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4.1 GRUPOS PRETERIDOS PELOS ADOTANTES

4.1.1 Crianças e Adolescentes Negras

Assim como já descrito no item anterior, a efetiva adoção de grupos preteridos pela adoção está cada vez mais difícil de acontecer, visto que há ainda muito preconceito e discriminação quando se envolve crianças e adolescentes que não são os desejáveis pelos adotantes.

Não obstante as expectativas de adoção desses grupos, estas diminuem bastante quando se trata dos institucionalizados de cor de pele negra ou pardas escuras. Isso acontece porque nem sempre os adotantes valorizam o que realmente é relevante para a criança e adolescente que está num abrigo, mas sim querem satisfazer suas expectativas sem levar a considerar que o direito de escolha é do adotado.

Tendo em vista que a escolha cabe ao adotante e que muitas vezes o pré-conceito conduz a preferência, é de se entender as razões pelas quais existem muitas crianças e adolescentes negras institucionalizadas.

É sabido que não se pode generalizar e se alegar inexistem adotantes que esses menos favorecidos, porém é notável que há sensível diferença no número de adoções de crianças e adolescentes de cor branca.

O gráfico nº4111

abaixo demonstra o contraste de números:

A preferência dos adotantes às crianças e adolescentes de pele branca chega a ser exorbial com relação às negras. Sabe-se que isso ocorre pelo fato de a sociedade carregar consigo, o que lá nos tempos da escravidão era considerado normal: a indiferença de quando se tratava dos escravos.

Porém, já que é dada ao adotante o direito de escolha sem observar-se a relevância do adotado em expor sua preferência, que pelo menos tenha-se consciência de que a cor da

pele não vai mudar a convivência, mas pode sim, fazer com que cresça ainda mais na criança ou no adolescente a resistência a futuras tentativas de adoção.

Por certo que o institucionalizado que é abandonado por sua família biológica e assiste o passar do tempo num abrigo esperando a hora de ser adotado que muitas vezes nunca chega, vai desenvolver pensamentos que ninguém lhe quer e que é indesejável a vista de todos. Tal situação pode criar receios de comunicação até com crianças de sua idade, sem contar a exposição à prática de crimes.

Colhe-se o seguinte ensinamento do magistério de Silveira:

Na prática adotiva, a categorização racial de negros é bastante evidente, reforçando os padrões socioculturais predominantes em termos de beleza e estética física. Aqueles que não se encaixam em um padrão determinado têm menos possibilidades de se encaminhar para a adoção. Pelo que se pôde depreender, o critério de seletividade com base nos traços fenótipos nesse contexto vale apenas a categorização dos negros e não de outros grupos raciais presente no Estado Brasileiro.112

Verifica-se que a autora citada explicita exatamente o que ocorre atualmente no país em que vivemos, pois quando se trata de adoções inter-raciais os padrões socioculturais predominam em termos de beleza e estética física.

O adotante quer escolher uma criança e adolescente com o mesmo fenótipo que tem, porém como se tratam de pessoas diferentes, mentalidade e personalidade diversas, não há porque o adotante escolher alguém parecido com ele na aparência, se na personalidade é diferente.

Silveira citando Weber relata que a autora

[...]traz contribuições significativas em relação ao fator racial na prática adotiva, as quais reforçam a ideia de que crianças e adolescentes adotadas fora do seu grupo racial estariam em „situação‟ de risco, quanto ao desenvolvimento de uma identidade racial, e teriam um autoconceito pobre pelo contato insuficiente com outras pessoas da própria raça; e que a falta de contato com pessoas da própria raça poderia resultar em uma capacidade diminuída para integrar com os elementos racistas da sociedade.113

Ora, se a criança ou adolescente, devido ao preconceito fomentado por toda sociedade brasileira, não consegue nem se comunicar com pessoas da mesma etnia,

por sentir-se acuado, enfrentará maior dificuldade com pessoas de raça diversa. Assim, imperioso que se promova a integração inter-racial com o incentivo de adoções que envolvam etnias diferentes.

112 SILVEIRA, 2005, p. 63.

Silveira ainda citando Weber, argumenta que esta também entende que “as adoções inter-raciais são medidas viáveis para dar um lar àqueles que não têm condições de permanecer em sua unidade familiar.”114

Porém apesar de o Brasil intitular-se democrático, ainda há preconceito com relação as pessoas de raças diferentes, constatando-se que nem mesmo os adotantes de cor de pele negra preferem os institucionalizados negros.

Os gráficos nº5115 e nº6116 abaixo demonstram as crianças e adolescentes

cadastradas conforme sua etnia, e comprovam que as negras são as que mais estão institucionalizadas, e que menos são adotadas:

Mas isso com certeza não é culpa dos adotados, e sim do preconceito que abate o Brasil, se tornando, neste caso, um dos países mais preconceituosos, na qual a cor de pele é um diferencial para o amor maternal e paternal.

A Constituição Federal 1988 é clara ao dispor, no artigo 227, que é dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, sem diferenciação de qualquer etnia, os seguintes direitos e garantias: vida, saúde, alimentação, educação, lazer, profissionalização, cultura, dignidade, respeito, liberdade, convivência familiar e comunitária,

114

SILVEIRA apud WEBER, 2005, p. 98.

115 SILVEIRA, Gráfico nº5: Crianças cadastradas conforme a etnia. p. 109.

além de garantir-lhes segurança contra toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.

Nessa perspectiva, resta claro que se uma criança ou adolescente está fora do meio familiar, vivendo sob a proteção de uma instituição, por vezes com determinação judicial em ação de destituição do poder familiar, o caminho viável para que seus direitos e garantias estampados na Constituição se concretizem é a adoção.

Adoção traz para a criança e ao adolescente a esperança de ter pais, pais que o amem, que os eduquem, que os criem, que não os tratem com indiferença nem com discriminação, porém muitos, os chamados grupos preteridos a adoção, incluindo as crianças e adolescentes negras, nem chegam a ter a esperança, pois com uma sociedade injusta e preconceituosa em que vivemos a dita esperança chega à zero.

Segundo Silveira citando Fernandes a escolha do perfil do adotado pode fazer com que aumente expressivamente o preconceito racial:

Idealizar determinado perfil da criança pode significar uma maneira dos adotantes de expressar o preconceito racial, o qual significa todas as exteriorizações regulares do comportamento humano e todas as objetivações sociais que resultam ou conduzem a estereótipos (ou representações coletivas) baseados na crença de que as diferenças raciais, reais ou imaginárias, são as causas eficientes da desigualdade psíquica e social dos seres humanos.117

Assim, fica ainda mais claro que o problematização de não haver tantas adoções como relação aos grupos preteridos, não está em a criança ou adolescente ser de etnia negra ou não, e sim no preconceito que toma a frente quando o adotante vai em busca de um filho por meio da adoção.

E para demonstrar que o preconceito está na mente dos adotantes e não na cor de pele dos adotados, frisa-se os gráficos nº 7118 e nº 8 abaixo, em que os motivos e as taxas de não inserção da adoção é evidente quando se trata de crianças e adolescentes negras:

117 SILVEIRA, 2005, p. 115.

Gráfico nº8119

Os gráficos acima demonstram com clareza que há sim a discriminação racial ao se tratar dos institucionalizados, percebendo-se a percentagem do motivo e da taxa em que crianças e adolescentes negras não são as desejadas pelos adotantes, pois representa 65% e 75%, respectivamente.

Para concluir, fica evidente a necessidade da reformulação na consciência dos pretensos adotantes, firmando-se novamente que são os titulares da escolha, o que com relação a adoção significa a escolha de uma vida, lembrando-se que a opção pelo negro ou branco não interfere no resultado da adoção pois com a diferença é que se aprende a igualar.

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