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A base para o aprendizado das RCOs está fortemente fundamentada na utilização dos dados, das informações e do conhecimento que são herdados durante a vida de uma dada RCO (sua memória organizacional - vide sub-seção 2.1.2), bem como no nível de preparo dos atores da RCO. Para se ter uma visão clara sobre o conteúdo herdado em uma RCO, é importante situar a natureza deste assunto.

Assume-se que as OVs são criadas em um ACV para executar uma determinada tarefa (produção de um bem ou prestação de algum serviço) para um cliente (Kürümlüoglu et al., 2005). As OVs têm um comportamento temporário e distribuído e são legalmente e logicamente dissolvidas após o(s) produto(s) ser(em) entregue(s) ou o(s) serviço(s) ser(em) executado(s) de acordo com as cláusulas

contratuais acordadas (Rabelo e Pereira-Klen, 2002). Embora as OVs tenham um ciclo de vida bem definido, compreendendo a sua criação, operação/evolução e dissolução (subseção 3.3.1), o tempo de duração pode variar entre um período curto até um período longo de colaboração, dependendo das suas características (Camarinha-Matos et al., 2005a).

Quando uma nova oportunidade de colaboração surge, uma nova OV é criada. Os clientes e os parceiros da nova OV não são necessariamente os mesmos que trabalharam em OVs anteriores. De maneira geral, os atores de uma RCO são capazes de identificar apenas o que aconteceu dentro das suas próprias organizações para uma dada OV e não os casos e/ou problemas que ocorreram em outras organizações, e raramente sabem algo sobre o desempenho dos outros parceiros em uma certa tarefa (Karvonen et al., 2004, 2005). Isto significa que o conhecimento está disperso, não estruturado e ao mesmo tempo “escondido” pela RCO, quando idealmente ele deveria ser coletado, organizado, armazenado e disponibilizado a quem interessar após a dissolução das OVs.

A tarefa executada durante a fase de dissolução da OV e que visa transferir a experiência da OV para o ACV, especialmente os seus indicadores de desempenho, é chamada de Herança de Organi- zação Virtual (do inglês Virtual Organization Inheritance) (H-OV). Pode-se dizer que H-OV tem suas raízes na área de Memória Organizacional (Huber, 1991; Corbett, 1997; Weiser, 1997; Acker- man et al., 2003). Segundo Walsh e Ungson (1991), a memória organizacional consiste em artefatos mentais e estruturais e pode existir independentemente de um indivíduo particular. Estes autores re- conhecem que são os indivíduos que adquirem informações e conhecimento na realização das suas atividades e são eles que solucionam problemas e tomam as decisões. Para Walsh e Ungson (1991), portanto, a memória organizacional é tanto um construto individual, quanto um construto organizaci- onal. Os autores assumem ainda a existência de cinco fatores de retenção que compõem a estrutura da memória organizacional, além de uma fonte de fora das organizações, a saber:

1. Indivíduos: os indivíduos de uma organização retêm informações e conhecimento baseados nas suas experiências e observações diretas, que podem ser armazenadas na própria memória dos indivíduos ou mesmo nas suas crenças (Cowan (1988)).

2. Cultura: cultura tem sido definida como a maneira aprendida de perceber, pensar e sentir os problemas. A cultura é transmitida aos membros das organizações (Schein (1984)), ou seja, ela incorpora experiências do passado que podem ser úteis para o futuro.

3. Transformações: as informações estão inseridas em muitas formas de transformações que ocorrem nas organizações. A lógica que guia a transformação de uma entrada para um resul- tado (saída) está incorporada nestas transformações. A recuperação das transformações que ocorreram no passado pode guiar os processos de transformação atuais.

4. Estruturas: as estruturas têm a sua ligação com a memória organizacional através dos papéis dos seus funcionários. Os papéis dos funcionários provêm um repositório no qual as informa- ções da organização podem ser armazenadas; assim, o conceito de papel nas organizações traz uma ligação entre os indivíduos e a memória organizacional.

5. Ecologia11: a estrutura física de uma organização pode revelar informações sobre a organiza-

ção. Funcionários que trabalham em locais densamente populosos e pouco iluminados têm, normalmente, desempenho baixo, muitos conflitos interpessoais e poucas oportunidades de de- senvolver amizades.

6. Arquivos externos: organizações são cercadas por outras entidades que seguem as suas ações. Essas entidades também armazenam informações que podem ser recuperadas sobre o passado da organização.

O termo H-OV tem surgido como uma prática para preservar e reutilizar as experiências comuns e outros bens criados em uma OV (Karvonen e Pereira-Klen, 2006) e visa capturar as informações e o conhecimento como forma de memória organizacional. Essa prática tem a sua importância quando se trata de problemas relacionados às questões de como gerenciar a informação, práticas e o conhe- cimento gerados, bem como produtos e serviços (Camarinha-Matos e Afsarmanesh, 2004b). De fato, esta área ainda se encontra na sua infância e alguns passos iniciais para lidar com as experiências pas- sadas de OVs foram dados no projeto ECOLEAD (Afsarmanesh et al., 2005). Segundo Afsarmanesh et al. (2005), os ACVs devem prover um repositório que contém ontologias comuns, ferramentas de softwaree informações comuns relacionadas ao ACV onde as suas OVs possam auxiliar na H-OV com o objetivo de manter a memória organizacional. Entretanto, ainda há falta de um formalismo para caracterizar a relação entre H-OV com a memória organizacional. Assim, o processo de gerir os dados herdados das OVs nos ACVs é chamado de Gestão da H-OV.

Existem algumas abordagens atuais que podem dar suporte à H-OV, pois elas lidam com proble- mas relacionados à grande quantidade de dados que é utilizada no ciclo de vida de uma OV. Estas abordagens buscam obter, interpretar, filtrar, modelar, armazenar, organizar e sistematizar os dados para que gestores possam recuperá-los e utilizá-lose para tomar as suas decisões de maneira mais efi- ciente e eficaz, um exemplo são as ferramentas de Business Intelligence (BI) (Rabelo e Pereira-Klen, 2002; Rabelo et al., 2004). Todavia estas não se preocupam com o conhecimento gerado nas OVs.

As atividades relacionadas à H-OV são vistas como um processo horizontal que fornece dados, informações e conhecimento ao ACV e às OVs (incluindo atores relacionados à gestão OVs de e sis- temas de suporte relacionados). A figura 3.8, inspirada no trabalho de Nonaka et al. (2003b), ilustra a visão global do fluxo de informação e criação de conhecimento. Nonaka et al. (2003b) sugerem uma estrutura baseada no conceito de hipertexto para permitir a criação do conhecimento de forma eficaz e contínua na organização, transformando dinamicamente o conhecimento entre os níveis de negócios. Assim, o conhecimento gerado no ACV e nas OVs, originadas no ACV, pode ser armazenado em uma base de conhecimento. Na parte superior, o ACV e as OVs são vistos como os produtores e os consumidores de conhecimento, informações e dados, pois eles lidam dinamicamente com uma vasta diversidade de problemas, produtos e serviços, que, para Nonaka et al. (2000), são os fatores pri- mordiais para a criação de conhecimento. Após a fase de dissolução da OV o conhecimento deve ser armazenado de maneira adequada (nível inferior da figura). O processo de armazenamento pode ocor- rer tanto nas formas apontadas por Walsh e Ungson (1991) (na forma de memória organizacional),

11Ramo da sociologia que se preocupa com o estudo das relações entre grupos de pessoas e os seus ambientes físicos e

como também através de um suporte eletrônico/digital (bases de dados) ou relatórios e memorandos impressos. Tanto o ACV como as OVs podem usar este conhecimento para criar valores e aumentar as suas habilidades. Além disso, o ACV pode tirar proveito dos casos de sucesso para aumentar a sua reputação perante os clientes. Todo o processo é visto como uma um ciclo virtuoso e evolutivo de criação e tratamento de conhecimento.

OVs ACV H­OV 33 1 2 4 5 9 8 base  de  conhecimento produtores e us uá rios  de c onheciment o

Figura 3.8: Arcabouço global para H-OV

É importante fazer a distinção entre H-OV e a história do ciclo de vida de uma OV. Na H-OV o conhecimento e as experiências adquiridas podem ser utilizados pelas OVs, já a história da OV está relacionada com a seqüência e o período em que as ações ocorreram (Tølle et al., 2002). Assim cada OV tem as suas próprias atividades descrevendo a sua história de vida. Exemplos de história do ciclo de vida de OVs podem ser encontrados em Ollus et al. (2002) e Tølle et al. (2002).

Por fim, o processo de H-OV é visto como mais do que a soma de conhecimentos. Ele proporci- ona experiências, práticas e casos de estudos para todos os atores de uma dada RCO. Neste caso, a GC é complementar à memória organizacional dando suporte ao processo de H-OV, pois a GC lida tanto com o conhecimento tácito (intrínseco aos indivíduos), como com o conhecimento explícito (formalizado) e ainda se preocupa com o conhecimento potencial (que pode ser descoberto). Como já explorado na seção introdutória desta tese, gestores e administradores buscam formas mais com- petitivas para sobreviver às complexidades do mundo dos negócios, sendo que uma delas é por meio da colaboração entre as organizações em forma de redes. A próxima seção objetiva introduzir os primeiros passos para o aprendizado das RCOs, elencando os principais desafios a serem enfrentados por estas organizações.

3.5

Passos Para o Aprendizado das Redes Colaborativos de Organiza-