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Da materialização à homologação do flagrante: a decisão judicial

Tendo em vista, então, o conceito de prisão em flagrante, bem como sua natureza jurídica e relevância para aplicação das medidas cautelares de coerção pessoal, é preciso que se analisem alguns requisitos fundamentais para sua legalidade.

A partir do conhecimento das espécies de flagrante, que estão previstas no artigo 30213, do Código de Processo Penal Brasileiro (CPP), conforme o elencado no

artigo 310 da mesma legislação, e segundo Lopes Jr. (2013, p. 73), ao receber o auto de prisão em flagrante, o juiz deverá proceder de tal maneira:

1º momento: analisar o aspecto formal do auto de prisão em flagrante, bem como a legalidade e ilegalidade do próprio flagrante, mediante a análise dos requisitos do art. 302, do CPP. Se legal, homologa; se ilegal (nos casos de flagrante forjado, provocado, etc.) deverá relaxá-la.

2º momento: homologando a prisão em flagrante, deverá, sempre, enfrentar a necessidade ou não da prisão preventiva, a concessão da liberdade provisória, com ou sem fiança, e a eventual imposição de medida cautelar alternativa.

Acrescenta Lopes Jr. (2013) que no primeiro momento o que o juiz faz é avaliar a situação de flagrância, se realmente ocorreu alguma das situações dos artigos 302 e 303, do Código de Processo Penal Brasileiro (CPP), e, ainda, se todo o procedimento para elaboração do auto de prisão em flagrante foi devidamente desenvolvido, especialmente no que tange à comunicação imediata da prisão ao juiz, a entrega da nota de culpa ao preso e a remessa ao juízo no prazo de 24 (vinte

quando a lei admitir; II - a manutenção da prisão, quando presentes os pressupostos da prisão preventiva, sempre por decisão fundamentada e observada a legislação pertinente; ou III - o relaxamento da prisão ilegal [..].

13 Art.302.Considera-se em flagrante delito quem: I- está cometendo a infração penal; II- acaba de cometê-

la; III- é perseguido, logo após, pela autoridade, pelo ofendido ou por qualquer pessoa, em situação que faça presumir ser autor da infração; IV- é encontrado, logo depois, com instrumentos, armas, objetos ou papéis que façam presumir ser ele autor da infração.

e quatro) horas. É, portanto, em última análise, a fiscalização da efetivação do disposto no artigo 306, do Código de Processo Penal brasileiro (CPP).

Lima (2015) ressalta que não há na lei nenhuma exigência de que a detenção em flagrante deva ser apreciada judicialmente no prazo máximo de 24 (vinte e quatro) horas, pois o que o Código prevê é que a cópia do flagrante seja encaminhada pelo Delegado ao juiz em até 24 (vinte e quatro) horas (vigésima quarta hora, portanto, inclusa). Na visão do autor, não tem, dessa forma, o juiz nenhuma obrigação de exarar decisão em tal prazo, pois só poderá decidir quando receber os autos, conforme a reforma legislativa ocorrida em 2011.

Nesse sentido, acentua Lima (2015), caso o juiz não tome nenhuma providência prevista no artigo 310, do CPP, em 24 (vinte e quatro) horas, não há que se falar em qualquer ilegalidade, justamente pela interpretação literal da lei.

Contudo, tal posicionamento não é majoritário. Diversas são as correntes que preconizam que a manifestação da autoridade judiciária deve acontecer no prazo de até 24 (vinte e quatro) horas após o recebimento do respectivo auto de prisão em flagrante. Em concordância a esse entendimento, afirma o Tribunal de Justiça gaúcho, no julgamento de um habeas corpus:

HABEAS CORPUS. HOMICÍDIO QUALIFICADO E TENTADO. ALEGAÇÃO DE INCOMPETÊNCIA DO JUÍZO. PRISÃO PREVENTIVA. 1. O impetrante postula a concessão da ordem de habeas corpus em favor dos pacientes, que estão segregados por ordem de prisão preventiva decretada, acusados da prática de homicídio qualificado e homicídio qualificado tentado. Alega que a prisão preventiva dos pacientes foi decretada por autoridade incompetente, uma vez que a magistrada presidente do Tribunal do Júri da Comarca de Caxias do Sul, após a homologação e conversão da prisão em flagrante em preventiva pelo Juiz plantonista, declarou a incompetência daquele Juízo e determinou a remessa dos autos para a Comarca de Bento Gonçalves, sem, contudo, se manifestar acerca da revogação da prisão preventiva. Na Comarca de Bento Gonçalves, os autos foram com vista ao Ministério Público, sem que fosse proferida qualquer decisão. 2. Nos termos do art. 290 do CPP, quando o indiciado empreende fuga após a prática delitiva e a prisão em flagrante se dá em outro município, cabe ao executor apresentá-lo à autoridade local. O juízo deve se manifestar a respeito da prisão em flagrante em até 24

horas, como no caso. Declinada a competência, a decisão foi ratificada pela

autoridade reputada coatora, não havendo ilegalidade a ser considerada, tendo sido verificada a observância do trâmite legal. ORDEM DENEGADA. (RIO GRANDE DO SUL, 2013)

Posteriormente, se chega ao momento mais importante, com base no corroborado por Lopes Jr. (2013): decretação de alguma das medidas cautelares de coerção pessoal, em substituição à prisão em flagrante, caso não seja possível a concessão de liberdade provisória, que deve ou ao menos deveria ser a regra.

Reporta-se aqui, ao já elencado no primeiro capítulo, no que tange à possibilidade de aplicação das medidas cautelares de coerção pessoal diversas ao cárcere, que estão previstas no artigo 319, do Código de Processo Penal brasileiro (CPP), e não somente a decretação da prisão preventiva.

Como já se verificou, após a homologação do auto de prisão em flagrante, pode o juiz, mediante requerimento do Ministério Público ou representação da autoridade policial, converter aquela em prisão preventiva. Contudo, bem se sabe que não é possível que isso ocorra de ofício pelo magistrado. E, também é de conhecimento que, apesar da possibilidade de concessão da liberdade provisória, ou da imposição de medidas alternativas à prisão, o cárcere é, atualmente, o meio mais utilizado.

Conforme destaca Lopes Jr. (2013), a conversão da prisão em flagrante em preventiva não é automática e tampouco despida de fundamentação. E mais, a fundamentação deverá apontar – além do periculum libertatis e fumus comissi delicti – os motivos pelos quais o juiz entendeu inadequadas e insuficientes as medidas cautelares do artigo 319, do Código de Processo Penal brasileiro (CPP).

Assinala-se, dessa forma, que a necessidade de ordem escrita e fundamentada pela autoridade judiciária competente é garantia constitucional prevista no artigo 5º, inciso LXI, da Carta Magna, e objetiva, acima de tudo, evitar prisões arbitrárias, haja vista que o magistrado deverá demonstrar fática e juridicamente os motivos da prisão assim, como sua necessidade, conforme corroborado por Nunes e Tópor (2015).

Lima (2015) frisa que, em caso de plantão judicial, o juiz receberá apenas a comunicação do flagrante acompanhada da cópia do auto de prisão em flagrante e não os consequentes autos iniciados através da notícia crime. Dessa maneira,

salienta que, com base na comunicação, mesmo que seguida do auto original da prisão em flagrante, o juiz por vezes não terá condições de aferir se o caso é de substituição por medida cautelar diversa da prisão, ante a precariedade de dados para tal.

Nesse viés, é que Lima (2015) ressalta a necessidade e a relevância da implantação da audiência de custódia, uma vez que permitirá a aplicação de medida cautelar adequada a cada caso, bem como, inevitavelmente, diminuirá o caos da superlotação das casas prisionais.

Outrossim, Lopes Jr. (2013) enfatiza que o problema não se encontra na necessidade do fumus comissi delicti, uma vez que este requisito, pressupõe-se, é inerente à própria situação do flagrante. Ora, se o sujeito foi surpreendido em situação de flagrante, restam configuradas a materialidade de um fato provavelmente delitivo e de sua provável autoria.

Contudo, para que a prisão em flagrante seja substituída por uma medida cautelar de coerção pessoal, não é suficiente a configuração da presença de seus pressupostos. Há de se atentar para o fato de que também deve estar configurada a necessidade de se acautelar a instrução criminal, a investigação policial, bem como a ordem pública ou econômica.

Ou seja, há de se verificar a presença do periculum libertatis, para o qual a fundamentação deve ser precisa e verídica, considerando-se que a probabilidade de cometimento de novos delitos com a liberdade do indivíduo, por exemplo, não tem o condão de justificar a manutenção de seu encarceramento por período indeterminado, como ocorre na prisão preventiva. É preciso a presença de risco iminente para as ordens pública e econômica, conveniência da instrução criminal ou para assegurar a aplicação da lei penal, de acordo com Lopes Jr. (2013).

Por conseguinte, importante destacar que, de acordo com o aduzido por Nunes e Tópor (2015), os princípios basilares da dignidade da pessoa humana e o da presunção da inocência devem ser devidamente observados pelo magistrado, independentemente da medida cautelar que decrete.

2.3 O estado de coisas inconstitucional do sistema penitenciário brasileiro e a