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Era condição imprescindível à concessão da aposentadoria, fosse por idade ou por tempo de serviço, o desligamento das atividades remuneradas abrangidas pela Previdência Social urbana.

O requerente da aposentadoria por velhice que exerce mais de uma atividade remunerada abrangida pela Previdência Social urbana deve desligar-se concomitantemente de todas elas para fazer jus ao benefício.234

Concomitantemente, a Consolidação das Leis do Trabalho, artigo 453, estabelecia (e ainda estabelece) como uma das causas de extinção do contrato de trabalho a aposentadoria espontânea:

No tempo de serviço do empregado, quando readmitido, serão computados os períodos, ainda que não contínuos, em que tiver trabalhado anteriormente na empresa, salvo se houver sido despedido por falta grave, recebido indenização legal ou se aposentado espontaneamente. (grifo nosso)

Dessa forma, tanto a legislação previdenciária quanto a trabalhista seguiam a mesma esteira, determinando que a aposentadoria necessariamente extinguiria o contrato de trabalho.

À época, a autarquia previdenciária expedia uma ‘carta de desligamento’, que o segurado levava à empresa onde trabalhava, e esta, por sua vez, providenciava a baixa do contrato de trabalho. Com a baixa, o INPS (como ainda era chamado o órgão gestor) concedia o benefício. Nada impedia, no entanto, que o empregado fosse readmitido no emprego, haja vista que não tinha se aposentado por invalidez.

234 Wagner Balera traz o informativo histórico da exigência de desligamento prévio para a concessão de aposentadoria espontânea: “A primitiva regra do direito brasileiro, inscrita na Lei Orgânica da Previdência Social (Lei nº 3.807, de 23 de agosto de 1960), exigia o desligamento do segurado do seu trabalho. Todavia, com o advento da Lei nº 6.887, de 10 de dezembro de 1980, resultou modificado o preceituado na Lei nº 5.890, de 1973, e foi criada a possibilidade jurídica de aposentadoria sem rompimento da relação laboral. Posteriormente, norma insculpida na Lei nº 6.950, de 1981, retomava a exigência de rompimento do vínculo laboral, com conseqüente restauração da regra primitiva estampada na Lei Orgânica da Previdência Social” (Revista de Direito Social, n. 20, p. 15).

A Lei nº 8.213/91 não fez nenhuma menção à exigência de desligamento do empregado como condição para a concessão do benefício da aposentadoria. Entendeu- se, portanto, que a relação jurídica trabalhista entre trabalhador e empresa estaria absolutamente desvinculada da relação jurídica prestacional entre trabalhador e Previdência Social.

Houve pretensa intenção de inserir no Plano de Benefícios da Previdência Social a extinção do vínculo empregatício nas edições iniciais da Medida Provisória nº 1.523, de 11 de outubro de 1996: “Art. 148. O ato de concessão de benefício de aposentadoria importa extinção do vínculo empregatício”.

No entanto, referido preceito foi revogado pela lei conversora, nº 9.528, de 1997, que não recepcionou a respectiva extinção.

Esse fato, contudo, tem gerado muita discussão, dando margem a entendimentos divergentes, em que uns concordam que a aposentadoria rescinde o contrato de trabalho por conta do artigo 453 da Consolidação das Leis do Trabalho e que, portanto, a partir da aposentadoria se iniciaria um novo contrato de trabalho, e outros entendem tratar-se de relações jurídicas distintas.

Posicionando-se favoravelmente à extinção do contrato de trabalho pela aposentadoria, Carrion assim se manifesta: “A aposentadoria extingue naturalmente o contrato de trabalho, quando requerida pelo empregado (assim também Magano)”.235

Nessa mesma esteira, Balera236 entende que a legislação previdenciária deve ser reformada para incluir a exigência de rompimento do vínculo laboral como pressuposto para a concessão da aposentadoria, para que novos postos de trabalho sejam criados. Para o autor, o objetivo da aposentadoria é a substituição do salário do trabalhador e, na medida em que este, aposentado, continua trabalhando, o objetivo deixa de ter eficácia, pois o benefício acaba sendo uma segunda renda, fugindo aos preceitos para o qual a proteção securitária foi criada.

Como conseqüência desse entendimento, a multa fundiária referente ao período anterior à jubilação não seria devida ao empregado. Assim sendo, a continuidade do empregado no emprego após a aposentação geraria uma ‘readmissão’ e uma automática renovação do contrato de trabalho, sendo devida a multa fundiária somente para o período a partir da ‘nova admissão’ contratual.

235 Comentários à Consolidação das Leis do Trabalho, p. 303. 236 Revista de Direito Social, n. 20, p. 14 e 17.

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Embora favorável à extinção do contrato de trabalho, Horvath Jr.237 menciona os principais argumentos para justificar que a aposentadoria não extingue o contrato de trabalho:

a) A relação jurídica laboral e a previdência são distintas. A atual legislação previdenciária não estabelece como pré-requisito para a concessão da aposentadoria a necessidade de afastamento do vínculo laboral;

b) A Constituição tutela o direito do trabalho sem restrições de qualquer natureza; c) A aposentadoria é faculdade subjetiva de quem preenche os requisitos previstos em

lei, não exigindo o sistema a partir da Lei 8.213/91 o afastamento do emprego. Nosso sistema não veda a continuidade da prestação de serviços após a aposentadoria, nem expressamente prescreve que o ato de concessão de benefício de aposentadoria importa em extinção do vínculo empregatício. A Medida Provisória nº 1.523, de 12/12/96, que deu nova redação ao art. 148 da Lei 8.213/91, estabelecendo que o ato de concessão do benefício de aposentadoria importava extinção do vínculo empregatício, teve curta duração, já que este dispositivo foi eliminado quando da terceira reedição da MP em tela. O art. 148 foi revogado pela Lei 9.528, de 10/12/97.

Há duas ações diretas de inconstitucionalidade a respeito, nos 1.721-3 e 1.770-4, sendo concedida medida liminar a esta última, entendendo os ilustres magistrados que seria inconstitucional considerar que a aposentadoria espontânea rescinde o contrato de trabalho se a legislação previdenciária nada dispõe a respeito e também pelo fato de que a ruptura do vínculo estaria infringindo a proteção do trabalho e a garantia ao recebimento dos benefícios previdenciários.

Embora os argumentos dos autores favoráveis à extinção do contrato de trabalho sejam bastante convincentes, concordamos com a posição de Castro e Lazzari238, que entendem não ser rescindível o contrato de trabalho pela aposentadoria por dois motivos:

O primeiro porque, sendo o contrato de trabalho um acordo de vontades, somente pela manifestação de uma das partes, ou pelo falecimento, ou por força maior, pode-se dar a ruptura da relação jurídica. O Estado não pode intervir para extinguir contratos entre particulares, pois aí não chega o poder coercitivo estatal. Em segundo lugar, o Direito do Trabalho se rege por princípios, dentre os quais o da primazia da realidade e o da continuidade da relação de emprego.

Durante muito tempo, considerou-se que o direito do trabalho englobava o direito previdenciário. Este último não existia de maneira autônoma.

237 Direito Previdenciário, p. 189-90. 238 Manual de Direito Previdenciário, p. 528.

A partir de 1988, o cenário mudou. A Constituição de 1988, chamada ‘Constituição Histórica’, destinou atenção especial à seguridade social, nunca antes vista em outra Carta Federal do país.

Como conseqüência, os direitos sociais experimentaram enorme avanço, demonstrando grande interesse do legislador constituinte no progresso social do país, principalmente no que tange ao direito do trabalho, e tratando separadamente o direito previdenciário, reservando um capítulo próprio para tratar dos assuntos da seguridade social, mas imprimindo ao primado do trabalho sua relevante importância.

A partir daí, o direito previdenciário começou a se desvencilhar cada vez mais e a se mostrar absolutamente autônomo em relação ao direito do trabalho.

A Lei nº 8.213/91 acompanhou toda essa mudança e deixou a cargo do trabalhador a decisão de rescindir ou não seu contrato de trabalho no momento de sua jubilação, já que as relações jurídicas seriam absolutamente distintas.

Rescindir o contrato de trabalho por aposentadoria não estaria mais conforme os ditames constitucionais do valor social do trabalho e de todo o seu primado.

Concordamos que aposentadoria significa ‘retirar-se para seus aposentos’, a fim de dar chance aos novos trabalhadores que estão ingressando no mercado de trabalho, mas essa deve ser uma decisão do trabalhador, e não é retirando-lhe direitos que o pleno emprego imperará.

Não se pode confundir relação jurídica de natureza trabalhista, cujos sujeitos são o empregado e o empregador, com relação jurídica de natureza previdenciária, cujos sujeitos são o segurado (ou dependente) e o INSS.

A Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) foi publicada no ano de 1943. A redação do artigo 453, portanto, é anterior à Carta Federal de 1988. A evolução dos direitos sociais nessa Constituição Histórica foi inédita, ressaltando a autonomia do direito previdenciário em relação ao direito do trabalho.

A Lei nº 8.213/91 acompanha essa evolução e retrata a realidade a partir da Constituição Federal, no momento em que deixa a cargo dos sujeitos da relação jurídica trabalhista a decisão de encerrar ou não o contrato de trabalho.

Assim, o artigo 453 da CLT acabou ficando em desconformidade com o progresso social, mostrando-se incompatível com o texto específico que trata especialmente da matéria previdenciária em comento.

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Ainda que a aposentadoria seja por idade e que haja presunção de incapacidade laborativa, a rescisão contratual deve ser uma liberalidade entre empregado e empregador, devendo ao primeiro o pagamento de todas as verbas rescisórias devidas por ocasião da demissão sem justa causa. O Estado não pode e não deve intervir nessa relação jurídica.

Assim, a busca do bem-estar social encontra-se no altiplano dos princípios, sendo, a nosso ver, perfeitamente possível não rescindir o contrato de trabalho do empregado que se aposenta espontaneamente, devendo ser respeitadas as relações autônomas entre os sujeitos envolvidos nas relações.

A importância que se dá ao trabalho vem de épocas longínquas. O homem, sem o trabalho, perde a dignidade. A própria Lei dos Pobres, já mencionada neste trabalho, objetivava não só assistir aos necessitados, mas principalmente ensinar aos pobres o trabalho, para que pudessem conseguir o próprio sustento.

Horvath Jr. descreve o desemprego como “a maior tragédia mundial porque atinge diretamente o indivíduo, destruindo a auto-estima do trabalhador, o induz ao crime, provoca destruição da família, sendo um elemento desagregador da vida em sociedade ”239.

Decisão recente, publicada em 14 de outubro de 2005 pelo Supremo Tribunal Federal no Recurso Extraordinário nº 449.420/PR, cujo relator foi o ministro Sepúlveda Pertence, teve o seguinte entendimento:

Só há readmissão quando o trabalhador aposentado tiver encerrado a relação de trabalho e posteriormente iniciado outra; caso haja continuidade do trabalho, mesmo após aposentadoria espontânea, não se pode falar em extinção do contrato de trabalho e, portanto, em readmissão.

Além disso, diante da medida liminar que ainda está operando, mantém-se intacto o contrato de trabalho pela aposentadoria, demonstrando os magistrados lucidez na busca da valorização merecida do primado do trabalho.

6.10 CÁLCULO DA APOSENTADORIA POR IDADE DO TRABALHADOR