• Nenhum resultado encontrado

Capítulo 2 Fundamentação Teórica

2.3 Cultura no plural

2.3.3 Cultura e língua

As ligações entre língua e cultura aparecem, para muitos estudiosos, sob diversos ângulos. Mendes analisa que a ideia de língua/linguagem precisa ser compreendida pelo professor de LE a fim de nortear sua prática. Consoantes com esta ideia, expomos suas considerações sobre o que é a língua:

[...] representa mais do que a fala, mais do que a estrutura, mais do que um instrumento para trocar ideias e informações, [...] ela é um símbolo, um modo de identificação, um sistema de produção de significados individuais, sociais e culturais, uma lente através da qual enxergamos a realidade que nos circunda (MENDES, 2011, p. 143).

De acordo com Almeida Filho (2002), a cultura está no mesmo lugar da língua ao se apresentar como uma ação social, pois ela governa a maior parte das atitudes, comportamentos, representações e costumes dos falantes de uma língua, muitas vezes, sem que eles sejam conscientes disso. Mendes (2001) compartilha desta ideia, pois ressalta que na organização de nossos pensamentos e ações, a língua/linguagem é o meio através do qual interagimos socialmente e que nos auxilia ordenar o mundo a nossa volta. Para a autora, a língua está no mesmo lugar da cultura uma vez que ambas fazem parte de um processo de estar e de agir no mundo.

Adotaremos como Mendes a denominação da língua estrangeira que ensinamos e aprendemos, mediadora de culturas diferentes, de língua-cultura e para ela este termo significa:

[...] um fenômeno social e simbólico de construção da realidade que nos cerca, é o modo de construirmos os nossos pensamentos e estruturarmos as nossas ações e experiências e as partilharmos com os outros (MENDES, 2011, p.144).

E acrescenta que além de envolver sistemas formais (dimensões fonológicas, morfológicas, sintáticas e semânticas, sons e representações, normas e regras de organização) a língua envolve códigos sociais e culturais que inclui igualmente a linguagem não -verbal e a maneira como nos expressamos.

A percepção da ligação língua- cultura para Kramsch (1998) considera que a maneira pela qual percebemos a realidade cultural passa pela linguagem, visto que esta personifica aquela, a torna manifesta pelo meio verbal e não-verbal. Por esta razão, os signos da linguagem são impregnados de valor cultural. A autora defende que: linguagem é o principal meio através do qual conduzimos nossa vida social16, tanto na manifestação de fatos, ideias ou eventos, como na criação de experiências, ou seja, a maneira pela qual as pessoas usam o meio falado escrito ou visual, cria significados compreensíveis no grupo ao qual pertencem.

A teoria do relativismo linguístico procurou investigar esta relação, pois trouxe a noção de interligação entre língua e cultura no final do século XVIII como consequência de estudos sobre língua e seu significado. Assim, propagou-se a ideia de que pessoas diferentes falam diferentemente porque assim pensam; e pensam de forma diferente porque sua língua oferece diferentes meios de expressar o mundo em volta deles. A hipótese de Sapir- Worf17 explica este pensamento, ao afirmar que falantes de línguas diferentes não se entendem não porque as línguas não possam ser traduzidas, mas porque eles não compartilham do mesmo modo de ver e interpretar os acontecimentos, isto porque o significado e o valor de conceitos subjacentes às palavras não entram em acordo (KRAMSCH, 1998).

Não é ideia recente a de que o sistema de signos tem em si mesmo um valor cultural, desde a hipótese de Sapir-Whorf observa-se esta questão e por isso acreditamos que é importante o estabelecimento ensino de línguas integrado à cultura e concordamos com Kramsch (1998) que explica que o signo não tem significado para quem não conhece a palavra na língua estrangeira, em seu contexto sociocultural.

Entendemos também que a língua enquanto forma simbólica, ou seja, como uma das expressões de uma cultura, é manifestação de unidade de uma comunidade.

A compreensão desta unidade para Rocher (1992) deve-se ao fato de que a cultura inclui elos que as pessoas sentem como reais- assim como outras realidades mais tangíveis como: um território, imóveis, monumentos, bens materiais. Para este sociólogo, a sociedade fundamenta-se simbolicamente, incluindo as maneiras coletivas de pensar, sentir e agir que são símbolos de comunicação ou que tornam possível a comunicação. Tanto para a linguagem

16 Tradução nossa: language is the principal means whereby we conduct our social lives.

17 Edward Sapir (1884-1939) antropólogo e linguista e seu discípulo Benjamin Lee Whorf (1897-1941)

formularam diversas hipóteses no estudo de línguas e entre elas a do determinismo linguístico que declara que a língua determina a maneira de pensar,ou seja, que percebemos a realidade e a organizamos em conceitos, aos quais atribuímos significados por um acordo implícito estabelecido em nossa comunidade linguística.

quanto para as atitudes existe um significado inconsciente para um grupo de pessoas, o que confere um caráter distintivo para uma dada sociedade. O respeito aos modelos simboliza geralmente a adesão a valores e por sua vez o vínculo a uma coletividade. Esta significação simbólica traça uma fronteira material entre membros e não membros, cidadãos e estrangeiros.

Além de unidade, Rocher (1992) defende que a língua é igualmente símbolo de identidade de um grupo social, ou seja, um indivíduo identifica um outro membro de seu grupo através do uso do mesmo código (língua) e o desconhecimento deste código implica um não pertencimento àquele grupo social.

O sentido é fruto da cultura que segundo Kramsch (1998) se refere a algo cultivado, algo modificado através da socialização e da escolarização. Assim como Rocher (1992) para ela os significados particulares são adotados por um discurso da comunidade e impostos por sua vez a seus membros. Estas maneiras da linguagem ou normas de interação e interpretação fazem parte do ritual invisível imposto pela cultura.

Zarate (1986), ao seu modo, entende que o implícito cultural é fruto da manifestação dessa organização social.