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4.1 Elementos de suporte ao aprendizado de RCOs

4.1.3 Elemento Humano

Para Jonassen (1996), ao trabalhar com organizações não se deve considerar apenas o aspecto tecnológico e o aspecto organizacional, mas também o aspecto humano. Apesar das redes de com- putadores permitirem acesso e distribuição de informações, bem como promoverem a socialização do conhecimento quando permitem aflorar e discutir novas idéias, elas por si só não fazem com que os indivíduos compartilhem conhecimento e aprendam. É importante considerar que para criar um contexto adequado para o compartilhamento do conhecimento, e por conseqüência o aprendizado, simplesmente prover os meios tecnológicos para que isso ocorra não é suficiente. Faz-se necessário, então, criar condições para que os atores destas tarefas possam confrontar as experiências adquiridas (Jonassen, 1996). No caso das RCOs, os atores são todos os membros do ACV.

De acordo com Vallejos e Wolf (2006), dentre muitos fatores, como o suporte tecnológico via TICs, regras e procedimentos, o aspecto chave para trabalhar colaborativamente é a confiança. Urze (2006) corrobora afirmando que um dos requisitos para que os atores compartilhem informações e conhecimento é a confiança. Segundo a autora, a confiança é um elemento cultivado por interes- ses comuns e preocupações que surgem em um grupo ou uma área do conhecimento, nas quais se deseja compartilhar experiências para solucionar problemas, bem como compartilhar idéias e práti- cas com o objetivo de preservar as suas capacidades e aumentar as suas competências (Urze, 2006). Nesse sentido, a abordagem de Comunidades de Prática (do inglês Communities of Practice) (CoPs)

surge como um mecanismo para contribuir na construção da confiança entre os membros das RCOs, criar um ambiente que venha motivar os indivíduos a compartilharem o seu conhecimento e, como conseqüência, a aprender com as experiências de outros indivíduos.

Comunidades de Prática

Raja et al. (2006) observa que as organizações têm visto o conhecimento dos seus funcionários como um ativo de grande valor. Todavia, poucas delas estão gerindo este conhecimento e fazendo uso deste potencial de forma ampla atualmente. Argumenta-se então que as CoPs podem auxiliar as organizações, e em especial as RCOs, a suprir parte deste problema através do compartilhamento e da criação de conhecimento tácito e explícito. Por exemplo, as CoPs podem ser utilizadas para integrar especialistas que se dedicam a um problema de interesse específico, mesmo em áreas funcionais diferentes em uma organização (Ackerman et al., 2003), compreendendo assim as fases de criação e evoluçãopropostas por Nissen et al. (2000).

Nessa mesma linha de pensamento, Brown e Duguid (1991) argumentam que as CoPs repre- sentam grupos auto-organizáveis de indivíduos que possuem conhecimentos complementares. Esses indivíduos se comunicam para compartilhar práticas, interesses e objetivos profissionais. Coakes e Clarke (2006a) complementam esta idéia afirmando que os grupos podem ser locais ou geografica- mente distribuídos. Eles corroboram com Brown e Duguid (1991) quando também afirmam que tais grupos são motivados por interesses comuns e pelo desejo de compartilhar e desenvolver os dois tipos de conhecimento: tácito e explícito.

Assim sendo, as CoPs permitem que ocorra o compartilhamento (distribuição) do conhecimento nas organizações, ajudando-as a se tornarem mais competitivas ao ponto que os seus colaboradores adquirirem novas habilidades e conhecimento (Smith e McKeen, 2003). Smith e McKeen (2003) tam- bém argumentam que os indivíduos engajados em CoPs compartilham experiências e conhecimento para promover a inovação (aplicação do conhecimento). Desta forma, as CoPs são vistas como um mecanismo para potencializar o aumento do desempenho das organizações, bem como permitir o compartilhamento das experiências dos profissionais nelas envolvidos e, conseqüentemente, melhor entender as suas tarefas (Scarbrough e Swan, 2002).

As CoPs ainda podem ser formais ou informais, elas são baseadas em práticas de aprendizagem que têm como fundamento a participação social (Wenger e Snyder, 2001). Cada membro de uma CoP participa ativamente e constrói identidades de relacionamentos na comunidade. Para Wenger e Snyder (2001), as CoPs apresentam três dimensões diferentes dos outros tipos de comunidades: i) elas são organizações articuladas; ii) possuem comprometimento mútuo dos seus membros; e iii) buscam o compartilhamento de recursos. Em outras palavras, os membros trabalham com ferramentas, técnicas e tecnologias para criar um vocabulário comum. Chama-se a atenção para as relações de interatividade entre os membros; estas relações não precisam ser necessariamente face a face, pois o avanço das TICs permite aos participantes das CoPs se relacionarem uns com os outros e participarem de equipes virtuais (Wenger, 1999).

Outra característica importante é o conhecimento compartilhado que é regido por regras, normas de reciprocidade e pela confiança entre os membros das CoPs (Scarbrough e Swan, 2002). Devido ao fato das CoPs serem baseadas na confiança, elas são difíceis de serem construídas, mas são destruídas facilmente. Um dos fatores para o seu sucesso é a associação voluntária dos seus membros (Coakes e Clarke, 2006a). Assim, a necessidade de participar de CoPs vem dos indivíduos que devem estar dispostos a compartilhar conhecimento e aprender algo novo e não de uma imposição organizacional.

Quanto ao processo de comunicação nas CoPs, ele é facilitado pelo uso de formulários específicos e um vocabulário (idioma) comum visando aumentar o fluxo de informações entre os seus membros. Scarbrough e Swan (2002) observam que algumas expressões básicas e jargões são amplamente utili- zados e a forma como um tema ou assunto é tratado ajuda a estabelecer a identidade dos membros das CoPs. Wolf e Kazi (2006) enfatizam que glossários, taxonomias e ontologias podem prover suporte ao entendimento de conteúdos essenciais às CoPs. Davenport e Prusak (1998) também evidenciam a importância do papel de uma linguagem comum entre os participantes de uma comunidade, bem como a falta de confiança e de entendimento entre os membros dessa comunidade quando não existe tal instrumento.

Na perspectiva de AO (Pawlowsky, 2003), a aprendizagem ocorre em todos os níveis de análise, pois as CoPs podem conter indivíduos de todas as organizações participantes de um ACV. No quesito que tange ao modo de aprendizagem as CoPs influenciam os modelos mentais (cognitivos) e culturais dos envolvidos pois podem trazer novo conhecimento aos seus participantes, fazendo com que eles venham a agir de forma diferente. No tipo de aprendizagem existe a detecção, correção e eliminação de erros (laço simples). Pode-se buscar a causa destes problemas visando ajustar o ambiente no qual os problemas ocorrem (laço duplo) e incentiva-se a aprender como solucionar os problemas por meio da reflexão entre os integrantes das CoPs (aprendizado deutero). Como conseqüência, ocorre o processo de aprendizagem em todos os níveis que foram elencados por Pawlowsky (2003), pois as CoPs estimulam a identificação e a criação do conhecimento, a difusão deste conhecimento entre os seus membros e, conseqüentemente, a integração com as suas tarefas, podendo levar a novas ações.

Argumenta-se que as CoPs podem servir de instrumento de apoio ao aprendizado das RCOs, pois as elas fomentam a construção da confiança e o aprendizado. Dessa forma, é importante considerar as diferenças e semelhanças entre estas RCOs e CoPs para que haja integração e sustentabilidade entre elas. A tabela 4.1 apresenta as principais diferenças e semelhanças entre as RCOs e as CoPs. Dentre as semelhanças destacam-se: quando as RCOs se manifestam na forma de OVs elas emergem em arranjos temporários e têm ao menos um coordenador. Para um bom funcionamento das CoPs, também deve haver algum nível de organização, mesmo que seja informal. Tanto as RCOs quanto as CoPs podem trabalhar em vários domínios e a sua operação depende da vontade de cooperar e de colaborar. Quando os seus objetivos são alcançados, ambas podem ser dissolvidas; isto significa que elas têm um ciclo de vida bem definido. RCOs e CoPs podem estar dispersas geograficamente. Elas seguem uma visão clara e um conjunto bem definido de regras para que as suas operações sejam eficientes e, finalmente, os seus membros podem participar em várias RCO e várias CoPs ao mesmo tempo.

tecnológica e uma organização formal de trabalho; as CoPs podem existir sem qualquer estrutura for- mal e sem qualquer suporte computacional, embora as interações sejam facilitas pelas TICs. Outra diferença está relacionada à multidisciplinaridade das RCOs e o fato delas demandarem um certo nível de preparo dos seus participantes, já as CoPs estão focadas em um segmento específico e re- querem conhecimento somente sobre o assunto abordado nelas. As RCOs se adaptam de acordo com o mercado e estão focadas em produtos de alta qualidade, bem como na satisfação dos clientes. As CoPs são dirigidas pelos interesses específicos dos seus membros e se adaptam de acordo com es- tas necessidades, sendo focadas no compartilhamento do conhecimento e na construção da confiança entre os seus participantes.

Semelhanças

Redes Colaborativas de Organizações Comunidades de Prática Configuradas em arranjos temporários (prin-

cipalmente as OVs)

Configuradas em arranjos temporários (até que os fins para que se destinam sejam cum- pridos)

Existe pelo menos um coordenador Existem moderadores Emergem de várias formas e em domínios di-

ferentes

Emergem de várias formas e em domínios di- ferentes

O desejo de colaborar é um pré-requisito O desejo de colaborar é um pré-requisito Uma vez alcançados os seus objetivos, elas

deixam de existir

Uma vez alcançados os seus objetivos, elas deixam de existir

Podem estar distribuídas geograficamente Podem estar distribuídas geograficamente Existe um conjunto claro de regras a seguir Existe um conjunto claro de regras a seguir Membros podem participar de várias RCOs

ao mesmo tempo

Membros podem participar de várias CoPs ao mesmo tempo

Diferenças

Redes Colaborativas de Organizações Comunidades de Prática Trabalham com grande suporte computacio-

nal

Podem utilizar alguma infraestrutura compu- tacional para suporte

São configuradas formalmente Normalmente são configuradas informal- mente

Multidisciplinares Focadas em um assunto/aspecto específico Adaptam-se de acordo com as condições do

mercado

Adaptam-se de acordo com as necessidades do grupo

Focadas em produtos e serviços de alta quali- dade e na satisfação dos clientes

Focadas no compartilhamento do conheci- mento e na construção da confiança

Buscam construir a confiança entre os seus membros quando estes participam de uma certa oportunidade de colaboração

Proporcionam a construção da confiança entre os seus membros

Tabela 4.1: Características das RCOs e das CoPs.

Dentre as similaridades e diferenças apresentadas, o fator-chave que dá às RCOs e às CoPs im- pulso, é o desejo de trabalhar em conjunto para atingir um certo objetivo e criar a confiança entre os seus membros. De acordo com Lewis e Weiger (1985) e Jones e George (1998), a confiança pode ser construída através de elementos cognitivos e afetivos. Os elementos cognitivos estão ligados à razão, como por exemplo, o senso de responsabilidade e competências específicas dos membros de uma rede. É importante enfatizar que a transparência de competências e dos objetivos de cada membro

fazem com que todos da rede sejam vistos como elementos importantes, capazes de trazer benefícios para o grupo (aplicação do conhecimento, de acordo com a perspectiva de Nissen et al. (2000)).

Wolf e Kazi (2006) acreditam que as CoPs podem fomentar o desenvolvimento de uma hierarquia de comunicação horizontalizada, encorajando o fluxo de conhecimento em um contexto social mais amplo e visando a participação coletiva dos seus membros, bem como o compartilhamento do conhe- cimento e a aprendizagem. A promoção de relações sociais é vital para que os elementos afetivos. São estes elementos afetivos os responsáveis pela construção da confiança.

Argumenta-se que as CoPs podem auxiliar a desenvolver a confiança entre os membros das RCOs (tanto coletiva quanto afetivamente), mas a confiança é construída lentamente e baseada nos níveis de relações interpessoais (virtuais ou não)22. Dessa forma, as CoPs podem encorajar a interação entre os membros de uma RCO tanto em uma disposição local, quanto em uma disposição distribuída.

De acordo com Raja et al. (2006), a confiança é desenvolvida mais facilmente em ambientes lo- cais, onde os membros de uma rede compartilham um espaço físico. Isto ocorre porque, em contraste com os relacionamentos diários, a comunicação pessoal permite uma identificação e uma percepção melhor, bem como a criação de elementos afetivos. Entretanto, Raja et al. (2006) também chamam a atenção para o fato de que em um ambiente virtual, onde os membros estão geograficamente disper- sos, também é possível fomentar a confiança. A existência de mecanismos, canais de comunicação e regras para dar suporte às práticas de interatividade em RCOs podem formar uma base sólida nos re- lacionamento dos seus membros. Acredita-se que este relacionamento pode ser cultivado pelas CoPs. Como por exemplo, as iniciativas para a participação e a contribuição voluntária dos membros deve ser promovida pelos líderes dos grupos dentro das CoPs.

Outro aspecto interessante é que em ambientes informais (típico das CoPs), elementos afetivos são introduzidos com maior facilidade que os elementos cognitivos. Nas RCOs, pode-se notar uma grande quantidade de valores cognitivos e uma taxa menor de valores afetivos, conseqüentemente existe a importância de estabelecer contato entre os membros, como citado anteriormente.

CoPs podem contribuir com o aprendizado de RCOs quando elas aumentam o uso de redes cola- borativas em favor dos elementos afetivos para fomentar a troca de experiências na rede de maneira informal e, assim, aumentar a construção da confiança nas duas camadas: afetiva e cognitiva. Dessa forma, entende-se que as CoPs podem encorajar as relações entre os membros da RCO e conseqüen- temente promover a confiança e o aprendizado. Por fim, faz-se importante enfatizar a existência de um ciclo contínuo, onde maior o valor da confiança, maior é a participação, engajamento e o compro- metimento de cada parceiro/membro da rede, ou seja, a interatividade e o sentimento coletivo. Esse fator também influencia na memória organizacional (diretamente ligada com a herança de OVs). A figura 4.9 apresenta o posicionamento das comunidades de prática no escopo do elemento humano do acarbouço proposto.

E lem ento Tecnol ógi co El em ento H u m ano RCOs Aprendizado de RCOs Comunidades de Prática E lem ento Or gani zaci ona l

Figura 4.9: Elemento humano da abordagem proposta.