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Critérios de Utilização das Coleções do PNLD em sala de aula

TÍTULOS DAS COLEÇÕES

6. REPRESENTAÇÕES DAS PROFESSORAS SOBRE O PNLD

6.3 Critérios de Utilização das Coleções do PNLD em sala de aula

Esses critérios estão relacionados à quarta subpergunta de pesquisa. Desse modo, sobre a utilização do livro didático em sala de aula, foi possível perceber as representações expostas a seguir, dentro da categoria de Segmentos de Orientação Temática, SOT.

QUADRO 30 - Representações sobre Critérios de utilização das coleções do PNLD - Categoria SOT

Representações Participantes Enunciados

O livro é utilizado como ponto de apoio e referência, e único material disponível.

Natália

Cristina

Eu acho que até utilizo muito em sala com eles

como ponto de referência e gostei muito do Upgrade.

[...] é um ponto de apoio porque nós não

tínhamos anteriormente.

[...] mas infelizmente, é o único material que a gente tem na escola, sabe?

As unidades são selecionadas de acordo com o planejamento

Natália Então, a gente vai selecionando as unidades também. Então é isso que a gente faz.

O livro didático é utilizado para auxiliar os alunos na ortografia.

Natália [...] os alunos escrevem muito errado quando eles estão copiando do quadro.

A não utilização do livro é uma fuga.

Natália

Cristina

Atualmente, eu estou bem voltada para ele. Não vou dizer pra você que eu estou fugindo, assim; fujo [...].

Então, não tem como você fugir do livro.

As aulas são enriquecidas com outros materiais porque não existe um livro ideal, perfeito.

Sílvia Tenho utilizado, mas tenho enriquecido com

outras atividades porque o que eu percebo é que

não existe aquele material ideal, porque o ideal é impossível.

Todas as participantes afirmaram utilizar o livro didático. Pelo uso da modalização lógica, Natália evidencia essa utilização: “Eu uso muito em sala de aula com eles como ponto de referência”. Pelo uso da modalização deôntica “Por mais que eu queira”, revela a sua intenção de querer trabalhar todo o conteúdo do livro, e pelo uso de modalização lógica “é impossível, não tem como” , expõe a necessidade de selecionar o conteúdo, as unidades, de acordo com o planejamento feito por ela:

Eu acho que até utilizo muito em sala com eles como ponto de referência e gostei muito do Upgrade. A partir do momento em que a gente trabalha o primeiro ano, você já vai vendo o que é viável, de acordo com o seu planejamento também. Porque, por mais que eu queira trabalhar tudo que esteja no livro, é impossível, não tem como. Então, a gente vai selecionando as unidades também. Então é isso que a gente faz. (NATÁLIA).

A representação de Natália sobre a seleção de conteúdos de acordo com o planejamento e de acordo com “o que é viável”, o que é possível de ser desenvolvido em sala de aula corrobora a análise que apresentei sobre a extensão das unidades109 na coleção Upgrade. Devido a essa questão, seria importante que o Manual do Professor das coleções indicasse uma previsão do tempo a ser gasto na atividade, ou do número aproximado de aulas previstas para determinada unidade. Tal indicação poderia otimizar o tempo na sala de aula e auxiliar o professor no planejamento do curso, não sendo necessário que o professor primeiro utilizasse a coleção para somente depois perceber o que é possível de ser utilizado na coleção, pois não é possível a pilotagem do material, conforme recomenda Cunningsworth (1995).

O livro auxilia também os alunos na questão ortográfica, no entendimento da professora Natália. Ao utilizar a modalização lógica “Eles escrevem errado”, a professora atesta este fato. Novamente Natália reforça a ideia de segurança que o livro didático traz para ela no seu fazer pedagógico pelo uso da modalização lógica “é um ponto de apoio”, “é um ponto de referência”, levando em consideração, principalmente, seu regime de trabalho de 40 horas, dois cargos, duas disciplinas, totalizando trinta e seis aulas semanais, conforme mostrado no quadro do perfil das participantes da pesquisa. A representação do livro didático como apoio para o professor pode escamotear que esse material abrange visões de mundo, valores, concepções de língua(gem), metodologias de ensino e expectativas culturais e educacionais da sociedade (DAHER, SANT’ANNA, FREITAS, 2013).

Por outro lado, Natália se justifica por não utilizar todo o conteúdo do livro. Pelo uso da modalização lógica “eu estou fugindo, assim [...]”, entende que se ela não utiliza todo o

conteúdo tal como vem proposto no livro didático, ela não estaria cumprindo com a sua obrigação enquanto professora:

O livro didático, com certeza, é um ponto de apoio porque nós não tínhamos anteriormente, fazia falta porque você tem que... os alunos escrevem muito errado quando eles estão copiando do quadro, principalmente no início do trabalho com inglês. Então eles sentem dificuldade ao escrever, ao copiar e o livro já possibilita essa questão, já nos ajuda nesse sentido. A questão de material também porque, na escola pública, a gente não tem, no Ensino Médio, geralmente, os alunos não trazem material, a não ser que o professor peça. Então, se eu precisar, por exemplo, de textos ou coisas mais, ou eu teria que estar programando. E em função do tempo também, em função dos dois cargos, o tempo fica escasso para tanta preparação. Para mim, é um ponto de apoio. Atualmente, eu estou bem voltada para ele. Não vou dizer pra você que eu estou fugindo, assim... fujo, mas ele é um ponto de referência para mim. (NATÁLIA).

O uso intenso que a professora Natália faz do livro didático pôde ser verificado durante o período de observação de aulas.Nota-se, ainda, o uso intenso da tradução durante as aulas, o que mostra a concepção de linguagem da professora, como expressão do pensamento e o uso do Método da Gramática e Tradução, adaptado ao Método de Leitura:

A professora inicia o tema da aula, que é Voices of Africa (unidade 5 do livro adotado, à página 80) e comunica aos alunos que vão fazer um projeto sobre esse tema. Ela utiliza estratégias de leitura da seção Pre-Reading, buscando ativar o conhecimento prévio dos alunos sobre o tema, e utiliza o glossário bilíngue. Interage com os alunos, buscando a participação de todos. [...]. A professora revisou a estrutura do passado perfeito em inglês. Em seguida, deu sequência aos exercícios 1 a 4, às páginas 83 a 85 sobre o Past Perfect. Apenas a professora lia as sentenças. Ao fazer a tradução dessas sentenças, buscava a participação dos alunos. Fazia a tradução das sentenças, verificando se os alunos haviam entendido a estrutura do passado perfeito. (NOTAS DE CAMPO DE OBSERVAÇÃO DE AULAS DA PESQUISADORA, REFERENTE ÀS AULAS 1 A 4).

Trazendo as vozes, possivelmente, de formadores de professores “Todas as pessoas que vêm aqui na escola falar”, Cristina utiliza-se de modalização lógica para atestar que o livro é o único material disponível, “é o único material que a gente tem na escola [...]”, e dessa forma, utilizando-se de modalização lógica, justifica sua ação, conformando-se a uma realidade da instituição, “não tem como você fugir do livro”. Também justifica-se pela utilização única do livro como material didático, afirmando, pelo emprego de modalização apreciativa “Eu acho que os livros estão ótimos [...]”:

Todas as pessoas que vêm aqui na escola falar, pessoas graduadas e até muito mais estudadas do que eu, fala: ‘Gente, professor não pode ficar só no livro’, mas infelizmente, é o único material que a gente tem na escola, sabe? Então, não tem como você fugir do livro. E outra coisa: não sei se você tem essa opinião, mas eu acho que os livros estão ótimos; tem muito livro bom. (CRISTINA).

Utilizando-se de modalização lógica “Tenho utilizado”, “eu faço uso”, “eu tenho feito um uso intenso, Sílvia atesta o uso do livro didático em suas aulas. Ainda pelo emprego da modalização lógica “eu percebo é que não existe aquele material ideal [...]”, alegando que “é impossível”, atesta a impossibilidade de se ter um livro ideal. Dessa maneira, pela modalização lógica “Quando eu percebo que as atividades estão fragmentadas”, “eu costumo saltar aquilo ali, não trabalho aquela atividade, acrescento outras”, evidência a necessidade da sua ação, selecionando apenas as atividades pertinentes ao seu objetivo, e acrescentando outras que ela entende que sejam necessárias:

Tenho utilizado, mas tenho enriquecido com outras atividades porque o que eu percebo é que não existe aquele material ideal, porque o ideal é impossível, mas eu faço uso, digamos, de 80% das minhas aulas eu tenho utilizado o livro didático. O que eu percebo é que algumas atividades, elas não... elas não, talvez elas estão um pouco fragmentadas ali na sequência da unidade. Então, eu costumo saltar aquilo ali, não trabalho aquela atividade, acrescento outras, mas eu tenho feito um uso intenso [...]. (SÍLVIA).

Essa fragmentação das atividades na coleção Freeway, que Sílvia menciona, pode estar relacionada à estrutura e organização das seções nas unidades. Conforme foi apontado na descrição e análise da unidade 3 desta coleção, a seção Crossroads foi produzida com o objetivo de fazer uma ruptura na sequência das atividades, o que se revelou inadequado na utilização da coleção.

Um outro aspecto, observado nas aulas de Sílvia, foi a respeito da seleção de atividades no livro didático que a participante afirmou realizar. Ao propor uma atividade de vocabulário para os alunos sobre o tema da unidade, a professora transcreveu as atividades 1 e 2 do livro, à página 43, da seção Highway, para ser distribuído a eles. O agir dessa professora corrobora os estudos de Coracini (1999), para quem o professor tende a repetir os procedimentos do livro didático porque os princípios norteadores desse material e a concepção de aluno por ele veiculada já podem ter sido internalizados pelo professor. Ao agir desse modo, a professora Sílvia deixou de realizar justamente a atividade 3, que era de produção oral, conforme notas de campo de observação de aulas abaixo:

A professora pediu, em seguida, que os alunos guardassem a folha de exercícios sobre graus de adjetivos porque eles iriam fazer uma atividade de vocabulário. A professora então perguntou aos alunos se eles se lembravam do tema da unidade. Entregou algumas fichas para os alunos. Leu os significantes e os significados aleatoriamente. Pediu que a turma relacionasse o significante ao significado. Pediu aos alunos para repetirem, mas eles não entenderam o que era pra fazer. A professora explicou em Português. Depois, entregou fichas contendo frases, para os alunos completarem com as palavras que ela daria em outra ficha. Os alunos se engajaram mais nessa atividade. Após terem finalizado o exercício, a professora recolheu as fichas e avisou para os alunos: ‘Vocês acabaram de fazer os exercícios da página 43, se quiserem checar’. Os alunos não completaram as respostas nos livros. Nessa parte, a professora deixou de fazer justamente o exercício 3 que possibilitaria aos alunos praticarem o vocabulário dos exercícios 1 e 2. (NOTAS DE CAMPO DE OBSERVAÇÃO DA PESQUISADORA, REFERENTE ÀS AULAS 3 E 4).

Ainda sobre a utilização do livro em sala de aula, pude verificar o que apontei na análise do apêndice Transcripts. A falta de indicação do número do exercício ao qual a transcrição se reporta realmente dificultou a localização da transcrição do texto pelos alunos, consoante registrado nas notas de campo de observação de aulas:

Agora vamos fazer um listening. Say no – Unite to end violence against women. Read the questions before you listen’, orienta a professora. Depois de terem terminado a correção é que a professora direcionou os alunos a checarem a transcrição à página 185 para responderem à questão 3. Ao perceber que os alunos não estão respondendo às perguntas desta questão, a professora vai de carteira em carteira, mostrando aos alunos, à página 185, o local exato da transcrição. (NOTAS DE CAMPO DE OBSERVAÇÃO DA PESQUISADORA, REFERENTE ÀS AULAS 3 E 4).

Observei, também, que a professora Sílvia trouxe para os alunos um material sobre a estrutura linguística da unidade, past perfect simple e past perfect continuous. Para utilizá-lo, a professora, ao terminar as atividades de compreensão oral da página 46, pediu aos alunos para fecharem os livros. Na sequência, escreveu uma frase fora do tema da unidade com o objetivo de explicar essa estrutura verbal:

Em seguida, a professora pede que os alunos fechem os livros e olhem para a frase que ela está escrevendo no quadro: When the ambulance arrived, the poor men had already died, e escreveu os nomes dos tempos verbais utilizados na sentença, especificando a primeira ação e a segunda ação. Explicou o uso do passado perfeito e passado perfeito contínuo em Inglês. Distribuiu uma folha com exercícios sobre esse tópico. Marcou como tarefa os exercícios 2 e 3 dessa folha e lembrou os alunos de terminarem os exercícios extras sobre graus de adjetivo. Observei que o livro didático trazia exercícios contextualizados sobre esses tempos verbais e a professora não os utilizou.

Preferiu escrever a frase, transcrita acima, totalmente descontextualizada no quadro. (NOTAS DE CAMPO DE OBSERVAÇÃO DA PESQUISADORA, REFERENTE ÀS AULAS 5 E 6).

No entanto, o livro didático apresentava a gramática contextualizada na seção Language Works, com exemplos relacionados ao tema apresentado na unidade, Violence against women. Esses exemplos estão transcritos abaixo:

Before she talked about her problems, she had been feeling depressed for years. She had never felt so depressed in her entire life. I had spoken to my sons about the way they treated their sister this month. They had been making fun of her since she turned twelve. (RICHMOND EDUCAÇÃO, 2010 a, v.2, p.46, grifo do autor).

A professora Sílvia, dessa maneira, não fez uso de várias atividades110 apresentadas no livro didático às páginas 47 a 49. O agir dessa professora evidencia que a mesma se utiliza de pressupostos tanto do Método da Gramática e Tradução, que desconsidera o contexto sócio- histórico da interação comunicativa, empregando o Método Dedutivo para a explicação gramatical. Vale lembrar que, nessa seção Language Works, os produtores do livro didático se apoiam no Método Indutivo para o ensino das estruturas linguísticas. Esse agir da professora, também, pode estar relacionado ao que Paiva (2014) aponta como dificuldade para os produtores de livros didáticos do PNLD: seguir a orientação do edital do PNLD, que fomenta a elaboração das coleções, observando a língua em uso, e o desejo dos professores de priorizar o estudo da gramática e, ainda, a dificuldade que os professores têm de utilizar o Método Indutivo no ensino de gramática. É importante realçar que Paiva (2012) indica que depende do professor a escolha de qual método utilizar, e que a combinação dos dois métodos pode levar a bons resultados na aprendizagem.