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D OMINAÇÃO MASCULINA , PRECONCEITO E DISCRIMINAÇÃO DE GÊNERO

I NTRODUÇÃO “[ ] na democracia representativa, a

A COLETA DOS DADOS

3. P RÁTICAS E REPRESENTAÇÕES SOBRE A AÇÃO POLÍTICA A atuação dos parlamentares no Congresso Nacional dá-se de diversas maneiras:

3.2. B ASES ELEITORAIS , DISCRIMINAÇÃO E SOCIALIZAÇÃO POLÍTICA

3.2.2. D OMINAÇÃO MASCULINA , PRECONCEITO E DISCRIMINAÇÃO DE GÊNERO

A dominação masculina – ou o patriarcalismo253 –, ao produzir um sistema de relações

sociais que colocam, por definição, a mulher no pólo dominado, contribui para produzir na sociedade as mais diferentes formas de preconceito e discriminação a respeito das capacidades e habilidades que a parcela feminina da população tem para o mundo político. A partir de um padrão que, durante muito tempo, situou a política como uma atividade fora do campo de ação das mulheres, a sociedade – permeada por uma herança patriarcal – parte de preconceitos que se constituem em verdadeiras barreiras que as parlamentares devem ultrapassar no seu cotidiano. Tomando-se como referencial os discursos produzidos na pesquisa de campo desenvolvida neste estudo, foram identificadas algumas manifestações desse teor.

A primeira delas refere-se às dificuldades que enfrentaram nos processos de candidatura e campanha. Tal como foi apresentado no capítulo 2, o comportamento das organizações partidárias aparece como um dos elementos que dificultam a ação das mulheres no campo político-institucional. No entanto, no caso das mulheres bem-sucedidas no processo político- eleitoral, que foram eleitas ou reeleitas para a Câmara dos Deputados, percebem-se menores queixas em relação ao apoio partidário. Isso se verifica, tanto porque contam com redes próprias de apoiadores e estão em situação de independência frente à máquina partidária, quanto porque eram dotadas de um nível de capital político maior que o das outras candidatas e, portanto, foram estimuladas a se candidatarem pelos próprios partidos.254 A idéia, neste

último caso, é que as mulheres que conseguem se eleger para a Câmara são dotadas de uma trajetória anterior e de um tipo de capital político que propicia o seu reconhecimento frente ao partido. Na fala das próprias parlamentares:

Tem muita [dificuldade nos partidos], mas eu, como tinha apoio do meu marido [que é político famoso], tinha a força dos meus familiares, dos meus amigos, muita gente envolvida na minha campanha, não tive. Não fiquei lá, assim, junto do partido, sentada ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

253 Tal como é entendido pelas estudiosas da área de gênero; ver capítulo 1.

254 Assim como aponta Prá (1992), qualquer evidência de apoio partidário colhida de mulheres que

obtiveram sucesso político deve ser relativizada, vez que, em geral, costuma-se dar mais crédito aos partidos do que eles realmente possuem. Essas mulheres, em grande parte dos casos, contaram com redes de apoio próprio, independentes dos partidos.

lá, dependendo de alguém. Não, nunca fui. Minha candidatura, de dois mandatos, eu não fiquei dependente do partido nosso, eu fiquei dependente do meu eleitor (Deputada federal – PFL). Depois do ministério, foi natural a aceitação, e o resultado foi eu ter sido a primeira deputada federal eleita pelo partido no estado. Como analista já conhecida, pelo contrário, tive enormes facilidades de fazer uma campanha dizendo o que eu faria (Deputada federal – PSDB).

Assim, as dificuldades em relação ao apoio partidário se manifestam muito mais no início de suas carreiras políticas, de seu envolvimento com esse campo, do que no momento em que conseguem lançar-se candidatas à Câmara Federal. Referindo-se às eleições que disputaram antes da Câmara, muitos foram os relatos de falta de estrutura e de apoio partidário para a campanha, de dificuldades para lançarem as candidaturas e do machismo ainda vigente nos partidos.

O partido, no PT, nós temos maior parte de participação de mulheres no processo político, tanto na Câmara como no Senado. Mas isso não significa que o machismo foi banido não, o machismo tá na cabeça, nas mentes, na história [...] Há diferenças de apoio de estrutura e tudo, há diferença de dar mais estrutura em alguns candidatos homens, eu senti isso na outra eleição como deputada federal (Deputada federal – PT/SC).

[Dificuldade] particular? Eu tive muitas dívidas. É, de novo a falta de apoio. Não foi tão consensual assim eu ter sido candidata a prefeita, eu tive que disputar uma prévia dentro do PT, o grupo de sindicalistas que faziam parte do partido não queriam meu nome. Eles lançaram outro nome, que não tinha nenhuma projeção, era só um rapaz que era presidente do sindicato. Nunca houve muita convergência dentro do PT, entre o grupo de sindicalistas, e eu, mulher, que fui vereadora, professora (Deputada federal – PT/SP). Eles [dirigentes partidários] acham que a gente como mulher tem dificuldade pra fazer uma viagem por uma estrada que é muito longe, eles acham que é difícil pra uma mulher ir viajar, e dormir naqueles apartamentos e nos quartos. Eles acham assim, e acham assim que política é mesmo só pra homem mesmo, por causa das coisas que eles pensam. Até para os assuntos pra conversar, o homem quer conversar tanta coisa que acha que a mulher não pode escutar... (Deputada federal – PFL).

Todas, todas, todas [dificuldades na primeira eleição]. Não tinha recurso de qualquer natureza. Era como se quisesse matar a candidatura no

nascedouro. Não tinha apoio, dificuldade pra falar em palanque. Tudo dentro do próprio partido. Na época, a própria esposa do governador, ela tinha discriminação sobre a gente usar o microfone, falar. Saí fazendo a campanha, me colocando em todos os lugares que tinha que me colocar, me coloquei em todos os lugares, falei onde quis 255, e

nos comícios que eles me falavam que eram grandes comícios, eu tinha muita dificuldade de falar, não me deixavam falar. Até que um dia aconteceu um fato que aí foi a minha sentença definitiva. Me chamaram pra falar, eu não falei, quando acabou o comício eu cheguei e falei: ‘Posso falar por favor?’, ‘Mas não tem ninguém na praça, você vai se queimar’. Eu falei: ‘Pois posso falar pra ninguém?’ Ele falou assim: ‘Então tá, com a palavra a candidata a deputada’ e tal. Falei. Aquela praça que tinha 10 mil pessoas que foram embora, tinha umas cento e poucas ainda caminhando na outra direção, voltaram umas 500, e eu tive 480 votos. E aí que foi minha ruína, porque a repercussão na cidade foi grande e aí que não me deixaram mais falar (Deputada federal – PMDB).

É interessante observar, a partir dos depoimentos, a eficácia do processo de dominação masculina. Como vem sendo destacado, a dominação simbólica funciona ao introjetar, nos próprios dominados, as mesmas categorias de percepção e de entendimento da realidade que seus dominantes utilizam; desse modo, há a reprodução, por parte das mulheres, de estereótipos e preconceitos referentes às suas capacidades e funções, tal como transparece nesse depoimento de uma das entrevistadas:

[As dificuldades] vêm, inclusive, de mulheres que fizeram uma reunião, era a presidente do PT na região, num outro município próximo, fizeram uma reunião pra eu desistir de ser candidata porque as mulheres trabalhadoras rurais não estavam preparadas pra ser candidatas. Isso me incomodou muito, a mim e a várias mulheres; isso motivou ainda mais a campanha, e o processo foi difícil porque como a gente não tava escalada pra ser eleita a gente tinha que se virar, né? [Isso] mostra que o preconceito, ele está nos homens e tá em algumas mulheres que também exercem o poder (Deputada Federal – PT/SC).

○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

255 A deputada possuía uma caminhonete, na qual instalou alto-falantes e, dessa maneira, pôde falar,

por conta própria, onde quis. Quando precisou do apoio do partido, a situação foi outra, tal como ficou relatado.

Não se pode ignorar, porém, que as dificuldades que as mulheres enfrentam nos partidos políticos remontam também à história de seu envolvimento nesse espaço. Por terem se inserido mais tardiamente na vida política formal do país e, portanto, contarem com menos capital político, os partidos, que atuam orientados segundo uma lógica eleitoral, apresentam, em grande parte dos casos, resistências em apoiarem decisivamente essas novas candidaturas:

Eu acho que essa dificuldade pra mulher atuar, é porque nós começamos depois, começamos atrasadas, por falta de experiência, por falta de participação nos partidos, porque os partidos eram fechados para as mulheres. Por isso que o movimento feminista na década de 70 teve uma importância muito grande de incentivar a participação das mulheres nas políticas e nos movimentos, é... mas penso... por exemplo, não se investe em mulher, não se investe em grandes campanhas de mulher, empresários, setores, grupos, não se investe muito em mulher, então a dificuldade vem lá desde a base, da experiência dela pra ela se eleger vereadora, deputada, até chegar aqui (Deputada Federal – PT/SP).

Uma vez vencidas as barreiras para a entrada no Parlamento, a dominação masculina encontra outras formas para se manifestar. Há que se considerar que a entrada de novos atores no campo político – independentemente de quem sejam – desencadeia um jogo de lutas de poder, de garantia da ordem dominante, de manutenção do status quo. Existe, portanto, subversão da ordem a partir do momento em que mulheres passam a participar da esfera política institucional. Há um sentido de ruptura, tanto no que se refere às práticas tradicionais que se desenrolam no Parlamento e que construíram o mundo político a partir de características consideradas masculinas, quanto no rompimento com a associação direta entre poder e mundo masculino. E essa relação, que sempre foi vista como natural, passa, agora, a ser questionada. Adotando-se a definição de campo de Bourdieu, historicamente os homens estiveram localizados nas posições de maior valor simbólico e prestígio no espaço político e, como tais, desejam manter essa mesma estrutura de forças. Para tanto, podem se utilizar de artifícios de que dispõem, inclusive de atitudes sexistas, estereotipadas e que desqualificam a presença da mulher na esfera política. Assim, características normalmente associadas ao feminino, como a sensibilidade, passam a ser apresentadas como formas de

desmerecer as conquistas alcançadas por essas mulheres.256 Algumas deputadas

manifestaram o que sentem em sua prática política cotidiana, destacando exemplos nos quais as posturas preconceituosas e estereotipadas se manifestam, não de forma explícita e direta, o que de fato se constituiria em crime, mas de maneira indireta, velada e sutil:

Ser mulher é uma coisa marcante, tu vai assim... Temas pra tu discutir, se tu não se impõe eles [homens] acham que temas pra você discutir são temas que não interessam pra grande política, interessam só pra nós mulheres, então você precisa tá enfrentando o tempo inteiro que nós somos capazes de discutir a distribuição de renda, que a questão da reforma agrária faz parte da nossa pauta, que a luta de construção do país democrático faz parte da nossa política de mulheres, dentro do nosso projeto também, então ele [o preconceito] é permanente, muitas vezes sutil, mas permanente (Deputada federal – PT/SC).

A primeira tendência, a primeira reação de um homem [no Parlamento] é não olhar a mulher da mesma forma que ele olha os seus pares. Ele olha a mulher sempre achando que ela tem uma capacidade um pouquinho menor, ele não se sente muito à vontade. Mesmo porque ele tá muito acostumado com esse ambiente que ele pode falar a bobagem que ele quiser, falar besteira, contar as piadas e com a nossa presença ali já mudou, entendeu? Então muda [o mundo político com a entrada da mulher], porque o ambiente masculino é um ambiente assim, muito próprio, não tô dizendo esquisito, mas é muito particular, como o ambiente feminino também é. Eu reparo que eles não gostam muito que a gente entre na roda (Deputada federal – PCdoB).

Na disputa plenária, quando a mulher tenta ter assento à mesa, aí a corporação se fecha pra impedir, né? (Deputada federal – PMDB).

Desse modo, muitas deputadas sentem que a questão de gênero perpassa a competição política ao criar elementos, posturas e representações que dificultam o pleno exercício de suas atividades diárias. São vítimas, em alguns casos, de ataques pessoais e de atitudes explicitamente discriminatórias que ainda desqualificam sua postura como postura política. Para além dessa discriminação direta, que não é a regra,

256 Ilustra esse argumento fato relatado em relação à ministra Marina Silva, que, por ter se emocionado

e chorado em público, foi acusada de somente conseguir “no choro” algumas importantes vitórias políticas. ATHAYDE, Phydia. Jogo de damas. Carta Capital, ano XII, n. 389, p. 12-18, abril de 2006.

reconhecem que são vítimas de comportamentos não explicitamente objetivados, mas que se manifestam nas menores e mais simples ações.

Eu não levo desaforo pra casa, eu respondo, nunca levei. Eu penso que nós precisamos nos valorizar, conquistar o espaço nesse sentido. Eu já tive numa comissão, que quando fez o enfrentamento político pra valer, de frente dos trabalhadores, teve deputado que me chamou de mal amada, mal resolvida, mal isso, mal aquilo, né? E isso aconteceu este ano, então é o seguinte, o preconceito, ele existe, e eu sofri isso. Agora houve uma reação muito bonita das mulheres em minha defesa, que eu nunca esperava, e da própria sociedade, de defender que ele ofendeu porque, além de ser uma mulher, fez uma disputa política, ideológica em defesa de uma classe social. Mas ele [o preconceito] não aparece muitas vezes, nem sempre aparece. O pior que tem é quando não aparece, esse que é o mais difícil de enfrentar (Deputada federal – PT/SC). A pessoa de repente, chega pra você e... ‘Ah.. vamos encerrar a discussão’, quando você... ‘Vamos encerrar, vamos discutir mais não’, depois que já discutiu tudo... ‘Não, não, eu tenho uma colocação a fazer’. Então muitas vezes eu não discuto não, vou lá, defendo minha proposta e acabou. Alguns gracejos, tipo assim, ‘essas mulheres falam demais, né?’ ‘Não sei o que mulher tá fazendo no Parlamento’, mas eu levo isso na galhofa, não levo a sério, até porque quem tá falando não pode ser sério, e se é sério não podia estar aqui, porque esse pensamento ele não fala no microfone pra ninguém... (Deputada federal – PMDB).

Há, ainda, o caso daquelas deputadas que relataram acreditar que esse tipo de manifestação existe no Congresso Nacional, mas que não foram atingidas por adotarem “posturas preventivas” ou por terem uma trajetória feminista que, de certa forma, constrangia os deputados a direcionarem-se a elas de modo pejorativo ou irônico.

Ah! Isso sim, gracinhas eles fazem, mas até pela minha atuação feminista que os deputados conhecem, não é comigo que eles fariam essas graças (Deputada federal – PT/SP).

Não [fui vítima de discriminação], mas, sem dúvida, pratico uma política de prevenção. Na verdade, a discriminação está em toda a parte, mas não é aqui dentro do Congresso que eu sofri qualquer impedimento por ser mulher, ou piadinha por ser mulher. Normalmente quando querem se manifestar desta maneira, eles [os deputados] usam a imprensa (Deputada federal – PSDB).

Por fim, um outro ponto importante, e que se relaciona à idéia de um ethos masculino de fazer política, é a percepção que as deputadas têm a respeito da adoção de posturas masculinizadas na sua atuação política. De fato, a questão que está por trás desse tipo de comportamento é a visão de que existe um modelo universal e masculino de se fazer política que é valorizado e adequado para o desenrolar das atividades no interior do Parlamento. A visão androcêntrica do mundo político, portanto, cria uma representação do ponto de vista dos valores e dos comportamentos que excluem – ou não reconhecem – as características que foram socialmente atribuídas às mulheres, ou que desenvolveram de modo particular. Logo, ao se dirigirem a espaços tipicamente masculinos, muitas mulheres acabam negando a condição de gênero que lhes foi atribuída por uma construção social e incorporam uma visão, também estereotipada, do homem no poder. Assim, à docilidade e delicadeza que seriam esperadas de uma mulher, em função das construções sociais acerca do “ser feminino”, opõem-se posturas mais agressivas e impositivas.

Ao tentarem romper com tais posturas tradicionalmente valorizadas como femininas, as mulheres passam a sofrer com a discriminação e o preconceito, sendo acusadas de serem masculinas, arrogantes e prepotentes.257 Tal como escreve Miguel,258 “Uma vez

no Parlamento, há duas opções: ou a mulher enfrenta o preconceito e age da mesma forma que o homem, correndo o risco de ser tachada de masculinizada, ou restringe-se aos nichos que no campo político são ligados às mulheres”. Nenhuma das entrevistadas assumiu adotar esse tipo de comportamento, mas reconheceram a sua existência e o associaram à questão da aceitação, da busca pela igualdade e pelo respeito.

Muitas mulheres, não só na política, mas também quando as mulheres vão para o Executivo, também uma secretaria, um ministério, um cargo de poder... Ela tá com esse defeito, ela começa a fazer essa postura, de grosseria assim até. Parece-me que é pra disputar em pé de igualdade com os homens. Eu acho que não deveria ser por aí. Nem ficar chorando também pra todo mundo ficar com pena da gente, mas também não é impor pela força, né?

257 Em entrevista ao jornal Correio Braziliense, de 5 de março de 2006, a ministra Dilma Roussef, cuja

atuação não segue os padrões reconhecidos como femininos, afirma que “[...] notei que sou a única pessoa autoritária, mandona e com opinião de todo o governo, cercada de homens meigos, doces e gentis”.

258 Em entrevista concedida à revista Carta Capital, de 19 de abril de 2006, p. 15.

E na casa tem mulher que grita, faz o pronunciamento gritando e todo mundo critica e acha ruim, os homens e as mulheres também. [Essa postura] prejudica a mulher, em vez de conquistar o espaço, nós perdemos (Deputada federal – PFL).

Existe porque é difícil, é difícil. Eu nem adotei a [postura] maternal, nem achei que eu tinha que me masculinizar pra me defender. Mantenho a minha postura como classe social e como uma questão de gênero, trabalhando as duas questões. Não dizendo às mulheres que nós somos umas coitadas (Deputada federal – PT/SC). Eu acho que isso existe, eu acho uma bobagem, mas existe. As pessoas procuram saídas, né? Muitas vezes é difícil você se colocar numa Casa como essa, é difícil, você aparecer, você conseguir desenvolver suas idéias, suas propostas, se é que você as tem, né? Vejo muitas vezes as mulheres assumindo essas posições, e vi aí pelos parlamentos afora, posições maternais ou assumindo posturas bem repetitivas do comportamento masculino, [com o objetivo] de defesa e de se impor (Deputada federal – PT/SP). Eu não vejo isto aqui no Congresso e penso que se pelas características desta mulher na política, ela se acha mais bem aceita desta maneira, então isso é uma questão dela na busca da aceitação, mas não é uma norma. (Deputada federal – PSDB).

A adoção de posturas estereotipadas revela-se, desse modo, uma estratégia de que parte das mulheres se utiliza para conseguir espaço no Parlamento. Por partir de uma situação de inferioridade e desvalorização simbólica – gerada pelos anos em que foram formalmente excluídas desse espaço e pelos papéis de gênero que as mantiveram longe, mesmo quando já não havia mais imposições legais –, as parlamentares buscam, em si, mas a partir de um espelho masculino, características que farão ampliar seu capital político, mesmo que para isso tenham de negar sua condição de gênero. Há, desse modo, uma dualidade de valores à qual a mulher está submetida na política: é cobrada por uma postura que renove a política, que seja sensível, que introduza novos temas na agenda do Parlamento, mas essas mesmas características não são ali valorizadas, sendo atribuídas às suas funções políticas qualidades que se supõe não serem típicas das mulheres, como agressividade e objetividade.259

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