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A criminologia crítica como condição de possibilidade para a construção de um modelo de controle social pautado na proteção/promoção dos direitos humanos

3 AS POLÍTICAS CRIMINAIS BRASILEIRAS CONTEMPORÂNEAS E A CRIAÇÃO DE UM ESTADO DE EXCEÇÃO

4 O RESGATE DO DISCURSO DA CRIMINOLOGIA CRÍTICA COMO CONDIÇÃO DE POSSIBILIDADE PARA A CONTRUÇÃO DE UM MODELO DE CONTROLE

4.2. A criminologia crítica como condição de possibilidade para a construção de um modelo de controle social pautado na proteção/promoção dos direitos humanos

“As pessoas que têm religião devem alegrar-se, pois nem a todos é dado o dom de acreditar nas coisas divinas. Necessariamente, nem se precisa temer castigo depois da morte; purgatório, céu e inferno são coisas que muita gente não consegue aceitar, mas afinal uma religião, seja ela qual for, conserva a pessoa no caminho reto. Não é o temor de Deus, mas o sustentáculo de nossa própria honra e consciência. Que maravilha se as pessoas, todas as noites, antes de dormir recapitulassem mentalmente os acontecimentos do dia que passou e considerassem o que haviam feito de bom e de mau. Então, mesmo sem perceber, tentariam aperfeiçoar-se, ao começar um novo dia; é claro que se consegue muito, com o correr do tempo. Qualquer um pode fazer isso, não custa nada e, certamente, ajuda muito. Quem não sabe precisa aprender a descobrir, pela experiência, que uma consciência em paz torna as pessoas fortes.”

O Diário de Anne Frank (2016).

Em sua obra, Batista (2007, p. 1) coloca uma questão que é fundamental para dar início à discussão que este tópico propõe: “devemos servir à manutenção da ordem do capitalismo de barbárie ou servir de dique utópico contra esta ordem?”

Do que foi salientado até o momento, pontua-se que o Direito Penal percorreu caminhos de radicalidade, altamente capitalistas, por influência burguesa, afastando-se do que impõem

os ideais democráticos, de liberdade e dignidade da pessoa humana, e ainda, amalgamando princípios internacionais de Direitos Humanos. Neste emaranhado de ideias, Batista (2007) traz à baila a doutrina de Rosa Del Olmo (1975), empreendendo acerca da descolonização ideológica da Criminologia, no intuito de compreender uma certa internacionalização do controle social dos resistentes – demonstrando que a partir dos anos 1970, as necessidades sociais das classes dominantes vão “deformar” a antropologia criminal, institucionalizando, assim, o que é útil para as sociedades e descartando aquilo que não serve.

No cenário brasileiro contemporâneo, Carvalho (2013, p. 227) realça o autoritarismo presente no âmbito do sistema penal, no sentido de que a órbita da repressão e da punição, inseridas pela dinâmica do controle estatal, “ao invés de estar associada às garantias e em respeito aos direitos das pessoas, demonstra radical potência para romper com a legalidade, produzindo ofensa aos direitos humanos de todos os envolvidos”.

Diante disso, pontua-se que a Criminologia adotou uma faceta radical ao repudiar qualquer estratégia de mudança como sendo de índole burguesa, distanciando-se da bandeira dos Direitos Humanos, ainda que esta fosse uma importante estratégia de contenção da violência estatal. Por este viés, o resgate dos Direitos Humanos proporcionaria a “efetivação de algumas pautas criminológicas [...] e dessa forma uma dinâmica de luta popular pela diminuição da violência estrutural e institucional, além de permitir a criminologia sair de seu encerramento e isolacionismo acadêmico – constituição da criminologia em práxis transformadora.” (LEAL, VECHI, 2016, p. 241).

A perspectiva do poder engloba a esfera do paradoxo subhumano. Para Zaffaroni (1988, p. 160), a criminalização do outro permeia a índole europeia, do colonizador que subjuga o estereótipo da raça, da cultura e da brasilidade:

El colonizado y el agresivo pobre de Europa — indisciplinado y huelguista — eran ‘malos’ y, por ende, ‘feos’. No importaba, en el fondo, la ‘raza’ sino que ambos eran igualmente antiestéticos, y esa fue la imagen que se proyectó públicamente sobre la burguesía central en los folletines de la época y que internalizaron sus policías y jueces al tiempo que reprimían las huelgas y eran agredidos por atentados anarquistas. La ‘fealdad’ del pobre era la que regía el estereotipo con el cual salían las ‘perreras’ a dar caza a los enemigos de la burguesía y a enjaularlos en sus cárceles o en sus manicomios. La ‘fauna’ carcelaria y manicomial servía, a su vez, para reforzar el ‘natural’ sentimiento de superioridad burguesa: ellos eran los ‘lindos, esbeltos y barbados’ , lánguidos en las escenas mundanas, coloridas, con la armonía cromática exquisita y dinámica en permanente cambio.

Em síntese, Leal e Vechi (2016) destacam que o repensar da Criminologia Crítica para o século XXI age no intuito de resgatar a função de desvelamento, aproximando-se de uma conscientização em relação ao funcionamento do Sistema Penal – considerando a capacidade

de interferir nas relações sociais, no domínio dos corpos para a formação (permanente) de um estado de exceção. O arcabouço político-criminal alarga-se na sociedade e, através de uma violência institucional, justifica atos pelas vestes da defesa social e marginaliza “determinados” indivíduos, assinalando-os como alvos no presente estado de exceção. Vera Malaguti Batista (2007, p. 03) conceitua o realismo marginal, trasladando a questão para a realidade brasileira, ao problematizar “os desafios dos direitos humanos em um contexto de militarização e de gestão acrítica da segurança pública, no qual a contenção do poder punitivo se faz fundamental”. Neste ínterim, o resgate da Criminologia Crítica na realidade brasileira vem ao encontro de iniciativas difundidas no âmbito internacional, eis que, analisado o contexto, verifica-se que

a experiência internacional com políticas de segurança pública e as evidências encontradas pelas ciências sociais, pode-se afirmar que as inovações mais significativas introduzidas nessa área, nas últimas três décadas, foram aquelas que tornaram possível a redução do crime e da violência a partir de abordagens preventivas. (ROLIM, 2007, p. 40)

Contrariamente a finalidade primordial do Direito Penal, observa-se que a criminalização, em sua atual estrutura, ratifica o modelo de encarceramento em massa, praticado contra os excluídos e marginalizados no Brasil. Sobre essa política punitiva, Luz e Ferro (2013, p. 03) versam que a adoção de medidas por parte dos Estados associada está com “violência, criminalidade, pobreza (e no caso da maior parte dos países europeus a imigração) e o discurso alarmista midiático uma percepção distorcida de insegurança social provocando uma sensação de insegurança que identifica em determinados segmentos da sociedade”. Interligar o aumento da criminalidade com um contingente populacional, fixando inimigos na sociedade, espraia a ideia de um direito penal do autor.

Em consonância ao que foi estruturado no tópico anterior, a Criminologia Crítica procura desvencilhar-se do paradigma etiológico, adentrando nas causas políticas da criminalidade – o caráter estrutural do mercado capitalista. Juarez Cirino dos Santos (2015, n/p.) toma o Direito Penal como um sistema dinâmico de funções, vinculado à estrutura das relações de produção e de distribuição de mercadorias, particularizando-o conforme as formas (artificiais) políticas e jurídicas sustentadas pelo Estado:

a) definição legal de crimes e penas (criminalização primária), com seleção de tipos legais que protegem valores estruturais e institucionais das classes e categorias sociais hegemônicas da formação social, concentrando a criminalização em condutas lesivas das relações de produção e de circulação de mercadorias; b) aplicação judicial da lei penal (criminalização secundária), com seleção dos sujeitos criminalizados pela posição de classe subalterna, com maior probabilidade para os segmentos sociais marginalizados ou em posição precária no mercado de trabalho; c) execução penal

(regime carcerário), momento culminante dos processos seletivos de estigmatização e de exclusão social, como mecanismo de garantia das desigualdades da relação capital/trabalho assalariado (fundada na separação trabalhador/meios de produção), e de produção de um setor de marginalizados, recrutado do excedente de mão de obra ociosa, inútil para a reprodução ampliada do capital – mas útil para mostrar o que pode acontecer aos que se recusam à socialização nas condições de trabalho assalariado.

A dogmática do Sistema Penal, é, portanto, mais um modo de (re)produção capitalista. Com tal característica, o autor sustenta que “o Direito é o meio de organização da economia política, do Estado Moderno e das relações entre ambos” (SANTOS, 2015, s/p.). Sobretudo, introduz ao estudo a lógica interna que vincula as relações econômicas (estrutura), políticas e jurídicas (superestrutura) da formação social, ao destacar que o Direito “trabalha” com a teoria simbólica do consenso, atuando diante dos conflitos a partir da linguagem universal da razão, qual seja: “que protege a liberdade, a igualdade e o bem comum e, assim, não só oculta as contradições de classe da sociedade, mas revela a forma jurídica como ideologia mistificadora, mediante a união abstrata de contradições sociais concretas” (SANTOS, 2015, s/p.). Distanciando-se desta “conformidade” em relação à atuação do Direito Penal, Santos (2015) revela a teoria do conflito (de classes), na contramão de tudo aquilo que explicava/justificava as causas da criminalidade, explicando as contradições existentes entre as classes sociais, no entorno da estrutura econômica de produção e circulação de mercadorias, considerando o objetivo de lucro mediante a congruência da mais-valia.

De fato, a Criminologia Crítica desperta a dialética instaurada pela forma legal do Direito, por intermédio do Sistema coercitivo de Justiça Criminal, no momento em que escancara “a desigualdade social entre a classe capitalista (proprietária dos meios de produção e circulação) e a classe trabalhadora (possuidora de força de trabalho, vendida ao capitalista pelo preço do salário).” (SANTOS, 2015, n/p.). A atuação do Estado fundamenta esta sociologia do conflito, pois naturaliza o controle e a ordem, conduzindo a sociedade na (re)produção do capitalismo como modo de bem viver, sustentando as nuances antagônicas da desigualdade social em detrimento do poder econômico. Tudo isso interligado está com a “dominação política (a submissão do trabalhador ao capitalista) e as relações de apropriação jurídicas (a expropriação legal de mais-valia) da formação social capitalista” (SANTOS, 2015, n/p.).

No leito de agonias que se aproxima o Sistema Penal, Alessandro Baratta (2004, p. 158) sustenta que a atual fase de desenvolvimento capitalista norteia um interesse de classes, elitistas e/ou burguesas – que opera em sacrífico das culturas subalternas. Em contraponto ao que vem sendo construído sugere um paradigma “a partir do qual se coloca uma teoria social comprometida, não na conservação, mas na transformação positiva, ou seja, emancipadora da realidade social” (BARATTA, 2004, p. 158). Considerando o interesse disposto na escala social

e a utilidade de tais classes subalternas para o avanço do sistema político-econômico, a força empreendida para a (re)estruturação do cenário compromete uma motivação entre a Ciência Penal e a questão social.

Nos embalos “liberais” do Direito Penal, levanta-se um momento dinâmico material do movimento da realidade. Nas palavras de Baratta (2004, p. 158), suscita-se uma “teoria da sociedade dialeticamente comprometida no sentido supradito, é uma teoria materialista (isto é, econômico-política) da realidade, que encontra as suas premissas, em particular ainda que não exclusivamente na obra de Marx.” Sobretudo, livrando-se das amarras e premissas que impõem ao que está em curso numa dogmática teórica voltada para a construção de um inimigo no Sistema Penal, a Criminologia Crítica traz à baila a esfera da criminalização.

Para Nilo Batista (1990, p. 49), há uma abundância de Sistema Penal que não conversa com a questão do Direito, em razão de uma duvidosa política-criminal que sustenta o sistema, limitada na agudez do capital no “duvidoso emprego revolucionário (quando a uma abundância do penal corresponde notável escassez de direito), o direito penal não é instrumento adequado para transformações sociais”. A tendência em criminalizar corresponde à uma ordem social, disciplinadora e usurpadora de corpos, que, de modo internamente excludente e discriminatório, utiliza-se do aparelho estatal para servir aos interesses classistas. Do desvelar desta notória ordem político-social, compreende-se o pressuposto ato de criminalizar – em toda a sua origem histórico-política classista, principalmente, no que concerne à marginalização de populações, observando que todo o

esforço teórico crítico e desmistificador do direito (que na América Latina recebeu excelentes contribuições, entre as quais os trabalhos de Novoa e Zaffaroni) revelou suas funções legitimadoras e conservadoras. A pesquisa criminológica demonstrou que ambiciosas pedras angulares de muitas concepções (por exemplo, a intimidação pela ameaça penal, ou a ressocialização carcerária) não passaram de fantasias, capazes de articular uma lógica penalística e desatar concretos sistemas de controle social penal, porém simplesmente sem existência social. As limitações hoje impostas no conceito de prevenção geral são bem representativas do caráter místico da maior parte das racionalizações penais. (BATISTA, 1990, p. 49)

A respeito do exposto, alvitra-se a possibilidade da construção de um modelo de controle social pautado na proteção/promoção dos Direitos Humanos. Conquanto, o caráter de um modelo de identificação para com o outro, contraria as expensas da segurança e da pretensão autoritária do controle estatal. O estado de exceção foca-se na decapitação de sujeitos indóceis, ainda que meramente ocasionais, quando dispostos pela política da “defesa social”, no intuito de garantir a harmonia entre os corpos domáveis, aqueles obedientes à ordem, sinalizados como “cidadãos de bem” por excelência, diante de tal “indignidade das classes perigosas”.

Os degenerados, praticantes da delinquência habitual, não merecem a magnitude do (sobre)viver, qualquer que seja a origem/finalidade do delito, eis que praticante da má vida (ZAFFARONI, 2016). Corroborando esta posição nazi-fascista de penalização do homo sacer, Zaffaroni (2016, p. 109, grifos do autor) expõe que “na América Latina as medidas de contenção para os inimigos ocupam quase todo o espaço de ação do sistema penal em seu aspecto repressivo, por via da chamada prisão ou detenção preventiva, provisória, ou seja, o confinamento cautelar, a que estão submetidos ¾ dos presos da região”. Ora, o Estado opera através destas medidas, em nome da prevenção da criminalidade, exercendo de forma progressista ao encarceramento em massa,

uma vez posto em marcha este processo, todos passam a ser tratados como inimigos, através de puros confinamentos de contenção, prolongados ou indefinidos. Embora seja verdadeira a íntima relação do direito processual penal com o direito penal, pois todos sabemos que o direito penal não toca sequer em um fio de cabelo do delinquente, que o sismógrafo do direito penal liberal é o direito processual e que o debate não pode deixar de ingressar na doutrina do direito processual penal, na qual também se batem belicistas contra pacifistas, em nossa região as elaborações no âmbito do direito processual são as que legitimam os confinamentos cautelares e esgotam a maior parte do exercício do poder punitivo repressivo. (ZAFFARONI, 2016, p. 109-110, grifos do autor)

Há que falar, portanto, de regulamentações penais no âmbito do direito processual, pois, impregnada está na legitimidade do Direito Penal, um sistema que criminaliza antes da condenação, operando sobre determinados corpos, travestido de medida de segurança.

O Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias (Junho/2016), a Secretaria Nacional de Segurança Pública (Junho/2016) e o Fórum Brasileiro de Segurança Pública (Dezembro/2015), configuram esta sistemática, tendo em vista que a população carcerária de presos sem condenação é de 40,2% e a taxa de aprisionamento até Junho de 2016 foi de 352,6 pessoas presas para cada 100 mil habitantes brasileiros.

Configurado o sistema binário do bem e do mal, o Sistema Penal não conhece o sujeito, tampouco persevera no sentido da argumentação, pois aquele definido como o inimigo pode ser qualquer coisa, desde que confinado às consequências jurídicas. O gosto da punição assimila- se ao da guerra, em um permanente estado de exceção, cuja natureza do ato é substituída pela expiação, tendo em vista o perigo que a aceitação do homo sacer representa na sociedade.

A ordem jurídica de paz e segurança segrega raças e confina corpos, amontoando-os no cárcere, subjetivando as premissas jurídicas do Direito Penal, reconhecendo a ilegitimidade de condutas pelo encantamento do horror.

Dialogando com a arte, um trecho de “A carne, a morte e o diabo na literatura romântica”, obra de Mário Praz (1996), retrata a condição do moribundo em relação à sociedade e suas astúcias vingativas, numa espécie de massacre em espetáculo, a vibração de todos e o paradigma da consternação:

A dor e o prazer se combinam numa única impressão nesses versos: dos mesmos motivos que deveriam gerar aversão – o vulto lívido do busto, o emaranhado das víboras, o rigor da morte, a luz sinistra, os animais asquerosos, o sardão e o morcego – brota um novo sentido de beleza traiçoeira e contaminada, um novo calafrio. (PRAZ, 1996, p. 44)

No êxito desta sistemática, (re)pensar o Sistema Penal na esfera dos Direitos Humanos, aduzindo-o para uma condição humana, ao afastar a mão do carrasco para exaltar a heterogeneidade do contexto social, parece ser “a saída” plausível deste sistema inquisitório. A construção deste modelo político-criminal de aniquilação do outro desconhece as virtudes de um direito humanitário, eis que voltado para a acumulação do capital. Assim, questiona-se, quão apertadas são as amarras do desenvolvimento político-econômico?

Ah! Desgraçados!

Um irmão é maltratado e vocês olham para o outro lado? Grita de dor o ferido e vocês ficam calados?

A violência faz a ronda e escolhe a vítima,

e vocês dizem: ‘a mim ela está poupando, vamos fingir que não estamos olhando’. Mas que cidade?

Que espécie de gente é essa?

Quando campeia em uma cidade a injustiça, é necessário que alguém se levante.

Não havendo quem se levante,

é preferível que em um grande incêndio, toda cidade desapareça,

antes que a noite desça.41

Pela lógica da disparidade social, Brecht (2012) assinala que aqueles que já comeram não se preocupam com a fome do outro. Isso não serve somente para a fome, isso serve para a vida. Aquele que disfruta da amplitude da servidão, em bens e regalias, não ocupa sua capacidade mental com as margens da realidade social. Neste sentido, o autor (2012, n/p.) sustenta que “Do rio que tudo arrasta, diz-se que é violento. Mas ninguém chama violentas às margens que o comprimem”. Quando apresentados à realidade do outro, o ser humano exalta sua condição rude, política e dominadora – de modo grosseiro, pacifista, no lugar comum que

aceitou de boa-fé para usufruir do que é (dis)posto, despreocupado em relação àqueles que morrem.

No seio da brasilidade contemporânea, a disparidade existente entre bons e ruins prevalece. Antunes (2015, p. 08) destaca que “a sociedade civil, em colaboração com o Estado, auxiliou na formulação de diversas políticas e aprimoramentos institucionais no campo da justiça criminal, da segurança e dos direitos humanos nos últimos anos”.

Ademais, cabe salientar que nesta guerra ao criminoso (cujo modelo contorna uma caça às bruxas) surgem “grupos organizados da sociedade civil que tem por objetivo promover os direitos humanos e assegurar mecanismos democráticos de transparência e controle social sobre o poder e as políticas públicas.” (ANTUNES, 2015, p. 08).

Tratam-se de ações com potencial para efetuar transformações concernentes ao sistema de política criminal imposto pelo controle estatal e suas instituições, no cenário brasileiro, podemos destacar exemplos como a Lei Federal nº 9.299/1996, que transferiu da Justiça Militar para a Justiça Comum a competência para o julgamento de políticas militares acusados de crimes dolosos contra a vida, a Lei Federal nº 9.455/1997 que tipifica o crime de tortura, a instituição do Programa Nacional de Direitos Humanos em 1996, que foi revisado e atualizado em 2002, a criação da Secretaria Nacional dos Direitos Humanos em 1997, vinculada ao Ministério da Justiça, posteriormente transformada em Secretaria de Estado e em Secretaria Especial dos Direitos Humanos, vinculada à Presidência da República (ANTUNES, 2015). Ainda, há que referir sobre a Emenda Constitucional nº 45 de 2004, referente à reforma do Poder Judiciário, no art. 109, parágrafo 5˚, que autoriza o deslocamento da competência para julgar violações de direitos humanos da Justiça Estadual para a Justiça Federal e o lançamento do Plano de Ação Integrada para Prevenção e Controle da Tortura no Brasil em 2005.

Destarte, a superação do Sistema Político-Criminal enfrenta a seletividade, a ordem de criminalização do outro, “a reprodução da violência, a criação de condições para maiores condutas lesivas, a corrupção institucionalizada, a concentração de poder”, eis que “a verticalização social e a destruição das relações horizontais ou comunitárias não são características conjunturais, mas estruturais do exercício de poder de todos os sistemas penais” (ZAFFARONI, 1991, p. 15). Características que tendenciam à queda do capitalismo, considerando que “mexem” na engrenagem da máquina socioeconômica ao restringir a atuação da ordem na seletividade estrutural:

O sistema de justiça criminal, do modo como está estruturado, dirige sua atenção a uma parte mínima da violência da sociedade através do conceito de criminalidade, elaborado por aqueles que detêm o poder de definição. Assim, dotado de uma

seletividade estrutural, caracterizada pela ‘discrepância entre os programas de ação previstos nas leis penais e as possibilidades reais de intervenção do sistema’, e também por uma orientação que restringe sua atuação a determinados delitos e delinquentes, com uma conotação social, ele está apto a dar apenas uma resposta penal simbólica e não instrumental ao fenômeno da criminalidade e à insegurança urbana. (ZACKSESKI, 2000, p. 01)

Às avessas do que deveria ser cultuado no horizonte penal, inclinam-se condutas