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2 SANÇÕES CIVIS E TUTELA PENAL DA RESPONSABILIDADE ADMINISTRATIVA

2.2 CRIME DE PREFEITOS

A responsabilidade dos Prefeitos foi objeto de uma lei específica, a Lei n.° 3.528, de 3 de janeiro de 1959, a qual, depois de

tipificar as condutas qualificadas como crime de responsabilidade (em seu art. 1º), dizia, em seguida, que a punição pelo cometimento de crime de responsabilidade (perda do cargo e inabilitação para o exercício da função) não impediria o processo e julgamento por crime comum “perante a Justiça ordinária”, quando a mesma conduta também fosse tipificada como infração penal156.

Importante é salientar, diz Dallari, que a Lei n.° 3.529/59 estipulava que a competência para disciplinar o processo e julgamento dos Prefeitos era de legislação estadual, mas que, na inexistência de lei estadual, aplicar-se-iam, no que fossem cabíveis, as normas estabelecidas na Lei n.° 1.079/50.

O Código Penal está em vigor, cuidando dos crimes contra a Administração Pública, que podem ser cometidos, inclusive por Prefeitos. O Prefeito pode perfeitamente ser julgado, pelo Tribunal de Justiça, no caso de cometer peculato, emprego irregular de verbas, concussão, prevaricação, tudo isso não é crime de responsabilidade; tudo isso é crime comum que o Prefeito pode cometer e ser julgado pelo Poder Judiciário.

Segundo Dallari é forçoso, entretanto, admitir uma sobrevida do Decreto-Lei nº 201, apenas em função do seguinte: como a responsabilidade é elementar, não pode, por falta de uma legislação

156 DALLARI, Adilson Abreu. Crime de responsabilidade do prefeito. Revista do Tribunal de Contas do

específica, o Prefeito ficar incólume. Não é porque não se tenha editado lei municipal que ele não pode ser responsabilizado. Supletivamente, se não houver lei municipal, pode-se tomar os tipos previstos no Decreto-Lei nº 201, mas o julgamento continuará sendo, de qualquer forma, feito pela Câmara Municipal, pela simples e pura razão de que crime de responsabilidade não é infração penal; é infração político-administrativa.

Como conclusão, cabe afirmar, com absoluta segurança, que o art. 29 da Constituição Federal (que diz competir ao Tribunal de Justiça o julgamento dos Prefeitos), deve ser entendido corretamente no seguinte sentido: compete ao Tribunal de Justiça o julgamento dos Prefeitos, no caso de crime comum157.

Na sistemática constitucional, onde fica claro que crime de responsabilidade não é infração penal, mas infração político- administrativa, os crimes de responsabilidade dos Prefeitos devem ser definidos pela lei municipal e julgados pela Câmara de Vereadores. O Supremo Tribunal Federal, em recente decisão, tomada em sessão do Pleno e por unanimidade, revisou sua jurisprudência relativa à responsabilidade penal dos Prefeitos, assentando que ela independe de se achar a autoridade no exercício do governo municipal.

As responsabilidades dos Prefeitos, conforme leciona Hely Lopes Meirelles, podem ser encaradas sob tríplice aspecto: penal, político-administrativo e civil, “visto que no desempenho das suas

funções, poderá incidir em qualquer desses ilícitos, dando ensejo à

respectiva sanção, aplicada em processos distintos e

independentes158”.

O art. 52 da Lei n.° 10.257/2001 enuncia que qualquer agente

público, especialmente o prefeito, incorre em improbidade

administrativa quando se descumprir ou não atender aos comandos do Estatuto. Preliminarmente, assinale-se que o Estatuto da Cidade parece ter previsto diferentes formas de responsabilização quer se trate de agente público, quer de particulares. Os últimos poderão ser atingidos por ação civil pública, consoante previsão do art. 54, que teve por efeito alterar o art. 4º da Lei n.° 7.347/1985. Os primeiros, especialmente por improbidade administrativa, notadamente os chefes do Poder Executivo Municipal, os prefeitos159.

Paulo de Barros Carvalho160 discorre que não há como se

destacar a priori a possibilidade de o particular ser o agente passivo de ato de improbidade administrativa em casos de lesão à ordem

158 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito municipal brasileiro. Boletim Legislativo Rio de Janeiro, n.° 28,

1992, p. 643.

159 DALLARI, Adilson Abreu; FERRAZ, Sergio. Estatuto da cidade e improbidade administrativa. São

Paulo: Malheiros, 2002, p. 367.

160 CARVALHO, Paulo de Barros. Direito tributário – Fundamentos jurídicos da incidência. São Paulo:

urbanística, e assim, ao patrimônio público, amplamente considerado. Isto porque o art. 3º da Lei nº 8.429/92 é explícito ao dispor:

Art. 3.°: “As disposições desta Lei são aplicáveis, no que couber, àquele que, mesmo não sendo agente público, induzo ou concorra para a prática do ato de improbidade ou dele se beneficie de qualquer forma direta ou indireta”.

Naturalmente que a participação de comunidades, movimentos e entidades da sociedade civil na gestão dos instrumentos urbanísticos são necessários não só para conferir a legitimidade à implantação da nova realidade legal, como, sobretudo para fiscalizar e regular a aplicação dos recursos públicos envolvidos nessa operação. Nessa medida seria temerário contemplar como ato de improbidade a conduta de dirigente municipal que impedisse ou deixasse de garantir a participação da comunidade, movimentos de sociedade civil e congênere, sem que, previamente, essa participação estivesse plenamente delimitada, com todos os seus balizamentos definidos161.

O inciso II do art. 52 contempla a hipótese de improbidade administrativa caso o prefeito deixe de proceder, no prazo de cinco anos, ao adequado aproveitamento do imóvel incorporado ao patrimônio público, conforme o disposto no § 4º do art. 8º da lei.

Para bem compreender a norma do art. 52, II, é preciso estar atento ao art. 182, § 4º, da Constituição Federal, bem assim ao

161 BONAVIDES, Paulo. Teoria constitucional da democracia participativa. São Paulo: Malheiros,

princípio da função social da propriedade, que se deseja ser concretizado a qualquer custo.

Nelson Saule Júnior162 O Estatuto da Cidade veio integrar a

vontade constitucional, oferecendo ao Poder Público Municipal a possibilidade efetiva de fazer valer os instrumentos urbanísticos do parcelamento e edificação compulsórios, IPTU progressivo no tempo, desapropriação com pagamento mediante títulos da dívida pública, de emissão previamente aprovada pelo Senado Federal, com prazo de resgate de até dez anos, em parcelas anuais, iguais e sucessivas, assegurados o valor real da indenização e os juros legais.

Assim, a visibilidade e controle na movimentação e destino dos recursos públicos e privados concernentes à operação é medida que não só atende ao interesse público e ao princípio da transparência, mas se impõe como um imperativo democrático na gestão da cidade. Conquanto a questão seja tormentosa e de algum modo se enquadre no antigo problema da “irresponsabilidade do legislador” crê-se que há plausibilidade na tese de responsabilização dos agentes políticos se restar comprovada omissão dolosa passível de ser individualizada. Mas reconhece-se que a regra é dirigida de modo especial ao prefeito municipal.

162 SAULE JÚNIOR, Nelson. Direito à cidade – trilhas legais para o direito às cidades sustentáveis.

Paulo Brossard163 comenta que o Supremo Tribunal Federal,

em recente decisão, tomada em sessão do Pleno e por unanimidade, revisou sua jurisprudência relativa à responsabilidade penal dos prefeitos, assentando que ela independe de se achar a autoridade no exercício do governo municipal. A jurisprudência sazonou e assentou que a apuração da responsabilidade criminal do prefeito nada tem com o exercício atual do mandado; o crime é que tem de ter sido praticado pela autoridade enquanto autoridade, ou seja, no exercício do mandato, até porque se trata de delicta in officio.