• Nenhum resultado encontrado

6. PISTAS, EVIDÊNCIAS E ANÉDOTAS PARA VERSAR TEMPO

6.2 Das conjugações sociais sobre midiatização da vida e da política

6.2.3 Das crenças e desconfianças

Conferir às plataformas digitais o status de nova esfera pública é considerar que as pessoas tendem a adotar confiabilidade nas informações que nela circulam. A decorrência desta dinâmica se circunscreve, entretanto, na alteração dos preceitos sobre credibilidade e confiabilidade no consumo de informações que, antes, estavam alocadas a conglomerados de comunicação e, agora, se transferem aos componentes da bolha em rede social de cada usuário.

O fenômeno da redução da confiança nas instituições tradicionais de informação, seja das empresas jornalísticas, sejam os Institutos de pesquisa, confere marca importante sobre os tempos que vivemos. Ainda que sob muitos esforços de divulgação científica e checagem de dados, a exemplo das experiências de Fact checking87 do jornalismo, a experiência de sociabilidade nas redes que conjuga a falsa sensação de democratização na disputa de narrativas produz uma relação em que, adotando por critério as relações estabelecidas ou as convenções que mais fazem sentido ao usuário sem tônica crítica, elege a narrativa a ser tomada como registro da realidade.

É justo notarmos, como faz Reuters (2019), que a polarização política reduziu em 11% a confiança geral nas notícias produzidas por instituições jornalísticas – quando comparado aos números do relatório lançado no ano anterior – e este é um dos elementos para que os canais de jornalismo não sejam, hoje, a principal fonte para obtenção de informação. Ao estabelecer comparativo entre os dados do Reuters Digital News Report dos anos de 2013 e de 2019, percebemos que a incidência de uso e confiabilidade caiu da marca de 50% para 27% entre impressos e de 43% para 26% em plataformas online.

Na justa medida em que, por sua vez, o Facebook passa a ser o principal curador de notícias para brasileiros que, por sua vez, são a população que mais acreditam em notícias – como já discutimos antes neste capítulo – e soma como fonte primária de informação dentre 87 - Fact checking é a prática jornalística de checagem de discursos em oposição aos dados dos substratos legais, factuais e temporais dos itens enunciados.

156 mecanismos digitais para 78% dos búlgaros, 68% de romênos, 67% dos mexicanos, 64% dos chilenos, 63% dos argentinos, 62% dos húngaros, 61% de poloneses, 60% dos malaios, 59% dos sulafricanos, 58% dos gregos, 56% dos croatas, 54% dos italianos, 53% de portugueses, 52% dos honconguêses, 50% dos alemãos, 50% dos checos, 47% de espanhóis, 46% dos franceses, 45% dos noruegueses, 42% dos belgas, 40% dos canadenses, 39% dos estadunidenses e 28% dos ingleses como detalha Reuters (2019).

Observamos a polarização da política como também resultante das métricas de mediação disponíveis nas plataformas virtuais. As suspeitas de Howard e Wooley (2018, p. 3) onde “os algoritmos de mídia social podem estar criando câmaras de eco nas quais conversas públicas são poluídas e polarizadas” são confirmadas na constatação, a partir da circulação de conteúdos segundo os perfilamentos de cada bolha. A polarização, portanto, é decorrente de um consumo selecionado de notícias que, por vezes, exprimem apenas uma versão das narrativas em disputa.

No Brasil, lidamos com um cenário apresentado pela pesquisa do DataSenado (2019, p. 5), onde 83% das pessoas entendem que as redes sociais virtuais influenciam ‘muito’ na formação da opinião pública. Esta consciência, entretanto, se afina a partir do nível educacional dos entrevistados de modo que, quanto mais alta a escolaridade, maior a noção de influência; e, quanto mais baixa, aumenta em relação inversamente proporcional a média de pessoas que perecebem a influência como ‘pouca’.

Nos canais analisados neste trabalho, percebemos estas características pela expressão quantitativa de ‘amei’ como reação majoritariamente predominante em decorrência de atingir as bolhas predispostas a dialogar com este conteúdo e pouco as superavam; nisto, possuiam um local no agendamento de informações para um pólo político.

Nem sempre esta seleção condiz com a ordem dos fatores, pois “os algoritmos do feed de notícias veiculam o que ‘pensa’ ser a sua opinião e a de seus amigos e certamente não checa fatos” (CELLAN-JONES, 2016) em ambiente que, como destaca White (2017), abriga uma série de informações “deliberadamente fabricadas e publicadas com a intenção de enganar os outros com falsas notícias ou em duvidar de fatos verificáveis". A este fenômeno de agendamento social a pesquisa em comunicação tem nomeado por ‘Fake News’ e se fundam no emprego de poderes, a fim de imprimir como real o que comprovadamente não é.

Este é um conceito que se fundamenta nos estudos de Cardoso et al (2018), de Ribeiro e Ortellado (2018) e nos escritos por Cellan-Jones (2016), ao identificar o ano de 2016 em um catalisador para a compreensão da fake news como um fenômeno da disputa de narrativa, sobretudo ao referenciar as eleições para o Governo Estadunidense a partir da

157 campanha de Trump e as narrativas compostas sobre as mobilizações em torno do Brexit. Entretanto, para além dos radicais de uma observância eurocêntrica e norteamericana do mundo, tomamos as eleições presidenciais no Brasil em 2014 como um marco para percepção do fenômeno que, devido à alta polarização entre Aécio Neves (PSDB) e Dilma Rousseff (PT), se deu em notada existência de fake news em ambas as plataformas de comunicação como confirma Rudieger (2017, p. 26). O estudo mantido pela Fundação Getúlio Vargas evidencia a participação de robôs em 10% das interações no Twitter sobre o assunto e, ao acompanhar o debate presidencial da Rede Globo em outubro, temos:

Gráfico 7 – Participação de robôs na rede social resultante do Debate da Rede Globo para eleiçoes presidenciais em 2014

Fonte: Rudieger (2017)

Ao analisar o tráfego de conteúdo disposto na plataforma no período referente ao debate entre presidenciáveis, transmitido pela TV Globo em 02 de outubro de 2014, Rudieger verifica a participação de robôs com disposição de conteúdos que acumulam politicamente na disputa de narrativas, sobretudo em favor dos candidatos que polarizaram a disputa: sendo a presença destes equivalente a 19,18% nas manifestações pró-Aécio e 17,94% nas intervenções pró-Dilma.

158 Sob a lógica dos filtros bolhas e alto conhecimento sobre usuários disponíveis em Big Data, temos, no caso acima explorado, um padrão de disseminação com êxito, porque os espaços para estabelecimento do contraditório e do debate público são muito restritos. Ainda que as narrativas falsas constantes em posts ganhem força e sejam impulsionados por compartilhamento, agregam a credibilidade de quem difunde a informação.

A confiabilidade da notícia em redes sociais para 71% dos brasileiros está relacionada à fonte de publicação, enquanto 24% agregam a pessoa que compartilha a informação o caráter de credibilidade. Esta relação, no entanto, oscila a partir dos níveis de escolaridade. A pesquisa confere que, quanto mais alto o grado da pessoa, maior a tendência de se orientar no produtor da noticia (86%) e menor em quem a circula nas plataformas (11%); e, ao reduzir a instrução ao ensino fundamental inconcluso, a diferença entre estes diminuem para 50% e 43% respectivamente, como detalha DataSenado (2019, p. 14)

Temos o ano de 2016 como um marco para complexificação da circulação de informações a partir dos desenhos de táticas estruturadas para o Whatsapp. As práticas de comunicação nas ocupações universitárias, entretanto, não foram sujeitas da inovação de integração entre plataformas. Apesar de possuírem grupos de Whatsapp para comunicação interna, não desenvolveram banco de dados e listas de disparo para difusão de conteúdo na plataforma. A tática, por sua vez, foi desenvolvida e utilizada majoritáriamente para difusão de fake news em período eleitoral ao ponto de, nas eleições brasileiras de 2018, por exemplo, o Reuters Digital News Report (2019) registrar a criação de cerca de um milhão de grupos no Whatsapp para promoção de candidaturas políticas no Brasil.

Lidamos com um cenário onde 8 em cada 10 brasileiros já identificaram notícias falsas nas redes sociais virtuais. As relações com educação constituem filtro importante neste quesito, pois percebemos que a ação de checagem é uma iniciativa para 89% dos perfis com acesso ao ensino superior e para 69% dos que possuem ensino fundamental incompleto. Estes dados são o extremo de uma escala onde os níveis de escolaridade definem, proporcionalmente, o uso (ou não) de critérios antes de circular informações, como expõe DataSenado (2019, p. 9).

Chegamos num ponto drástico ainda em 2017, ao registrar a marca de 12 milhões de pessoas difundindo fake news sobre política no Brasil, como apresentam as pesquisas do Grupo de Pesquisa em Políticas Públicas para o Acesso à Informação – GPoPAI da Universidade de São Paulo realizadas por Ribeiro e Ortellado (2018, p. 74), ao analisar a produção de conteúdo em 500 páginas no Facebook.

159