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PROIBIÇÃO DE CONTRATAR COM O PODER PÚBLICO OU RECEBER INCENTIVOS FISCAIS OU CREDITÍCIOS

2 SANÇÕES CIVIS E TUTELA PENAL DA RESPONSABILIDADE ADMINISTRATIVA

2.4 SANÇÕES PREVISTAS NA LEI 8.429/

2.4.6 PROIBIÇÃO DE CONTRATAR COM O PODER PÚBLICO OU RECEBER INCENTIVOS FISCAIS OU CREDITÍCIOS

A proibição de contratar com o Poder Público e receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios é providência de idêntica natureza jurídica, porém implica suspensão temporária do exercício de direitos por aqueles (as pessoas referidas nos artigos 2º e 3º) ato de improbidade administrativa, impedindo que possam negociar com a Administração Pública direta, indireta ou fundacional, receber valores públicos ou beneficiar-se dos instrumentos de extrafiscalidade, quando demonstraram sério desvio ético de conduta no trato da coisa pública.

Tem singular eficácia contra o particular beneficiário da improbidade administrativa, mesmo que não tenha causado dano ao erário, o que é muito significativo, na medida em que dele se exige a observância dos princípios éticos e jurídicos da Administração Pública nas relações jurídicas entre eles mantidas.

Essa suspensão é absoluta, irradiando-se para todo e qualquer nível de governo (federal, estadual e municipal) e de Administração (direta, indireta, fundacional). O ressarcimento do dano não cessa sua eficácia. A vedação admite a forma indireta, exemplificando a lei que se aplica “ainda que por intermédio da pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário”, de modo que é plenamente cabível nos casos de sucessão societária, consórcios, sociedades em conta de participação, etc.. Embora seja aplicável à pessoa jurídica também, nada impede sua incidência sobre seus sócios com o emprego da teoria da desconstituição da personalidade jurídica209.

Emerson Garcia210 assevera que anteriormente à celebração de qualquer contrato, é aconselhável que seja aferida a idoneidade das partes, o que representa relevante fator de segurança para o cumprimento das avenças de natureza onerosa. O Poder Público, em que pese dissociar-se do princípio da legalidade em certas ocasiões, sempre terminará com adimplir as obrigações pecuniárias que

209 ORTIZ, Carlos Alberto. Improbidade administrativa. Cadernos de Direito Constitucional e Eleitoral,

Imprensa Oficial do Estado de São Paulo, v. 28, p. 17.

estiverem a seu cargo, sendo vários os instrumentos existentes para compeli-lo a tanto.

Explica o autor que no que concerne ao pólo oposto da relação obrigacional, deverá ser ocupado por quem demonstre possuir retidão de conduta compatível com a natureza do contrato e do seu destinatário final. Essa característica, prima facie, não será encontrada naquele que infringiu os princípios da legalidade e da moralidade, vindo a praticar atos de improbidade em detrimento do interesse público. Assim, é plenamente justificável que lhe seja defeso contratar com o Poder Público.

Essa sanção foi cominada nos três incisos doa RT. 12 da Lei n.° 8.429/92, sendo estatuído que o enriquecimento ilícito acarretaria a proibição de contratar por dez anos (inc. I), o dano ao erário por cinco anos (inc. II) e a violação aos princípios regentes da atividade estatal por três anos (inc. III). Além do aspecto da segurança das relações jurídicas a serem estabelecidas, não deve ser olvidado o nítido caráter punitivo de tal disposição, importando em penalidade pecuniária de ordem indireta, pois o ímprobo não poderá auferir qualquer benefício advindo de uma relação contratual com o ente estatal, explica Fábio Medina Osório211.

A proibição de contratar deve ser dispensada de uma interpretação condizente com a extensão atribuída a essa sanção pelo texto legal, abrangendo todos os contratos passíveis de serem estabelecidos com o Poder Público, que sejam unilaterais ou bilaterais, onerosos ou gratuitos, comutativos ou aleatórios. O ímprobo não poderá, igualmente, receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios em lapso que variará em conformidade com a natureza do ato de improbidade praticado. A exemplo da proibição de contratar com o Poder Público caracterizam-se como sanções pecuniárias de ordem indireta.

Regra geral, a obrigação tributária atinge a todos que sejam considerados responsáveis pelo crédito tributário advindo do implemento do fato gerador, o que é consectário do próprio princípio da isonomia. Em muitos casos, referida obrigação, de natureza principal ou acessória, bem como o crédito tributário dela resultante, podem sofrer atenuações sempre que concorrerem determinados fatores, dentre eles, os benefícios ou incentivos fiscais. Estes, a exemplo dos incentivos creditícios, se caracterizam como instrumentos utilizados pelo Poder Público para implementar o desenvolvimento de determinado território ou de certa atividade, bem como para corrigir desigualdades ou recompor a ordem econômica e social. Vários são os tipos de incentivos fiscais passíveis de serem concedidos aos contribuintes, podendo ser mencionados a isenção, a redução de alíquota e a dedução do crédito tributário ou da base de cálculo, sendo

que a extensão destes variará em conformidade com a legislação que os instituir.

Tratando-se de benefícios ou incentivos incondicionais, em que não é exigido do interessado o preenchimento de requisitos especiais, ou determinada contraprestação, inexistirá óbice a que o ímprobo venha auferi-los, pois referidos benefícios, em verdade, não representam privilégios, mas medida de política fiscal adotada em prol da coletividade, sendo concedidos de forma genérica. Deve-se observar que o entendimento contrário ensejaria o surgimento de múltiplos questionamentos sem solução adequada212.

Quanto à proibição de receber incentivos creditícios, ela veda a realização de empréstimos, financiamentos e doações ao ímprobo, os quais como, contrato que são, já estariam abrangidos pela proibição de contratar com o Poder Público. A exemplo da suspensão dos direitos políticos são sanções de efeitos temporários, mas que geram graves conseqüências de ordem econômica.

Aplicadas as sanções ora estudadas, será proibido ao ímprobo contratar com o Poder Público ou receber incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de

pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário. A parte final da oração

denota claramente a preocupação do legislador com os artifícios normalmente utilizados para se contornar a restrição imposta.

Em razão disto, não só o ímprobo, como também as pessoas jurídicas de que faça parte como sócio majoritário, ou mesmo as pessoas, físicas ou jurídicas, que sejam interpostas entre ele e o benefício almejado, sofrerão os efeitos da sanção. Na primeira hipótese, tem-se uma nítida variante da teoria da desconsideração da personalidade jurídica (disregard of legal entity), sendo afastada a existência independente desta e, ex vi legis, presumida a utilização de sua personalidade para contornar a restrição que acomete o ímprobo.

Note-se que o dispositivo legal não dispõe em dúvida a diferença de personalidade da sociedade e de seus sócios, mas visa a impedir a consumação de uma fraude manifesta. Ainda que o ímprobo seja sócio minoritário da sociedade, será possível a desconsideração da personalidade jurídica, o que exigirá prova de uma possível simulação, com a conseqüente demonstração de que aquele que comanda a sociedade através de interpostas pessoas.