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4 CURATELA E TOMADA DE DECISÃO APOIADA

O Estatuto da Pessoa com Deficiência e as Alterações no Código Civil de 2002

4 CURATELA E TOMADA DE DECISÃO APOIADA

A curatela é uma medida excepcional cujo intuito é eleger uma pessoa, denominada de curador, para prestar auxílio aos interesses de maiores incapazes, que são os curatelados. Não obstante, conforme já dito anteriormente, essa assistência estará adstrita ao âmbito patrimonial e negocial.

O CC/2002, em seu art. 1.767, enumera os sujeitos a interdição. Sucede que o EPD remodelou esse rol, reduzindo a curatela apenas àqueles que, por causa transitória ou permanente, não puderem exprimir sua vontade, aos ébrios habituais e aos viciados em tóxicos.

Analisando esse preceito, verifica-se que não existirá a curatela de absolutamente incapaz e, indo a fundo, o § 1º do art. 84 do EPD, em uma atitude audaciosa, propiciou a curatela de pessoas capazes ao estabele-cer que, “quando necessário, a pessoa com deficiência será submetida à curatela, conforme a lei”. Sendo capaz, não poderá ser representado nem assistido; então, fica o questionamento ao legislador de qual será a função do curador: se representante ou assistente do curatelado.

Ainda nessa conjuntura, o EPD incluiu o inciso IV no art. 1.768 do CC/2002 para adequadamente permitir que o curatelado possa pro-mover o processo que define os termos de sua curatela. Quanto à par-ticipação do Ministério Público, o EPD rechaçou a ideia do inciso I do art. 1.769 do CC/2002, para que a atuação do Parquet não se limite aos casos de maior gravidade, mas a qualquer situação de debilidade, bas-tando que seja mental ou intelectual.

No mais, o art. 1.771 passará a ter nova redação: “Antes de se pro-nunciar acerca dos termos da curatela, o juiz, que deverá ser assistido por equipe multidisciplinar, entrevistará pessoalmente o interditando”. A substituição da interdição por curatela foi necessária porque aquela de-nota pessoas incapazes, e, como dito anteriormente, a curatela também abrangerá pessoas capazes, bem como a troca da palavra especialistas por equipe multidisciplinar e arguido por incapacidade por interditando.

Cumpre anotar que o § 3º do art. 84 do EPD determina que a curatela do sujeito com deficiência corresponda às necessidades e às circunstâncias de cada caso. Para amoldar a esse mandamento é que o art. 1.772 do CC/2002 também passou por uma mutação para prever que o Magistrado, ao fixar o alcance da curatela, observe as potenciali-dades da pessoa, observando os limites e indicando o curador.

Não bastasse a mutação retroinformada, foi inserido o parágra-fo único, que diz: “Para a escolha do curador, o juiz levará em conta a vontade e as preferências do interditando, a ausência de conflito de interesses e de influência indevida, a proporcionalidade e a adequação às circunstâncias da pessoa”. Atente que, com sensatez, o EPD favorece a participação do curatelado, dando liberdade para que ele faça suas escolhas e tome decisões. Dando continuidade a esse bom-senso é que o EPD introduziu o art. 1.775-A no CC/2002, com o propósito de viabi-lizar a curatela compartilhada a mais de uma pessoa, melhor dizendo, retirando o excesso de poder das mãos de um só indivíduo.

É evidente que o legislador está preocupado em agregar os defi-cientes ao cotidiano da sociedade, tanto que a antiga regra do recolhi-mento, que o afastava da convivência familiar e comunitária, hoje é uma exceção. O EPD reescreveu o art. 1.777 do CC/2002 para autorizar o afastamento, tão somente, daqueles que, por causa transitória ou perma-nente, não puderem exprimir sua vontade.

Por derradeiro, o EPD concebeu uma alternativa à curatela que é a tomada de decisão apoiada. Ela foi incorporada no Título IV, do Livro IV, do CC/2002, e o Capítulo IV foi criado especialmente para discorrer sobre esse tema. Nele consta exclusivamente o art. 1.783-A acompanha-do de onze parágrafos. O caput a conceitua como senacompanha-do um “processo pelo qual a pessoa com deficiência elege pelo menos duas pessoas idô-neas, com as quais mantenha vínculos e que gozem de sua confiança, para prestar-lhe apoio na tomada de decisão sobre atos da vida civil, fornecendo-lhes os elementos e informações necessários para que possa exercer sua capacidade”.

Novamente o EPD proporciona aos deficientes o direito de esco-lha dos sujeitos que, ao seu lado, irão apoiá-lo nas decisões atinentes aos atos da vida civil. Esse procedimento, conforme o § 3º, dar-se-á pelas vias judiciais, devendo o Magistrado decidir com auxílio de uma equipe multidisciplinar, oitiva do Ministério Público, do requerente e das pes-soas que lhe prestarão apoio.

CONCLUSÃO

De todo o exposto, conclui-se que o EPD, ao atribuir às pessoas com deficiência a plena capacidade civil, em verdade, intenta erradicar o preconceito e promover a inclusão social, evitando ao máximo o

afas-tamento do deficiente com o meio ao qual ele está inserido. O diploma acima busca dar liberdade a esses indivíduos para que possam gerir sua vida sem a necessidade de representação ou de assistência.

Essa nova definição, na teoria da capacidade, reconfigurou todo sistema civilista, pois o Estatuto criou alguns institutos como a curatela de capazes e a tomada de decisão apoiada, ao passo que outros não existirão mais, como a curatela de absolutamente incapaz, a nulidade do casamento em face de enfermos mentais e a anulabilidade quanto ao erro essencial sobre a pessoa do outro cônjuge quando ignorava, antes do enlace matrimonial, uma deficiência ou moléstia grave e trans-missível.

Desse modo, pode-se dizer que o EPD trouxe benefícios, pois um indivíduo, mesmo portando alguma debilidade, pode tomar decisões por ele mesmo, como constituir união estável, casar, ter ou não filhos. Contudo, algumas proteções previstas no CC/2002 não recairão mais sobre eles, como o caso da suspensão e impedimento dos prazos pres-cricionais e decadenciais e a responsabilidade subsidiária.

Logo, quando uma norma adentra ao ordenamento jurídico cau-sando tantas mudanças, todo cuidado é pouco. Deve atentar sempre que o EPD é uma lei protetiva, cujo foco é fazer com que sujeitos com defi-ciência possam interagir e fazer suas escolhas, mas ao mesmo tempo não retira o poder do juiz e do Ministério Público em fiscalizar os diversos procedimentos em que a atuação de curador se poderá fazer necessária.

REFERÊNCIAS

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GARCIA, Bruna Pinotti; LAZARI, Rafael de. Manual de direitos humanos. 2. ed. Salvador: JusPodivm, v. único, 2015.

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