabulário é pior, porque ainda não memorizaram.”

(N). [72]

“Depois que apresento um texto de vocabulário novo ..., daí um pouco eles já esqueceram tudo.” (EI-1).

A meu ver, Belinha generaliza a falta de estudo dos alunos na EP para inconscientemente, justificar a dificuldade de retenção do vocabulário novo. Ela refere-se à memorização, ou não, do vocabulário como algo que fica pior à medida que o aluno vai para o ensino médio, sugerindo assim a ineficácia da aprendizagem, e ainda da avaliação, uma vez que o aluno é aprovado e continua sem saber o vocabulário.

As crenças, assim, parecem exercer influência na abordagem da professora (ALMEIDA FILHO, 2003), e conseqüentemente em todas as dimensões da OGEL, a saber, o PC, a seleção de materiais, a metodologia e a avaliação. Apesar do foco deste estudo ser as crenças a respeito da aprendizagem e do PC, especificamente, considero relevante mencionar a opinião de Belinha sobre a avaliação, já que esta envolve as crenças sobre a aprendizagem do vocabulário e da gramática.

Belinha acredita que o reconhecimento e a escrita dos vocábulos seja a parte mais complicada da aprendizagem de LI. Há evidências da interferência desta crença na sua maneira de realizar a avaliação, conforme revela o excerto da EI a seguir:

[73]

“..., agora reconhecer e escrever os verbos e o vocabulário é a parte que eu acho mais complicada..., Eu até usava um método assim.. Dava duas avaliações: uma era mais voltada para a gramática e outra voltada só pra vocabulário, igual a gente vê nos cursinhos.. né?! A da gramática, eles saiam bem, a de vocabulário DERRUBAVA a turma toda.” (EI-1).

É impossível negar o efeito negativo do termo “derrubava” na fala de Belinha, assim como a idéia da separação da língua em vocabulário e gramática, evidenciados no trecho supracitado. Os acontecimentos em sala de aula, incluindo o modelo de avaliação citado acima, reforçam as crenças de Belinha a respeito do vocabulário. A comparação do contexto da EP com o de cursinhos aparenta uma provável visão positiva da aprendizagem de LI nos mesmos. Em outro momento, Belinha volta a comentar sobre o ensino de instituições que preparam o aluno para o vestibular, ou seja, colégios que oferecem cursinhos preparatórios, demonstrando novamente a crença na abordagem tradicional:

[74]

“Essas escolas, [que oferecem cursinhos] que aprovam muito no vestibular, são tradicionalistas. Não tem essa de introduzir um tema, ouvir o aluno..., o negócio é dar aula, mostrar serviço.” (EI-1).

Entretanto, ao mesmo tempo em que Belinha demonstra sua crença na abordagem tradicional, em outros momentos, sua fala sugere traços característicos da abordagem comunicacional. De acordo com meu entendimento, Belinha encontra-se numa etapa de desenvolvimento da competência aplicada (ALMEIDA FILHO, 1993), as crenças sobre ensinar a LI de maneira tradicional a influenciam fortemente, porém acredita que há outras formas, mais eficientes, de trabalhar a LI na EP, como evidencia o seguinte excerto da SV:

[75]

“ É... a aula não tava dando certo, né?[tom de voz triste] eu acho..., é.. se os alunos praticassem o vocabulário, né... tivesse mais situações pra eles falarem... talvez a dificuldade com as palavras diminuísse.[...]” (SV-2).

Nesta SV, Belinha reconhece que os procedimentos utilizados não atingem os objetivos esperados. É relevante enfatizar que a percepção da ineficácia de algumas ações na aprendizagem de LI, já é um grande avanço neste estudo, devido ao pouco tempo de convivência, entre a pesquisadora e Belinha, no período da observação e coleta dos dados.

Ainda em relação às crenças sobre a aprendizagem de LE (inglês), na próxima subseção, apresento dados que se referem às crenças sobre o que Belinha considera primordial para a retenção e concretização da aprendizagem, as quais foram categorizadas como crenças sobre o ‘melhor aprender’.