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CONSIDERAÇÕES SOBRE JOGOS DIDÁTICOS

3.4 Criar, adaptar ou traduzir jogos didáticos surdos

Os jogos didáticos presentes na educação bilíngue e na formação de professores surdos, para o ensino com atividades didáticas, revelam a necessidade de se ter estratégias sobre o conhecimento, sobre como criar, adaptar ou traduzir os jogos didáticos surdos para o ensino dos estudantes surdos. É importante que se tenha já no ensino superior, ou no local de trabalho, contato com outros professores também surdos, a fim de estimular a produção e o uso de jogos didáticos. Infelizmente, ainda que existam esses materiais, são poucas as publicações sobre eles, elas são muito restritas. No caso dos professores surdos que atuam no ensino bilíngue, por exemplo, torna-se importante também o contato com outros surdos que produzam jogos, de modo que assim possam desenvolver o interesse pelos mesmos. Portanto, valorizar essas estratégias didáticas de criar, adaptar ou traduzir jogos didáticos para a cultura surda é interessante, o que pode também se concretizar nas buscas em sites, dicionários, dentre outras fontes que possam proporcionar o aprendizado.

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Conforme já foi dito, há dois tipos de jogos didáticos: os produzidos industrialmente, como aqueles feitos em gráficas, vendidos no mercado, aqueles constantes em revistas e livros e aqueles provenientes da internet, muitos em aplicativos. Vamos a eles:

a- criados (jogos inéditos e diferentes); b- adaptados (de jogos existentes);

c- traduzidos (de outras línguas ou culturas).

Outro tipo são os jogos produzidos manualmente pelos professores surdos que também apresentam semelhanças em seus elementos, sendo:

a- criados (jogos inéditos e diferentes);

b- adaptados (jogos existentes adaptados para a cultura surda); c- traduzidos (Português / Língua de Sinais).

No entanto, o que desperta o interesse por estes jogos criados, adaptados ou traduzidos pelo professor surdo é o elemento cultural, característico e específico, que o professor surdo imprime ao jogo didático surdo.

Vamos entrar agora nas atividades de criar, adaptar e traduzir em que o professor surdo exerce a escolha de jogos didáticos em geral e os transforma em jogos didáticos surdos.

A criação do jogo didático surdo é um momento que acompanha uma ideia, uma história, uma cultura. Por trás do jogo existe a ideia de utilizar o jogo, a fim de proporcionar o lúdico ao estudante surdo no processo de ensino-aprendizagem, bem como um processo de construção do conhecimento em cuja estruturação todos os materiais e os jogos pedagógicos são objetos. Então, o professor surdo acrescenta a estes, os elementos culturais que contêm a relação entre cultura e identidade surda e outros artefatos culturais. Estes artefatos dão ao jogo didático o lúdico para o trabalho na escola bilíngue. Cabral (1998, p. 43) atenta para a simplicidade destas criações: “Os professores podem criar jogos semelhantes a partir dos materiais com que as crianças estejam já familiarizadas, como feijões, castanhas, conchas, caixas de fósforos, pedrinhas etc.”. Notamos, aqui, que a criação destes jogos didáticos é simples. O que importa é a agregação de ideias, estratégias, regras do jogo e ainda o aspecto cultural que o professor surdo imprime. Já Albres e Saruta (2012) indicam que outros materiais podem ser usados na criação de jogos didáticos:

“Os materiais didáticos têm uma abrangência maior, já que se tornam codificações de experiências potenciais com recursos organizados para aplicação em unidades de trabalho. Podem ser desenvolvidos utilizando a tecnologia, como gravação de vídeos ou, mesmo, cartazes, folhas avulsas com atividades para compor o portfólio do aluno.” (ALBRES, SARUTA, 2012, p. 43- 44).

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Ou seja, as tais criações podem, com uso de internet e outros instrumentos, constituir a criação de jogos mais qualificados, ou sofisticados, porém sempre com história, a ideia, as regras e o acréscimo do elemento cultural.

A importância de incluir os elementos culturais aos aspectos dos jogos didáticos contribui, como já dissemos, com o surgimento dos jogos didáticos surdos. Com isto, eles podem servir a vários fatores como: desenvolvimento da capacidade de raciocínio para os estudantes surdos, as experiências visuais e espaciais, contato com a cultura e identidade surdas, dentre outros. Isto permite que o foco do jogo didático surdo seja o mesmo da educação bilíngue. Desta forma, os professores surdos criam o jogo durante o processo de ensino-aprendizagem. E a mediação de seu espaço de trabalho faz com que criem aspectos lúdicos para os jogos didáticos surdos.

A importância do registro destas criações se faz presente, tendo em vista que tais jogos criados necessitam ser divulgados, disseminados e levados ao conhecimento de outros professores surdos.

Wanderley, em seu livro, registra alguns dos jogos criados por professores surdos, entre eles o jogo de boliche. O jogo criado consistia no uso de 6 garrafas plásticas (de refrigerante) onde se aplicaram números em SignWriting de 1 até 6. As regras do jogo são: colocar as garrafas em fila e jogar uma bola. Se cai uma garrafa o estudante surdo registra o número da garrafa em SignWriting no quadro. No caso de caírem duas, registra os dois números. Tal jogo se presta também para perguntar: que numero é este? E a partir daí fazer a adição, ajudando na formação do conceito de matemática. O jogo possibilita também que o estudante adivinhe palavras, cuja configuração da mão leva o sinal da garrafa que caiu. De tal jogo, segundo a autora, “foi pedida, diariamente, pelos estudantes surdos a sua repetição em sala de aula.” (WANDERLEY, 2015, p. 104).

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Wanderley também cita Huizinga (2010), onde comenta sobre o jogo e sua potência de repetição.

“Mesmo depois de o jogo ter chegado ao fim, ele permanece como uma criação nova do espírito, um tesouro a ser conservado pela memória. É transmitido, torna-se tradição. Pode ser repetido a qualquer momento, quer seja “jogo infantil” ou jogo de xadrez, ou em períodos determinados, como um mistério.” (HUIZINGA, 2010, p. 13).

Esta colocação de Wanderley sobre a repetição de um jogo didático atesta o quanto um jogo criado por professor surdo tem valor como jogo cultural e como é um achado de valor para o estudante surdo.