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1.2 CRONOLOGIA DO PROCESSO DE ELABORAÇÃO DO PLANO DIRETOR

Parte II: está dividida em duas seções: a primeira faz uma análise mais descritiva das experiências nos processos de revisão dos

1.2 CRONOLOGIA DO PROCESSO DE ELABORAÇÃO DO PLANO DIRETOR

O atual plano diretor de Lages teve início em 2004 e foi finalizado em 2007, sendo que sua gênese deu-se a partir de trabalhos preliminares69 que ocorreram por meio de um estudo realizado por um grupo de sete técnicos da Prefeitura Municipal (três Arquitetos e quatro Engenheiros Civis). Os resultados desse projeto, segundo o Entrevistado 0270, deu origem a uma análise mais detalhada dos principais problemas da cidade. A conclusão do grupo de técnicos foi que a cidade necessitava de um novo marco regulatório para poder ordenar o crescimento da cidade, ou seja, um novo plano diretor.

Diante dessa constatação, a equipe de funcionários municipal passou a trabalhar a ideia de revisar o plano diretor e cumprir com o que determina o Estatuto da Cidade: que todas as cidades com mais de vinte mil habitantes deveriam revisar seus planos diretores dentro de um prazo estipulado pelo órgão competente, nesse caso o Ministério das Cidades.

A implantação de um sistema de Geoprocessamento na cidade tinha por finalidade produzir uma ferramenta com a qual se pudesse fazer uma análise do potencial de expansão urbana do município. Utilizando-se dessa ferramenta, caracterizar-se-iam as condições existentes para a expansão - industrial e habitacional, investigando se a direção do crescimento da cidade ocorreria em áreas favoráveis à

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O principal dos trabalhos realizados pelo grupo, foi a implementação de um projeto de Implantação do Geoprocessamento da Cidade.

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Arquiteto e funcionário municipal de Lages, coordenador dos trabalhos no processo de elaboração do novo Plano Diretor de Lages. Entrevista concedida aos Pesquisadores do Laboratório Cidade e Sociedade (LABCIS), na Secretaria de Planejamento de Lages – SEPLAN, em 17 de setembro de 2010.

ocupação e adensamento. A junção entre esse estudo e os mapeamentos avaliativos de potenciais possibilitou a visualização das áreas conflitantes quanto aos seus potenciais e levou o grupo de técnicos responsável pelo trabalho a repensar a cidade sobre a lógica da elaboração de um novo plano diretor, condizente com as suas necessidades (ENTREVISTADO 02). Dessa forma, o plano diretor atual teve sua gênese a partir de uma visão bastante influenciada pelo tecnocratismo.

Como vimos, o último plano diretor da cidade datava de 1988, e, com a necessidade Constitucional de revisão do plano, após a aplicação do estudo prévio sobre a cidade, o grupo de trabalho deu início à definição de instrumentos de planejamento territorial. Com a ajuda do Instituto de Arquiteto do Brasil – IAB/Lages - em 2004, iniciaram-se os trabalhos, sob a coordenação da Secretaria de Planejamento de Lages (SEPLAN).

As primeiras atividades foram realizadas por iniciativa de técnicos da prefeitura, uma vez que não puderam contar com a ajuda financeira ou vontade política expressa do Executivo. De acordo com o Entrevistado 02, tentou-se, inicialmente, a contratação de uma Assessoria Técnica junto a Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), mas faltaram recursos financeiros após a resposta negativa do chefe do executivo. Com os parcos recursos disponíveis, o máximo que se conseguiu foi montar uma equipe de seis profissionais (um técnico da Prefeitura e cinco contratados – arquitetos e engenheiros da Empresa Fornari Souza Engenharia) para assessoria técnica (ENTREVISTADO 02).

O processo teve início em julho de 2006, com a criação de uma Comissão de Técnicos (com status de Núcleo Gestor), por iniciativa deles próprios. No mesmo mês, ocorreu uma reunião de instalação do “núcleo” que serviu também de lançamento oficial do Plano Diretor, ocasião em que foram explanados os objetivos, a metodologia e os temas básicos para discussão nas reuniões públicas. Os trabalhos de elaboração do plano duraram seis meses. Finalizado o plano, ele foi apresentado aos vereadores em novembro do mesmo ano, momento em que foram iniciadas as discussões nas comissões internas. Os trabalhos foram finalizados em 21 de dezembro de 2007, com a aprovação do Projeto de Lei na Câmara Municipal de Vereadores.

O fluxograma representado pela figura 04 dá a ideia da sequência das etapas dos trabalhos realizados durante o processo de elaboração do novo plano diretor de Lages:

Figura 4 - Fluxograma das etapas de atividades do Plano Diretor de Lages

ORGANIZAÇÃO: O Autor, 2014.

Como descrito anteriormente, o processo iniciou-se com a formação de uma Equipe Técnica que era a responsável por todas as ações do processo. Com o auxílio dos decanos, foram organizadas as reuniões públicas; nestas, foi preparada e implementada a leituras da Cidade (leitura técnica e comunitária) e completadas pelas oficinas temáticas. O resultado destas duas etapas serviu de bases para que a equipe técnica preparasse a minuta de lei e encaminhasse ao legislativo. 1.3 - TEMÁTICAS QUE NORTEARAM AS DISCUSSÕES DO PLANO DIRETOR

Os pontos mais importantes que caracterizaram o plano aprovado em 2007, de forma particular, foram: a falta de interesse ou o distanciamento do executivo municipal - em especial do prefeito - pelo projeto e a tímida participação popular no planejamento do território, que resultou na exclusiva dedicação do segmento técnico.

De acordo com o Entrevistado 02, a metodologia adotada consistiu em dividir o município em dez regiões, sendo sete na área urbana e três no interior (área rural), onde foram realizadas as reuniões,

as oficinas temáticas e as audiências públicas. Para esses encontros, convidava-se um dos “decanos” da cidade, o qual fazia uma leitura e interpretação da evolução do município, cada um em sua especialidade, com o intuito de realizar um diagnóstico comparativo entre as diferentes visões da cidade. Essas visões eram predominantemente tecnicistas e as reuniões estavam restritas a poucos convidados ligados ao tema escolhido71.

O desenvolvimento do plano envolveu duas etapas apenas: a primeira direcionada às leituras técnica e comunitária e a segunda com as oficinas temáticas e as audiências públicas. Observa o Entrevistado 02, sobre a leitura técnica, considerada pelos entrevistados como a principal: “De um modo geral a leitura técnica foi feita e compreendeu a avaliação dos principais problemas em termos de infraestrutura urbana: sistema de trânsito, redes de energia, água e saneamento básico, por exemplo”. Nessa etapa do plano, os “decanos” tiveram papel preponderante na leitura da cidade, pois foi a partir de suas experiências profissionais, de sua visão sobre a realidade do território local que foram elencadas as principais diretrizes demandadas e os rumos que o município deveria tomar.

Quanto à leitura comunitária, no entender dos técnicos e profissionais ligados ao executivo e legislativo municipal, essa etapa ocorreu em conformidade com as determinações legais, contudo, elas foram diluídas nas audiências públicas, que de certa forma tiveram a participação de pessoas ligadas principalmente aos setores econômicos.

As audiências públicas possibilitaram um maior entendimento de como a população local percebia o território de Lages. “Foi feita, através das audiências públicas participativas, a leitura comunitária, que possibilitou a compreensão de como a comunidade enxerga a cidade, o bairro, o interior do município e para onde, na visão deles, Lages deve crescer” (ENTREVISTADO 02).

Ainda de acordo com o Entrevistado 02, nas oficinas temáticas os assuntos mais abordados e discutidos foram os relacionados ao trânsito, ao zoneamento e aos problemas ambientais. Nelas, a participação resumia-se a algumas entidades (CDL, ACIL, IAB/Lages, OAB,

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Segundo o Entrevistado 02, para cada reunião escolhia-se um tema que deveria ser discutido, convidava-se um especialista no assunto, preferencialmente com grande experiência na área, convidava-se o público alvo (com ligação direta ao tema), escolhia-se o local e realizava-se a reunião com caráter de audiência pública.

CREA), essencialmente ligadas aos interesses do Executivo ou áreas econômicas, tais como o comércio, imobiliárias e construção civil.

Os números referentes aos participantes nas audiências demonstram a fraca participação das entidades ligadas ao campo popular e da população em geral. O total de treze reuniões (entendidas pelo Grupo Técnico como audiências) contou com 81 (oitenta e um) participantes naquelas realizadas no centro da cidade (dez ao total) e 55 (cinquenta e cinco) participantes nas atividades realizadas no interior do município (três reuniões). Esses dados indicam uma media de 10,4 pessoas por reunião.

Quanto às oficinas temáticas – nas quais foram discutidos assuntos como meio ambiente, educação, meio rural, uso do solo, trânsito, zoneamento e outros -, segundo o Entrevistado 02, foram realizadas em sua totalidade 33 (trinta e três) reuniões. O número total de participantes nessa etapa foi de 129 (cento e vinte e nove) pessoas. Esses dados indicam uma participação média em torno de 3,09 pessoas por oficina.

Como pode ser percebido, o baixo número de participantes aconteceu em todas as etapas do processo. O número total de participantes em todas as fases (as leituras técnica e comunitária, audiências públicas e oficinas) foi de 265 (duzentos e sessenta e cinco) habitantes.

Finalizadas as etapas de reuniões, o grupo de estudo do plano diretor direcionou seu trabalho para a elaboração das diretrizes e propostas a partir das discussões com os decanos e demais participantes. Nessa fase, os trabalhos foram restritos aos seis técnicos que tiveram a iniciativa de elaborar o projeto. De acordo com o Entrevistado 02, foi um trabalho restrito a escritórios e gabinetes da prefeitura.

O Quadro 06 tem por objetivo mostrar de forma detalhada as diferentes etapas de trabalho do processo de construção do novo plano diretor de Lages.

Em seguida, após o período de estudo, em novembro de 2006, com os trabalhos concluídos pelo grupo, o documento final foi formatado e remetido à Câmara de Vereadores. Salienta-se que de acordo com os Entrevistados 2672 todo o processo de elaboração e o que vem acontecendo atualmente (revisão) foram dentro da mesma lógica: sem participação popular. Portanto, não ficou claro para a população a

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Presidente e Vice-presidente da União das Associações de Moradores de Lages. Entrevista concedida aos Pesquisadores do Laboratório Cidade e Sociedade (LABCIS), em 27 de julho de 2012.

vontade política de uma participação efetiva, autêntica. Assim, podemos afirmar também que os habitantes não viram como resultado um plano diretor que emergisse a partir de uma metodologia participativa, na sua essência.

Quadro 6 - Etapas do Processo de revisão do PDP de Lages

Etapas Período Objetivo

I Leitura Técnica da Cidade Junho a outubro de 2006 Produzir um quadro urbanístico do território. Leitura Comunitária da Cidade Junho a outubro de 2006 Compreender e avaliar os principais problemas de infraestrutura urbana. Foram consideradas audiências públicas.

II Oficinas Temáticas Junho a outubro de 2006

Abordar e discutir assuntos, tais como os de trânsito, zoneamento e problemas ambientais. III Elaboração do Anteprojeto de Lei do Plano Diretor Novembro de 2006

Elaborar o Anteprojeto de Lei e encaminhar ao Legislativo municipal.

Elaboração: O Autor, 2014.

Na fase de tramitação na Câmara de Vereadores, por falta de conhecimento técnico da matéria, alguns legisladores solicitaram que fosse contratada uma assessoria para fazer um estudo técnico73 do plano. Apenas após o término dos estudos realizados pela assessoria, o projeto foi aprovado na Câmara de Vereadores.

Segundo informações do Entrevistado 02, não houve nenhuma discussão entre os vereadores sobre o plano em plenário legislativo, tão pouco conflitos, apenas a realização do estudo técnico pela empresa contratada. Passado um ano da finalização dos trabalhos da assessoria

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Segundo informações do Entrevistado 02, coordenador dos trabalhos, por falta de conhecimento técnico da matéria a ser discutida, a Câmara de Vereadores contratou uma empresa de assessoria técnica para realizar um estudo da nova lei do plano diretor. Grande parte dos mentores da minuta de lei do plano faziam parte dessa equipe contratada, inclusive o próprio Arquiteto. Esse fato facilitou os ajustes do trabalho e encaminhamento à câmara de vereadores local.

técnica, o Plano Diretor de Lages foi aprovado por unanimidade e com poucas modificações, em 2007, através da Lei Complementar Nº 306, de 21 de dezembro de 2007, que instituiu o Plano Diretor de Desenvolvimento Territorial de Lages – PDDT – LAGES.

Como estratégia para executar as propostas do plano, foi reinstituído o Conselho do Plano Diretor (CPD), composto por 27 (vinte e sete) membros distribuídos entre entidades e poder público. Esse conselho não foi constituído por uma lei específica, mas sua existência permanece por uma tradição local desde o governo de Dirceu Carneiro (ENTREVISTADO 01). Segundo Lages (2014), os membros que compõem o Conselho estão distribuídos da seguinte forma: 10 (dez) representantes do Poder Executivo, e 01 (um) representante de cada uma das seguintes representações: Fundação Cultural de Lages, Procuradoria Geral do Município; para entidades comerciais e profissionais (ACIL, CDL, CREA/Lages, CRECI, SINDUSCON, e IAB/Lages); DIRETRAN, Associação de Moradores, Exército Brasileiro; Entidades de Ensino (CAV, UNIPLAC e FACVEST) e Polícias (Militar e Civil). 1.4 - DESENHO INSTITUCIONAL PROPOSTO PARA DISCUSSÃO DO PLANO DIRETOR

Em Lages o desenho institucional formalizado pelos cinco técnicos que elaboraram o novo plano diretor local visava, em primeiro lugar, a participação de apenas alguns atores ligados aos campos técnico, econômico e político da cidade. A participação popular ficou relegada a reuniões com pouco poder de decisão, a maioria no centro da cidade, e pautadas nas observações de alguns notórios do município.

O processo foi gerido e administrado por um pequeno grupo de profissionais técnicos (arquitetos e engenheiros) que centralizaram e canalizaram os trabalhos para uma metodologia não participativa do ponto de vista popular.

Não existia formalmente um Núcleo Gestor do Plano, embora o “núcleo técnico” desenvolvesse também essa função. De início, a plataforma de trabalho montada estava baseada nas interações dos participantes a partir da “leitura técnica” e da “leitura comunitária” que eram realizadas concomitantemente a partir de intervenções de profissionais com perfis técnicos e com pretenso “profundo” conhecimento do território de Lages.

Segundo o Entrevistado 02, as reuniões de leituras iniciavam-se sempre com uma intervenção de um dos “decanos” convidados que falava para poucos convidados. Os convites eram feitos nominais às

pessoas que os coordenadores do Grupo Técnico achavam que poderiam contribuir nas discussões, não havendo, portanto, ampla divulgação dos trabalhos; as pessoas que participaram, de alguma forma, tinham ligações ou com os poderes executivo e legislativo ou com as classes econômicas que atuam no mercado da cidade.

Durante o trabalho de campo foi possível perceber que em Lages, diferentemente dos demais municípios objetos desta pesquisa, não houve discussões para implementação das diferentes etapas, conforme as recomendações do MCidades, havendo por parte do grupo técnico um atropelo e diluição das etapas.

Efetivamente as leituras técnicas e comunitárias foram as que ocorreram em menor número de vezes, mas foram as que trataram de temáticas mais em evidência dentro do território. As audiências públicas caracterizaram-se como a fase de catalisação das propostas das duas leituras; foi o momento em que se discutiu com os convidados as intervenções dos palestrantes para servir como base ao grupo técnico e que posteriormente foram transformadas nas diretrizes e propostas presentes no plano diretor.

Um desenho institucional democrático e aberto que proporcionasse espaços democráticos de debates, com regras e normas que regulassem o processo e que estabelecesse quem poderia participar e como deveria ser essa participação (a escolha, os locais, etc.) não fez parte concretamente do processo.

Com a falta de vontade política do executivo, manifestada especialmente na distância de seu chefe de todo o processo e na ausência de recursos (disponibilidade de verbas suficientes) para divulgação das reuniões, a participação da população foi muito limitada.

Por outro lado, as oficinas temáticas merecem destaque pelo grande número de reuniões realizadas e pela variedade de temas tratados. No entanto, esses encontros também não se traduziram em ampla participação das comunidades locais; com per capita (3,09) por reunião, foi a etapa com menos participantes.

Em Lages, a organização dos trabalhos em torno do plano diretor não contou com organismos como um Conselho do Processo de elaboração do Plano Diretor, um Núcleo Gestor, uma Secretaria Executiva, ou um Grupo de Trabalho com funções detalhadas, tão pouco com um Congresso do Plano que aprovasse seus encaminhamentos.

Segundo informações do Entrevistado 02, não houve debates nem desavenças entre os segmentos da sociedade que participaram das discussões do plano. Por esses motivos, os técnicos afirmam que o desenho institucional proporcionado dialogou com vários atores sociais

e chegou-se a um consenso. Há, no entanto, algumas pessoas, entre elas os Entrevistados 02 e 26 que discordam dessa afirmação e entendem que o governo local não promoveu um amplo debate com toda a sociedade sobre a cidade, e que, devido a isso, os conflitos não foram evidenciados.

A figura 05, mostra o organograma de como ficou montado o desenho institucional do plano diretor de Lages:

Figura 5 - Formato de implantação do Desenho Institucional do Plano Diretor de Lages

ORGANIZAÇÃO: O Autor, 2014.

Como pode ser percebido na figura 05, as concepções do processo e as tomadas de decisões estavam centrada nas mãos do Grupo Técnico, que ocupava também a função de “Núcleo Gestor”, caracterizando um modelo de desenho tecnocrático. Os estudos do território ficaram a encargo de profissionais técnicos, considerados autoridades, baseados na tradição e na formação bacharelesca, em torno do qual giravam as discussões. As reuniões (com caráter de audiências públicas) foram meramente para cumprir ritos do processo, pois seu formato não proporcionava a participação de todos os atores interessados. Como principal consequência desse desenho que deveria ser participativo, teve-se o esvaziamento popular do processo.

1.5 - VONTADE POLÍTICA EXPRESSA NO PODER LOCAL