• Nenhum resultado encontrado

3 DOS DITOS E NÃO-DITOS SOBRE O CASO

3.2 Soltando a voz nas redes sociais

3.2.2 Da frequência de postagens e da narrativa resultante

Afinado ao percurso realizado até aqui, cruzamos os dados sobre a quantidade de posts realizados pelas páginas a cada dia, considerando a primeira data de uso como marcador inicial. Disto, sistematizamos:

Tabela 7 – Volume de postagens por dia QUANTIDADE

Página IES 0 posts 1 a 5 posts 6 a 10 11 a 15 16 a 19

@greveestudantilUFC UFC 34 18 6 5 3 @ocupaifce IFCE 24 50 --- --- --- @ocupartes IFCE 4 38 3 --- --- @ocupaurca2016 URCA 39 43 1 1 1 @ocupaufca UFCA 2 17 14 3 --- @ocupaunilab UNILAB 28 19 5 3 1

Fonte: Produzido nesta pesquisa (2019).

Primeiro, queremos tomar como recomendação postulada por Facebook ao orientar variável entre um e cinco postagens por dia como parâmetro, pois retroalimentam a mediação algorítmica da plataforma – conceito que aprofundaremos no terceiro capítulo. Estes caracteres em face a esta definição nos permitem observar em três vias: na primeira, nos debruçamos sobre a quantidade de dias sem postagens e percebemos em @ocupaunilab e em @greveestudantilUFC números maiores que o parâmetro estabelecido; enquanto, por sua vez, temos em @ocupaufca e @ocupartes uma expressão inferior a uma semana sem alimentação da plataforma.

79 Na segunda, atentamos ao excedente e percebemos que @ocupaufca tem o mesmo número de dias com quantidade de postagens aderentes ao parâmetro e que ultrapassam a recomendação. @ocupaunilab e @greveestudantilUFC possuem mais que a metade dos usos sugeridos. A este fenômeno dá-se o nome de overposting quando em, escala métrica, uma página realiza quantidade excedente de forma contínua em plataformas digitais.

A terceira está na aferição da desigualdade na distribuição do conteúdo entre os dias, de modo que as únicas páginas que realizaram mais de 16 postagens no mesmo dia são, em contrapartida, as mesmas que passaram mais dias sem publicar nada. Doravante, @greveestudantilUFC, @ocupaurca2016 e @ocupaunilab.

Para melhor extratificar o fluxo das postagens, temos:

Gráfico 1 – Fluxo de postagens das páginas

Fonte: Produzido nesta pesquisa (2019).

Nesta visualização conseguimos perceber, de forma mais acentuada, os períodos de overposting e de baixa gerência dos canais. Temos um boom de saturação da timeline em quase todos os canais logo após o lançamento – com exceção a @ocupaifce que nunca ultrapassa cinco postagens – e permanecendo assim 07 de dezembro, último registrado de overposting, praticado por @ocupaufca.

Diferente das redações jornalísticas nutridas por reuniões de pautas e planejamento estratégico que orienta a produção de sentidos e a costura narrativa sobre as coisas, as comissões de comunicação pouco se reuniam e encaminhavam as tarefas de forma

80 mecânica e pactuada em mecanismo de comunicação comum – a exemplo do que apuramos em entrevistas na composição da monografia. Nisso, a gestão das páginas possuía baixa curadoria do conteúdo e pouca – ou nenhuma – definição do traçado narrativo a ser compartilhado.

Nisto, oposto à análise dos jornais realizado na graduação, não temos aqui um circuito narrativo. Temos, por sua vez, um apanhado majoritário de conteúdo ofertado diariamente com convites a programações e com registros fotográficos destas que convencionam uma condição comum quanto ao maquinário industrial da geração de saberes. Notamos na configuração do conteúdo que esta era a única narrativa planejada de forma seriada e executada fielmente em todos os casos, pois a ampla adesão à tática de divulgação das ações abertas nas ocupações confere uma costura de sentidos voltada a dirimir à criminalização que as ocupações tendiam a sofrer, atribuindo, assim, o sentido de normalidade ao espaço acadêmico. Apesar de se nutrir em debates oficinas incomuns ao currículo das instituições, o chamado ao debate público permitia a justa construção de narrativa onde o espaço continuava exercendo seu papel: produzindo conhecimentos.

A ausência de campanhas articuladas em torno de alguma pauta específica ou de apontamentos políticos mais constantes nos faz concluir que o exercício de comunicação pública, por sua vez, pode ser majoritariamente envolta à postura defensiva aqui discutida em detrimento da possibilidade de estabelecer maiores considerações nos canais construídos sobre a forma que percebem a conjuntura e o mundo que os rodeia.

A presença massiva dos serviços de programação frente à notória ausência de políticas de comunicação e agitação da política assumem duas conotações: na primeira, configura uma noção de cotidiano que torna as ocupações mais próximas à prática de cidadania do que de desobediência civil – de modo que a centralidade em dizer que existiam atividades sucumbiu, por exemplo, à narrativa sobre paralisação das atividades e a articulação de ações de demarcação e de pressão pública em torno das pautas defendidas. Na segunda, corrobora para o esvaziamento da política nos canais pensados para o diálogo público.

É justo, portanto, aferir após análise do conteúdo que a narrativa construída pelos estudantes eixa-se em: a) o estabelecimento das ocupações nas universidades com demarcação da política nos dias iniciais de ocupação; b) oferta de programação e construção de imagem pública de cidadania em relação aos usos dos espaços – maior período narrativo; que desemboca em c) acirramento no dia de votação em última instância da PEC 55, de 11 a 13 de dezembro; e finaliza com o d) encerramento e balanço das ocupações.

81 Assim, @ocupaufca finalizando atuação em 14 de dezembro com 1037 seguidores; @greveestudantilUFC encerrou suas atividades em 17 de dezembro com 5558 seguidores; @ocupartes concluiu trabalhos em 21 de dezembro com 781 seguidores; @ocupaifce fechou expediente em 03 de janeiro com 567 seguidores; @ocupaunilab dirimiu trincheiras virtuais 12 de janeiro com 664 seguidores e @ocupaurca2016 hasteou bandeira em 18 de janeiro com 1006 seguidores.

3.2.3. Da representação social

Considerando os itens discutidos até aqui e o conjunto do conteúdo analisado, notamos, na narrativa construída nos canais de comunicação pública das ocupações, a constituição de representação social em três vias: sobre o estudante, sobre o ato de manifestação política e sobre a ação de ocupação.

Temos em @greveestudantilUFC, @ocupaufca, @ocupaunilab, @ocupaifce e @ocupartes uma representação social margeada em disputa dentro dos marcadores do sistema político. Tomando, por sua vez, uma representação do ato de ocupação como uma ação cidadã voltada à defesa de direitos sociais e em conformidade aos preceitos legais, apoiando-se, essencialmente, na construção de imagem pública de bom convívio e diálogo. Estabelecem uma configuração de ocupação como um espaço aberto a partir da manutenção da produção de conhecimento nas Universidades, só que, naquele momento, com o convite público a todos que queiram se fazer presentes.

Representam o ocupante como um cidadão em exercício de direitos e a manifestação política como um critério para justaposição de um sistema democrático. Balizam-se em torno de uma representação média que mais exprime a importância da ação empreendida do que os motivadores desta sem demarcar uma orientação política e pouco visibilizando as organizações políticas que construíram as ocupações.

Em @ocupaurca2016, temos uma representação antissistêmica e de ruptura. É comum, no texto, críticas inflamadas ao ordenamento do Estado e às dinâmicas democráticas. Entende e nomeia a ação como um precursor revolucionário, representa o estudante como o dono de todo poder, quando se propõe à ação coletiva, renega valores de cidadania em exposição a versadores políticos que conflitam entre anarquismo e stalinismo com frequentes formações políticas demarcadas nestes radicais. Versa sobre manifestação política como ação urgente e pautada essencialmente na demarcação do ódio de classes, estimulando ações como

82 o achincalhamento e a queima de um boneco com o rosto de Temer na entrada do Campus. Provoca, ainda, o enunciado pela página como única verdade possível em detrimento da negação invariável do apurado por jornalistas ou do que fora dito em outros canais.